Acórdão nº 103/11.6.TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução27 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: I.

– Em 27/01/2011, AA e "BB - SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES, L.DA" intentaram (nas Varas Cíveis de Lisboa, com distribuição à 6.ª Vara) em 17/01/2011) uma acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum ordinário, contra 1) "BANCO BPI, S.A."; 2) "CC – RESTAURAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE EVENTOS, L.DA"; e 3) DD, pedindo a condenação solidária dos Réus a pagar aos AA. a quantia de 41.800,00 €, acrescida de juros vencidos no valor de 2.849,69 € e vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegaram, em síntese, que: – No cumprimento de um contrato de empreitada de construção civil, relativo à modificação duma fracção autónoma, destinada a restaurante, que, na altura, era explorada pela ora 2.ª Ré (CC, Lda.), nomeadamente para pagamento do valor da obra realizada pela sociedade ora 2.ª Autora (da qual o ora 1.º Autor é sócio e gerente), o 3.º R. (DD) preencheu, assinou e entregou aos Autores 4 (quatro) cheques, pré-datados, emitidos à ordem do 1.º Autor, sobre a conta n.º 36618320001, do Banco ..., S.A., no valor de € 10.440,00 cada, datados de 22 de Abril de 2010, de 22 de Maio de 2010, de 22 de Junho de 2010 e de 22 de Julho de 2010, tudo no valor global de € 41.760,00; – Conforme ficou acertado entre os AA. e os 2.º e 3.º RR, tais cheques seriam pagos e tinham vencimento nas datas respectivamente neles apostas, já que a obra tinha terminado e nada mais os AA. tinham nela que efectuar; – Contudo, no dia 23 de Março de 2010, o R. DD redigiu e entregou ao 1.º R. (..., S.A.) uma declaração, na qual ordenou a este que procedesse ao cancelamento dos aludidos cheques, alegadamente por impedimento e incumprimento contratual, e, no dia 5 de Abril de 2010, redigiu e entregou junto do 1.º R novo documento, no qual declarou que os cheques em causa não deveriam ser pagos, por motivo de extravio; – Nos dias 26/04/2010, 26/05/2010, 23/06/2010 e 22/07/2010, o 1.º Autor apresentou a pagamento os referidos 4 cheques, tendo o respectivo pagamento sido recusado, pelo 1.º R, com a menção de "Extravio"; – Nunca tendo havido qualquer resolução e/ou incumprimento contratual, tão pouco se tendo extraviado os cheques em causa, os ora AA. ficaram desapossados, ilicitamente, das quantias apostas nos mencionados cheques, devido à actuação ilícita e concertada dos 1.º e 3.º RR, durante o decurso do prazo para a apresentação dos mesmos cheques; – A revogação dos referidos cheques, por parte do 3.º R, violou o disposto no n.º 1 do art.º. 32.º da LUC [Lei Uniforme sobre Cheques], porquanto, anteriormente a 24 de Março de 2010, o 3.º R não indicou ao 1.º R que os cheques se haviam extraviado mas, tão só, que, os revogava, por um alegado incumprimento contratual, ordenando o cancelamento do seu pagamento, dentro do prazo da respectiva apresentação; – Tal revogação ordenada pelo 3.º R e aceite e cumprida pelo 1.º R não tem qualquer justificação e tão pouco é válida; – Acresce, no caso concreto, que o 1.º R indicou, na certificação da devolução dos cheques, motivos diferentes daqueles que lhe foram transmitidos pelo sacador, tendo-os devolvido por motivo de Extravio, vício este que nunca fora referido em primeiro lugar pelo sacador, ora 3.º R, na declaração de revogação que lhe enviou; – O 3.º R agiu ilicitamente, com manifesto dolo directo, porque desejou revogar e cancelar o pagamento dos supra referidos cheques, bem sabendo que o não poderia fazer; – Tal conduta dos 1.º e 3.º RR. causou aos A.A. o prejuízo consubstanciado nos valores constantes dos cheques, acrescido de € 10,00 por cada cheque devolvido, num total de € 40,00, em sede de despesas bancárias cujo pagamento os AA. tiveram de suportar.

– A 2.ª Ré é devedora à 1.ª Autora da aludida importância de € 41.700,00 (correspondente ao valor total dos mencionados 4 cheques), por ser esta a parcela em dívida do preço global pelo qual a 1.ª Autora realizou para ela a referida obra de remodelação duma fracção autónoma destinada a um estabelecimento comercial de restauração então explorado pela 2.ª Ré.

Os RR. contestaram separadamente, em articulados autónomos.

O R. BANCO ..., SA pugnou pela sua absolvição do pedido, alegando, para tanto, que a 2.ª Ré o informou do extravio dos cheques, motivo pelo qual não procedeu ao respectivo pagamento, existindo assim justa causa para o seu não pagamento, de harmonia com o Acórdão Uniformizador de 28/2/2008, não competindo ao Banco aferir da veracidade das declarações dos seus clientes.

A 2.ª Ré ("CC – RESTAURAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE EVENTOS, LDA") contestou, por excepção e por impugnação, e deduziu reconvenção.

Defendendo-se por excepção, invocou a falta de causa de pedir (no que ao 1.º Autor diz respeito), porquanto não celebrou qualquer contrato com o 1.º Autor, mas sim com a 2.ª Autora.

Mais invocou a nulidade do contrato de empreitada, pelo facto de a A. não possuir alvará de construção, ainda que tenha garantido à Ré que o possuía.

Ainda em sede de defesa por excepção, alegou que a 2.ª Autora, tendo embora celebrado um contrato de empreitada com a 2.ª Ré, não cumpriu o mesmo, já porque não executou a obra dentro do prazo convencionado, já porque a realizou com defeitos que foram oportunamente denunciados, faltando ainda a realização de trabalhos que as partes haviam acordado, pelo que existia uma causa legítima de cancelamento dos cheques.

Concluiu pela nulidade do contrato (nos termos do art.º 29.º, n.º 2, do DL n.º 12/2004, de 9/01), devendo ser restituído à Ré o valor pago à A, ser a acção declarada improcedente, reduzindo-se o valor do contrato a € 50.000 e nada sendo devido à Autora (dado o valor das reparações serem de montante superior).

Em sede reconvencional, sustentou que, não tendo a A. concluído a obra, é devida pela mesma a indemnização correspondente a 1% do valor da obra, até à resolução definitiva do contrato, ocorrida em 9 de Abril de 2010, ou seja, o valor total de 26.500 €. Além disso, a não realização da obra teria impedido a Ré de abriu o restaurante projectado para o local, ainda que tenha suportado as rendas do mesmo, sem contudo retirar lucro, computando tais danos no valor de € 23.258,32, a que acresce o valor de € 10.000 de rendas pagas. Ademais, devido à má realização das obras, teria perdido clientela, computando tal dano no valor de 10.000 €.

Em sede reconvencional, peticionou a condenação da Autora, a título de cláusula penal, no pagamento do valor de € 26.500, e na indemnização pelos prejuízos e lucros cessantes no valor de € 23.258,32 e € 20.000.

O 3.º Réu (DD) também contestou, alegando, em síntese, que apenas actuou como gerente da 2.ª Ré, sendo assim parte ilegítima, impugnando porém a matéria articulada pelos AA. e dizendo que o A. exigiu o pagamento em seu nome, dado a 2.ª A. ter cessado a sua actividade, – o que consubstanciaria um crime fiscal –, concluindo pela improcedência da acção e pela sua absolvição.

Os AA. replicaram, mantendo o alegado na PI e impugnando a matéria do pedido reconvencional.

A 2.ª Ré treplicou e pediu a condenação dos AA, como litigantes de má-fé.

Os AA. foram convidados a aperfeiçoar o alegado na PI quanto aos cheques e o 1.º R. manteve o alegado em sede de contestação.

Findos os articulados, o processo foi saneado, organizou-se a base instrutória, realizou-se a instrução do processo e teve lugar a audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferida sentença (datada de 6/09/2013) que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, decidiu: «a) Absolver os réus Banco ... e DD do pedido dos AA; b) Absolver a A. do pedido reconvencional deduzido pela ré "CC, Lda"; c) Condenar a ré CC, Lda a pagar à A. "BB, Lda" quantia a liquidar e correspondente às obras efectuadas, com exclusão dos valores correspondentes às obras em falta e referidos no ponto 18, e o valor da diferença do material, quanto a preço, denunciado no ponto 19 dos factos provados, acrescido de juros, considerandos e ainda o valor já pago pela ré e referido em 6. dos mesmos factos.

Custas pela A. e 2.ª ré, na proporção do decaimento.» Inconformados com o assim decidido, os Autores apelaram da referida sentença, tendo a Relação acordado em conceder parcial provimento à Apelação das Autoras, alterando a sentença recorrida, no segmento em que absolveu do pedido o Réu "BANCO ..., S.A.", e condenando este, solidariamente com a Ré "CC – RESTAURAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE EVENTOS, LDA", a pagar à Autora "BB – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES...

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