Acórdão nº 1829/10.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA - limited partnership, constituída de acordo com a Lei Alemã (1.ª A.
), e BB COMUNICAÇÕES, S.A. (2.ª A.), instauraram ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, em 16/08/2010, junto da Instância Central Cível da Comarca de Lisboa, contra a CC PORTUGAL, S.A.
(R.), a pedir que se declarasse verificado o incumprimento de um “Termination Agreement”, por parte da R. e, em consequência, se condenasse a mesma a pagar às A.A.: a) – a quantia de € 4.063.282,69, referente ao IVA devido pela aquisição de equipamentos à 1.ª A.; b) – a quantia de € 513.587,80, a título de juros vencidos desde 29/01/2009 até 31/07/2010; c) – e ainda os juros vincendos desde 01/08/2010 até integral e efetivo pagamento à taxa legal em vigor.
Alegam, para tal, no essencial, que: .
As A.A. e a R., juntamente com outras entidades, celebraram, em 28/11/2003, uma “operação de financiamento”, denominada German Lease, cuja assessoria financeira coube, respetivamente, ao Banco DD e à EE; .
A estrutura da referida operação consistiu, para além de diversos outros contratos de índole financeira, essencialmente, na celebração de: (i) - um contrato de compra e venda, denominado “Purchase Agreement”), nos termos do qual a 2.
a A., a FF, S.A., e a então denominada GG, Portugal, S.A., a atual CC PORTUGAL, S.A., ora R., venderam os equipamentos ali identificados à 1.ª A.; (ii) - um contrato de locação, denominado “Head-Lease Agreement”, desses equipamentos, entre a 1.ª A., na qualidade de locadora, e uma outra entidade alemã, na qualidade de locatária, a HH & Co. KG (GSI); (iii) - um contrato de sublocação, denominado "Sub-Lease Agreement”, dos mesmos equipamentos, entre a GSI, na qualidade de sublocadora, e a 2.
a A., a FF e a R., na qualidade de sublocatárias; .
A referida operação de financiamento, celebrada pelo prazo de 4,5 anos, com vencimento previsto para 30/05/2008, tinha em vista a aquisição dos aludidos equipamentos, incluindo, nomeadamente, telefones e boxes de televisão, por parte de diversas entidades subsidiárias da sociedade “II, S.A..”, tais como: a 2.ª A., a FF e a R., à data designada “GG Portugal, S.A.”; .
Os montantes a pagar, em cada momento, em caso de vencimento – os termination amounts –, encontram-se identificados nos Anexos II e III do sobredito contrato de sublocação, prevendo-se também a existência de obrigações fiscais a cumprir em Portugal, por imposição legal, na decorrência do pagamento do preço da compra e venda pela 1.ª A., no início da operação, e do pagamento dos termination amounts pela BB, pela FF e pela R., na data de vencimento, ficando a 2.ª A., desde logo, nomeada como representante fiscal da 1.ª A. em Portugal; .
Em 07/11/2007, verificou-se o spin-off entre a 2.
a A. e a BB Multimédia - Serviços de Telecomunicações e Multimédia, SGPS, S.A., a atual JJ Multimédia SGPS, S.A., que assim deixou de integrar o grupo da 2.ª A.; .
A GSI veio a exercer o direito, que lhe estava contratualmente atribuído, de provocar o vencimento antecipado da “Operação German Lease”, por contrato, designado Termination agreement, de 23/01/2008, igualmente subscrito pela R., tendo aquela operação sido encerrada com efeitos retroativos a 8/01/2008; .
Na sequência do Termination Agreement, a 1.ª A. transferiu para a 2.
a A., para a FF e para a R. a propriedade dos equipamentos, nos termos contratuais, os quais, desde então, se encontram na posse destas últimas, que os utilizam no exercício da sua atividade, deles dispondo, de forma plena e livre, e beneficiando de forma exclusiva; .
Na fatura emitida pela 1.ª A., na qualidade de vendedora, à R., na qualidade de compradora, e com vencimento em 29-01-2009, foi liquidado o IVA respetivo, à taxa de 21%, no valor de € 4.063.282,69, tendo o respetivo montante sido pago à Administração Tributária Portuguesa pela 2.
a A., na referida qualidade de representante fiscal da 1.ª A.; .
Porém, a R. apenas procedeu ao pagamento parcial do valor de capital da fatura, na cifra de € 19.348.965,18, correspondente ao valor dos bens transmitidos antes da liquidação do IVA, referente aos equipamentos adquiridos por força do Termination Agreement, o que foi feito mediante compensação dos contratos financeiros, nos termos ali clausulados, encontrando-se ainda por pagar a quantia de € 4.063.282,69, relativa a IVA, apesar da interpelação da R. para o fazer.
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A R. contestou: 2.1.
, Invocando a ilegitimidade da 2.ª A., porque, enquanto representante fiscal da 1.ª A., apenas teria poder para atuar, em nome desta, perante a administração fiscal e em assuntos que respeitem concreta e exclusivamente ao IVA, o que não é o caso nesta ação; 2.2.
Impugnando, designadamente, quer o pagamento à Administração Tributária portuguesa pela 2.ª A., na qualidade de legal representante fiscal da 1.ª A., do montante do IVA liquidado na fatura emitida por esta, em 30/12/2008, quer mesmo o pagamento parcial, pela sua parte, do valor de tal fatura, sustentando que: .
a referida “Operação GBL” não teve em vista o financiamento da R., mas, em última análise, o da 2.ª A. e mais latamente o Grupo BB/BB SGPS, tendo a mesma R. participado naquela operação de forma unicamente acessória e instrumental, sem ter recebido qualquer tipo de contrapartida financeira, ou outra, proporcional aos valores da fatura em apreço nos autos; .
além de o ganho potencialmente adveniente para a R. do não pagamento da fatura em apreço nos autos ou do montante correspondente a 21 % do seu valor total, ora peticionado, foi desde sempre assumido pelas 2.
a A., R. e FF, como contrapartida da R. pela sua participação na dita operação.
Concluiu a R. pela procedência da arguida exceção dilatória de ilegitimidade da 2.ª A. e pela total improcedência da ação e consequente absolvição da R. dos pedidos.
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As A.A. replicaram, pugnando pela improcedência da exceção deduzida, reiterando o petitório.
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O processo prosseguiu com dispensa da audiência preliminar e prolação do despacho saneador, em que foi julgada improcedente a exceção de ilegitimidade da 2.ª A., a que se seguiu a seleção da matéria de facto tida por relevante com organização da base instrutória (fls. 730-739).
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Realizada a audiência final, foi proferida sentença a fls. 928-942, datada de 05/08/2013, a julgar a ação improcedente com a absolvição da R. do pedido.
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Inconformadas com tal decisão, as A.A. recorreram dela para o Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou a apelação parcialmente procedente, conforme acórdão de fls. 1583 a 1636, datado de 19/03/2015, no qual foi decidido condenar-se a R. a pagar à A. “AA & Co. Kg.” a quantia de € 4.063.282,69, acrescidos de juros de mora, às sucessivas taxas legais fixadas nos termos previstos no art.º 102.º, § 3.º, do Código Comercial, vencidos desde 29/01/2009, no montante de € 513.587,80, à data da propositura da ação, em 16/08/2010, e vincendos, até integral e efetivo pagamento, absolvendo-a do pedido enquanto formulado pela 2.ª A. II, S.A..
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Desta feita, inconformada, veio agora a R. recorrer de revista, formulando as seguintes conclusões: A - Quanto ao Capítulo 1 das presentes Alegações 1.ª - O Tribunal “a quo” concentrou a sua análise da “vexata quaestio” dos autos no seu suposto enquadramento jurídico-fiscal, todavia desconsiderando os factos provados nos autos e, bem assim, a construção e delimitação fáctico-jurídica da presente lide, tal como efetuada pelas A.A.; 2.ª - O Tribunal “a quo” incorre numa manifesta confusão (e procede a uma incorreta e infundada justaposição) entre: i. a suposta obrigação contratual de pagamento que constitui o fundamento da presente causa de pedir e que as A.A. imputam à R.; ii. a obrigação legal de pagamento/entrega de IVA à Administração Tributária (AT) que legalmente incumbe à 1.
a A. AA, emitente da fatura que visa titular a referida (suposta) obrigação contratual; B - Quanto ao Capítulo II das presentes Alegações: 3.ª - Tal como provado nos autos - factos provados n.ºs 2, 3, 21 a 26, 28, 31, 34, 35 e 38 -, a Operação "GBL" foi uma operação meramente contabilística/financeira, que não foi objeto de qualquer concretização monetária ou execução material e que, portanto, não teve específica execução pelas partes, não tendo sido causa de qualquer circulação de bens ou de dinheiro; C - Quanto ao Capítulo III das presentes Alegações: 4.ª - Com respeito à fatura em apreço e ao seu valor remanescente de capital não peticionado nos autos (€19.348.955,18), está assente o seu não pagamento pela R., o que foi reconhecido pelo Tribunal “quo”, por via da eliminação do mencionado facto n.º 19 da sentença da 1.
a Instância. Tal não pagamento corresponde ao ajustado entre as partes, não sendo, nem jamais tendo sido, demandando pelas A.A.; 5.ª - Sendo inexigível o pagamento do valor de capital da fatura “sub judice”, não poderá diversamente concluir-se ser exigível o seu correspetivo IVA: uma determinada obrigação, ou é contratual e legalmente exigível, ou não o é; 6.ª - Assim, mal andou o Tribunal “a quo” ao considerar que a sua própria decisão de procedência do requerido pela R., em sede de ampliação do âmbito da apelação, determinando a eliminação do facto provado n.º 19, não prejudicaria o anteriormente concluído no sentido da procedência da ação; 7.ª - Acresce que não é a R. que está obrigada legalmente a proceder ao pagamento do referido IVA à AT, mas sim o transmitente/emitente da fatura, no caso, a 1.
a A.; 8.ª - Já o pagamento pela R. à 1.
a A. da parte do valor da obrigação/fatura correspetíva de tal imposto será, ou não, exigível consoante exigível seja, ou não, a obrigação contratual de per si - o pagamento do valor da fatura de per si e não segmentado por capital, que vimos já não ser exigível, e IVA; 9.º - Esta conclusão impõe-se independentemente das considerações que, subsidiariamente e por cautela de patrocínio, se tecerão a respeito da configuração fáctico-jurídica da presente lide pelas A.A. e pelo próprio Tribunal “a quo” e das...
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