Acórdão nº 267/06.0GAFZZ-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução10 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça _ No processo comum nº 267/06.06AFZZ.do Tribunal Judicial de Ferreira do Zêzere, o Tribunal Colectivo do Círculo Judicial de Tomar após audiência para cúmulo de penas aplicadas ao arguido AA, com os demais sinais dos autos, proferiu, em 10 de Dezembro de 2012, a seguinte decisão: “4.1 Pelo exposto, este Tribunal Colectivo decide operar o cúmulo jurídico da penas impostas nos autos nº 267/06.0GAFZZ e nº 340/05.2GAFZZ, ambos desta Comarca de Ferreira do Zêzere, e condenar o arguido AA na pena única de 13 (treze) anos de prisão.

4.2. Cumpra o disposto no artº 372º, nº 5, do Código de Processo Penal.

4.3. Notifique, sendo o arguido pessoalmente.

4.4. Desde já, comunique com cópias certificadas ao competente Tribunal de Execução de Penas, Estabelecimento Prisional e aos processos englobados no presente cúmulo jurídico.

4.5. Após trânsito em julgado, remete nota desse trânsito ou cópias certificadas das decisões dos Tribunais Superiores (conforme o caso) ao competente Tribunal de Execução de Penas, Estabelecimento Prisional e ao processo englobado no presente cúmulo jurídico e remeta boletim para efeito de registo criminal. Remeta cópia simples à DGRS.” - Inconformado, recorreu o arguido para este Supremo, apresentando a respectiva motivação - Por acórdão deste Supremo, de 26 de Junho de 2013, decidiu-se “na procedência do recurso, em declarar nulo o acórdão recorrido por omissão de fundamentação e de pronúncia, nos termos do artº 379º nº 1 a) (1ª parte) e c) do CPP, devendo por isso, ser reformulado tendo em conta o supra exposto, e, o disposto nos artºs 77º nºs 1 e 2 e 78º nºs 1 e 2 do CP.” - Baixando os autos à Instância, foi proferido novo acórdão em 30 de Janeiro de 2014, com a seguinte: “ 4. DECISÃO.

4.1. Pelo exposto, este Tribunal Colectivo decide operar o cúmulo jurídico das penas impostas nos autos n. ° 267 j06.OGAFZZ e n. ° 340j05,2GAFZZ, ambos desta Comarca de Ferreira do Zêzere, e condenar o arguido AA na pena única de 13 (treze) anos de prisão; 4.2. Cumpra o disposto no art.° 372.°, n,º 5, do Código de Processo Penal.

4.3. Notifique, sendo o arguido pessoalmente.

4.4. Desde já, comunique com cópias certificadas ao competente Tribunal de Execução de Penas, Estabelecimento Prisional e aos processos englobados no presente cúmulo jurídico.

4.5. Após trânsito em julgado, remeta nota desse trânsito ou cópias certificadas das decisões dos Tribunais Superiores (conforme o caso) ao competente Tribunal de Execução de Penas, Estabelecimento Prisional e ao processo englobado no presente cúmulo jurídico e remeta boletim para efeito de registo criminal. Remeta cópia simples à DGRS. “ - Inconformado, de novo recorreu o arguido, apresentando a motivação do recurso, com as seguintes Conclusões: 1 - Por imperativo constitucional, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei (art. 205°, n.º 1 da CRP).

2 - Dos arts. 118°, nº1, 194°, n.º 5 e 379°, n.º 1 a) do CPP resulta que, em processo penal, a nulidade é um vício exclusivo da sentença e do despacho que aplica medida de coacção.

3 - No douto Acórdão recorrido decidiram os Mmos. Juízes a quo que “ a realização do cúmulo dessas penas de multa neste processo não traria qualquer utilidade para a definição da situação do arguido”.

4 - Não fundamentou o Tribunal a quo o porquê de não realizar o cúmulo jurídico também das penas não privativas da liberdade.

5 - Nos mesmos moldes o Tribunal a quo na sua douta decisão ora em crise não fundamentou a decisão da escolha da medida da pena aplicada em cúmulo jurídico.

6 - Só o conhecimento integral do percurso lógico percorrido pejo Tribunal permitirá ao arguido reagir, por via de recurso, contra a referida decisão, só uma fundamentação mínima poderá permitir ao arguido inteirar-se dos fundamentos de facto e de direito que fundaram a prolação do despacho recorrido, mormente do ponto de vista da sua bondade intrínseca.

7 - A decisão recorrida deve ser revogada na parte em que considera que a realização do cúmulo das penas de multa não traria qualquer utilidade para a definição da situação do arguido.

8 - O Tribunal Constitucional tem chamado precisamente a atenção para o facto de não serem "uniformes as exigências constitucionais de fundamentação de todo o tipo de decisões em matéria penal, (…) que as decisões condenatórias devem ser objecto de um dever de fundamentar de especial intensidade, mas que não se verifica o mesmo noutro tipo de decisões” (Ana Luísa Pinto, A Celeridade no Processo Penal: O Direito à Decisão em Prazo Razoável, p. 75 e Acs TC 680/98,281/2005 e 63/2005 aí clt.).

9 - O arguido foi condenado nos autos n.º 267/06.0GAFZZ, por Acórdão proferido a 26 de Maio de 2011, não impugnado e transitado em julgado, pela prática de: - quatro crimes de furto qualificado, previstos e puníveis pelos art.ºs 203.° e 204.°, n.º2, alínea e), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão, por cada um desses 4 crimes; - um crime de incêndio, previsto e punível pelo art.º 272.°, n.º1 do Código Penal, na pena de cinco anos de prisão; e de, - um crime de incêndio, na forma tentada, previsto e punível pelos art.ºs 272.°, n.º1, 22.º.º e 73.º, do Código Penal, na pena de dois anos de prisão, por factos praticados entre o dia 8 de Outubro de 2006 e dia não concretamente apurado do mês de Novembro de 2006. Operado o cúmulo jurídico dessas penas, foi o arguido condenado na pena única de 11 anos de prisão - ut fls. 1482 a 1549.

10 - O arguido foi também condenado nos autos n.° 340/05.2GAFZZ, por Acórdão proferido a 15 de Janeiro de 2010, não impugnado e transitado em julgado no dia 11/4/2012, pela prática de: - um crime de furto simples, previsto e punível pelos art.º 203.º e 204.º, n.º1, alínea e), n.º1, alínea h), do Código Penal, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão; e de, - quatro crimes de furto qualificado, previstos e puníveis pelos art.ºs 203.° e 204.°, n.º 1, alínea e) e h), do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão, por cada um desses 4 crimes, por factos praticados entre um dia não concretamente apurado de Junho ou Julho de 2005 e o dia 3 de Novembro de 2005. Operado o cúmulo jurídico dessas penas, foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão - ut fls. 1735 a 1848.

11 - O arguido foi também condenado noutros processos em penas de multa, pela prática de crimes de detenção ilegal de arma, falta de habilitação para o exercício da caça e outros crimes relativos à caça e pesca e falsificação de documento, nos termos certificados a fls. 1852 a 1857.

12 - O condenado tem direito à pena única, resultante da soma jurídica das penas (parcelares) correspondentes aos crimes por si cometidos, desde que concorram efectivamente ou realmente entre si.

13 - Assim é, independentemente do concurso ser conhecido num mesmo ou em vários processos, desde que todas as penas correspondam a crimes cometidos antes do trânsito em julgado da primeira condenação.

14 - O art. 78° do C.P.P. procede, pois, à reposição da situação de igualdade entre arguido com conduta ilícita global conhecida logo num mesmo (primeiro) processo e arguido cujo ilícito global sofre a fragmentarização formal acidental, por vários processos. Razões exclusivamente formais, de procedimento (razões processuais), não podem ditar diferenças de tratamento material, particularmente no que respeita às consequências do crime.

15 - Nos casos de concurso superveniente haverá, assim, que lançar mão do mecanismo previsto no art. 472° do C.P.P., a fim de, em audiência especialmente designada para o efeito, o tribunal se dotar (em contraditório) de toda a informação necessária e pertinente para a decisão sobre a pena única, à luz do sistema consagrado no art. 77° do C.P. - sistema de pena conjunta obtida através de cúmulo jurídico.

16 - A pena única determinar-se-á, então, dentro de uma moldura penal de cúmulo, casuisticamente encontrada após fixação de todas as penas parcelares integrantes de uma certa adição jurídica.

17 - E o n° 3 do art. 77° do C. P. preceitua que "se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores”.

18 - A nossa leitura do art. 77°, nº3 do C.P., de acordo aliás com a lição de Cavaleiro de Ferreira (Ioc. cit. p. 158) é a de que, nestes casos, "a formação da penalidade do concurso implica a prévia formação da penalidade diferenciadamente quanto às penas de prisão e quanto às penas de multa. E então a formação de penalidade global do concurso de penas consiste na ajunção da penalidade global das penas de prisão e da penalidade global das penas de multa. (...) A penalidade do concurso é então também uma penalidade compósita; à penalidade no concurso resultante do cúmulo jurídico das penas de prisão acrescerá a penalidade no mesmo concurso resultante do cúmulo jurídico das penas da multa aplicadas” (Ioc. cit., p. 159- 160).

19 - Assente que a pena de prisão e a pena de multa se somam materialmente e não juridicamente, importa determinar se, em caso de concurso superveniente, ainda assim permanece a obrigatoriedade de proceder a essa operação cumulatória (para cúmulo material de penas), por via da qual o arguido ficará condenado numa única pena, de prisão e multa.

20 - A pena tem que ser, por opção legal, uma pena única - " ... a diferente natureza (das penas de prisão e de multa) mantém-se na pena única ... " (art. 77°, nº3 do C.P.).

21 - O que significa que a pena única assumirá, então, a forma de pena compósita cumulativa, por exemplo, " pena de onze anos de prisão e trinta dias de multa à razão de ... ".

22 - A condenação plural e a consequente inscrição plural no C.R.C. tem sempre - só pode ter - na sua base uma sucessão de penas correspondente a uma sucessão de crimes.

23 - Donde concluímos que também o princípio constitucional da igualdade (art. 13° da CRP) e, implicitamente, ainda os princípios...

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