Acórdão nº 87/12.3SGLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelISABEL PAIS MARTINS
Data da Resolução02 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I 1.

No processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, n.º 87/12.3SGLSB, da 6.ª vara criminal de Lisboa, por acórdão de 05/07/2013, quanto à acção penal, foi decidido: 1.1.

Condenar os arguidos AA [AA], BB [BB], CC [CC], DD [DD] e EE [EE] pela prática, em co-autoria, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.

os 1 e 2, alíneas d) e h), do Código Penal[1], na pena de 18 anos de prisão.

1.2.

Condenar os arguidos AA e BB pela prática, em co-autoria e em concurso efectivo, de um crime de homicídio qualificado tentado, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º, n.

os 1 e 2, alínea d), 22.º, 23.º e 26.º, do Código Penal, na pena de 8 anos de prisão.

1.3.

Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, condenar os arguidos AA e BB na pena única de vinte anos de prisão.

1.4.

Condenar a arguida EE pela prática de um crime de ofensas corporais simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.

1.5.

E, em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, condenar a arguida EE na pena única de 18 anos e 6 meses de prisão.

2.

Todos os arguidos interpuseram recursos para o Tribunal da Relação de Lisboa.

3.

Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23/12/2013, foi decidido julgar improcedentes os recursos e confirmar o acórdão da 1.ª instância recorrido.

4.

Inconformados, interpuseram todos os arguidos recursos para o Supremo Tribunal de Justiça.

4.1.

A arguida DD formulou as seguintes conclusões: «A) O presente recurso visa questionar a douta decisão recorrida, nos seguintes aspectos: «A) impugnação da decisão de facto (pontos 3, 6, 7, 8, 9, 4/19, 20, 22, 23, 27/33, 40, 41, 43, 45) quanto à decisão condenatória à arguida DD; B) Impugnação da matéria de direito relativamente a: 1) interpretação dada pelo Tribunal violou o artigo 147º, nº 7 do C.P.P. e artigo 32° da CRP; 2) "Da árvore do fruto envenenado" ou do efeito à distância; 3) Violação do princípio da livre apreciação da prova; 4) Da inexistência de responsabilidade penal pela alegada prática de crime de homicídio qualificado; 5) Da medida da pena aplicável - Pena excessiva; 6) Da existência de fundamento para a suspensão da execução da pena relativamente à arguida.

«B) Impugnação da matéria de facto: O douto acórdão recorrido perfilha o entendimento de que as provas produzidas em audiência permitem fazer um juízo de segurança quanto ao facto de a arguida ter praticado o crime de que foi acusado.

«1) Ora, esta fundamentação é inaceitável dado que a situação de facto, tal como ela se desenrolou. Na verdade, conforme se demonstrará adiante a decisão é inaceitável dos aspectos impugnados por se entender que: a) Existem provas claras, que foram produzidas e examinadas em audiência, que impunham decisão diferente quanto à arguida; b) que inexistem provas que possam condenar a arguida pela prática, em co-autoria material, num crime de homicídio qualificado c) Não existe qualquer fundamento para a decisão de condenação.

«2) Pontos de facto incorrectamente julgados e provas que impõem decisão diversa da recorrida: «- Pontos dados como provados na matéria de prova (acórdão da 6ª vara criminal de Lisboa): 3, 6, 7, 8, 9, 14, 19, 20, 22, 23, 27, 33, 40, 41, 43, 45.

«- Provas que impõe decisão diversa: Atenta a ausência de provas resultante do Tribunal e em virtude da dúvida razoável existente e, por conseguinte, a ausência de certeza máxima requer-se a análise de todos os depoimentos produzidos em sede de audiência de discussão e julgamento.

«C) Impugnação da matéria de direito «1. Nenhuma testemunha e/ ou arguido esclareceu, de forma clara, inequívoca se a arguida DD decidiu, em conjunto com os demais arguidos, por termo à vida dos ofendidos.

«2. Nenhuma testemunha e/ou arguido esclareceu, de forma clara e inequívoca o modo de actuação da arguida para o resultado trágico daquele dia.

«3. O próprio ofendido FF referiu que não viu a arguida DD agredir o seu primo.

«4. O próprio ofendido FF referiu que apenas e somente por um momento (à porta da discoteca ...) a arguida DD o agarrou, tendo o mesmo interpretado tal facto como uma tentativa da mesma em separá-lo do namorado da arguida à data, BB.

«5. As testemunhas presenciais dos factos - FF, GG e HH - referiram que viram a arguida no local mas não a viram fazer rigorosamente nada à vítima. A testemunha FF refere que não viu qualquer agressão da arguida DD ao primo II; a testemunha GG identificou a rapariga morena que batia com uma bota na cabeça da vítima como sendo a "...", pessoa que já conhecia como sendo streapper e a qual sabia ter uma tatuagem no peito com um coração e umas asas; e a testemunha HH, condutor da ..., que esteve no local quando se ocorreram os factos referiu, expressamente, que não era a DD a rapariga morena com uma tatuagem com um coração e asas que estava com uma bota na mão a bater na cabeça da vítima, tendo, inclusivamente, feito a referência que apenas viu a DD com um pé encostado à zona lombar (barriga) do ofendido não sabendo concretizar o porquê.

«6. Tais depoimentos são, em tudo, manifestamente diferentes dos constantes dos autos de reconhecimento de fIs ..., nos quais as mesmas testemunhas reconheceram a DD como sendo a pessoa que tinha o sapato na mão e agredia a vítima na cabeça.

«7. E não se pense, sequer, que os depoimentos produzidos na P.J. é que são os "válidos" atento o decurso do tempo. As testemunhas evidenciaram, expressamente, os elementos identificadores da alegada suspeita: rapariga tez morena, cabelo preto, com cerca de 20 a 30 anos, que tinha uma tatuagem no peito com um coração e asas. Contudo, aquando da elaboração dos autos de reconhecimento atribuíram a identidade de tal pessoa (em julgamento CC) à arguida DD.

«8. Resulta inequivocamente provado através dos depoimentos das testemunhas, que os reconhecimentos realizados não cumpriram os requisitos impostos pelo artigo 147º, nº 1 do C.P.P.

«9. No caso em concreto dúvida não existe que o reconhecimento efectuado na P.J. não cumpriu com as formalidades exigidas pelo artigo 147º, n.º 1 e 2 do C.P.P. razão pela qual, nos termos do nº 7 do mesmo artigo: "o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste artigo não tem valor como meio de prova, seja qual for a fase do processo em que ocorrer." «10. Assim existe a ponderação do sentido das provas subsequentes, não declarando a invalidade destas, quando estiverem em causa declarações confessórias, mostra-se de acordo com o preceituado na CR.P., não comportando qualquer sobreposição interpretativa a essa norma que implique uma clara ofensa aos preceitos constitucionais invocados.

«11. Ora forçoso somos de concluir que, no caso em apreço, os reconhecimentos não foram realizados de acordo com as regras impostas e, bem assim, as surpreendentes e preocupantes declarações produzidas pelas testemunhas em sede de audiência de discussão e julgamento (ao esclarecerem que as pessoas que praticaram os factos não são aquelas que constam dos reconhecimentos a fls ... ).

«12. Não existem provas produzidas em audiência de discussão e julgamento que possam, por exemplo, concluir que a rapariga morena com a tatuagem no peito com um coração e umas asas seja a DD (quando, até, foi constatado em plena audiência, tal tatuagem na zona do peito da arguida CC, também ela morena e presente no local e reconhecida, em julgamento, pelas testemunhas supra identificadas) sendo apenas teorias e teses sem fundamentação probatória.

«13. Assim e tal como já defendido supra, admitida que seja a dúvida, o Tribunal recorrido deveria ter aberto mão do instituto do In dubio pro reo, como medida de mais elementar prudência e decorrente dos princípios constitucionais e sagrados na ponderação e apreciação da prova, o que, salvo o devido respeito, não sucedeu.

«14. Pelo exposto a interpretação dada pelo Tribunal no douto acórdão, de desvalorizar o conteúdo dos autos de reconhecimento, violou o disposto no n.º 7 do artigo 147º do C.P.P. uma vez que o Tribunal tinha, obrigatoriamente, que declarar que os reconhecimentos de pessoas de fls ... não tinham valor como meio de prova com as demais consequências que daí se retiram.

«15. Na apreciação das provas o julgador deve nortear a sua actividade, procurando analisar de forma lógica as provas, todas as provas produzidas, através de um juízo de normalidade das coisas, de onde resulte a reconstituição dos factos com um certo grau de certeza.

«16. O que está em causa neste caso resulta da conjugação de dois princípios fundamentais, a saber: o dever de fundamentação e o da livre apreciação da prova. Como se referiu supra a douta fundamentação é irrazoável, denota falta de clareza e não valorou as provas relevantes em termos legais, entre elas o depoimento da arguida. Por outro lado, também foi violado o princípio da livre apreciação da prova, dado que não apreciaram as provas de acordo com as regras da experiência.

«17. Assim, resulta inequivocamente demonstrado que, pese embora o Tribunal tenha desvalorizado os reconhecimentos pessoais de fls ... não declarou que os mesmos não tinham qualquer valor como meio de prova.

«18. A interpretação dada pelo Tribunal - ou a ausência de interpretação conforme o disposto no n.º 7 do artigo 147º do C.P.P. como se impunha – traduz, claramente numa violação do princípio da livre apreciação da prova.

«19. Também sobre esta matéria se reitera e reproduz, ipsis verbis, o já referido no ponto 2 da impugnação da matéria de direito, sobre a teoria da árvore do fruto envenenado.

«20. Efectivamente e ao contrário do afirmado pelo Tribunal recorrido não existe qualquer meio de prova e / ou prova que possa, com a segurança que se lhe exige, afirmar que a arguida DD tivesse, em algum momento, decidido com os demais arguidos executar um plano e que tal plano fosse o de por termo à vida dos ofendidos e/ ou bem assim que tenha, sequer, agredido por algum momento os ofendidos e/ ou sequer que tenha tivesse e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
12 temas prácticos
12 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT