Acórdão nº 1111/13.8T4AVR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDES DA SILVA
Data da Resolução08 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. n.º 1111/13.8T4AVR.S1 Revista – 4.ª Secção[1].

FS (GR/LD).

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1.

AA, BB, EE, DD, EE e FF instauraram a presente acção, com processo comum, contra o «Estado Português» (Ministério da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas – Direcção Geral de Veterinária), pedindo a condenação deste a: - Reconhecer que os AA. se encontraram vinculados por contratos de trabalho subordinado, desde as datas indicadas, quanto à celebração dos contratos iniciais ditos de “avença”, para cada um deles na PI, e até 31.03.2010, vínculos que se prolongaram para todos os AA. para além de Março de 2010, com a celebração do contrato de trabalho em funções públicas; - Pagar a cada um dos AA., os valores, não pagos e nos montantes que concretamente indicaram para cada um deles, a título de retribuição de férias, subsídios de férias e dos subsídios de Natal; - Pagar a cada um dos AA. os juros de mora legais, sobre as importâncias antes mencionadas, que se venceram desde as datas dos vencimentos de cada um dos valores e até ao integral pagamento, concretizando o montante dos já vencidos.

Para tanto, alegaram, em breve escorço, que: - Foram admitidos ao serviço do Estado Português, através da Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral, por contratos que foram celebrados de 2000 a 2005, os quais foram denominados de “contratos de avença” e tinham duração inicial previsível de 1 ano; - Esses contratos foram-se renovando até 31.03.2010, altura em que foram celebrados, com cada um dos AA., contratos de trabalho em funções públicas, na modalidade de contrato por tempo indeterminado, tendo continuado a executar os mesmos serviços que antes desempenhavam.

- Apesar de os contratos inicialmente celebrados terem sido denominados de “avença”, a relação que existiu entre AA. e R. era de natureza laboral, tratando-se, materialmente, de “contratos de trabalho” sendo que, no ano de início daqueles contratos, o R. não concedeu férias aos AA. nem lhes pagou remuneração correspondente a essas férias e nunca pagou aos mesmos o subsídio de férias correspondentes às férias remuneradas de cada ano, nem qualquer valor a título de subsídio de Natal.

- Em 2010, quando foi celebrado contrato de trabalho em funções públicas, o R. não concedeu aos AA. as férias relativas aos 3 meses de contrato anterior a esse contrato de trabalho em funções públicas, nem pagou subsídios de férias e de Natal proporcional a esse período.

  1. O Réu, representado pelo Ministério Público, contestou, por excepção e por impugnação, alegando, em síntese útil, que se verifica a excepção peremptória da prescrição porquanto os AA. celebraram com o R. contratos de trabalho em funções públicas que produziram efeitos a partir de 01.04.2010, tendo, nessa data, cessado o vínculo que anteriormente ligou cada um dos AA. ao R., pelo que, desde essa data e até à data da instauração da presente acção, já se mostra decorrido o prazo estabelecido no art. 381.º do CT/2003 e 337.º do CT/2009 para a prescrição dos créditos do trabalhador decorrentes daqueles primeiros vínculos.

    Por outro lado, aduziu que o valor da remuneração paga mensalmente aos AA. incluía duodécimos de subsídios de férias e de Natal, acrescendo também subsídio de refeição.

    Impugnando os factos alegados para a existência de contratos de trabalho, sustentou o R. que as funções desempenhadas pelos AA. correspondiam a serviços necessários ao desempenho das atribuições da Direcção-Geral de Veterinária, que, antes da reestruturação orgânica da mesma, eram contratados “externamente” com os aludidos vínculos de “avença”.

    Concluiu no sentido de deverem ser julgadas procedentes as excepções de prescrição e de pagamento, com a inerente absolvição do pedido ou, se assim não se entender, dever a acção ser julgada improcedente, com a inerente absolvição do pedido.

    Os AA. responderam à contestação, concluindo pela improcedência das excepções invocadas.

  2. Discutida a causa, proferiu-se sentença, em que se concluiu que os vínculos celebrados por cada um dos AA. com o R., denominados de “avença”, e que vigoraram até 31 de Março de 2010, consubstanciaram contratos de trabalho, que são nulos por não ter sido observado o procedimento imperativo para a selecção dos trabalhadores em funções públicas, sendo-lhes aplicável, até à declaração da sua nulidade, o regime do contrato de trabalho.

    Considerou-se e concluiu-se ainda, que, não estando demonstrado o pagamento de subsídios de férias e de natal reclamados pelos AA., era de equacionar a determinação do seu pagamento; porém, como tais contratos de trabalho cessaram com a celebração, em 01 de Abril de 2010, dos contratos de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, esses créditos já se encontravam prescritos, atento o disposto no art. 337.º do CT.

    Decidiu-se julgar procedente a excepção da prescrição e, consequentemente, julgou-se a acção totalmente improcedente e absolveu-se o R. de todos os pedidos formulados pelos AA.

  3. Irresignados com o assim decidido, os AA. interpuseram recurso de Apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, circunscrevendo o respectivo objecto a duas questões: a da (im)procedência da excepção de prescrição e a do pretenso erro de julgamento por não ter sido considerado procedente o pedido de reconhecimento da natureza laboral que uniu AA. e R. até Março de 2010.

    Nas contra-alegações apresentadas, o R., sustentando que as duas questões suscitadas na apelação são exclusivamente relativas a “matéria de direito”, requereu que, verificados que se mostram os requisitos contidos no n.º 1 do art. 678.º do CPC, «a apelação subisse directamente ao Supremo Tribunal de Justiça (recurso per saltum)».

    Notificados do assim requerido, os AA. nada opuseram.

    ___ O recurso foi assim admitido directamente neste Supremo Tribunal de Justiça, como Revista (per saltum).

    A motivação recursória, oportunamente deduzida pelos AA./recorrentes, encerra com a formulação das seguintes proposições conclusivas: «I - PRESCRIÇÃO DOS CRÉDITOS.

    1 - Enquanto no Código Civil o prazo prescricional se inicia quando o direito puder ser exercido, no direito laboral esse prazo só se inicia quando cessa a relação contratual.

    2 - A razão de ser deste regime especial de prescrição de créditos está no facto de o legislador reconhecer que o trabalhador, enquanto permanece vinculado por contrato de trabalho subordinado, está afectado de uma capitis diminutio, "presumindo que ele não goza de plena liberdade psicológica para reclamar o que lhe é devido" – vide Monteiro Fernandes, in ‘Direito do Trabalho’, Almedina, Ed. 12ª.

    3 - E "o que importa para o início da contagem é o momento da ruptura da relação de dependência, não o momento da cessação efectiva do vínculo jurídico" – página 481 da mesma obra.

    4 - Em 31/03/2010 não se dá a ruptura das relações de dependência, na medida em que os Recorrentes continuaram a trabalhar para o Estado a partir de 1/04/2010, de forma subordinada.

    5 - A relação de trabalho e de subordinação manteve-se inalterada entre o momento anterior a 31/3/2010 e o posterior a esta data.

    6 - A única alteração ocorrida reside no facto de o Estado ter procedido à regularização de uma situação ilegal, que se verificava até 31/3/2010, formalizando a celebração de contratos de trabalho em funções públicas.

    7 - Portanto, contrariamente ao que defende a douta decisão recorrida, não ocorreu em 31/3/2010 a cessação do contrato de trabalho, mantendo-se depois desta data o mesmo tipo de relação de dependência, o mesmo tipo de subordinação e com mesmo conteúdo funcional da prestação de trabalho que se verificava anteriormente.

    8 - Por outro lado, sem prescindir do anteriormente defendido, sendo nulos os contratos de trabalho que vigoraram, entre cada um dos Recorrentes e o Réu, até 31/3/2010, essa declaração de nulidade não pode ter como consequência a prescrição dos créditos.

    9 - Como se sustenta no douto acórdão recorrido: “Os efeitos do contrato nulo, como se fosse válido, em relação ao tempo durante o qual esteve em execução, limitam-se à obrigação da entidade empregadora pagar as retribuições vencidas correspondentes ao tempo em que o contrato esteve em execução, designadamente os subsídios de férias e de Natal reclamados. Mais nenhum efeito jurídico é legítimo extrair dessa invalidade.” E… “Sendo esse o único efeito jurídico da declaração de nulidade do contrato, ficam excluídos quaisquer outros, designadamente os efeitos prescricionais decorrentes do decurso do prazo previsto no art.º 337.º, n.º 1, do Código do Trabalho”.

    10 - Por isso, não ocorreu a prescrição dos créditos reclamados pela Recorrente, já que nem sequer esse prazo teve início.

    11 - Devendo o Estado ser condenado a pagar aos Recorrentes os créditos reclamados, bem como os respectivos juros de mora peticionados.

    12 - Ao decidir de forma diversa, a douta decisão recorrida violou, em nosso entender, o disposto no artigo 337.º do Código do Trabalho.

    II - ERRO DE JULGAMENTO, NA PARTE DECISÓRIA.

    13 - O primeiro pedido formulado pelos Recorrentes na sua petição foi o de ser o Réu condenado a reconhecer que "os AA. se encontraram vinculados por contratos de trabalho subordinado, desde as datas indicadas, quanto à celebração dos contratos iniciais ditos de "avença", para cada um deles neste articulado, e até 31/3/2010... ".

    14 - Apesar de ter reconhecido, na sua fundamentação, que existiu entre os Recorrentes e o Estado uma relação de trabalho subordinado durante aquele período, a douta sentença acabou por não condenar o Réu a reconhecer a existência desses mesmos vínculos.

    15 - Esta omissão deve-se a mero lapso do julgador, tratando-se assim de um erro de julgamento.

    16 - "Daí que se entenda que pode e deve este Tribunal de recurso corrigir esse erro de julgamento e condenar o Réu nos precisos termos peticionados pelos Autores."».

    Terminam perorando que seja dado provimento ao presente recurso, revogando-‑se a douta decisão recorrida, (que julgou...

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