Acórdão nº 965/09.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelSALRETA PEREIRA
Data da Resolução07 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça ... Airways - Transportes Aéreos, S.A. intentou e fez seguir contra BB Airlines And Tourism, Ld. a presente acção declarativa, com processo ordinário, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 1.922.369,41 (um milhão novecentos e vinte dois mil trezentos e sessenta e nove euros e quarenta e um cêntimos), sendo € 1.729.406,50 a título de capital e € 192.962,91 a título de juros, acrescida de juros à taxa legal para juros comerciais sobre o capital em dívida desde 31 de Março de 2008 até efectivo e integral pagamento e juros de 5% nos termos do disposto no art. 829.0-A nº 4 do Código Civil, desde o trânsito em julgado da sentença condenatória até efectivo e integral pagamento.

Para tanto e em síntese alegou ter celebrado com a ré um contrato de Wet Lease, o qual tinha por objecto a locação de uma aeronave para o período de 05.01.2008 a 31.01.2008, contrato esse que foi aditado em 29.12.2008, tendo sido aumentada a garantia de BH e o preço reduzido, e tendo sido prorrogado o prazo de locação até 31 de Março de 2008, garantindo assim a ré um total de 700 block hours a um preço de € 4.050,00.

Mais alegou ter cedido à ré o gozo da aeronave Boeing 767-300, que começou a ser utilizada logo no dia 5 de Janeiro de 2008.

Adianta que, em 09 de Janeiro de 2008, a ré comunicou-lhe que iria terminar o contrato em 31 de Janeiro e que não continuaria em Fevereiro e Março.

Após vários contactos, reuniões e e-mails, a autora, em 22.01.2008, informou a ré de que, se mantinha interesse na resolução, teria de proceder ao pagamento das quantias resultantes do cumprimento total do contrato, dado que a autora não aceitava a resolução antecipada deste.

Finalmente, refere ter tido danos, na sequência do incumprimento do contrato pela ré, correspondentes aos valores que receberia se esta tivesse cumprido integralmente o contrato e que os prejuízos correspondem ao total de € 1. 764.511,50, deduzido o valor das quantias que teria de pagar à tripulação e que ascendem a € 35.105,00, o que perfaz o valor de € 1.729.406,50, que corresponderia ao lucro que a autora teria obtido.

Concluindo não existir qualquer fundamento para a resolução do contrato e que a declaração efectuada pela ré apenas consubstancia um anúncio antecipado de incumprimento, sendo esta responsável pelos prejuízos causados à autora.

A ré defendeu-se por excepção e por impugnação e deduziu reconvenção, tendo concluído: Pela procedência da excepção invocada de resolução do contrato motivada pelo incumprimento definitivo deste pela autora, não produzindo o mesmo quaisquer efeitos a partir de 31 de Janeiro de 2008, nada mais devendo a ré à autora, seja a que título for; Caso assim não se entenda, seja julgada procedente a segunda excepção invocada pela ré, dando-se por operada a condição resolutiva expressa invocada e constante da cláusula 17.a do contrato, tendo-se este por resolvido na data de 31 de Janeiro de 2008 e não produzindo quaisquer efeitos a partir dessa data, nada devendo a ré à autora seja a que título for; Caso assim não se entenda, julgando-se antes ser a condição da cláusula 17.a do contrato uma condição suspensiva, seja julgada procedente a excepção invocada, pela ré dando-se por não verificada a condição suspensiva expressa invocada e constante da cláusula 17ª do contrato, não produzindo assim o mesmo quaisquer efeitos a partir de 31 de Janeiro de 2008, nada devendo a ré à autora seja a que título for; Caso assim igualmente se não entenda, seja julgada procedente a quarta excepção invocada pela ré, declarando-se a anulabilidade do negócio jurídico com base em erro sobre o objecto do negócio - o contrato dos autos - com as legais consequências, nada mais devendo a ré à autora, seja a que título for; Em qualquer caso, seja a presente acção julgada totalmente improcedente, por não provada, sendo, em consequência, a ré absolvida dos pedidos formulados.

Mais deve o pedido reconvencional ser julgado totalmente procedente por provado, sendo a reconvinda e ora autora condenada a pagar à reconvinte e ora ré o valor de € 135.781,00 (cento e trinta cinco mil, setecentos e oitenta e um euros), acrescido de juros de mora vencidos até à presente data e vincendos desde o dia 20 de Fevereiro de 2008 até integral pagamento e ainda o valor indemnizatório que se venha a apurar em sede de liquidação de sentença.

Para tanto e em síntese alegou ter sido a autora que não cumpriu com o acordado e por isso formula pedido reconvencional, mais alegando que o cálculo dos prejuízos efectuado pela autora não está correcto.

Refere que, ao assinar o contrato, estava convencida de que o aparelho podia operar os voos Telavive/Nova Iorque directamente e sem qualquer escala para reabastecimento e que todas as negociações prévias à assinatura do contrato assentaram nesse pressuposto, sendo que a autora, em momento algum das referidas negociações, fez qualquer reserva ou representou, por qualquer modo, que a sua aeronave não poderia fazer todos os voos sem paragem para reabastecimento.

Acrescenta que, no voo do dia 8 de Janeiro de 2008, tiveram de fazer escala e deixar para trás dois contentores de carga porque embarcaram 218 passageiros e tiveram de pagar uma compensação a 15 passageiros que alocaram para outro voo e a quem pagaram os bilhetes, porquanto, apesar de a autora ter referido que faria o voo sem escala com cerca de 205/210 passageiros, não o fez.

Tal situação provocou custos adicionais imprevisíveis, naquela semana, o que constituiu surpresa para a ré, que conhecia o aparelho e as suas características, facto que foi comunicado por e-mail de 09.01.2008 à autora e por isso e porque as reclamações dos passageiros eram constantes e porque ficaram conscientes de que o aparelho não podia cumprir os fins para os quais havia sido locado, a ré avisou a autora de que não podia continuar a suportar tais custos e que o contrato não poderia prolongar-se para além do dia 31 de Janeiro.

Tal situação manteve-se e, a 14 de Janeiro, a ré voltou a insistir com a autora que considerava terminado o contrato a 31 de Janeiro, tendo referido nessa data e posteriormente a 18 de Janeiro que o avião não tinha capacidade para fazer voos directos com mais de 160 passageiros, ao contrário dos 240 acordados.

Alegou, ainda, que até ao final do contrato cumpriu todas as obrigações que lhe competiam, tendo procedido a todos os pagamentos relativos ao mês de Janeiro.

Adianta que o contrato será anulável por erro sobre o objecto uma vez que, quando contratou, estava convencida de que a aeronave poderia fazer os voos directos e que a autora sabia, desde o inicio, qual a finalidade do contrato e quais as características que o contrato e os serviços teriam de revestir.

Pelo que, segundo refere, nunca teria celebrado o contrato se conhecesse os defeitos do avião e da tripulação.

Alegou, ainda, que a autora não teve qualquer prejuízo, pois sabia, com certeza, que o contrato terminaria a 31 de Janeiro, tendo até solicitado os bilhetes de regresso da tripulação para Portugal.

E que se o avião não foi alugado no período de Fevereiro e Março tal se deve apenas à autora.

Em sede de reconvenção, alegou que o incumprimento da autora lhe causou prejuízos resultantes das aterragens e horas de voo suplementares, desvalor que foi suportado pela ré e relativos a custos directos operacionais, tendo sido realizadas pelo menos 12 aterragens suplementares.

Sendo que a decisão de resolver o contrato acarretou para a ré custos suplementares com o cancelamento dos voos e consequente inactividade, cujo valor desconhece e solicita se relegue para liquidação em execução de sentença.

Bem como com a transferência de passageiros para outras companhias despendeu quantia não inferior a USD 1.000.000 equivalente a € 715.000,00.

A que acresce a manutenção dos escritórios abertos em Nova Iorque para atender às queixas e reclamações dos passageiros e para prover à assistência destes.

Tendo efectuado despesas acrescidas com publicidade e marketing para poder recuperar a sua boa imagem e atingir a credibilidade e quota de mercado que sempre manteve, tudo derivado das aterragens a mais e do tempo excessivo de voo e do péssimo serviço prestado pela tripulação.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença em que se decidiu: Por todo o exposto, declaro procedente a excepção de anulação do negócio e, em consequência, anulo o Acordo denominado de Wet Lease, celebrado entre autora ... Airways - Transportes Aéreos, S.A., e a ré, BB Airlines And Tourism, Lda., o qual tinha por objecto a aeronave Boeing 767-300 ER, com a matrícula ..., declarando extintas por compensação as prestações restituitórias de ambas as partes, nada mais sendo devido à autora e, em consequência, absolvo a ré do pedido.

Mais decido julgar improcedente o pedido reconvencional e, em consequência, dele absolvo a autora.

Custas por autora e ré na proporção do decaimento.

Inconformada com tal decisão, a autora recorreu para o Tribunal da Relação Lisboa que proferiu acórdão a julgar parcialmente procedente a apelação, condenando a ré a pagar à autora a indemnização de € 1.324.965,64, acrescida de juros à taxa dos juros comerciais, crédito que julgou extinto por compensação, nada mais sendo devido pela ré à autora.

Inconformadas com tal decisão, autora e ré vieram dela recorrer para este Supremo Tribunal de Justiça, a primeira a título principal e a segunda subordinadamente.

A autora apresentou alegações em que concluiu pela nulidade do acórdão, acusando-o de julgar extinto o crédito da autora sobre a ré por força do instituto da “compensatio lucri cum damno”, não invocado pelas partes.

Impugnou, de seguida, a resposta dada ao quesito 105º da base instrutória.

Mais defendeu o erro de julgamento, na medida em que a ré não provou o nexo de causalidade entre o seu ilícito contratual e o lucro obtido pela autora com a locação do mesmo avião à empresa CC- Cabia à ré demonstrar que...

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