Acórdão nº 177/04.6TBRMZ.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução04 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 .

No então Tribunal Judicial de Reguengos de Monsaraz, o Município de Mourão, representado pelo Ministério Público, instaurou esta ação declarativa contra: AA e mulher, BB; CC e mulher, DD; EE, Sociedade de Caça e Turismo Rural, Lda. e Banco FF, S.A.

Alegou, em síntese, que: Em 7.11.2003, os réus AA e BB venderam nove prédios aos réus CC, DD e EE; Nessa data, foi constituída, sobre todos esses prédios, uma hipoteca a favor do réu Banco FF; Quatro desses prédios, denominados “Herdade das GG”, “Herdade da HH”, “Herdade do II” e “Herdade dos JJ”, situam-se na área do concelho de Mourão; Na escritura pública de compra e venda, declararam preços inferiores aos reais, em termos que pormenoriza; Por isso, tem o direito de preferir na referida venda, ao abrigo do disposto no artigo 176.º do CSISD; Preferência que, incidindo sobre a venda, exclui a hipoteca que os preferidos constituíram após a sua aquisição.

Pediu, em conformidade: O reconhecimento da preferência na aquisição dos referidos quatro imóveis e, assim, que se julgue como adquirente dos mesmos, substituindo-se aos segundo e terceiro réus na aquisição; Consequentemente, que se julguem ineficazes e sem efeito as hipotecas sobre os mesmos prédios, ordenando-se o seu cancelamento.

Contestaram os réus.

Os primeiros (AA e BB), no essencial, aceitaram a totalidade dos factos alegados na petição inicial, salientando que a divergência verificada entre os preços reais dos imóveis e aqueles que foram declarados na escritura pública de compra e venda foi uma imposição – como condição de celebração do negócio – dos réus compradores e concluindo por aceitar a procedência da ação.

CC, DD e EE, Sociedade de Caça e Turismo Rural, Lda., alegaram, em síntese, que o preço de cada um dos prédios que consta da escritura de compra e venda corresponde ao preço efetivamente acordado entre vendedores e compradores, não existindo qualquer simulação, não sendo de acolher a pretensão de preferência invocado pelo autor.

O Banco FF defendeu também a inexistência de qualquer simulação no preço da compra e venda dos imóveis em causa.

2 .

A ação prosseguiu a sua tramitação e, na altura própria, foi proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: “Julgo a ação totalmente procedente:

  1. Reconhecendo que o autor, Município de Mourão, é titular de direito de preferência na compra e venda, realizada no dia 7 de Novembro de 2003, em que outorgaram como vendedores os réus AA e BB e como compradores os réus CC, DD e “EE, Sociedade de Caça e Turismo Rural, Lda.”, dos seguintes prédios: Prédio rústico denominado “Herdade das GG”, sito na freguesia da Granja, concelho de Mourão, inscrito na matriz sob parte do artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mourão sob o n.º …; Prédio misto denominado “Herdade da HH”, sito na freguesia da Granja, concelho de Mourão, inscrito na matriz rústica sob o artigo … e na matriz urbana sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mourão sob o n.º …; Prédio misto denominado “Herdade do II”, sito na freguesia da Granja, concelho de Mourão, inscrito na matriz rústica sob o artigo … e na matriz urbana sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mourão sob o n.º …; e Prédio rústico denominado “Herdade dos JJ”, sito na freguesia da Granja, concelho de Mourão, inscrito na matriz sob parte do artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mourão sob o n.º ….

  2. Determinando a substituição dos réus compradores pelo autor e adjudicando, a este último, o direito de propriedade sobre cada um dos prédios referidos em A); C) Declarando ineficazes as hipotecas constituídas, sobre os prédios referidos em A), pelos réus CC, DD e “EE, Sociedade de Caça e Turismo Rural, Lda.”, a favor do réu Banco FF, S.A..; D) Ordenando o cancelamento de todas as inscrições lavradas no registo predial, com base no contrato referido em A) e C), a favor dos réus CC, DD, “EE, Sociedade de Caça e Turismo Rural, Lda.” e Banco FF, S.A..; E) Ordenando a inscrição, no registo predial, da aquisição, a favor do autor, do direito de propriedade sobre os prédios referidos em A).” 3 .

    Apelaram os réus CC, DD, EE e Banco FF.

    Mas sem êxito. Para além de negar provimento a um agravo entretanto interposto e que não interessa ao presente recurso, a Relação de Évora julgou as apelações improcedentes, confirmando a sentença recorrida.

    4 .

    Pedem revista: O CC e DD e O Banco FF.

    Vistas a data da instauração da ação e a ressalva do artigo 7.º, n.º1 da Lei n.º 41/2013 e conforme despacho liminar do relator, a dupla conforme não preclude a admissibilidade dos recursos.

    Levantando estes, no essencial, questões idênticas ou interpenetradas, vamos deles conhecer em conjunto. 5 .

    Concluem os recorrentes CC e DD as alegações do seguinte modo:

  3. Mal decidiram as instâncias (com o devido respeito) quanto à apreciação da matéria atinente à simulação e dos requisitos previstos nos Art.º 240º a 242º, do CC., bem como o disposto no Art.º 39º, da LGT, expressamente aplicável às situações de simulação fiscal.

  4. Mal andaram as instâncias, ao darem por provados os quatro quesitos da base instrutória, sendo certo que o A., alegou e invocou como causa de pedir, apenas um facto, a saber: - A inexactidão na indicação do preço na escritura pública de compra e venda, outorgada em 07 de Novembro de 2003, no Cartório Notarial de Sousel.

  5. Desde logo porque o preço da compra e venda alegado pelo A., como sendo o valor real da transacção, foi de € 4 933 413,88, não se compreendendo porque é que os compradores, atentos os documentos - cópias, dos meios de pagamento, que se encontram juntos aos autos, pagariam aos vendedores a quantia de € 5 433 413,88, ou seja, pagariam a mais a quantia de meio milhão de euros. Seria a título de liberalidade? O) Isto considerando os seis cheques de um milhar de euros que foram grosseiramente adulterados, conforme considerou o MP no despacho de arquivamento proferido no processo 24/04.9TAETZ, junto a fls. 983 a 1008.

  6. Este facto sempre teria que relevar quer na 1ª, quer na 2ª instância, pois as contas nunca batem certas. Mas certo é que o direito não se pode conformar nem conforma com imprecisões e dúvidas deste calibre e alcance. Já que mais não fosse à luz do princípio constitucional e processual in dúbio pro reo.

  7. A legislação aplicável impõe que, para poder proceder a alegada simulação fiscal e, para que por essa via, a autarquia pudesse lançar mão do disposto no Art.º 176º, do CIMSISSD, sempre teria que se verificar uma diminuição na receita tributária. E esta disposição legal exigia, como é óbvio, a prova dessa redução no pagamento do imposto.

  8. E, quanto a esta matéria nenhuma prova foi feita nos presentes autos da qual se pudesse concluir com a necessária certeza, que o valor da transacção tivesse excedido aquele que ficou declarado na escritura pública de compra e venda.

  9. Mas antes, encontra-se documentalmente provado neste processo, que nenhum valor a título de imposto é devido ou que tivesse ficado por liquidar e pagar à Fazenda Pública. Documentos, estes, a que o Exmo. Senhor Desembargador no TRE não atribui qualquer valor, tal como no Tribunal de Reguengos de Monsaraz. Ressalvando-se que, neste Tribunal de Reguengos de Monsaraz, apenas neste processo é que foi decidido de forma diferente de todos os outros - Acção Executiva e Inquéritos nos Serviços do MP.

  10. Isto porque, a então denominada Administração Fiscal (AF), nos termos que lhe se lhe encontram legalmente atribuídos, com fundamento num único indício, que foi a declaração modelo 3 de IRS apresentada pelos vendedores para efeitos de mais-valias, procedeu a liquidações adicionais aos compradores CC e mulher (aqui recorrentes) e EE, Lda., que as impugnaram para o competente Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que veio a proferir sentenças que já transitaram em julgado, através das quais determinou o TAF a anulação dessas liquidações adicionais, por não ter a AF provado, com o mínimo de segurança que lhe era exigido, que os valores da transacção foram os constantes na declaração unilateral apresenta pelos vendedores que nela tinham todo o interesse, conforme pelos Réus demonstrado ficou.

  11. Assim sendo, como entendem os Recorrentes que é, ficou para sempre judicialmente decidida a inexistência de qualquer dívida por imposto de sisa e de selo pago a menos pelos Recorrentes/adquirentes, por via de acto simulatório.

  12. Note-se que, nos termos legais e das Leis que regem as competências dos Tribunais Nacionais, nunca os Recorrentes poderiam ter impugnado as liquidações adicionais do imposto de sisa levadas a efeito pela AF, para o Tribunal Judicial de Reguengos de Monsaraz ou para qualquer outro Tribunal que não fosse o Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, isto por razões que se prendem com a competência em razão da matéria e da territorialidade.

  13. Não podendo o A., atenta a declaração de inexistência de qualquer diferença no pagamento do imposto de sisa, prosseguir e ter tido como teve, por erro na apreciação da matéria pelas instâncias, procedimento nos presentes autos.

  14. Verifica-se que as instâncias não tiveram em devida conta as decisões judiciais que declararam a inexistência de falta de pagamento do(s) tributo(s) e que se encontram juntas a fls. 1807 a 1826, Vol. VIII. Decisões, essas, de que o Ministério Público de Reguengos de Monsaraz, que representa o A. nos presentes autos, teve desde logo conhecimento.

  15. Antes, na fundamentação de direito constante na sentença que o acórdão sob recurso confirmou, se exarou e declarou que assiste direito a preferir por parte do A., devido ao facto de: "Verificou-se, pois, uma evidente simulação na fixação do preço de cada prédio na escritura de compra e venda, com repercussão, em prejuízo da Fazenda Nacional, no montante da Sisa paga pelos compradores. Com efeito, sendo a taxa deste imposto de 5% sobre o valor da compra, a diferença entre a Sisa paga (que foi de €...

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