Acórdão nº 1857/09.9TJVNF.S1.P1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2014
Magistrado Responsável | LOPES DO REGO |
Data da Resolução | 18 de Setembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, Lda instaurou, em 22 de Maio de 2009, acção com processo ordinário contra BB, Lda e CC, S.A, pedindo: 1 - que seja declarada válida e eficaz a resolução operada pela demandante, com as legais consequências ou, 2 - subsidiariamente, para o caso de a resolução praticada pela demandante não ser considerada válida e eficaz, atenta a factualidade alegada, seja o contrato em mérito declarado resolvido por via judicial; 3 - subsidiariamente ainda, atento o erro sobre o objecto mediato, seja declarada a anulabilidade do contrato de compra e venda, com as legais consequências.
Declarado resolvido e/ou anulado o contrato de compra e venda, deverão as demandadas, solidariamente ou não, ser condenadas: a) a restituir o valor relativo à contrapartida pela aquisição do veículo, computando-se o já liquidado em € 13.795,05 (treze mil, setecentos e noventa e cinco euros e cinco cêntimos), correspondente ao valor já pago por conta do valor do veículo (referente a 20 prestações já vencidas e pagas, no valor de € 607,73 cada, bem como uma primeira prestação de € 1.640,45), bem como em igual quantia mensal de € 607,73 até cumprimento do contrato em 01/10/2001, bem como ainda na quantia de € 5.531,44 referente à venda do veículo pela locadora à demandante; b) caso assim se não entenda, sempre será devido à demandante o preço de venda do veículo, de € 32.808,98, acrescido de juros de mora até efectivo pagamento, à taxa comercial, ascendendo os já vencidos a € 5.782,67, como restituição dos frutos civis – juros – vencidos desde o recebimento do preço e vincendos até pagamento, dado que, como a resolução depende de culpa da parte faltosa, deverá esta ser equiparada ao possuidor de má fé no que respeita à restituição dos frutos; c) na quantia de € 5.850,00, a título de privação do uso, calculados desde a resolução até à presente data e referente ao período em que o veículo esteve nas oficinas das demandadas, e em igual quantia diária até que as demandadas restituam o valor do veículo e, d) ainda nas despesas e encargos que a demandante suporte com a recolha, guarda e depósito do veículo – vulgo parqueamento – deverá ser suportado pelas demandadas, valor que se remete para liquidar em execução de sentença, por não ser neste momento conhecido, quantificável e líquido.
Como fundamento de tais pretensões, alegou, em síntese, que: Em 1/10/2007, celebrou um contrato de aluguer de longa duração com o Banco de Crédito Especializado DD, SA, que teve por objecto o veículo Renault Laguna, de matrícula …-EJ-…, adquirido, em 28/9/2007, à primeira demandada e fornecido pela segunda ré, pelo preço de 32.808,98 €, com a duração de quatro anos, ficando com a opção de compra, no fim do contrato, pelo valor de 4.609,53 €.
Tal veículo apresenta várias anomalias desde a sua aquisição, o que motivou a apresentação de reclamações junto das demandadas que providenciaram pela reparação, a última das quais em 10/11/2008, sem qualquer êxito.
Em face disso, porque persistiam as anomalias, resolveu o contrato de compra e venda por carta registada de 21/11/2008 que enviou à primeira demandada e que foi por ela recebida no dia 25 seguinte.
Em 25/11/2008, foi-lhe enviada uma carta pela 2.ª demandada informando-a de que o veículo se encontrava conforme o preconizado pelo construtor e, em 10/12/2008, interpelou-a para que procedesse ao levantamento da viatura na oficina onde se encontrava, dado estar devidamente reparada, o que não se verificou, continuando a apresentar maus cheiros.
Em 11/5/2009, confirmou à 1.ª demandada a resolução já operada e deu conhecimento à 2.ª demandada, por cartas registadas por ambas recebidas, e interpelou-as para a restituição do preço, pondo à sua disposição o veículo.
Em consequência da conduta das rés, sofreu danos, correspondentes às prestações que teve de pagar à locadora e terá ainda que pagar ou ao preço do veículo.
As rés contestaram por excepção, invocando a ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir, a ilegitimidade activa e passiva e a caducidade do direito de acção, e ainda por impugnação.
A autora replicou, pugnando pela improcedência das invocadas excepções e requerendo a intervenção principal provocada de Banco de Crédito Especializado DD, Instituição Financeira de Crédito, S.A..
Admitida a requerida intervenção, foi citada a interveniente, que fez seus os articulados da autora.
No despacho saneador, foram julgadas improcedentes a invocada nulidade por ineptidão e as excepções da ilegitimidade activa e passiva, tendo sido relegada para final a apreciação da caducidade.
No termo da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença a julgar procedente a excepção peremptória da caducidade e, consequentemente, a absolver as rés dos pedidos formulados.
2. Inconformada, a autora interpôs recurso para o STJ - per saltum, nos termos do art.º 725.º do CPC - determinando-se, porém, a remessa dos autos à Relação, por se entender que as questões suscitadas ultrapassavam o âmbito da revista – e tendo a Relação julgado a apelação improcedente e confirmado a sentença recorrida.
O acórdão recorrido começou por considerou estabilizado o seguinte quadro factual: 1. A 1.ª ré, como concessionária da marca Renault, é representante e distribuidora da marca Renault para os concelhos de Vila Nova Famalicão, Santo Tirso e Trofa, tendo como objecto social a comercialização, serviço pós venda e pelo comércio de peças originais da marca Renault (sítio:www.diascosta.pt) 2. A 2.ª ré é representante em Portugal da Renault.
3. A 2.ª ré vende os veículos a uma rede oficial de distribuidores – in casu, à 1.ª ré -, que os revendem depois em nome próprio, aos clientes finais.
4. O serviço pós venda dos veículos da marca Renault, manutenção, revisão, reparação, é realizada por uma rede oficial de reparadores autorizados – in casu, entre as quais, a 1.ª ré -, os quais, na maioria das vezes, acumulam também a qualidade de distribuidores.
5. É nesta rede de distribuidores e reparadores autorizados que se integra a actividade comercial da 1.ª ré, com ambas as qualidades.
6. Em 24-04-2008, a 1.ª ré procedeu à limpeza dos filtros de partículas do habitáculo – cfr. doc. 5.
7. Àquela data, o veículo tinha apenas 5.692 Km.
8. Em 18-09-2008, o veículo tinha 9.200 Km.
9. Em 13-10-2008 foram realizados trabalhos de limpeza de filtros e do circuito de ar condicionado.
10. O veículo tinha à data desta intervenção, apenas 9.766 Km.
11. Em 03-11-2008, o veículo apresentava 10.047 Km.
12. Passados 5 (cinco) dias, em 07-11-2008 – 6.ª feira – quando a autora foi “levantar” o veículo, foi-lhe dito que a oficina tinha procedido à desmontagem do tablier, à desmontagem dos cintos de segurança.
13. Não tendo sido detectado a causa do problema.
14. Nesta data, as intervenções da oficina Renault Boavista, foram acompanhadas pelo departamento técnico da CC – cfr. doc. 12.
15. Logo na 2.ª feira seguinte, dia 10-11-2008, conforme acordado com a oficina, a autora depositou o veículo nas instalações da Renault da Boavista – cfr. doc. 13.
16. Àquela data, o veículo apresentava apenas 10.237 Km.
17. As rés não detectavam as causas dessas mesmas manifestações.
18. A autora, por carta registada com aviso de recepção datada de 21-11-2008, comunicou à 1.ª ré a resolução do contrato de compra e venda – cfr. doc. 14 e 15.
19. Carta esta que foi recepcionada pela ré em 25-11-2008 – cfr. Doc. 16.
20. Nessa mesma carta, a autora, invocando a cronologia das sucessivas intervenções pelas oficinas das rés, 21. A persistência dos problemas e seu agravamento e, 22. Sobretudo, as manifestações nas pessoas desses mesmos odores e cheiros de carácter tóxico, com dores de cabeça, pressão encefálica, tonturas, enjoos, hemorragias nasais, inflamações e irritações das vias respiratórias, dos olhos e das mucosas, perdas de consciência, latejar das têmporas, 23. Não tendo inclusive, segundo referiram, sequer detectado a causa do problema, 24. A 2.ª ré, posteriormente, enviou à autora uma carta com data de 25-11-2008, segundo a qual preconizava a conformidade do veículo com os requisitos do construtor – cfr. Doc. 18 25. A que a autora respondeu, por carta registada com aviso de recepção de 28-11-2008 – cfr. Doc. 19, 20 e 21 26. Posteriormente, a autora foi interpelada pela 2.ª ré, por carta de 18-12-2008, no sentido de proceder ao levantamento do veículo que se encontrava nas instalações da Boavista – cfr. Doc. 22.
27. Na sequência daquela enviada em 10-12-2008, segundo a qual seriam debitados €: 15,25 por cada dia que decorresse até ao levantamento do veículo.
28. O que a autor fez, procedendo ao levantamento do veículo.
29. Todavia e apesar da resolução do contrato pela autora e da posição tomada pelas rés, a 1.ª ré pretendeu ainda tentar apurar a causa dos odores e cheiros e, 30. E a sua eliminação.
31. Para o que convenceu a autora a permitir esses trabalhos, 32. Perante a ausência de resposta, por carta registada com aviso de recepção, datada de 11-05-2009, a autora confirmou à 1.ª ré a resolução já operada – cfr. Doc. 23 e 24.
33. Recepcionada pela 1.ª ré em 12-05-2009 – cfr. Doc. 25 34. Carta que foi igualmente enviada à 2.ª ré – cfr. Doc. 26 e 27 35. Recepcionada em 13-05-2009 – cfr. Doc. 28 36. Nestas cartas, atenta a resolução do contrato, a autora procedeu à interpelação das rés para procederem à restituição do preço.
37. Sendo que colocou à disposição das mesmas o veículo, 38. Interpelando-as expressamente para indicarem local, dia e hora para a entrega do veículo, 39. Além do mais, a autora adquiriu este veículo para assegurar as deslocações do seu sócio-gerente, aos clientes, fornecedores, a parceiros.
40. Na verdade, foi a autora quem escolheu o veículo, as suas características, o modelo, a cor, a potência, a cilindrada, os acessórios extras.
41. A autora tem como objecto social a instalação eléctrica de comunicações e de climatização, comércio de electrodomésticos, aparelhos de rádio e televisão – cfr. doc. 2 42. A...
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