Acórdão nº 161/12.6PBFAR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução18 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo com o n.º 161/12.6PBFAR, do então 1.º Juízo Criminal de Faro, foi realizado na Instância Central Criminal de Faro, o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido AA, nascido em ..., na freguesia e concelho de ..., actualmente recluso no Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, em cumprimento de pena (fls. 454).

******* Foi realizada a audiência a que alude o artigo 472.º do Código de Processo Penal, em 10 de Fevereiro de 2015, com a presença do arguido, conforme consta da acta de fls. 455/6, tendo-se em vista a elaboração do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao referido condenado.

******* Por acórdão do Tribunal Colectivo da Instância Central Criminal de Faro, datado de 19 de Fevereiro de 2015, constante de fls. 457 a 477, e depositado no mesmo dia, ut fls. 480, foi deliberado: a) Proceder ao cúmulo das penas impostas ao arguido AA referidas em 1, 2 e 3 dos factos provados – ou seja, nestes autos de Processo Comum Colectivo n.º 161/12.6PBFAR, do extinto 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, no Processo Comum Colectivo n.º 42/10.8GASLV do extinto 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão e no Processo Comum Colectivo n.º 1739/11.0PAPTM do extinto 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão, condenando-o na pena conjunta de 14 (catorze) anos de prisão.

******* Inconformado com o assim deliberado, o condenado interpôs recurso, apresentando a motivação de fls. 482 a 492, que remata com as seguintes conclusões: 1 – Vem o presente recurso interposto do douto acórdão que efectuou o cúmulo jurídico do então arguido e ora recorrente na pena de 14 anos de prisão efectiva.

2 – O ora recorrente entende que a pena fixada em cúmulo jurídico não se fundou da forma mais correta, tendo em conta a culpa do arguido, as exigências de prevenção e proporção da quantificação efectuada.

3 – A medida concreta da pena aplicada ao ora recorrente – 14 anos – aplicada pelo Tribunal a quo, bem acima do limite médio das penas mínimas à máxima, surge como elevada, não tendo em conta a culpa, os sentimentos e o tolher das emoções do então arguido e ora recorrente, a conduta anterior e posterior aos factos, e a preparação por si manifestada para manter conduta lícita, violando assim o disposto nos artigos 40º, 71º e 72º do Código Penal.

4 – A prevenção geral dita os limites: um limite máximo, medida óptima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas da sociedade que a pena se deve propor alcançar; e um limite mínimo, o ponto comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos.

5 – Emergem, assim, necessidades de prevenção geral – “protecção de bens jurídicos” -, por um lado, e, por outro lado, necessidades de prevenção especial – “reintegração do agente na sociedade” na aplicação concreta de qualquer pena.

6 – O arguido quando sair em liberdade pretende recomeçar a sua vida, longe da actividade criminosa, pois está muito arrependido de todos os crimes que cometeu, e entendeu o quanto doloroso é a vida em reclusão, bem como se consciencializou da dor e do sofrimento que causou aos ofendidos.

7 – Os anos que o arguido já cumpriu e vai cumprir de pena de prisão serviram-lhe de ensinamento, pois ele tem perfeita noção de que o caminho que estava a percorrer não era o adequado, comportamento esse não o exigido pela sociedade.

8 – Sendo o pano de fundo da determinação da medida da pena, a ponderação em conjunto, dos factos e da personalidade do agente, conforme estipula o nº 1 do art.º 77º do C.P., entendemos ser fulcral elaboração de novo relatório social.

9 – Esse relatório ajudará indubitavelmente à apreciação da personalidade do agente no sentido se existe tendência, que no limite se identificará com uma carreira criminosa, ou se o arguido esteve apenas perante uma mera pluriocasionalidade de cometimento de actos ilícitos, e que não radicam na sua personalidade.

10 – Não obstante todas as necessidades de prevenção especial que se aferir-se-ão, tendo em conta a dita personalidade actual do agente, também far-se-ão sentir factores como a idade, a integração ou desintegração familiar, o apoio que possa encontrar a esse nível, as condicionantes económicas e sociais que tenha vivido e que se venham a fazer sentir no futuro.

11 – Não reclama o ora recorrente que a medida concreta da pena aplicada, ou a que lhe venha a ser aplicada, desça até ao limite mínimo da moldura da prevenção (geral positiva), ou que com ela coincida, mas suplica-se, sim, pelo não excesso.

12 – Porque a medida concreta da pena não brota da mera consideração dos fins das penas – prevenção geral e especial -, apela-se, ao fim que se almeja, ao limite da pena – a culpa.

13 – Não obstante a razoabilidade dos argumentos aduzidos pelo Tribunal a quo e sem descurar a manifesta gravidade da conduta do ora recorrente, considera-se pois, que não podem deixar de ser relevadas, a reintegração do agente delituoso na sociedade (prevenção geral e prevenção especial, respectivamente), e assim ir atingir um ajustado equilíbrio entre elas, equilíbrio esse que não inibe que, perante o caso concreto, uma dessas finalidades possa e deva prevalecer sobre outra.

14 – Em face de todo o exposto, entende o ora Recorrido que deverá a pena de 14 anos de prisão ser reduzida.

Termina, pedindo seja concedido provimento ao recurso, “revogando-se o acórdão recorrido, substituindo-se por outro em que seja efectuado um cúmulo jurídico com uma pena final total não superior a 14 anos de prisão” (SIC).

******* O recurso foi admitido por despacho de 7-04-2015, sendo então, dirigido, de forma correcta, ao Supremo Tribunal de Justiça, conforme fls. 493/4.

******* O Magistrado do Ministério Público junto da Procuradoria da Instância Central Criminal de Faro respondeu conforme fls. 498 a 502, concluindo: 1 – Por Acórdão de 19/02/2015, proferido a fls. 457 a 477 dos autos à margem supra referenciados, foi decidido pelo Tribunal Coletivo condenar o arguido ora recorrente AA, em cúmulo jurídico das penas de prisão em que foi condenado no presente processo e nos autos de processo comum coletivo n.º 42/10.8 GASLV e 1739/11.0 PAPTM, na pena conjunta de 14 anos de prisão.

2 – Na determinação daquela pena o Tribunal Coletivo valorou corretamente e no seu conjunto os factos e a personalidade do agente.

3 – Nomeadamente, os diversos crimes cometidos pelo recorrente num quadro de heterogeneidade temporal, alguns deles apresentando gravidade, tendo em conta as consequências pessoais e patrimoniais em causa.

4 – Bem como a pouco estruturada situação pessoal do arguido à data da prática dos factos e a circunstância do mesmo ter uma baixa escolaridade e pouca preparação para enfrentar o mercado de trabalho.

5 – Sendo assim elevado o juízo de censura a formular relativamente à conduta do arguido, sendo ainda prementes quer as exigências de prevenção geral, quer as necessidades de marcar um percurso ressocializante para o arguido.

6 – Pelo que, o douto Acórdão objeto do presente recurso não merece qualquer censura na apreciação que fez das circunstâncias relevantes para a determinação da medida da pena conjunta de 14 anos de prisão efetiva que aplicou ao recorrente.

Pede que seja negado provimento ao recurso, confirmando-se o acórdão recorrido nos seus precisos termos.

******* O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, no visto a que alude o artigo 416.º do CPP, emitiu douto parecer, constante de fls. 506 a 508, onde refere a dado passo: “detecta-se já não uma pluriocasionalidade, mas uma tendência para a prática de crimes contra a propriedade, a que não será alheio o consumo de estupefacientes, em cujo tratamento o arguido não investe”; a pena poderá merecer algum desagravamento para a proximidade dos 12/13 anos, mais de 1/3 do somatório das demais penas”.

******* Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente silenciou.

******* Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 411.º, n.º 5, do Código de Processo Penal.

******* Como é jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção dos vícios decisórios ao nível da matéria de facto, previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, e nulidades previstas no n.º 3, do mesmo preceito – é pelo teor das conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, ou dito de outro modo, as razões de discordância com o decidido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e se fixam os horizontes cognitivos do Tribunal Superior.

******* Colhidos os vistos, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

******* Estamos face a uma deliberação final proferida por um tribunal colectivo – mais concretamente, um acórdão cumulatório, que fixou pena única ao ora recorrente, em medida superior a cinco anos de prisão – visando o recurso exclusivamente o reexame da matéria de direito, estando em causa discordância do recorrente apenas no que respeita à medida da pena única, sendo este Supremo Tribunal competente para conhecer do recurso – artigos 427.º (este é caso de recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça) e 432.º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, do Código de Processo Penal.

******* Questão proposta a reapreciação e decisão Como resulta das conclusões do presente recurso, onde o condenado expõe as razões de divergência com o deliberado no acórdão recorrido, a única questão proposta a reapreciação por este Supremo Tribunal é a: Questão única - Medida da pena conjunta ******* Apreciando – Fundamentação de facto O acórdão recorrido para a elaboração/fundamentação/justificação da pena conjunta fixada assentou na seguinte matéria de facto: Nota - O acórdão recorrido nos pontos de factos provados 22 e 23 colocou os factos dados por provados em processos antigos relacionados com decisões de 2003...

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