Acórdão nº 868/12.8TTVNF.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelMÁRIO BELO MORGADO
Data da Resolução25 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA, intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra BB, …, CRL, ambas com os sinais nos autos, pedindo a declaração da ilicitude do seu despedimento (em 30.09.2012), bem como a condenação da R. a pagar-lhe as quantias referentes a: i) indemnização substitutiva da reintegração; ii) todas as retribuições que deixou de auferir, até à data do trânsito em julgado da decisão; iii) créditos salariais (subsídios de férias e de Natal, proporcionais ao trabalho prestado em 2012); iv) € 3.500,00, por danos não patrimoniais; juros de mora, vencidos e vincendos, até integral pagamento.

    Para tanto, alega, essencialmente, que os sucessivos contratos que celebrou a termo com a R., para exercer funções como docente universitária (assistente), devem considerar-se sem termo (por tal estipulação ser nula), tendo as partes ficado vinculadas por um contrato de trabalho por tempo indeterminado, razão pela qual a declaração de caducidade do contrato levada a cabo pela R. consubstancia um despedimento ilícito.

  2. A R. contestou, alegando, em síntese, que o vínculo contratual com a A. cessou por esta não ter logrado obter o grau de Mestre a que se propôs, razão pela qual se esgotou a possibilidade de manter o contrato.

  3. Julgada parcialmente procedente a ação, foi decidido: a) - Declarar ter a A. sido ilicitamente despedida pela R. e, em consequência, condenar esta a pagar àquela: € 17.477,46 euros, a título de indemnização por antiguidade; todas as retribuições vencidas desde o dia 07/11/2012 até ao trânsito em julgado desta decisão, deduzindo-se o valor que a trabalhadora tenha recebido com a cessação do contrato de trabalho e que não teria recebido se não fosse o despedimento, bem como qualquer quantia que a trabalhadora tenha recebido a título de subsídio de desemprego, sendo esta quantia entregue pela empregadora à segurança social; juros de mora, à taxa legal, desde a data do respetivo vencimento e até integral pagamento; € 2.247,10, a título de créditos salariais; juros de mora, à taxa de 4%, sobre as quantias referidas, desde a citação quanto às retribuições já vencidas e outros créditos e desde a data desta decisão quanto às retribuições entretanto vencidas e indemnização, e até integral pagamento.

    1. – Absolver a R. do mais peticionado.

  4. Interposto recurso de apelação pela R., o Tribunal da Relação do Porto (TRP), concedendo parcial provimento ao recurso, decidiu “declarar nulo o contrato de trabalho dos autos (...), mantendo-se a condenação da ré [com fundamentos parcialmente diversos] no pagamento da indemnização em substituição da reintegração, que, contudo, somente será devida até à notificação às partes do (...) acórdão, o mesmo acontecendo relativamente às retribuições intercalares, que (...) serão calculadas entre 30 dias antes da data da propositura desta ação (...) e a notificação (...) deste acórdão”.

  5. Interpôs recurso de revista a R., peticionando a sua absolvição do pedido, sustentando, no essencial, nas conclusões da sua alegação: - O primeiro contrato a termo, celebrado em 1998, é válido, e não se transformou em contrato sem termo. A justificação do termo foi indicada e a recorrida nunca apontou qualquer vício do contrato nesse ponto, pelo que o exercício do direito de impugnação prescreveu.

    - Nunca a recorrida alegou qualquer vício resultante de se ter operado um número ilegal de renovações, pelo que também prescreveu o direito de exercer essa impugnação.

    - À data da sua contratação não existia qualquer impossibilidade, já que preenchia os requisitos do art. 13° do DL 448/79, de 13.11.

    - A partir do termo do contrato de 1998, ou seja em 2001, a recorrida estava impedida de continuar a lecionar por falta de habilitações académicas (art. 29° do mesmo diploma).

    - Porque se verificava um vazio legislativo para a situação concreta da A., a R. optou por lançar mão do contrato de docência além quadro, de acordo com o que se achava estipulado nos seus estatutos.

    - O Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, aprovado pela Lei 62/2007, de 10/9, veio, no seu art. 52°, unificar este regime jurídico, reforçando a ideia de um paralelismo entre o ensino superior público e o ensino superior privado, exigindo que aos docentes do ensino superior privado seja assegurada uma carreira paralela à dos docentes do ensino superior público. Mais estabeleceu que o pessoal docente dos estabelecimentos de ensino superior privados deve possuir as habilitações e os graus legalmente exigidos para o exercício de funções da categoria respetiva no ensino superior público.

    - O Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, aprovado pelo DL 16/94, de 22/1, que vigorou até à entrada em vigor da Lei 62/07, dispunha no seu art. 23° que as categorias dos docentes do ensino superior particular ou cooperativo deveriam ser paralelas às categorias de docentes reconhecidas no ensino superior público e que o pessoal docente dos estabelecimentos de interesse público deveria possuir as habilitações e graus legalmente exigidos para o exercício de funções da categoria respetiva no ensino superior público.

    - Neste quadro legal, a única solução possível para a situação profissional e académica da recorrida foi a escolhida pela recorrente, fazendo aprovar e publicar os seus estatutos, de forma a colmatar a lacuna que ainda subsiste, por força de ainda não ter sido aprovado o regime legal previsto no art. 53° da Lei 62/07 de 10/9.

    - Por via dos contratos de docência sucessivamente renovados, a recorrente possibilitou que a A. pudesse continuar a lecionar, não lançando mão de um despedimento.

    - A correta interpretação e subsequente aplicação desta legislação deveria ter levado a concluir-se pela cessação do primeiro contrato celebrado entre as partes em 1998, por falta de habilitações académicas da Autora/recorrida.

    -Os contratos de docência além quadro que a recorrente celebrou com a A. são válidos e a sua cessação decorreu de acordo com a legislação relativa às carreiras docentes dos estabelecimentos de ensino superior privado e cooperativo, não sendo de aplicar a Lei Geral do Trabalho.

  6. Contra-alegou a parte contrária, pugnando pela confirmação do julgado.

  7. A Ex.mª Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser concedida a revista, em parecer a que apenas respondeu a autora, na linha do antes sustentado nos autos.

  8. Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 608.º, n.º 2, in fine, do CPC[1]), em face das conclusões da alegação do recurso, as questões a decidir, de acordo com a sua precedência lógico-jurídica, são as seguintes: [2] - Regime jurídico aplicável à relação contratual em discussão; - Se in casu (não) se configura um vínculo laboral por tempo indeterminado; - Tratando-se de uma relação deste tipo, se a comunicação da sua cessação, efetuada pela R., consubstancia um despedimento ilícito, com as consequências decretadas na decisão recorrida; - Se prescreveu o direito da autora à respetiva impugnação.

    Cumpre decidir.

    II.

  9. Foi fixada pelas instâncias a seguinte matéria de facto:[3] 1. A A. assinou com a R. um contrato de trabalho denominado “a termo certo”, com a duração de seis meses, com início a 01/11/1998, renovável por igual período.

  10. Para exercer as funções de docência, em regime de tempo integral e com 35 horas semanais, como assistente de 1º triénio, contrato esse que consta de fls. 20 a 21 (...).

  11. (...) 4. Resulta deste contrato a subordinação daquela relação de trabalho ao regime da lei geral.

  12. (...) [N]o nº 1 da Cláusula Quarta do referido contrato (...) consta que é celebrado “ao abrigo do disposto na alínea b) do art. 41º do DL 64-A/1989, de 27/02, tendo em vista obviar a um acréscimo de serviço na área da sua especialidade”.

  13. A R. apresentou à A. outro contrato a termo, no dia 01/02/2001, nos termos de fls. 22 (...), que esta assinou.

  14. Este contrato teve início em 01/02/2001, pelo prazo de 36 meses, e terminaria em 01/02/2004, sendo denominado de “contrato de docência além do quadro a tempo integral docentes de carreira”, para exercer a docência como assistente de 1º triénio na Escola Superior de Saúde do ….

  15. Deste contrato resulta que o mesmo é celebrado considerando que o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo aprovado pelo DL 16/94, de 22/01, dispõe no seu art. 24º e que a contratação do pessoal docente para ministrar ensino nos estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo tem regime especial, que consta de diploma próprio e que tal diploma não se encontra publicado, considerando ainda que o citado diploma equipara a carreira docente do ensino superior particular e cooperativo à do ensino superior público e que, na falta de legislação própria, a entidade instituidora da BB, a Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário CRL, aprovou um estatuto de docência para os estabelecimentos de ensino superior por si titulados, que segue no essencial o estatuto da carreira docente do ensino superior público respetivo.

  16. A A. esteve ininterruptamente em funções ao serviço da R., após o facto referido em 1, até 01/02/2001.

  17. A A. continuou com a mesma função (docente), em regime de tempo integral, com 35 horas semanais e mesma entidade patronal.

  18. (...) 12. A R. apresentou à A. outro contrato de trabalho a termo em 03/03/2004, que terminaria em 31/01/2007, constante dos autos a fls. 24 a 26., 24 (...), que a A. assinou, denominado “contrato de docência além do quadro docentes de carreira a tempo integral de 35 horas semana”, como docente, assistente 2º triénio, pelo período de 36 meses, para exercer funções na Escola Superior de …, com um horário fixo e determinado, estava inserida na estrutura organizativa da R. recebendo orientações desta, as suas funções sempre foram realizadas nas instalações da R. e, periodicidade de uma quantia certa.

  19. Deste contrato resulta que o mesmo é celebrado...

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