Acórdão nº 461/14.0PEVR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL PAIS MARTINS
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I 1.

No processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, n.º 461/14.0PBEVR, da instância central, secção cível e criminal, J 3, da Comarca de Évora, por acórdão de 03/06/2015, foi decidido, no que respeita à acção penal, condenar o arguido AA, nascido ..., ..., natural do ..., actualmente preventivamente preso à ordem do processo, pela prática: – de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo disposto nos artigos 131.º e 132.º, n.

os 1 e 2, alíneas b) e e), do Código Penal, na pena de 24 anos de prisão; – de um crime de violação, p. e p. pelo disposto no artigo 164.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, na pena de 7 anos de prisão.

E, em cúmulo jurídico dessas penas, na pena conjunta de 25 anos de prisão.

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso do acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: «I) O presente recurso tem por objecto a medida da pena aplicada (matéria de direito); «II) O Tribunal a quo violou o disposto no artigo 71.º, n.º 2, alínea d), do Código Penal, pois apenas foi considerado o facto do arguido vivenciar quadro económico fragilizado e subsistir com um rendimento social de inserção no valor de 178,15 euros e com apoio institucional ao nível da alimentação, no entanto na determinação da pena concreta a aplicar não foi considerado que o mesmo frequentava um curso de educação e formação de empregado comercial, recebendo também uma bolsa de formação de 146,13 euros, bem como subsídio alimentação, o que demonstra uma vontade do arguido se inserir na sociedade e no mercado de trabalho, o que deve ser valorado a favor do arguido; «III) Não foi também considerado na determinação da medida concreta da pena que o arguido tem duas filhas de 8 e 9 anos, que embora vivam com a mãe, certamente que também necessitam da presença e do apoio do pai, violando assim o Acórdão recorrido o artigo 71.º n.º 2 alínea d) do C.P.; «IV) A favor do arguido foi considerado o facto do mesmo se ter apresentado voluntariamente na PSP de Évora e de ter confessado parte dos factos praticados, mas para além de se ter apresentado voluntariamente na PSP, o arguido indicou também ao órgão de polícia criminal o local onde se encontrava o corpo da vítima, tendo indicado também o local onde, antes de se apresentar na PSP, tinha colocado alguns objectos, tratando-se de um contentor de lixo que continha um saco que indicou como seu, circunstâncias que não foram consideradas na determinação concreta da pena, ainda que a elas se aludam na motivação dos factos provados, e que foram determinantes para a prova dos factos, as quais devem ser consideradas favoravelmente ao arguido, não o tendo feito violou o Acórdão recorrido os artigos 40.º n.º 1 e 2, 71.º n.º 1 e n.º 2 alínea e) e 72.º n.º 1 do C.P., uma vez que o arguido teve assim uma conduta posterior à prática do crime onde se mostrou colaborante com a justiça, o que é claramente relevante para uma atenuação da medida concreta da pena e não deixa de ser demonstrativo de arrependimento; «V) O arguido tem apoio familiar da mãe e da irmã, o que devia ter sido considerado a favor do arguido, pelo que foi violado o artigo 71.º n.º 2 alínea d) do C.P. pelo tribunal a quo, ao não valorar tal circunstância na determinação da medida concreta da pena; «VI) No douto Acórdão recorrido, quanto ao enquadramento jurídico dos factos, a fls 22, no que diz respeito à qualificação do homicídio pela alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º do C.P. conclui-se que o arguido foi "movido ainda pela satisfação dos seus instintos sexuais e libidinosos", enquanto que a fls 24, quanto ao crime de violação se indica que "mais se apurou que o arguido actuou com o propósito concretizado de, contra a vontade de BB, obrigá-la a sofrer introdução anal com o referido objecto e desta forma satisfazer os seus instintos sexuais e libidinosos", pelo que esta circunstância ("satisfazer os seus instintos sexuais e libidinosos") foi considerada duas vezes, quer para preencher a qualificação de homicídio, quer para preencher o crime de violação, pelo que o artigo 29.º, n.º 5 da Constituição República Portuguesa foi violado; «VII) Efectivamente não pode o arguido ser condenado duas vezes pelo mesmo facto, de acordo com o princípio do ne bis in idem (artigo 29.º n.º 5 da CRP ), pelo que tendo o arguido sido condenado por violação, significa que o mesmo facto ("satisfazer os seus instintos sexuais e libidinosos") já não podia ser considerado no homicídio previsto pelo artigo 132.º n.º 2 alínea e), pois caso contrário estará a ser julgado duas vezes pelo mesmo facto de forma simultânea; «VIII) Por outro lado o tribunal considerou, a fls 22 do Acórdão que se preencheu a alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º C.P. quanto ao crime de homicídio, porque entende que "o arguido actuou movido por um especial prazer de causar sofrimento na vítima, movido ainda pela satisfação dos seus instintos sexuais e libidinosos", no entanto, nos pontos 2, 3 e 12 dos factos provados indica-se que o arguido começou a bater na vítima, e que terá agido no intuito de a matar, unicamente em virtude da existência de uma discussão motivada pelo facto de não ter gostado de ter sido chamado à atenção para que não ingerisse mais bebidas alcoólicas, o que significa que a qualificação aqui prevista seria no máximo a existência de um motivo fútil para a prática do crime, mas não foi com base nisso que o tribunal recorrido considerou a alínea preenchida; «IX) Com efeito o Tribunal a quo apenas faz referência ao prazer de causar sofrimento e à satisfação dos instintos sexuais e libidinosos, não fazendo referência à discussão referida nos pontos 2, 3 e 12 dos factos provados, sendo que da generalidade dos factos provados não se pode inferir um especial prazer de causar sofrimento, pelo que a alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º C.P. deve-se ter por não preenchida; «X) Ora o Tribunal considerou na determinação da medida concreta da pena duas circunstâncias qualificativas quanto ao crime de homicídio, a da alínea b) do n.º 2 do artigo 132.º C.P. (praticar o facto contra pessoa com quem mantenha uma relação análoga à dos cônjuges), e a da alínea e) do mesmo artigo, no entanto esta última não devia ter sido considerada, pois dos factos provados apenas se alcança que poderíamos estar no máximo perante um motivo fútil para a prática do crime (a discussão), mas não foi por esse facto que o Tribunal considerou preenchida a alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º C.P., pelo que ao valorar esta circunstância qualificativa, em contradição com os factos provados, violou o Acórdão recorrido os artigos 40.º n.º 1 e 2 e 71.º n.º 1 do C.P.; «XI) Assim, e pelo exposto deve ser determinada a diminuição da pena de prisão aplicada em cúmulo jurídico, por se entenderem violados os artigos 40.º, 71.º e 72.º do Código Penal, de acordo com a mais adequada subsunção dos factos ao direito no presente caso, diminuindo as penas parcelares de prisão que foram aplicadas, sendo fixada a pena pelo homicídio qualificado (artigo 132 n.º 2 alínea b) do C.P. ), abaixo dos 20 anos e a do crime de violação (artigo 164.º n.º 1 alínea b) do C.P.) no seu limite mínimo de 3 anos, com a consequente diminuição da pena aplicada em cúmulo jurídico, tendo em atenção que a aplicação de uma pena de prisão excessivamente longa pode comprometer definitivamente a ressocialização e vida futura do arguido Luís.» 3.

    Foi proferido despacho a admitir o recurso.

  2. O Ministério Público respondeu ao recurso, no sentido de o mesmo não merecer provimento.

  3. Remetidos os autos a esta instância, na oportunidade conferida pelo artigo 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal [CPP], a Exm.ª Procuradora-geral-adjunta suscitou a questão prévia de o acórdão condenatório estar apenas assinado electronicamente e, quanto às questões postas no recurso, foi de parecer de que o recurso não merece provimento.

  4. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, nada chegou ao processo.

  5. Não tendo sido requerida a realização da audiência (artigo 411.º, n.º 5, do CPP) e não sendo caso de julgar o recurso por decisão sumária, foi o julgamento do recurso remetido para a conferência (artigo 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP).

    Colhidos os vistos, com projecto de acórdão, realizou-se a conferência, da mesma procedendo o presente acórdão.

    II 1.

    A questão prévia da assinatura electrónica do acórdão A Ex.ma Procuradora-geral-adjunta levantou a questão de o acórdão estar apenas assinado electronicamente, não observando, consequentemente, o disposto nos artigos 374.º, n.º 3, alínea e), e 95.º do CPP.

    Com razão.

    Nos termos do artigo 374.º, n.º 3, alínea e), do CPP, a sentença termina pelo dispositivo que contém a data e a assinatura dos membros do tribunal.

    Quanto à assinatura, o artigo 95.º do CPP, justamente com a epígrafe “Assinatura”, estabelece, no n.º 1, que o escrito a que houver de reduzir-se um acto processual é no final assinado por quem a ele presidir, sendo as folhas que não contiverem assinatura rubricadas pelos que tiverem assinado, impondo o n.º 2 que as assinaturas e as rubricas são feitas pelo próprio punho.

    A assinatura electrónica viola, pois, frontalmente, estas disposições legais.

    Por outro lado, a Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, tem o seu âmbito de aplicação restrito à tramitação electrónica de processos de natureza cível e dos processos tramitados de acordo com o Código de Execução das Penas e Medidas privativas da Liberdade. Nessa Portaria, nenhuma referência é feita à tramitação processual penal, devendo, por conseguinte, concluir-se que o artigo 19.º, da mesma, não constitui suporte para a assinatura electrónica dos actos proferidos em processo penal que devam reduzir-se a escrito[1].

    A irregularidade cometida, não afectando a existência do acórdão deve ser, no entanto, suprida. O que se relega para momento posterior à baixa do processo à 1.ª instância, por razões de celeridade processual.

  6. O objecto do recurso Das...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT