Acórdão nº 122/13.TEFLRS-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | JOÃO SILVA MIGUEL |
Data da Resolução | 03 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. AA, identificado nos autos, alegando estar no gozo dos seus direitos políticos, vem, nos termos dos artigos 31.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e 11.º, n.º 4, alínea c), e 222.º, ambos do Código de Processo Penal (CPP), pedir providência de habeas corpus para a libertação imediata de BB, ex-... de Portugal, alegando que aquele encontra-se «ilegalmente preso preventivamente no “Estabelecimento Prisional de ..."», petição que formula com os fundamentos que, na íntegra, a seguir se reproduzem: «1. Como é do conhecimento público e internacional, o Ex-...de Portugal foi detido, em ..., em público e com transmissão televisiva nacional, pelas autoridades policiais e apresentado ao juiz de instrução criminal do Tribunal de Instrução Criminal Central de ....
2. Do Ministério Público, o signatário apenas tem a informação sobre indícios de crime, analogamente transmitida pela comunicação social.
3. Do referido Tribunal (...) o oficial de justiça junto do mesmo confirmou, igualmente através da comunicação social, esses indícios da comissão de crimes de corrupção e conexos pelo Ex-....
4. Do comunicado público do ... não consta a gravidade dos indícios.
5. E nem os fundamentos.
6. A inexistência de gravidade dos indícios e a ausência de fundamentos públicos para aplicação da mais grave medida de coação na ausência de todos os seus pressupostos legais, viola, designadamente, o Artigo 204.º do Código de Processo Penal.
7. E o Artigo 30.º da Constituição (CRP).
8. E também viola provavelmente o número 4 do Artigo 26.° da CRP.
9. Porque o Ex-... de Portugal é uma figura pública e quando o interesse público de uma população está em causa, é dever do Estado, onde se inclui o poder judicial, informar com clareza os portugueses, como já sucedeu e sucederá noutras catástrofes em território nacional.
10. Ademais, a comunicação pública conhecida do despacho que determinou a prisão preventiva do Ex-..., viola, por conseguinte, os Princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, ínsitos no Artigo 193.º do Código de Processo Penal.
11. E viola, também, o Artigo 27.º da CRP.
12. Trata-se de uma situação anormal, extraordinária e de gravidade extrema, jamais surgida na história destes 40 anos de Democracia em Portugal. [A negrito no original] 13. Na medida em que o Ex-... está preso preventivamente por se considerar que venha a ser condenado no futuro, não havendo, ainda, uma condenação judicial, deve prevalecer, sem dúvidas, a consagração constitucional do direito à liberdade.
14. Aliás à semelhança de outros casos identicamente mediáticos, mas de gravidade e consequências incomparavelmente menores, como é comummente percecionado.» A final, conclui nestes termos: «O Ex-... de Portugal está, assim, pública e objetivamente na prisão por facto pelo qual a lei a não permite e que repugna os bons costumes. [A negrito no original] Pelo exposto A continuidade do estado de preso do Ex-... de Portugal, sem acusação formada, gozando este de Presunção de Inocência Constitucionalmente garantida a todos os cidadãos (Art.- 32.°), havendo outros meios mais eficazes previstos na lei e menos estigmatizantes, humilhantes e injustos para um cidadão, nomeadamente, perante aquele que representou Portugal enquanto chefe do Governo durante 7 anos (2005-2011), coloca indelével, efetiva e inarredavelmente em crise o Estado de Direito Democrático, o interesse público, o prestígio internacional de Portugal e a ordem e a tranquilidade públicas.» (A itálico no original) 2. No cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 223.º do CPP, o Senhor Juiz de Instrução do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) prestou a seguinte informação, que se transcreve na parte relevante: «Por despacho proferido em 18 de Novembro de 2014, foi determinada a detenção fora de flagrante delito de BB, atenta a existência de indícios da prática de crimes de fraude fiscal qualificada, corrupção e branqueamento de capitais e por se verificarem os perigos de fuga e de perturbação da recolha e conservação da prova.
Em 19 de Novembro/2014, BB ausentou-se de Portugal, com bilhete de regresso para o dia seguinte.
Em 20 de Novembro/2014, foram realizadas diligências de busca e detenção de outros arguidos.
Entre os dias 20 e 21 de Novembro/2014, verificou-se a retirada de objectos, dispositivos informáticos, da casa de BB.
No dia 21 de Novembro/2014, por volta das 22:45 horas, BB, regressou de avião a Portugal.
Ainda no dia 21 de Novembro/2014, cerca das 23:00 horas, BB foi detido no cumprimento dos mandados de detenção emitidos.
No dia 22 de Novembro/2014, pelas 17:05 horas, BB foi presente detido perante o JIC signatário, neste TCIC, para interrogatório judicial.
No dia 23 de Novembro, foram recuperados e apreendidos os objectos que haviam sido retirados da casa do arguido, após informações fornecidas pelo mesmo em sede de interrogatório.
No dia 24 de Novembro, foi concluído o interrogatório judicial de BB, vindo a lhe ser aplicada a medida de coação de sujeição a prisão preventiva, pela verificação dos perigos de fuga e de perturbação da recolha e da conservação da prova, O arguido BB, no âmbito da sua actividade por conta da ..., tinha prevista uma viagem para o Brasil, com início em 24 de Novembro/2014.
O arguido BB permanece em prisão preventiva à ordem dos presentes autos.
Por conseguinte, entende-se não assistir razão ao requerente, inexistindo qualquer vício ou violação legal ou constitucional que implique a ilegalidade da prisão preventiva decretada ao arguido BB e seja susceptível de conduzir à sua revogação.» 3. Da documentação que acompanhava a informação extraem-se os seguintes elementos de facto com pertinência para a decisão: a. O mandado de detenção contra BB foi emitido em 19 de novembro de 2014, no mesmo constando os tipos legais indiciados e as correspondentes disposições legais, nos seguintes termos: «fraude fiscal qualificada, p. e p. nos arts. 103.º-1 a) e 104º-1d), f9 e g) e 2) do RGIT, de corrupção, p. e p. nos arts. 372.º, 373.º e 374.º do Cod. Penal e nos arts. 16.º a 18.º da Lei...
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