Acórdão nº 235/11.0TBFVN.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Abril de 2015
Data | 15 Abril 2015 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Figueiró dos Vinhos, contra BB, S.A.
acção ordinária, que recebeu o nº235/11.0TBFVN pedindo a condenação da Ré a pagar ao autor as seguintes quantias: a) € 34 687,75, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efectivo e integral pagamento; b) O que vier a apurar –se em sede de liquidação de sentença, a título de danos patrimoniais; Em resumo, alegou: é proprietário do veículo automóvel de Marca Porshe, modelo 911 Turbo, com a matrícula ...-...-PZ e contratou com a ré um seguro titulado pela apólice nº…, através do qual transferiu para esta a sua responsabilidade civil obrigatória respeitante ao supra mencionado veículo, para além de ter igualmente contratado a cobertura de danos próprios; em 10 de Abril de 2010, na EN 237, ocorreu um acidente de viação, que envolveu apenas o seu veículo, aquando da sua participação num passeio organizado, com a duração de 3 dias, e que se destinava a visitar parte da zona centro e norte de Portugal; nesse dia e local o Autor conduzia o referido veículo, mas após a queda do aparelho GPS, perdeu por breves instantes o controlo do veículo, entrando na berma e subindo um talude, o que originou o capotamento do veículo; do acidente não resultaram quaisquer feridos ou danos a terceiros, tendo apenas o carro do autor sofrido os danos que melhor se identificam no art.23º da petição inicial; para além desses danos encontra-se o autor privado do uso do veículo, o que determina não só que não tenha como se deslocar, como ainda que o mesmo se venha a deteriorar de forma acentuada face à sua paralização; a ré vem declinando a sua responsabilidade quanto aos danos sofridos, ao abrigo do art.4.º das Condições Gerais da Apólice.
Contestou a Ré impugnando a dinâmica do acidente e invocando litigância de má fé do autor, por alterar propositadamente a verdade dos factos e omitir outros com relevo para a decisão da causa; feita a averiguação do acidente pelos serviços da ré veio esta a apurar que no dia referido pelo autor a EN 237 esteve fechada ao trânsito, por nela ter decorrido uma prova desportiva automóvel, denominada Rally Verde Pino 2010, organizada pelo Núcleo de Desportos Motorizados de Leiria, sob a autoridade desportiva nacional da Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting, prova essa na qual o veículo do autor participou, como concorrente e condutor, tendo sido acompanhado por um 2º condutor, CC; o referido Raly disputava-se em conformidade com o Código Desportivo Internacional da FIA, com as prescrições gerais aplicáveis às provas de Automobilismo e Karting e de acordo com o seu regulamento específico; era uma prova desportiva composta por diversas provas de classificação cronometrada, na qual o objectivo de cada concorrente é conseguir o melhor tempo e a melhor penalização possível; quando o veículo do autor capotou estava em plena competição, fazendo a prova de regularidade em rampa, a velocidade superior a 180 kms/h; aquando da celebração do contrato de seguro, o autor não fez qualquer menção de que fazia uso desportivo da viatura, sendo que de acordo com a proposta o veículo se destinava a ser usado nas naturais e normais deslocações e viagens pessoais e profissionais; de acordo com as regras da boa fé, devia o autor ter informado a ré de que pretendia utilizar o seu veículo em provas desportivas, sendo que ao não o fazer influenciou decisivamente a vontade da ré, pois se soubesse que o autor pretendia fazer uso do veículo em competição desportiva, jamais assumiria os riscos de choque, colisão ou capotamento que assumiu.
Invoca assim a nulidade do contrato de seguro, bem como invoca as causas de exclusão de responsabilidade previstas nos arts.5º, nº1, als. g), i), o), e 6º, nº4, al. e).
O autor replicou e a ré exerceu o contraditório relativamente a documentos juntos aos autos, pelo autor, na réplica.
Foi designada data para a realização de audiência preliminar, na qual – frustrada que foi a possibilidade de conciliação das partes – se fixou valor à acção e se seleccionaram os factos assentes e respectiva base instrutória.
Previamente à audiência de discussão e julgamento, veio o autor, nos termos dos arts.378º, nº1, 379º e 471º, nº1, al. b), do CPCivil, apresentar requerimento de liquidação de danos, o qual foi contestado pela ré (cf. fls. 416 e ss.).
Na sequência de tal incidente de liquidação procedeu-se, por despacho, à ampliação da base instrutória, nos termos constantes de fls.435 a 437.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, com respostas à base instrutória nos termos do despacho de fls. 570 a 577, foi proferida a sentença de fls. 578 a 598, datada de 23 de Janeiro de 2014, que julgou a presente acção parcialmente procedente, por provada, na forma demonstrada, e em consequência condenou a Ré BB, S.A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 40 194,11 (quarenta mil cento e noventa e quatro euros e onze cêntimos), acrescida de juros moratórios à taxa legal e supletiva contados de 01-07-2011 até integral pagamento, absolvendo-a de tudo o que, de mais, havia sido peticionado.
Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação.
Por acórdão de fls. 698 a 727 o Tribunal da Relação de Coimbra, na procedência da apelação, revogou a sentença recorrida e absolveu a ré dos pedidos.
É agora a vez de o Autor AA se não conformar pedindo, por isso, revista para este Supremo Tribunal.
E alegando a fls. 734 e ss, CONCLUI o recorrente: A – O Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão de que se recorre revogou a sentença de 1ª instância, substituindo-a por outra que absolveu a ré do pedido.
B – Para assim decidir o Tribunal da Relação de Coimbra considerou que o contrato de seguro em discussão dos autos é anulável, nos termos conjugados do art.429.º do CComercial e arts.251º e 247º do CCivil, por o autor, aqui recorrente, não ter comunicado à ré, ora recorrida, que utilizava o veículo automóvel em provas de cariz desportivo.
C – Conclui desta forma presumindo qual seria a vontade negocial da ré.
D – Apesar da ré, conforme sustentou o Tribunal de 1ª instância, não ter logrado fazer qualquer prova a este respeito.
E – Para o Tribunal da Relação de Coimbra foi suficiente para a prova por presunção judicial a junção da proposta de subscrição de seguro e nada mais.
F – O recorrente entende por isso que o Tribunal da Relação de Coimbra aplicou erradamente o direito ao caso concreto, uma vez que, e conforme foi considerado pelo tribunal de 1ª instância, a ré não logrou provar que mesmo que soubesse da utilização dada ao veículo pelo autor, independentemente do momento e que iniciou aquele tipo de utilização, não celebraria o contrato de seguro com o autor.
G – Era à ré quem incumbia alegar e provar a declaração inexacta ou reticente com a virtualidade de desaguar na anulação do contrato, o que não logrou fazer.
H – E como bem decidiu o Tribunal de 1ª instância, era à ré quem cabia fazer prova que essas declarações inexactas existiram e ainda que, em caso afirmativo, mesmo que as conhecesse, não celebraria o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel.
I – Afirmou o tribunal de 1ª instância que «incumbirá sempre à seguradora, num tal tipo de casos a alegação e prova não só das declarações inexactas, mas também que não teria celebrado o contrato se conhecesse o facto verídico (no caso de falsidade da declaração) ou omitido (caso se trate apenas de falta de comunicação) e foi essa prova que a ré efectivamente não logrou fazer no caso concreto…».
J – Acrescentando ainda a sentença do Tribunal de 1ª instância que «o facto constante no art.16º da base instrutória mereceu, também por isso, resposta negativa, pelo que improceder a tese da ré fundada em invalidade do seguro por falsas declarações.».
K – No art.16º da Base instrutória questionava-se o seguinte «se a ré soubesse que o autor utilizava o PZ para o fim referido em 15º, não teria assumido os riscos de choque, colisão ou capotamento?» L – O tribunal ao considerar como não provado aquele artigo 16º da base instrutória, na esteira do que sustenta o Ac. do STJ de 08-06-2006, é como se tal facto não existisse, pois «a resposta negativa a um quesito significa que o facto não se provou. Tudo se passa como se não tivesse sido alegado, não sendo, outrossim...
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