Acórdão nº 3938/12.9TBPRD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução27 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório 1 - AA, S.A.

, com sede na ..., Paredes, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma de processo ordinário, contra, BB, ..., S.A.

, com sede no Loteamento ..., Lote …, traseiras, em …, Braga, alegando, em breve resumo, que é uma ... e, nesse âmbito, até maio de 2011, era titular de uma quota de € 101.900,00, na sociedade, CC, Ldª.

A Ré, por sua vez, era também titular de uma outra quota nesta mesma sociedade, no valor nominal de € 98.000,00.

Acontece que, no dia 26/05/2011, mediante contrato nessa data celebrado, adquiriu à Ré esta quota, pelo preço base de € 109.008,00, que já lhe pagou.

Ficou, então, convencionado que ao preço indicado de €109.008,00 deveria ser deduzido o valor correspondente a qualquer item do activo a transmitir à sociedade, DD, que se verificasse estar em falta.

Estabeleceram ainda as partes, no nº 3 da Cl. 3ª, que “o valor/preço foi apurado tendo por base o valor a que correspondem 49% da previsão da situação líquida contabilística da sociedade CC na data de 31.05.2011, situação líquida que será rectificada no prazo máximo de 30 dias de acordo com o apuramento contabilístico final das várias rubricas que a compõe, comprometendo-se ambas as outorgantes a creditar/debitar o valor das diferenças que nesse prazo se venham a produzir na referida situação líquida, que deverá ser pago no prazo máximo de 8 dias após o débito/crédito.

Sucede que, na sequência de tal apuramento da situação líquida, e seguindo o que ficou clausulado, foi emitida uma nota de débito da soma das diferenças a crédito e a débito encontradas, correspondentes a 49% do valor achado, no montante de €20.599,84 de que a Ré lhe era devedora.

A Ré, todavia, apesar de lhe ter sido dado conhecimento desse débito, por carta que lhe foi remetida no dia 21/05/2012, e de saber que o devia liquidar no prazo de oito dias, como fora convencionado, recusa-se a pagá-lo.

Sendo assim, deve-lhe a Ré os referidos € 20.599,84, os juros de mora vencidos, à taxa legal, desde 06/06/2012 até 26/11/2012, no montante de € 925,58 e os vencidos e vincendos, em data posterior, até integral pagamento; € 100,00, a título de cláusula penal e ainda os juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento sobre este último valor.

Pede, deste modo, que a Ré seja condenada a pagar-lhe o valor total de €121.525,42, acrescido dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal, desde 26/11/2012 até efectivo pagamento sobre o valor de € 20.599,84 e dos juros vincendos, igualmente à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento, sobre o valor de €100.000,00.

2 - Contestou a Ré reconhecendo a celebração do contrato indicado pela A., mas não os créditos de que a mesma se arroga titular, seja decorrentes da alegada nota de débito, seja a título de cláusula penal, uma vez que o valor estipulado nesta cláusula foi previsto apenas para o caso de incumprimento, o que não ocorreu da sua parte.

Assim, pretendendo o A. exigir o cumprimento coercivo do contrato, não pode, em simultâneo, beneficiar da citada cláusula.

Mas, mesmo que assim não se entenda, defende que a exigência de pagamento de tal cláusula é abusiva, além de desproporcionada.

Termina, assim, pedindo a sua absolvição da presente instância por ineptidão da petição inicial ou, subsidiariamente, a improcedência de todos os pedidos, devendo estes, caso procedam, implicar a redução da eventual dívida ao seu real valor com a absolvição do pagamento da quantia peticionada a título de cláusula penal ou ainda, no limite, a redução desta aos danos efectivamente sofridos pela A.

3 - Respondeu a A. refutando a tese da Ré, alegando além do mais, que a cláusula penal convencionada entre as partes assume a natureza de cláusula compulsória e ou sancionatória.

Daí que pugne pela improcedência da excepção arguida pela Ré.

4 - Seguiram-se ainda outros articulados, mas os mesmos foram julgados inadmissíveis, sem impugnação subsequente.

5 - Finalmente, em sede de despacho saneador, foi julgada verificada a excepção de nulidade do processo decorrente da ineptidão da petição inicial por dedução de pedidos incompatíveis e, consequentemente absolvida a Ré da presente instância.

6 - Inconformada com o assim decidido, reagiu a A., interpondo recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto, através de acórdão proferido a 1 de Abril de 2014, revogado a sentença do tribunal de 1.ª instância, decidindo o seguinte: «Pelas razões expostas, acorda-se em conceder provimento ao presente recurso e, não julgando inepta a petição inicial por contradição de pedidos, revoga-se a sentença recorrida, determinando-se, consequentemente, o prosseguimento dos autos de acordo com a ritologia legalmente prevista».

7 – Inconformada, recorre a Autora para este Supremo Tribunal, formulando, na sua alegação de recurso, as conclusões exaradas a fls. 293 a 300 que aqui se consideram integralmente reproduzidas.

8 – Os recorridos apresentaram contra-alegações, em que pugnam pela manutenção do decidido.

9 – Objecto do recurso Sabido que o objecto dos recursos se delimita pelas conclusões das alegações (art. 635.º n.º 3 do NCPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 608.º NCPC in fine), a única questão a decidir é a da natureza jurídica da cláusula penal. 10 - Os recorridos apresentaram contra-alegações, em que pugnam pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – Fundamentação de facto O Tribunal da Relação fixou a seguinte factualidade: «Além dos factos que resultam do relatório supra transcrito, julga-se ainda provado que, entre a A., AA, S.A., a Ré, BB - ..., S.A. e a sociedade, CC – …, S.A., respetivamente, na qualidade de primeira, segunda e terceira outorgantes, foi celebrado, no dia 26 de maio de 2011, o seguinte contrato de cessão de quotas: “(…) CLÁUSULA 1ª O capital social, de 200.000€ (duzentos mil euros), da sociedade denominada CC, LIMITADA, NIPC … é totalmente detido pelas 1.ª, 2.ª, e 3.ª Outorgantes da forma assim descriminada: A 1.ª Outorgante AA detém uma quota de 101.900€ (cento e um mil e novecentos euros); A 2.ª Outorgante BB detém uma quota de 98.000 € (noventa e oito mil euros); A 33 Outorgante CC detém uma quota de 100 € (cem euros).

CLÁUSULA 2ª 1. Pelo presente contrato, a 2.ª outorgante cede à 1.ª e esta adquire, a identificada quota social.

  1. Sem prejuízo do infra acordado em cláusula quarta, a cessão de quota engloba todos os direitos e obrigações a ela inerente, designadamente prestações acessórias ou suplementares ou suprimentos que a 2a outorgante detenha.

    CLÁUSULA 3ª 1. O preço da cessão é de 109.008 €, e será pago em simultâneo com a entrega DD do imobilizado constante do anexo I, devendo no entanto ser deduzido ao referido valor o correspondente a qualquer item do ativo a transmitir que se verifique estar em falta, através de cheque visado/bancário ou transferência bancária feita na hora.

  2. As viaturas -UB, -UL e -VX sem nenhum equipamento oficinal foram vendidas pela CC ao representante legal da aqui 2ª outorgante ou a quem esta indicou, pelo preço devido por essas vendas - 1.626 €, 1.626 € e 3.000 €, acrescidos de IVA respetivamente - é pago por compensação no preço a que a 2a tem direito e referido no parágrafo anterior.

  3. O valor / preço foi apurado tendo por base o valor a que corresponda 49% da previsão da situação líquida...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT