Acórdão nº 8/13.6JAFAR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelARMÉNIO SOTTOMAYOR
Data da Resolução17 de Dezembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA, nascido em ...

e BB, nascido em ... e com os demais elementos de identificação constantes dos autos, foram acusados, pelo Ministério Público, em processo comum colectivo, da prática, em co-autoria e em concurso real, de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 131º e 132º nºs 1 e 2 al. j) e 26º do Código Penal e de dois outros crimes de homicídio qualificado, estes na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131º e 132º nºs 1 e 2 al. j) e 22º nºs 1 e 2 als. b) e c) do Código Penal e ainda de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 3º nºs 1 e 6, 8º, 86º nº 1 al. d) da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro.

CC, que se constituiu assistente, deduziu, por si e em representação de seu filho menor DD, pedido de indemnização civil contra os arguidos pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Depois de em audiência ter procedido à alteração da qualificação jurídica passando a ser imputada aos arguidos, quanto aos crimes de homicídio, a agravação do nº 3 do art. 86º do Regime Jurídico das Armas e Munições, na redacção da Lei nº 17/2009, de 6 de Maio, o tribunal colectivo, por acórdão de 20-12-2003, absolveu os arguidos dos crimes de homicídio qualificado na forma tentada, tendo condenado cada um dos arguidos em 18 anos de prisão pela prática do crime consumado de homicídio qualificado cometido na pessoa de EE e em 2 anos de prisão pelo crime de detenção de arma proibida; feito o cúmulo das duas penas, foi cada um dos arguidos condenado na pena única conjunta de 19 anos de prisão.

Foi julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização civil, tendo os arguidos demandados sido condenados a pagar, solidariamente, à demandante CC a quantia de € 946,13 de danos emergentes e aos dois demandantes a quantia de € 40.000,00 a título de danos futuros, importâncias a que acrescem juros de mora à taxa supletiva, desde a notificação para contestar e até integral pagamento, e também a quantia de € 90.000,00, pela perda do direito à vida de EE e pelo dano por este sofrido antes de falecer, esta acrescida de juros de mora até integral pagamento a contar da data do acórdão de 1ª instância e até integral pagamento. Foram os demandados ainda condenados a pagar à demandante CC a quantia de € 15.000,00 pela perda do companheiro e ao demandante DD a quantia de € 20.000,00 pela perda do pai, acrescendo a estas importâncias juros de mora à taxa supletiva, desde a data do acórdão de 1ª instância e até integral pagamento.

Inconformados os arguidos interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Évora.

AA recorreu de facto e de direito quanto ao crime de homicídio qualificado, defendendo a existência de erro notório na apreciação da prova quanto aos factos provados descritos no acórdão do tribunal colectivo sob os nºs 1.3, 1.5. 1.6 (parte final), 1.10 (quanto à coronha no ombro) 1.17, 1.20, 1.21. e 1.22 e aos factos não provados 2.7 e 2.11; por entender que o a atitude do arguido não revela uma especial censurabilidade, comparativamente à do crime de homicídio previsto no art. 131º do Código Penal, defende não dever a pena exceder 12 anos de prisão; e quanto ao crime de detenção de arma proibida, não dever a pena ser superior a 1 ano de prisão.

BB, por seu turno, alegou a insuficiência para decisão da matéria de facto provada e a existência de erro notório na apreciação da prova quanto aos factos provados 1.3, 1.5, 1.17, 1.18, 1.19, 1.20, 1.21, 1.22 e quanto aos factos não provados 2.7, 2.8, 2.9, 2.10, 2.12 e 2.20; discorda, por outro lado, da pena fixada, considerando dever ser outra a qualificação jurídica dos factos e defende ter direito à aplicação da atenuação especial prevista no art. 4º do Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro. Por acórdão de 17-06-2014, a Relação de Évora negou provimento a ambos os recursos, confirmando integralmente o acórdão de 1ª instância.

Mantendo-se inconformados, os arguidos recorrem ao Supremo Tribunal de Justiça.

BB extraiu da motivação do seu recurso as conclusões que se passa a transcrever: - DA NULIDADE DO ACORDÃO POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA A) O Acórdão Recorrido prolatado pelo Tribunal da Relação de Évora em Recurso do Acórdão proferido pelo Tribunal de Círculo de Beja é nulo por omissão de pronúncia (art° 410°, n° 3 C.P.P. e artº 379°, n° 1 al. c) C.P.P.) B) Com efeito, o Recurso interposto da Decisão da 1ª Instância pelo Arguido Recorrente João pediu que fosse reapreciada a matéria de facto não provada proveniente da Contestação do Arguido BB e constante dos pontos 2.7, 2.8, 2.9, 2.10, 2.12, 2.20 e 2.23.

C) O douto Acórdão da Relação analisou o pedido de reapreciação da matéria de facto provada nos termos alegados pelo Arguido/Recorrente AA, apreciação que tornou extensiva ao Arguido/Recorrente BB, considerando que se tratava das mesmas questões, mas ignorou e não se pronunciou sobre a reapreciação da matéria de facto não provada - resultante da Contestação do Arguido/Recorrente BB.

D) Brevitatis causa dá-se aqui por reproduzidos os factos constantes dos pontos 2.7, 2.8, 2.9, 2.10, 2.12, 2.20 e 2.23 (numeração da 1ª Instância) factos não provados.

E) Tais factos são de relevante interesse para a descoberta da verdade material e da defesa do Arguido/Recorrente BB porquanto permite abalar a convicção do Tribunal a quo sobre a concepção do "plano" e participação do Arguido no "subterfúgico assalto", no conhecimento da arma no interior do veículo e ainda a tentativa do Arguido/Recorrente impedir o irmão AA de disparar.

F) A omissão de apreciação desta matéria de forma autónoma relativamente à defesa do Arguido/Recorrente AA impede quer a avaliação da existência ou não de "plano", quer a sua intervenção nele, quer a sua culpa e bem assim do dolo e viola de forma grave as garantias da defesa do Arguido, do seu direito a um Julgamento justo e equitativo (art° 10° e art° 11° da Declaração Universal dos Direitos do Homem e art° 32° da Constituição da República Portuguesa).

G) Nos termos do art° 379°, nº 1 al. c) do C.P.P. o douto Acórdão é, pelas razões acima invocadas e desenvolvidas na Motivação, nulo, nulidade que se argui para todos os efeitos legais.

DA MATÉRIA DE FACTO - DA NULIDADE DO ACORDÃO POR VÍCIO DE ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA H) O Arguido/Recorrente coloca a questão do Vício/Erro Notório na apreciação ·da prova na convicção de que o SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, pode, ex ofício, conhecer da questão (art° 410°, nº 2, al. c) do C.P.P.), mas ainda que o Venerando Tribunal a quo assim o não entendesse (hipótese sem concessão por patrocínio cauteloso), sempre a questão deverá sei analisada na óptica de falta de fundamentação da Decisão no que respeite à prova da existência de um plano prévio.

I)O douto Acórdão da Relação ao manter o decidido pelo Tribunal da 1ª Instância quanto à verificação de um "plano" prévio para a execução de homicídio julgado nestes autos, concertado entre os dois Arguidos enferma do vício de erro notório na apreciação da prova.

J)Vício que se revela no iter decisório da 1ª Instância, mantido pela Relação, e que é notório para o homem de intelectualidade e compreensão mediana porquanto assenta neste raciocínio discursivo: a)o Arguido BB era o condutor do Golf; b)o Arguido AA deu os tiros; (estes dois pontos traduziriam a repartição das tarefas) a) seguiram o veículo Passat pela Rua dos Celeiros; b) este (o Passat) desvia-se para uma transversal à esquerda (Rua da Casa do Povo); c) os Arguidos seguem em frente; d) mas fazem a inversão de marcha uns metros adiante: e) cruzam-se de novo com a vítima e o Arguido AA dispara.

Concluindo o douto Acórdão do Tribunal da 1ª Instância que se não existisse "plano" o Arguido BB não teria feito a inversão de marcha.

O Tribunal da Relação escreve "analisando a decisão sindicada não vislumbramos onde a mesma possa estar eivada do apontado vício".

K) A lógica e as regras da experiência comum conduzem todavia, a partir dos factos considerados provados pelo Tribunal de 1ª Instância e mantidas pela Relação, a outro percurso de percepção da realidade e que será o seguinte: - existência de "plano" para: - perseguir a vítima e matá-la 1ª hipótese: - encontrar a vítima: - segui-la não a perdendo de vista uma vez que se encontrava a circular e na melhor oportunidade disparar; 2ª hipótese: - conhecer o seu destino: - espera-la aí e/ou surpreendê-la e disparar.

Em qualquer das hipóteses: - deixar a vítima virar à esquerda, não lhe acompanhar o movimento, seguir em frente e voltar passado ainda que fosse pouco tempo, estando a vítima motorizada, não indicia qualquer "plano" e frustraria qualquer um que hipoteticamente existisse, porquanto o perseguido facilmente poderia ter saído do alcance dos perseguidores.

L) Também contra a lógica deste raciocínio aponta o outro argumento usado pelo Tribunal da 1ª Instância e mantido pela Relação que é o "subterfúgico" assalto que foi considerado não provado (ponto 2.7 dos factos não provados) mas depois usado e considerado como elemento do plano prévio à execução do plano. Escreve-se no douto Acórdão da 1ª Instância: "Donde a convicção do Tribunal é de que o cenário do assalto foi propositadamente montado pelos arguidos e aí não se terem considerado provados os factos a este respeito alegados pelo arguido BB na sua contestação".

M) Para que o assalto pudesse integrar quer a fundamentação da Decisão quer o raciocínio lógico do seu papel no plano, o Tribunal de 1ª Instância teria que: - ter dado como provado que houve um assalto; - que esse assalto foi propositadamente levado a cabo pelos Arguidos (e situar no tempo e no espaço essa actividade); - para o utilizarem como motivo e justificação para perseguirem a vítima.

N) Só que esta versão não tem sustentação probatória pelo que cai, necessária e logicamente como pressuposto da existência do "plano".

O) E forçoso é concluir que não existia plano algum em que cuja elaboração o Arguido BB tivesse participado para pôr termo à vida de EE, terá...

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