Acórdão nº 8969/09.3TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Junho de 2015
Magistrado Responsável | MÁRIO MENDES |
Data da Resolução | 02 de Junho de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – AA– ..., Ldª intentou acção declarativa com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB, Ldª pedindo a condenação da R. no pagamento de uma indemnização por danos emergentes e lucros cessantes, no total de € 479.329,73; de uma indemnização por danos de imagem, no valor de € 10.000,00, sempre com juros de mora e ainda a considerar ilegais, ou abusivos e ilegítimos, os aumentos das taxas de manutenção, declarando-os sem efeito.
Subsidiariamente pediu para ser considerada nula a cláusula 15º n.º 2 do contrato, devendo a R. restituir à autora o montante correspondente ao período em falta até ao termo do contrato, no valor de € 83.144,32, mais juros de mora a contar da data de comunicação da resolução.
Ainda subsidiariamente, e para o caso de ser válida a resolução do contrato, a autora entende que a ré lhe deverá devolver a parte do preço pago correspondente ao tempo que falta até ao termo do contrato.
Alegou em síntese que CC e a Ré BB, Ldª celebraram, no dia 28 de Julho de 1999, um contrato tipo de promessa de cessão do direito de utilização de um estabelecimento na ...
, referente ao espaço “ L … do Edifício ... “, pelo prazo de 25 anos e preço de 22.560.000$00 (€ 112.528,81), mais IVA, que foi integralmente pago, adiantando que o referido CC se decidiu a celebrar esse contrato porque a Ré lhe garantiu que a M.... seria um empreendimento constituído por largas dezenas de estabelecimentos, com conceito integrado e global, acessos adequados, entre os quais um parque de estacionamento subterrâneo e um acesso pedonal com um nível elevado, arranjos paisagísticos, uma zona de marcas de alta costura, lavandaria automática e supermercado, bem como lojas âncora, tudo combinado com uma ampla promoção e tudo suportado pela maqueta exibida e material publicitário.
Segundo a A a R garantiu ainda que as taxas de manutenção seriam reduzidas (2.400$00/m2/ano) e que não seria autorizada a abertura de lojas que prosseguissem a mesma actividade da autora, no mesmo edifício.
Refere igualmente que no dia 23 de Maio de 2000, o referido CC transmitiu à sociedade autora, constituída por si e pela mulher, a totalidade dos direitos e deveres emergentes do contrato antes mencionado, que a autora celebrou porque teve como boas as garantias dadas pela ré e acima mencionadas – que também constituem obrigações legais decorrentes da Concessão -, mas que a mesma não veio a cumprir.
Com efeito a R. apenas construiu o parque de estacionamento no ano de 2008, pelo que, até essa data, o estacionamento foi feito em frente dos espaços comerciais, com prejuízo para a fruição do espaço, o que contribuiu para afastar o público da M...., e foi agravado quando a ré decidiu cobrar um valor exagerado pelo estacionamento, bem como pela falta do acesso pedonal; que o arranjo paisagístico apenas em 2009 estava a ser implementado, nunca foi instalada qualquer zona de moda, a lavandaria e o supermercado apenas existiram temporariamente, e apenas cerca de 35% dos estabelecimentos iniciaram actividade, valor que nunca ultrapassou os 45%, com a ré a deixar de fazer qualquer promoção da M.....
Acrescenta que a limpeza, a sinalética e a iluminação também eram deficientes, o mesmo acontecendo com a vigilância e a segurança, o que deu origem a cenas de vandalismo, tudo situações que afastaram público da M.... e que por outro lado, a loja da autora sofre de maus cheiros, que a R também passou a arrendar espaços comerciais por períodos curtos, tendo também permitido a abertura no Edifício ..., de dois outros estabelecimentos com a mesma actividade da autora, com prejuízo para as vendas.
Todas as situações descritas tiveram como consequência, segundo a A, diminuição do seu volume de negócios, impedindo-a de obter as receitas projectadas, para além de terem prejudicado a sua imagem perante os devedores.
Em relação às taxas de manutenção, alega a A, que, em Janeiro de 2000, a R procedeu inesperadamente ao seu aumento para 13.600$00/m2/ano, ou seja, da ordem dos 500%, não tendo apresentado nessa ocasião ou posteriormente qualquer explicação plausível para esse aumento, para além de ter dito que o valor inicialmente previsto se tinha devido a um lapso seu, a um erro na previsão dos custos.
Afirma que tanto o CC como ela pagaram sempre essas taxas pelo valor inicialmente acordado, actualizado, e pediram insistentemente esclarecimentos sobre as razões que teriam conduzido ao seu aumento o qual considera ilegal e abusivo, por não ser proporcional nem adequado ao custo dos serviços prestados, por contrariar as regras da boa-fé e da proibição do abuso de direito, bem como a confiança suscitada pela ré, e por não ter sido fundamentado, até porque não existiu alteração em relação aos serviços abrangidos.
Afirmando que se soubessem que viriam a ocorrer as situações antes descritas, nem ela nem o CC teriam celebrado o contrato e nunca o teriam feito nas condições em que tal aconteceu indica que através de carta de 13 de Outubro de 2009, a R veio comunicar-lhe a resolução do contrato, com fundamento na falta de pagamento das taxas fixadas, o que a autora não aceitou.
Conclui que o alegado incumprimento de uma obrigação secundária nunca seria suficiente para levar à resolução do contrato e que o artigo 15 do contrato, pelo seu conteúdo genérico, nada acrescenta à regulamentação legal, para além de ter havido abuso de direito na resolução do contrato.
Na contestação, a R. invocou a excepção de incompetência material deste tribunal no que diz respeito ao pedido formulado pela autora sobre a ilegalidade da fixação das taxas de manutenção.
Para além disso afirma que as obrigações assumidas perante a autora são apenas aquelas que constam do contrato celebrado no dia 28 de Julho de 1999, nas quais não se incluem a generalidade das situações invocadas pela autora, que também não resultam do contrato de concessão e que algumas das situações invocadas pela autora traduzem obrigações da ré mas apenas perante o Estado, emergentes da concessão.
Afirma que a M.... tem em funcionamento largas dezenas de lojas, sujeitas a regras impostas pela ré, em número superior ao indicado pela autora e suficiente para garantir a continuidade da sua exploração comercial, sendo que a ré tudo tem feito para a abertura das restantes e que o actual acesso pelo Passeio M.... pertence à CMC, que o construiu, e está fora da área concessionada acrescentando que esse acesso pedonal existia na ocasião abertura da M.....
Em relação ao parque de estacionamento subterrâneo, apenas em 2007 é que a CMC lhe entregou o terreno necessário para a sua construção e por outro lado, existia estacionamento suficiente no interior da M...., em moldes que já estavam previstos no projecto da M.....
Acrescenta que a M.... sempre teve palmeiras e zonas verdes, que foram aumentando ao longo dos anos, em particular em 2008, sendo a ré livre de dispor dos espaços da M.... lavandaria e o supermercado também existiram, tratando-se de equipamentos destinados ao uso dos utentes das embarcações e não dos lojistas e que tem feito promoção da M...., promovendo as acções que descreve na contestação com pormenor, ao contrário da autora em relação ao seu estabelecimento.
Por outro dado a iluminação e a sinalética sempre foram adequadas e o horário comercial até às 2 horas, sendo certo que a violação desse horário foi uma das causas dos distúrbios ocorridos na M.... a seguir à sua abertura e a que a ré pôs cobro, nomeadamente com reforço da presença policial; do mesmo modo, a segurança e limpeza foram as adequadas, existindo um sistema de câmaras de vigilância, remodelado em 2008.
No que diz respeito às taxas de manutenção, a ré defende que actuou no âmbito dos poderes atribuídos pela Concessão e com observância dos requisitos legais, tendo procurado que os seus valores sejam equivalentes ao custo dos serviços prestados, acrescentando que as taxas se destinam a cobrir as despesas que tem com a exploração da M...., em especial com as partes comuns.
A previsão feita pela ré para o ano de 1999 veio a verificar-se errada e a ré fez uma nova previsão para o ano seguinte, corrigindo-a, tendo cobrado nos anos seguintes valores próximos.
Conclui que tinha fundamento para resolver o contrato e que os pedidos formulados pela autora carecem totalmente de fundamento, até porque a mesma, quando celebrou o contrato de cessão com o primitivo contraente, conhecia a situação concreta em que se encontrava a M.....
Em reconvenção pede a condenação da autora no pagamento dos valores de taxas em dívida, no total de € 11.386,89, acrescido de juros de mora comerciais; no pagamento de uma indemnização mensal de € 1.204,67, pela ocupação da loja após a extinção do contrato, além dos juros de mora, bem como das indemnizações vincendas até à entrega da loja, que também deve ser decretada.
Na réplica, a autora alega que a cláusula 18º do contrato é contrária à boa-fé e proibida e defende a competência dos tribunais comuns para conhecer do pedido formulado e que, por outro lado, se a resolução do contrato fosse considerada válida, a não devolução das prestações correspondentes ao período em que o contrato não vigorou traduziria o exercício do direito de uma forma que excede manifestamente a boa-fé.
A autora contestou o pedido reconvencional, e invocando a prescrição das taxas anteriores a 23 de Janeiro de 2005.
Defendeu a improcedência desse pedido, pelos motivos já alegados na petição inicial, acrescentando que a ré vem defender que as taxas cobradas afinal não se destinam a suportar os custos com os serviços prestados, mas os custos com as partes comuns e com a exploração da M...., como são muitos daqueles que a ré enumera no artigo 491, onde inclui a renda paga ao Estado, custos com pessoal, amortizações, fornecimentos ou seguros.
Na tréplica, a ré nega fundamento para a excepção de prescrição bem como para o pedido de condenação como litigância de má-fé formulado pela autora.
Procedeu-se ao saneamento dos autos...
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