Acórdão nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) instaurou ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, em 09/07/2005, junto do então Tribunal Judicial da Figueira da Foz, contra o Hospital Distrital BB, S.A.
(R.), alegando, em resumo, o seguinte: .
No dia 14/09/2000, ocorreu um acidente de viação, em consequência do qual o A. sofreu lesões corporais, tendo sido levado para as instalações do Hospital Distrital BB, ora R., onde foi observado e radiografado; .
Aí permaneceu algumas horas, tendo desmaiado por três vezes, sendo depois mandado para casa, com a informação de que apresentava apenas alguns hematomas; .
Após ter aguardado durante 15 dias indicações novas do R. sem resultado e sem qualquer outro tratamento, o A. teve de regressar ao Luxemburgo para não perder os interesses que aí tinha, sofrendo entretanto imensas dores e ficando quase impedido de se deslocar; .
Depois de consultar médicos particulares, o A. submeteu-se a uma intervenção cirúrgica artroscópica e aparafusamento ortroscópico com dois parafusos, ficando a padecer de uma incapacidade permanente de 70%, segundo a Tabela Internacional de Invalidez; .
Porém, tal situação poderia ter sido evitada se, logo após o acidente, houvesse ocorrido um tratamento adequado ao ombro do A.; .
O A. nasceu em 28/12/1955 e recebe uma pensão mensal de € 1.508,00, donde decorre que, de 2001 a 2020 perderá de salários e bónus no montante de € 420.673,00, que, em 2030, ascenderá a € 546.874,90; .
As sequelas permanentes que afetam o A. provocam-lhe infindáveis e constantes dores físicas, bem como uma enorme dificuldade em andar e em estar de pé e o impedimento de fazer uma vida normal, sendo-lhe, por isso, devida uma compensação, a título de danos não patrimoniais, em valor nunca inferior a € 500.000.
Concluiu pedindo a condenação do R. a paga-lhe uma indemnização global no valor de € 1.047.175,854.
-
O R. contestou, defendendo-se, quer por via exceção quer por impugnação, nos seguintes moldes: 2.1.
Arguiu a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial por falta de alegação de factos essenciais e acessórios integrativos da causa de pedir e absolutamente indispensáveis para a procedência da ação; 2.2.
Invocou a prescrição do pretenso direito invocado pelo A.; 2.3.
Impugnou o alegado na petição inicial, sustentando, no essencial, que: .
O A. foi observado, na ocasião em causa, tendo estado sempre consciente, orientado espácio-temporal e sem amnésia sobre o que lhe havia acontecido, queixando-se de dores ao nível do ombro direito e do joelho direito, de pequenas escoriações na região frontal esquerda (couro cabeludo) e ainda de dores de cabeça; .
Nessas circunstâncias, foi observado pelo médico e enfermeiro de serviço no Hospital R., tendo-lhe sido efetuados exames complementares, nomeadamente radiografias ao ombro direito, ao joelho direito e ao crânio, dos quais resultou a conclusão de que apresentava uma pequena fratura da base da cavidade glenoide da omoplata direita, sendo então medicado em consonância com isso; .
Dado que do ponto de vista cirúrgico, o A. apresentava exame neurológico negativo e não patenteava sinais de fratura, foi-lhe dada alta com a indicação de que, por se tratar de acidente de viação e residir fora de Portugal (Luxemburgo), deveria dirigir-se aos serviços clínicos da sua seguradora competente e aos serviços do Hospital R. se sentisse um agravamento da sintomatologia; .
Em face dessa sintomatologia, a terapêutica prescrita pelos clínicos que o atenderam e o diagnóstico de alta efetuado mostram-se corretos, pelo que não ocorreu violação de qualquer das regras e procedimentos ditados pelas leges artis vigentes na matéria; .
Além disso, as protusões discais evidenciadas pelo A., aquando da observação pelos serviços do R., não têm qualquer relação com traumatismos provocados pelo acidente em referência, sendo anteriores ao mesmo; .
Os clínicos do R. atuaram segundo a normalidade e adequação da prática clínica ao caso concreto, usando de todos os cuidados medicamente exigíveis, nenhuma responsabilidade podendo ser assacada nem a eles nem ao Hospital R..
Concluiu o R. pela improcedência da ação com a sua consequente absolvição do pedido.
-
O A. apresentou réplica a sustentar a improcedências das exceções deduzidas, reiterando o petitório.
-
Findos os articulados, foi proferido despacho saneador a julgar improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial e a relegar para final o conhecimento da exceção de prescrição, procedendo-se, de seguida, à seleção da matéria de facto tida por relevante com organização da base instrutória.
-
Realizou-se a audiência final com a gravação da prova produzida, após o que foi julgada a matéria de facto controvertida, conforme o despacho de fls. fls. 364 a 367, de 05/07/2010, que foi objeto de reclamação, por parte do A., mas que foi desatendida nos termos do despacho de fls. 384 a 390, de 10/11/2011.
-
Por fim, foi proferida sentença, a fls. 438-459, datada de 02/12/ 2012, a julgar a ação improcedente com a consequente absolvição do R. do pedido.
-
Inconformado com tal decisão, o A. recorreu dela para o Tribunal da Relação de Coimbra, que julgou a apelação improcedente, confirmando a decisão da 1.ª instância, conforme o acórdão de fls. 672-702/v.º, datado de 20/01/2015.
-
De novo inconformado com aquela decisão, o A. interpôs recurso de revista, a título excecional, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - Antes de mais, apenas uma palavra para referir que quanto ao regime recursório aplicável ao presente recurso, dúvidas não restam que será de aplicar o regime de recursos decorrente do Dec.-Lei n.º 303/2007, de 24/08/, por força do artigo 7.º, n.º 1, da Lei n.º 41/2013; 2.ª - De acordo com este regime, por força do disposto no n.° 1 do art.º 638.º do CPC, o prazo para a interposição dos recursos é de trinta dias - para a aferição de regime aplicável, apenas releva a data em que foi proferida a decisão que se pretende impugnar e não a data em que deu entrada a ação em Juízo; 3.ª - No recurso interposto junto do TRC, o Recorrente invocou a nulidade da sentença proferida com base na falta de fundamentação e de exame crítico - através da fundamentação das sentenças judiciais o legislador apresenta as razões de facto e de direito por que optou por certa solução, fixando os factos e baseando neles a aplicação do direito, operação complexa, já que não prescinde da enumeração dos factos provados e não provados, constando, ainda, de uma exposição motivos de facto e de direito que legitimam a decisão, com a indicação e o exame crítico das provas - art. 659.º do CPC aplicável à data da sentença, correspondente ao art. 607.º do NCPC; 4.ª - Se não é necessário explicitar facto a facto as razões que levaram ao rumo decisório, não se dispensa que da fundamentação figure, de forma simples, clara e suficiente, o processo encadeado que, em resultado da lógica e da razão nela impressas, levou a tomar-se o sentido decisório expresso, enquanto sua consequência inelutável, à margem da dúvida - vide Acórdão proferido pelo STJ, de 03¬10-2013 (processo 2201l0.0TBPNl.L1.S1, Relator Gabriel Catarino): «(…) A fundamentação deficiente não se equipara ou equivale a uma fundamentação omissa, determinante da nulidade elencada no art.º 668.º do CPC; para que ocorra uma omissão, importa que o tribunal tenha deixado de indicar os meios de prova em que firma a sua convicção.»” 5.ª - Ocorre uma omissão fundamento de nulidade elencada no art.º 668.° do CPC (atual 615.° do NCPC), como pugnamos, quando o tribunal tenha deixado de indicar os meios de prova em que firma a sua convicção, deixe de fazer alusão a prova de onde retira a existência de realidades factuais aí plasmadas e relevantes para o raciocínio que se depreende e que deixe de aludir ao material probatório onde ancora a sua razão de inteligência para, daqui, optar pela solução afirmativa ou negativa ao enunciado que havia sido proposto para decisão da questão de direito a resolver; 6.ª - No caso em apreço, o tribunal não deu uma razão motivante para a solução a que chegou facto, aliás, expressamente reconhecido e confirmado pelo TRC, quando considera que “foi dado integral cumprimento ao disposto no art.º 653°, n.º 2 e 4, do CPC (redação aplicável), já que houve um efectivo julgamento da matéria de facto sob escrutínio e houve a respectiva fundamentação, como se impunha, ao que o A. até apresentou reclamação”, acrescentando que “não cabe na sentença voltar a fazer o que já foi feito, isto é, não cabe aí reproduzir a fundamentação da anterior decisão proferida sobre a base instrutória, pois essa fundamentação está nos autos e consta de uma decisão proferida na sequência do julgamento havido e até antes sujeita a reclamação das partes, como sucedeu no caso, o que faz parte da própria sentença”; 7.ª - Para cumprir a exigência constitucional, o art.º 205.º, n.° 1, da CRP, «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei», a fundamentação há-de ser expressa, clara, coerente e suficiente; ou seja, não deve ser deixada ao destinatário a descoberta das razões da decisão; os motivos não podem ser obscuros ou de difícil compreensão, nem padecer de vícios lógicos; a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão, convencendo e não apenas impondo; 8.ª - Por outro lado, não é percetível da fundamentação genérica veiculada quais as razões, os documentos e depoimentos de testemunhas concretas que formaram a sua convicção na prova de cada quesito e que subjazem ao decidido, tomando a sindicabilidade da matéria de facto um puro exercício de adivinhação, que não se coaduna com o dever de fundamentação das decisões judiciais; 9.ª - É indiscutível que a sentença recorrida enunciou a matéria de facto que se encontrava provada e com base na qual foi proferida a decisão, mas nada mais foi feito com vista ao cumprimento do dever de fundamentação - conforme ensina...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 02027/12.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020
...ou, melhor dizendo, total independência. » Cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015,Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1; Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo - sejam os que estão enquadrados no sector público administrativo......
-
Acórdão nº 00118/10.1BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Março de 2021
...ou, melhor dizendo, total independência» - .cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015,Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1. Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo, sejam os que estão enquadrados no setor público administrativo,......
-
Acórdão nº 8838/12.0TBVNG.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Maio de 2016
...do STJ, de 22/09/2011, processo n.º 674/2011.PL.S1, de 02/06/2015, no processo n.º 1263/06.3TVPRT.P1.S1 e de 29/10/2015, processo n.º 2198/05.2TBFIG.C1.S1, acessíveis em [10] Cfr. último acórdão citado. [11] Quanto à distinção entre obrigações de meios e obrigações de resultado, pode ver-se......
-
Acórdão nº 00029/15.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2023
...melhor dizendo, total independência» - .cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015, Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1. Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo, sejam os que estão enquadrados no setor público administrativo, co......
-
Acórdão nº 02027/12.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020
...ou, melhor dizendo, total independência. » Cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015,Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1; Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo - sejam os que estão enquadrados no sector público administrativo......
-
Acórdão nº 00118/10.1BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Março de 2021
...ou, melhor dizendo, total independência» - .cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015,Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1. Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo, sejam os que estão enquadrados no setor público administrativo,......
-
Acórdão nº 00029/15.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2023
...melhor dizendo, total independência» - .cfr. Acs. do STJ, de 24/5/2011, Processo nº 1347/04.2TBPNF.P1.S1; de 29/10/2015, Processo nº 2198/05.2TBFIG.C1.S1. Em suma, podemos afirmar que os hospitais públicos, em sentido amplo, sejam os que estão enquadrados no setor público administrativo, co......
-
Acórdão nº 8838/12.0TBVNG.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Maio de 2016
...do STJ, de 22/09/2011, processo n.º 674/2011.PL.S1, de 02/06/2015, no processo n.º 1263/06.3TVPRT.P1.S1 e de 29/10/2015, processo n.º 2198/05.2TBFIG.C1.S1, acessíveis em [10] Cfr. último acórdão citado. [11] Quanto à distinção entre obrigações de meios e obrigações de resultado, pode ver-se......