Acórdão nº 235/11.0TBFVN.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelPIRES DA ROSA
Data da Resolução15 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Figueiró dos Vinhos, contra BB, S.A.

acção ordinária, que recebeu o nº235/11.0TBFVN pedindo a condenação da Ré a pagar ao autor as seguintes quantias: a) € 34 687,75, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efectivo e integral pagamento; b) O que vier a apurar –se em sede de liquidação de sentença, a título de danos patrimoniais; Em resumo, alegou: é proprietário do veículo automóvel de Marca Porshe, modelo 911 Turbo, com a matrícula ...-...-PZ e contratou com a ré um seguro titulado pela apólice nº…, através do qual transferiu para esta a sua responsabilidade civil obrigatória respeitante ao supra mencionado veículo, para além de ter igualmente contratado a cobertura de danos próprios; em 10 de Abril de 2010, na EN 237, ocorreu um acidente de viação, que envolveu apenas o seu veículo, aquando da sua participação num passeio organizado, com a duração de 3 dias, e que se destinava a visitar parte da zona centro e norte de Portugal; nesse dia e local o Autor conduzia o referido veículo, mas após a queda do aparelho GPS, perdeu por breves instantes o controlo do veículo, entrando na berma e subindo um talude, o que originou o capotamento do veículo; do acidente não resultaram quaisquer feridos ou danos a terceiros, tendo apenas o carro do autor sofrido os danos que melhor se identificam no art.23º da petição inicial; para além desses danos encontra-se o autor privado do uso do veículo, o que determina não só que não tenha como se deslocar, como ainda que o mesmo se venha a deteriorar de forma acentuada face à sua paralização; a ré vem declinando a sua responsabilidade quanto aos danos sofridos, ao abrigo do art.4.º das Condições Gerais da Apólice.

Contestou a Ré impugnando a dinâmica do acidente e invocando litigância de má fé do autor, por alterar propositadamente a verdade dos factos e omitir outros com relevo para a decisão da causa; feita a averiguação do acidente pelos serviços da ré veio esta a apurar que no dia referido pelo autor a EN 237 esteve fechada ao trânsito, por nela ter decorrido uma prova desportiva automóvel, denominada Rally Verde Pino 2010, organizada pelo Núcleo de Desportos Motorizados de Leiria, sob a autoridade desportiva nacional da Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting, prova essa na qual o veículo do autor participou, como concorrente e condutor, tendo sido acompanhado por um 2º condutor, CC; o referido Raly disputava-se em conformidade com o Código Desportivo Internacional da FIA, com as prescrições gerais aplicáveis às provas de Automobilismo e Karting e de acordo com o seu regulamento específico; era uma prova desportiva composta por diversas provas de classificação cronometrada, na qual o objectivo de cada concorrente é conseguir o melhor tempo e a melhor penalização possível; quando o veículo do autor capotou estava em plena competição, fazendo a prova de regularidade em rampa, a velocidade superior a 180 kms/h; aquando da celebração do contrato de seguro, o autor não fez qualquer menção de que fazia uso desportivo da viatura, sendo que de acordo com a proposta o veículo se destinava a ser usado nas naturais e normais deslocações e viagens pessoais e profissionais; de acordo com as regras da boa fé, devia o autor ter informado a ré de que pretendia utilizar o seu veículo em provas desportivas, sendo que ao não o fazer influenciou decisivamente a vontade da ré, pois se soubesse que o autor pretendia fazer uso do veículo em competição desportiva, jamais assumiria os riscos de choque, colisão ou capotamento que assumiu.

Invoca assim a nulidade do contrato de seguro, bem como invoca as causas de exclusão de responsabilidade previstas nos arts.5º, nº1, als. g), i), o), e 6º, nº4, al. e).

O autor replicou e a ré exerceu o contraditório relativamente a documentos juntos aos autos, pelo autor, na réplica.

Foi designada data para a realização de audiência preliminar, na qual – frustrada que foi a possibilidade de conciliação das partes – se fixou valor à acção e se seleccionaram os factos assentes e respectiva base instrutória.

Previamente à audiência de discussão e julgamento, veio o autor, nos termos dos arts.378º, nº1, 379º e 471º, nº1, al. b), do CPCivil, apresentar requerimento de liquidação de danos, o qual foi contestado pela ré (cf. fls. 416 e ss.).

Na sequência de tal incidente de liquidação procedeu-se, por despacho, à ampliação da base instrutória, nos termos constantes de fls.435 a 437.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com respostas à base instrutória nos termos do despacho de fls. 570 a 577, foi proferida a sentença de fls. 578 a 598, datada de 23 de Janeiro de 2014, que julgou a presente acção parcialmente procedente, por provada, na forma demonstrada, e em consequência condenou a Ré BB, S.A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 40 194,11 (quarenta mil cento e noventa e quatro euros e onze cêntimos), acrescida de juros moratórios à taxa legal e supletiva contados de 01-07-2011 até integral pagamento, absolvendo-a de tudo o que, de mais, havia sido peticionado.

Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação.

Por acórdão de fls. 698 a 727 o Tribunal da Relação de Coimbra, na procedência da apelação, revogou a sentença recorrida e absolveu a ré dos pedidos.

É agora a vez de o Autor AA se não conformar pedindo, por isso, revista para este Supremo Tribunal.

E alegando a fls. 734 e ss, CONCLUI o recorrente: A – O Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão de que se recorre revogou a sentença de 1ª instância, substituindo-a por outra que absolveu a ré do pedido.

B – Para assim decidir o Tribunal da Relação de Coimbra considerou que o contrato de seguro em discussão dos autos é anulável, nos termos conjugados do art.429.º do CComercial e arts.251º e 247º do CCivil, por o autor, aqui recorrente, não ter comunicado à ré, ora recorrida, que utilizava o veículo automóvel em provas de cariz desportivo.

C – Conclui desta forma presumindo qual seria a vontade negocial da ré.

D – Apesar da ré, conforme sustentou o Tribunal de 1ª instância, não ter logrado fazer qualquer prova a este respeito.

E – Para o Tribunal da Relação de Coimbra foi suficiente para a prova por presunção judicial a junção da proposta de subscrição de seguro e nada mais.

F – O recorrente entende por isso que o Tribunal da Relação de Coimbra aplicou erradamente o direito ao caso concreto, uma vez que, e conforme foi considerado pelo tribunal de 1ª instância, a ré não logrou provar que mesmo que soubesse da utilização dada ao veículo pelo autor, independentemente do momento e que iniciou aquele tipo de utilização, não celebraria o contrato de seguro com o autor.

G – Era à ré quem incumbia alegar e provar a declaração inexacta ou reticente com a virtualidade de desaguar na anulação do contrato, o que não logrou fazer.

H – E como bem decidiu o Tribunal de 1ª instância, era à ré quem cabia fazer prova que essas declarações inexactas existiram e ainda que, em caso afirmativo, mesmo que as conhecesse, não celebraria o contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel.

I – Afirmou o tribunal de 1ª instância que «incumbirá sempre à seguradora, num tal tipo de casos a alegação e prova não só das declarações inexactas, mas também que não teria celebrado o contrato se conhecesse o facto verídico (no caso de falsidade da declaração) ou omitido (caso se trate apenas de falta de comunicação) e foi essa prova que a ré efectivamente não logrou fazer no caso concreto…».

J – Acrescentando ainda a sentença do Tribunal de 1ª instância que «o facto constante no art.16º da base instrutória mereceu, também por isso, resposta negativa, pelo que improceder a tese da ré fundada em invalidade do seguro por falsas declarações.».

K – No art.16º da Base instrutória questionava-se o seguinte «se a ré soubesse que o autor utilizava o PZ para o fim referido em 15º, não teria assumido os riscos de choque, colisão ou capotamento?» L – O tribunal ao considerar como não provado aquele artigo 16º da base instrutória, na esteira do que sustenta o Ac. do STJ de 08-06-2006, é como se tal facto não existisse, pois «a resposta negativa a um quesito significa que o facto não se provou. Tudo se passa como se não tivesse sido alegado, não sendo, outrossim...

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