Acórdão nº 164/09.8TCLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução08 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1.

AA e BB intentaram a presente ação declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra CC e mulher DD, EE e mulher FF, GG e mulher HH, pedindo que (i) seja declarada a preferência dos autores no contrato de compra e venda do prédio rústico sito em …, freguesia de Santo Antão do Tojal, concelho de Loures, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo … da Secção H, celebrado em 28 de Maio de 2007, entre os quatro primeiros réus como vendedores e os dois últimos como compradores e (ii) que sejam os réus condenados a verem transferido o prédio vendido para a esfera jurídica dos autores, ou seja, substituídos os dois últimos réus pelos autores na transmissão operada mediante o pagamento do preço pago por estes, ordenando-se o cancelamento das inscrições prediais feitas a favor deles.

Fundamentando a sua pretensão, alegaram, em síntese, não terem sido notificados para exercer o seu direito de preferência na venda em causa, direito de que são titulares em virtude de um prédio de sua pertença se encontrar sujeito a uma servidão de passagem a favor do prédio ora vendido, sendo que o prédio de sua propriedade confronta a sul com o prédio objecto do negócio em causa, tornando-os contíguos.

Contestaram os réus por impugnação e excepção, invocando neste último âmbito a caducidade do direito de preferência que os autores pretendem fazer valer.

Houve réplica onde os autores, além de responderem à matéria de excepção, disseram pretender ampliar o pedido e a causa de pedir.

Alegaram, em síntese, que, sendo confinantes, conforme já haviam afirmado na petição inicial, o prédio vendido e o de sua pertença, são titulares do invocado direito de preferência, já que ao caso se aplica o disposto no artigo 1380º do Código Civil, pois o prédio vendido – com 0,4640 hectares - tem área inferior à unidade de cultura (estabelecida através da Portaria 202/70, de 21/04, que continua em vigor, a titulo transitório, por força do artigo 53º do DL 103/90, de 22/03, e o prédio dos autores tem a área de 0.6120 hectares.

E, aventando a hipótese de o adquirente ser igualmente proprietário de prédio confinante, suscitam a aplicação do disposto na alínea b) do nº 2 do referido artigo 1380º.

Houve tréplica dos réus, opondo-se à pedida ampliação, tendo os réus compradores invocado a caducidade do direito de preferência, agora fundado na contiguidade dos prédios.

Em sede de despacho saneador, foi admitida a ampliação da causa de pedir pretendida pelos autores e relegou-se para final o conhecimento da excepção da caducidade.

Realizado o julgamento, houve decisão sobre os factos levados à base instrutória e, subsequentemente, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, decidiu: a) - Condenar os réus “a reconhecer aos autores o direito de preferência na aquisição do imóvel mencionado no ponto 2º da matéria de facto assente na presente sentença” b) - Substituir “o adquirente na escritura pública outorgada em 28 de Maio de dois mil e sete, GG e HH pelos autores AA e BB, casado com II, na compra do “prédio rústico localizado em “…”, freguesia de Santo Antão do Tojal, concelho de Loures e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo …, da Secção H, com a área de 0, 4640 hectares, pelo preço de € 25.000 (vinte e cinco mil euros)”.

Inconformados, apelaram todos os réus, tendo o Tribunal da Relação julgado as apelações procedentes e, em consequência, revogou a sentença impugnada, absolvendo-os do pedido.

Não se conformando agora com a decisão da Relação, recorrem de revista os autores, finalizando as alegações com as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que decidiu julgar as apelações procedentes, revogando a sentença impugnada, absolvendo os réus do pedido, que considerou nula a sentença por omissão de pronúncia quanto à excepção de caducidade do direito de preferência na alegada contiguidade dos prédios e declarou extinto, por caducidade, o direito de preferência, invocado pelos autores recorrentes, ao abrigo do artigo 1380º do Código Civil.

  1. - É desta parte do acórdão que os autores recorrem, pois consideram que, no caso sub judice, não subsiste qualquer caducidade do direito.

  2. - O Tribunal da Relação considerou verificada a caducidade da preferência fundada na contiguidade dos prédios invocada pelos autores, ao abrigo do artigo 1380º do Código Civil, absolvendo os réus do pedido e, em consequência, não apreciou as demais questões suscitadas nas apelações dos Réus.

  3. - Não podem os autores aceitar esta decisão pois entendem que detêm o direito de preferência invocado na acção, não tendo ocorrido qualquer causa extintiva do mesmo.

  4. - Não compreendem e nem podem aceitar o entendimento vertido no acórdão de que se recorre, e com base no qual se considera verificada a caducidade do direito de preferência com base no artigo 1380º do Código Civil.

  5. - Refere o acórdão: "Nos termos do n.º 1 do artigo 1410º citado, o direito dos autores haverem para si o prédio alienado tivesse de ser requerido, sob pena de caducidade, no prazo de seis meses, a contar da data em que tiveram conhecimento dos elementos essenciais da alienação.

    Ora, segundo eles próprios alegaram, o seu conhecimento desses elementos data de meados de Junho, altura em que terão acedido a uma certidão da respectiva escritura.

    Entre meados de Junho de 2008 e 11 de Junho de 2010, data em que invocaram o direito de preferência assim configurado, decorreram muito mais de seis meses, o que determina a caducidade desse mesmo direito, o que se deixa declarado".

  6. - Os recorrentes não podem aceitar este raciocínio, uma vez que a data de 11 de Junho de 2010, não corresponde à data em que os autores propuseram a ação, mas a data da ampliação do pedido e causa de pedir.

  7. - O prazo de seis meses estabelecido no artigo 1410º do Código Civil deve contar-se desde a data em que os autores tiveram conhecimento dos elementos essenciais da alienação, (cfr. alínea D), a 24 de Junho de 2008, sendo que a ação foi interposta a 17 de Dezembro de 2008, portanto, ainda não haviam decorrido os seis meses legalmente previstos para a sua propositura.

  8. - Na data de 11 de Junho de 2010, os autores através da réplica ampliaram o pedido e a causa de pedir, o que lhes era permitido, não constituindo tal acto a "interposição da acção" mas antes o desenvolvimento e a normal tramitação processual da acção que propuseram a 17 de Dezembro de 2008.

  9. - Nos termos do disposto no artigo 552º, n.º. 1, alínea d) do C.P.C., na petição deve o autor expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, e formular o pedido. A petição inicial há-de assim traduzir um facto jurídico concreto (causa de pedir) e tirar dele, como conclusão, um efeito de direito que o autor impetra lhe seja reconhecido (pedido).

  10. - Uma vez citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, pedido e causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei: é o que se extrai do princípio da estabilidade da instância, consignado no artigo 260º do C.P.C.

  11. - No caso dos autos, a pretendida modificação da instância obedece às condições previstas no artigo 265º do actual CPC, (correspondendo ao artigo 273º do CPC em vigor à data do pedido).

  12. - Sem prejuízo do regime da alegação de factos supervenientes, apenas na réplica será admissível a alteração ou ampliação da causa de pedir, idêntico regime está previsto para a alteração ou ampliação do pedido, que apenas terá lugar no mesmo articulado.

  13. - Na verdade, a modificação operada pelos autores constitui uma mera ampliação da causa de pedir, que não afecta a relação jurídica descrita na petição inicial. O que, à face da lei, se afigura admissível.

  14. - Dispõe artigo 273º nº 1 do CPC, em vigor à data, que, "na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada na réplica, se o processo a admitir, a não ser que a alteração ou ampliação seja consequência de confissão feita pelo réu e aceita pelo autor".

  15. - O processo comum ordinário admite réplica (artigo 502º) e esta serve para os fins previstos no artigo 502º e/ou para, querendo, o autor alterar ou ampliar a causa de pedir ou o pedido (nº.2 do artigo 273º), pelo que, correndo os presentes autos a forma de processo comum ordinário, aos autores assistia a possibilidade de ampliar a causa de pedir na réplica, como fizeram.

  16. - Da réplica dos autores não existe qualquer contradição entre a ampliação da causa de pedir invocada e o pedido.

  17. - Considerando o pedido dos autores, o efeito jurídico pretendido (artigo 581º, nº 3, CPC), ou seja, no caso em apreciação, o reconhecimento do direito legal de preferência a favor dos autores.

  18. - A causa de pedir numa acção real, como sucede na presente acção, consiste no facto jurídico de que deriva o direito real (artigo 581º, 2ª parte do nº 4, CPC), ou seja, no caso em apreço, a título principal, a confinância de imóveis de área inferior à unidade de cultura nos termos do artigo 1380º do Código Civil.

  19. - Não pretendendo mais os autores apoiar o pedido formulado na causa de pedir invocada na petição inicial, e não existindo, agora, qualquer contradição entre a ampliação e a (nova) causa de pedir e o pedido, não podia o tribunal recorrido entender como entendeu, ou seja considerar a réplica como uma nova acção e um novo pedido, que não é.

  20. - O prazo previsto no artigo 1410º, nº 1 do Código Civil é um prazo de caducidade, e esta só é impedida pela prática do acto dentro do prazo legal – artigo 331º do Código Civil que tem de ser exercido através de uma acção judicial a propor dentro de certo prazo.

  21. – E, para o efeito impeditivo da caducidade referido no artigo 1410º, nº. 1, do Código Civil, não se pode considerar a data de 11 de Junho de 2010 que se refere á data da réplica e não da petição inicial, sendo que esta ocorreu a 17 de Dezembro de 2008.

  22. - Por isso, a propositura da acção por parte dos autores foi dentro do prazo...

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