Acórdão nº 791/12.6GAALQ.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | RAUL BORGES |
Data da Resolução | 29 de Abril de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
No âmbito do processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n.º 791/12.6GAALQ, do então 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Alenquer, integrante do Círculo Judicial de Vila Franca de Xira, foi submetida a julgamento a arguida AA, ..., nascida em ..., em prisão preventiva, sucessivamente, no Hospital Prisional São João de Deus em Caxias (Facto provado n.º 104 e fls. 688 e 701), Estabelecimento Prisional de Tires (fls. 1221) e Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo (fls. 1018 verso, 1030, 1038 verso, 1252 e 1260 e verso).
A arguida foi detida no dia 23 de Dezembro de 2012 (fls. 147).
Submetida a primeiro interrogatório judicial em 24 Dezembro de 2012 (auto de fls. 177 a 183), por se mostrar indiciada, pela prática de factos de 19 de Dezembro de 2012, na autoria material de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a), c), e), h) e j), do Código Penal, e um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código, foi validada a detenção e determinada a sujeição da arguida à situação de prisão preventiva.
Pela acusação de 22-04-2013, constante de fls. 544 a 554, foi-lhe imputada a autoria material de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a), c), e), h) e j), do Código Penal, e um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código, em concurso aparente com um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1, e um crime de maus tratos, p. e p. pelo artigo 152.º -A, n.º 1, alínea a), do Código Penal e pedida a condenação na pena acessória de expulsão do território nacional, nos termos do artigo 134.º, n.º 1, alíneas a), e) e f) e n.º 2 e artigo 151.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho.
BB, progenitor dos menores falecidos, foi admitido a intervir nos autos como assistente, conforme fls. 411, 611 verso e 621.
Deduziu acusação, acompanhando integralmente a acusação pública, bem como pedido de indemnização, conforme fls. 588 a 596 e, em original, de fls. 598 a 606.
A arguida contestou, conforme fls. 719 a 724 e, em original, de fls. 785 a 790.
Realizado o julgamento, com sessões em 19 (fls. 687-690) e 26 de Junho (fls. 706-8) e em 12 de Julho 2013 (fls. 747-750), foi designado para leitura do acórdão o dia 12 de Agosto de 2013.
Como se colhe da acta de leitura de fls. 865 a 870, o Colectivo de Alenquer procedeu então a alteração não substancial dos factos descritos na acusação em 31 pontos e ainda a alteração da qualificação jurídica, de modo a substituir a agravante da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal pela da alínea i).
Por acórdão de 12 de Agosto de 2013, constante de fls. 793 a 864, do 3.º volume, depositado no mesmo dia, conforme fls. 877, foi deliberado: Parte Criminal Absolver a arguida da prática de um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, de que vinha acusada.
Condenar a arguida Pela prática, em autoria material, de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 20 anos de prisão por cada um deles; Pela prática, em autoria material, de um crime de maus-tratos, p. e p. pelo artigo 152.º-A, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão; Pela prática, em autoria material, de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão.
Efectuado o cúmulo jurídico, foi aplicada a pena única de 24 anos de prisão.
Parte Cível Absolver a arguida do pedido deduzido pelo demandante civil relativo às quantias de 8.000,00 euros para cada um dos falecidos menores a título de indemnização por danos não patrimoniais por eles sofridos.
Condenar a arguida/demandada no pagamento ao demandante BB da quantia de 10.000,00 euros, como compensação pelo dano causado pela privação do direito à vida de cada um dos filhos, CC e DD, sendo 5.000,00 € por cada um deles.
Decretada foi também a expulsão da arguida do território nacional “assim que se mostre verificado o legal condicionalismo”.
******* Inconformada com o teor da decisão, dela interpôs a arguida recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, conforme expressão de fls. 883 a 906 do 3.º volume, impugnando matéria de facto e de direito, tendo respondido o Ministério Público, conforme fls. 914 a 921, de novo de fls. 922 a 929, e finalmente, em original, de fls. 930 a 937.
Por acórdão da 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 14 de Janeiro de 2014, constante de fls. 967 a 1003, foi o recurso julgado parcialmente procedente e anulado o acórdão recorrido por enfermar de falta de fundamentação (falta de exame crítico das provas) e por outro lado, por omissão de tomada de posição sobre a conclusão pericial onde se diz “embora possa considerar-se a sua atenuação”, não a aferindo e valorando, quer para efeitos de enquadramento jurídico-criminal da conduta da recorrente, quer para a graduação das penas.
O acórdão recorrido foi então declarado nulo, por falta de fundamentação e ainda por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alíneas a) e c) e n.º 2, do CPP.
Remetido, por força da anulação, o processo à 1.ª instância, foi agendado para leitura do acórdão perfectibilizador, o dia 4 de Abril de 2014 - fls. 1020.
Foi proferido então novo acórdão em 1.ª instância, em 4 de Abril de 2014, conforme fls. 1135 a 1216, depositado no dia 7 seguinte, como consta de fls. 1218, tendo sido suprida a invocada omissão de pronúncia e mantidas as supra mencionadas absolvições e condenações, anotando-se que no respectivo relatório, omite-se, por completo, o que não faz grande sentido, a menos que se trate de descuidado esquecimento, qualquer, mínima mesmo, referência ao anterior acórdão impugnado e à anulação do mesmo, decretada pela Relação - fls. 1136.
Novamente se mostrou inconformada a arguida, vindo interpor recurso de tal acórdão – fls. 1226 a 1250 – visando a reapreciação da prova gravada e da matéria de direito, tendo o Ministério Público respondido como consta de fls. 1261 a 1269.
Por acórdão da mesma 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 9 de Setembro de 2014, constante de fls. 1304 a 1368, foi negado provimento ao recurso.
A arguida interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, conforme motivação de fls. 1374 a 1390, e em original, de fls. 1392 a 1406, o qual foi admitido por despacho de 21-10-2014, a fls. 1408.
Nota: Há duas conclusões XXII, a recorrente salta da conclusão XXXI para a XXXIII e utiliza numeração romana até à conclusão XXXIX, mas a seguir prossegue com as conclusões XXXX, XXXXI, e assim por diante, até à XXXXVIII.
A recorrente apresenta as seguintes conclusões: A matéria de facto considerada como provada e não provada pelo Tribunal a quo está deficientemente apreciada uma vez que, da prova documental junta aos autos e dos depoimentos das testemunhas e Perito tem que se retirar as seguintes conclusões: I - O Tribunal não poderia olvidar estas declarações periciais, e deveria ter dado como provado que a arguida, aquando da prática dos factos, estaria numa situação de consciência muito diminuída; II - Outra não podia ser a decisão que não fosse a de concluir pela imputabilidade diminuída da arguida e ter sido tomada em conta no momento da aplicação da medida da pena; III - Por outro lado, o Tribunal a quo volta a não pronunciar-se sobre matéria de facto que cumpria apreciar devidamente.
IV - A pena de 24 anos de prisão (em cúmulo jurídico) aplicada pelo tribunal a quo é gravosa e afasta-se fortemente do limite mínimo. Veja-se que o Tribunal a quo nem sequer teve em conta o fato de a arguida ser primária, ter confessado os factos (ainda que sob o efeito de forte medicação) e ter demonstrado arrependimento.
V - Assim, deve a pena de 24 anos de prisão ser reduzida para a sua duração mínima, atendendo ao fato da Recorrente à data da prática dos factos ter a sua imputabilidade diminuída, ser primária, ter demonstrado arrependimento, e confessar os factos.
VI - Salvo o devido respeito por solução diversa, é modesto entendimento da recorrente, após cotejar o Acórdão recorrido, que na parte relativa à fundamentação, mais concretamente na indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, não procedeu o tribunal a quo, ao seu exame crítico, conforme art.º 374 n.º 2 e art.º 379 n.º 1 a) e c) ambos do CPP, o que gera a nulidade da Sentença; VII - Pois, a prova que serviu de base para formar a convicção do tribunal, designadamente, a confissão livre, efetuada pela arguida, devia ser objeto de exame crítico como se impõe e ter sido levada em consideração; VIII - Com efeito, para cumprimento dos referidos preceitos legais, carece o tribunal de, não apenas indicar as provas que serviram para formular a sua convicção (inclusive a confissão pelo arguido), mas também de as analisar criticamente, pois só assim, se garante que na sentença se seguiu um processo lógico e racional na complexa tarefa de apreciação da prova, não sendo portanto, uma decisão ilógica, arbitrária, contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum da apreciação da prova.
IX - A falta de ponderação em conjunto, dos factos e personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no art.º 77 n.º 1 do Código Penal. O douto Acórdão não procedeu, como lhe está imposto, à ponderação em conjunto, dos factos e à personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena.
X - O douto Acórdão não procedeu, como lhe está imposto, à ponderação em conjunto, dos factos e à personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no art.º 77 n.º 1 do Código Penal.
XI - Os critérios de escolha e determinação da medida da pena impostos pelas normas dos artigos 70.º e 71.º do...
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