Acórdão nº 363/05.1TTCSC.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDES DA SILVA
Data da Resolução16 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. Nos autos epigrafados, em que o A./Sindicato pedia a condenação da sociedade Ré a repor os horários que estavam em vigor antes da alteração ilegal ocorrida a partir de 20.6.2005 e a proceder a uma nova auscultação dos trabalhadores e representantes, com vista à reestruturação dos horários de trabalho em causa, foi oportunamente proferido acórdão por este Supremo Tribunal, a fls. 1007-1047, em que, além do mais, se determinou, a final, a remessa dos autos ao Tribunal da Relação a fim de ser apreciada a questão não conhecida, conforme aí explicitado.

  2. Foi lavrado, na sequência, o acórdão que constitui fls. 1069-1090, em cujos termos se julgou improcedente o recurso interposto pelo ‘Sindicato dos Trabalhadores AA, …’, absolvendo a R., ‘BB, S.A.’ do pedido.

  3. O A./Sindicato traz-nos a presente Revista, cuja motivação rematou com a formulação das seguintes conclusões: A - Em sede de sentença de que se recorre veio o douto Tribunal da Relação de Lisboa a decidir pela improcedência do recurso, escudando a sua decisão nos seguintes argumentos: - "Se o sindicato autor pretendia proteger direitos adquiridos, deveria ter sujeito estas questões a negociação colectiva, e a sua protecção expressamente consignado no AE." - Os usos laborais embora reconhecidos como fonte de direito cedem hierarquicamente perante as demais fontes de direito laboral; B - Não obstante, mal enquadrou ao douto Tribunal de que se recorre a questão cuja análise carecia de redobrada atenção.

    Vejamos: C - Conforme é considerado em sede de matéria assente, a recorrida, por ofício, já no decurso das negociações com vista à celebração do A.E. dizia: "A Administração garante, plena e categoricamente, a manutenção de todos os direitos e regalias em vigor para os trabalhadores do CC." D - Sendo desta forma, as cláusulas referentes aos horários de trabalho destinadas a todos os trabalhadores não vinculados à recorrida à data da celebração do A.E.

    E - Vem o Supremo Tribunal de Justiça a entender que no que concerne as cláusulas de convenções colectivas deve ser tido em conta o artigo 9.º do Código Civil.

    F - Da atenta análise do descrito em 4 resulta clara a intenção dos intervenientes no A.E.

    G - Sendo o A.E. um encontra de vontades, para a sua correta interpretação teremos que nos socorrer do artigo 236.º do Código Civil.

    H - "Há que imaginar – escreve o Prof. Paulo Mota Pinto – uma pessoa com razoabilidade, sagacidade, conhecimento e diligência medianos, considerando as circunstâncias que ela teria conhecido e o modo como teria raciocinado a partir delas, mas figurando-a na posição do real declaratário...

    e o modo como aquele concreto declaratário poderia a partir delas ter depreendido um sentido declarativo." I - Dúvidas não restam, que dotados de sagacidade e conhecimento medianos, os trabalhadores entenderam a declaração supra descrita como integradora do A.E., sendo esta garante de que os seus direitos e regalias prévios à celebração do A.E. estariam garantidos pela entidade patronal.

    J - A este propósito relembramos o vertido em sede do artigo 227.º do Código Civil, quando impõe a boa-fé das partes nas negociações, sob pena de responder pelos danos causados.

    L - Por forma a resolver o verdadeiro sentido da cláusula do A.E. celebrado entre recorrente e recorrido deveria o douto Tribunal da Relação lançar mão de: - Declaração proferida pela recorrida, na qual garante aos trabalhadores a manutenção dos direitos e regalias em vigor aquela data; - Considerar esta como parte integrante daquele acordo, seja por via da aplicação do artigo 9.º do Código Civil, seja por via do artigo 236.º do Código Civil; - Tudo porque presumidamente a recorrida actuou em conformidade com o vertido no artigo 227.º do mesmo diploma legal.

    Nessa esteira – remata – deveria a recorrida ser condenada no peticionado, o que desde já expressamente se requer.

  4. A Ré contra-alegou, concluindo, por seu turno, que …porque os horários de trabalho não foram individualmente acordados; porque a alteração dos horários de trabalho compete ao empregador, dentro dos mecanismos legais; porque o AE celebrado e em vigor assim o permitia, nada impedia à Recorrida de proceder como procedeu, sendo substancialmente válidos os novos horários instituídos.

    Deve, pois – termina – confirmar-se o acórdão impugnado.

    ___ O Exm.º P.G.A. emitiu proficiente parecer em que concluiu que: .

    Nos termos do art. 170.º do Cód. Trabalho, bem como dentro dos limites decorrentes do AE negociado entre a R. e a FESAHT, das normas que o regem e da legislação geral sobre o jogo, compete àquela definir os horários de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço; .

    Na fase de negociações, a R. anunciou a sua intenção de proceder à alteração dos horários de trabalho após a entrada em vigor do AE em causa, referindo fazê-lo ‘com respeito pelos períodos de trabalho diário e semanal efectivos e de permanência fixados na cl.ª 40.ª; .

    A cl.ª 40.ª daquele AE não suporta uma interpretação que permita concluir que os horários de trabalho em vigor na R. até ao início da vigência daquele IRC seriam salvaguardados com base em pretensos direitos adquiridos pelos trabalhadores; .

    A prática que vinha sendo aplicada pela R., em matéria de horários de trabalho, foi revogada por uma fonte de direito superior; .

    Atento o princípio da filiação, consagrado no art. 496.º do Cód. Trabalho, bem como o constante das cl.ªs 1.ª e 2.ª do referido AE, este obriga a R., bem como os trabalhadores ao seu serviço, inscritos no A., razões pelas quais o recurso deverá improceder, antes sendo de confirmar o Acórdão sub judicio.

    Conhecido pelas partes, nenhuma ofereceu resposta.

    _____ Preparada a deliberação, vamos conhecer.

    II.

    1 - O objecto do recurso.

    Inexistem questões de conhecimento oficioso.

    Compulsadas as asserções conclusivas alinhadas pelo recorrente – por onde se afere e delimita, por regra, o objecto e âmbito da impugnação – importa saber, afinal, se os (novos) horários implementados pela recorrida são ou não substancialmente válidos.

    2 - Dos Fundamentos 2.1 – De Facto.

    Vem dada como provada, das Instâncias, a seguinte factualidade: 1.

    São associados do Autor os seguintes trabalhadores da Ré, que exercem funções na Sala de … e Sala Mista do CC, trabalhadores que, em 20 de Junho de 2005, subscreveram as declarações juntas ao processo:

    1. Com a categoria de pagadores de banca: DD ------------------------------------ a fls. 287; EE --------------------------- a fls. 271; FF ----------------------------- a fls. 282; GG ----------------------------- a fls. 289; HH --------------------------------------- a fls.275; II ----------------------------- a fls.272; JJ --------------------------------------- a fls.261; KK -------------------------------- a fls.266; LL --------------------------------------- a fls.284; MM --------------------------------------- a fls.259; NN ----------------------------------- a fls.240; OO ------------------------------- a fls.264; PP ----------------------------- a fls.274; QQ ------------------------------------------ a fls.273; RR ---------------------------- a fls.263; SS ---------------------------- a fls.285; TT ------------------------------------- a fls.288; UU ---------------------------------------- a fls. 280; VV ------------------------------------ a fls. 286; XX --------------------------- a fls. 267; ZZ -------------------------------- a fls. 265; b) Com a categoria de fiscal de banca: AAA ---------------------------------- a fls. 268; BBB -------------------------------------------- a fls. 269; CCC ---------------------------------- a fls. 270; DDD --------------------------------- a fls. 277; EEE ------------------------------- a fls. 278; FFF -------------------------------------------- a fls. 279; GGG -------------------------------- a fls. 283; 2.

    Alguns dos trabalhadores associados do Autor trabalham para a Ré há mais de duas décadas.

  5. Durante os últimos anos, o horário desses trabalhadores sempre foi organizado atendendo ao início das folgas e ao dia de trabalho a seguir à folga, do seguinte modo:

    1. No dia de trabalho na véspera da folga, o trabalhador teria o seu turno organizado de modo a terminar às 21 horas; b) No dia em que entrava ao serviço após as folgas, o seu turno de trabalho sempre se iniciou às 21 horas; 4.

    A Ré procedeu a uma reestruturação dos tempos de trabalho dos seus trabalhadores, fiscais de banca, pagadores de banca e chefes de banca, que se efectivou em 20 de Junho de 2005, data em que entraram em vigor os novos horários de trabalho implementados pela Ré.

  6. Com essa reestruturação, os trabalhadores, na véspera das folgas, passam a sair sempre às 22 horas e, no dia a seguir às folgas, passam a entrar sempre às 20 horas.

  7. A Ré enviou à Comissão Unitária de Trabalhadores do CC a comunicação cuja cópia foi junta a fls. 55 a 58 do processo.

  8. Em 31 de Maio de 2005, a requerida enviou à Comissão Unitária de Trabalhadores (CUT) comunicação com o seguinte teor: «Como é do vosso conhecimento, o novo Acordo de Empresa recentemente celebrado, estabelece, na sua Cláusula 40.ª, novos períodos de trabalho diário e de permanência para os trabalhadores afectos ao Sector de Jogos.

    Sendo da competência do empregador a definição dos horários de trabalho, dentro dos limites da lei (art. 170.º do Código do Trabalho e Cláusula 39.ª do AE), é intenção da BB (III), S. A, proceder a uma reestruturação dos horários de trabalho dos trabalhadores das salas de Jogos … e …, tendo em conta os parâmetros estabelecidos na referida Cláusula 40.ª.

    Tal reestruturação estará condicionada à entrada em vigor do AE.

    Nestes termos, e em cumprimento do disposto no art. 173.º, n.º 2, do Código do Trabalho, procede-‑se, por este meio, à consulta dessa Comissão para o conteúdo dos novos horários, que se juntam em anexo, cuja aplicação efectiva só ocorrerá após a entrada em vigor do Acordo de Empresa».

  9. A Comissão Unitária de Trabalhadores, através de...

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