Acórdão nº 2199/11.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 2199/11.1TVLSB.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – AA – ..., L.da, propôs, contra BB, SA, CC, SA, e DD, SPA, acção seguindo forma ordinária, distribuída à 4.ª Vara Cível de Lisboa, pedindo a condenação da 1ª, 2.ª e 3.ª RR., respectivamente, no pagamento das quantias de € 17.092,74, 235.596,20 e 60.014,80 e, de todas elas, solidariamente, na quantia de € 75.000, acrescida de juros, a título de indemnização de clientela, e por prejuízos alegadamente sofridos, em virtude da cessação de contrato de distribuição, com aquelas celebrado.

Contestaram as RR., sustentando não serem devidas as quantias reclamadas, concluindo pela improcedência da acção.

Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual se considerou a acção improcedente, absolvendo-se as RR. dos pedidos formulados.

Inconformada, veio a A. interpor recurso de apelação, limitado aos pedidos de indemnização de clientela e retoma dos produtos, bem como, na devida proporção quanto a juros e custas, sem sucesso, já que a Relação confirmou o acórdão recorrido.

Continuando inconformada, veio a A. interpor recurso de revista excepcional, a qual foi admitida.

São as seguintes as conclusões formuladas pela A. no seu recurso: QUANTO À ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL:

  1. De acordo com o disposto no nº 3 do artigo 721º do Código de Processo Civil "antigo" com as alterações do Decreto-Lei n° 303/2007, de 24 de Agosto, "corrigidas" pelo Decreto-Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, "não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida 13 instância, salvo nos casos proferidos no artigo seguinte".

  2. Sucede que nos presentes autos encontram-se preenchidos os requisitos constantes da alínea a) (relevância jurídica) e da alínea c) (contradição com acórdão do Supremo Tribunal de Justiça) do nº 1 do artigo 721º-A do Código de Processo Civil, requisitos estes que não são cumulativos, bastando, pois, que se verifique qualquer um deles para que, em caso de dupla conforme, o recurso de revista seja admitido excepcionalmente.

  3. Com efeito, a posição sustentada pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa no douto acórdão revidendo segundo a qual, na concessão comercial, têm de se verificar cumulativamente os três requisitos constantes do n° 1 do artigo 33° do Regime Jurídico do Contrato de Agência, está em frontal contradição com o acórdão-fundamento, ou seja, com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 2012 (processo n° 99/05.3TVLSB.L 1.S1), proferido no domínio da mesma legislação (face à inexistência de legislação a propósito da concessão comercial e por aplicação analógica do Regime Jurídico da Contrato de Agência) sobre a mesma questão fundamental de direito (os requisitos da indemnização de clientela em caso de cessação de contrato de concessão comercia!), posto que segundo o mencionado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. o requisito da alínea c) do referido n° 1 do artigo 33° não é aplicável à concessão comercial.

  4. Ainda que se admitisse - sem conceder - a necessidade de verificação cumulativa dos três requisitos da indemnização de clientela aquando da sua aplicação analógica ao contrato de concessão comercial, sempre se teria - ainda assim, e salvo melhor opinião - que concluir pela existência duma outra contradição entre o douto acórdão revidendo e o acórdão-fundamento, desta feita no que se refere à interpretação do requisito da indemnização de clientela constante da alínea c) do nº 1 do artigo 33º do Regime Jurídico do Contrato de Agência.

  5. Com efeito, entendeu o Tribunal a quo no douto acórdão revidendo, a propósito do requisito contido na mencionada alínea c), que "se exige que o concessionário deixe de ser compensado pelos custos directamente relacionados com os contratos que negociou e venham a ser concluídos pelo concedente após a cessação da concessão". Salvo melhor opinião, um tal entendimento leva a que se tenha que concluir que, a haver lugar ao pagamento de uma indemnização de clientela, esta terá que corresponder, in casu, não à média do rendimento anual líquido auferido pela Recorrente com a comercialização dos produtos de cada uma das Recorridas nos últimos cinco anos de duração do contrato de distribuição, mas sim aos custos com a promoção, angariação e negociação de contratos concretos.

  6. Simplesmente, tal entendimento é manifestamente distinto daquele que tem vindo a ser amplamente sufragado pela jurisprudência nacional, incluindo pois, o entendimento sustentado pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão-fundamento, de acordo com o qual " (...) a indemnização tem como limite o lucro correspondente a uma anuidade, ponderando as médias dos últimos cinco anos, sendo que, conforme jurisprudência e doutrina corrente, o que interessa para o efeito é o lucro líquido".

  7. Acresce estar o douto acórdão sob revista igualmente em contradição com o acórdão-fundamento também quanto à interpretação do requisito da indemnização de clientela constante da alínea b) do nº 1 do artigo 33º do Regime Jurídico do Contrato de Agência.

  8. Com efeito, ao passo que o Tribunal a quo sustenta que, embora implicando o direito de indemnização de clientela a demonstração de que, "num juízo de prognose, o principal beneficiou consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade de angariação ou incremento de clientela, por aquele desenvolvida" tal "juízo de prognose não emerge, de forma automática, do facto do principal ter tido acesso a uma base de dados onde constam os clientes angariados, não podendo presumir-se necessariamente que a mera cognoscibilidade das respectivas identidades potencie consideravelmente o aproveitamento da clientela", no acórdão-fundamento conclui-se, pelo contrário, que, "atentas as dificuldades que enfrenta o concessionário de, após a cessação do contrato, demonstrar factos que se projectam no futuro, como ocorre com os ligados à ocorrência de "consideráveis benefícios" para o concedente, basta para o efeito que, num juízo de prognose, se possa afirmar ter sido proporcionada à concedente a possibilidade de obter tais benefícios, designadamente pelo facto de [mediante] o efectivo acesso à clientela angariada pelo concessionário lhe serem proporcionadas condições objectivas para a continuidade da clientela".

  9. Ora, a concessão do acesso a uma base onde constam os clientes angariados pela concessionária afigura-se proporcionar, objectivamente, condições de continuidade da clientela, e, consequentemente, a possibilidade das concedentes extraírem proveitos da actividade desenvolvida pela concessionária.

  10. Diga-se, por fim, que o facto da questão da indemnização de clientela ter manifesta relevância subjectiva para a Recorrente não obsta, naturalmente, a que se possa - e deva - reconhecer que a questão da definição e apreciação dos requisitos da indemnização de clientela no contrato de concessão comercial constitui, em si mesma, matéria que objectivamente necessita de uma apreciação que contribua para uma melhor aplicação do direito.

  11. É certo que o douto acórdão revidendo não se reporta expressamente ao requisito da alínea a) do n° 1 do artigo 33° do Regime Jurídico do Contrato de Agência. Mas facto é que tal acórdão tão pouco manifesta concordância com a posição sustentada pela Recorrente nas suas alegações de recurso a propósito do requisito em questão e que acaba por confirmar integralmente a decisão recorrida. Assim, afigura-se legítimo à Recorrente concluir ter o Tribunal a quo concordado também com a posição sustentada pelo Meritíssimo Juiz da Primeira Instância a respeito do requisito em causa.

    I) Ora, entendeu, a propósito, a Primeira Instância que só se justifica a equiparação do concessionário ao agente quando o distribuidor desempenha funções, cumpre tarefas e presta serviços semelhantes aos de um agente, em termos de ele próprio dever considerar-se, pela actividade que exerceu, como um relevante factor de atracção de clientela.

  12. Importa, assim, clarificar se tal critério - que manifestamente não é pressuposto da indemnização de clientela em sede de contrato de agência - deve, ou não, ser aplicável ao contrato de distribuição/concessão comercial, máxime quando tal aplicação é feita por via de analogia.

  13. Sendo manifesta a necessidade de apreciar tal questão. atendendo ao facto de estarmos em presença de um contrato atípico. mas que consabidamente envolve uma intervenção não poucas vezes relevante (quer em termos económicos, quer em termos de tempo) por parte do concessionário.

  14. Estamos, muito por força do "vazio legal" existente quanto ao contrato de concessão comercial, perante uma questão difícil, susceptível de interpretações divergentes e, porque não dizê-lo, não isenta de polémica.

  15. O raciocínio acima desenvolvido a propósito da relevância jurídica da apreciação da aplicação da alínea a) do nº 1 do artigo 33º do Regime Jurídico do Contrato de Agência afigura-se igualmente aplicável à apreciação, nos mesmos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 do mesmo normativo legal: em bom rigor, o que está em causa é aplicação daquele regime ao contrato de concessão comercial.

    QUANTO À DECISÃO DO MÉRITO DA CAUSA: q) O entendimento do Venerando Tribunal a quo deveria ter sido outro no que respeita aos pedidos identificados nas alíneas a) a c) (indemnização de clientela) e f) a h) (retoma de stock) do petitório e - consequentemente, e na devida proporção - aos pedidos identificados nas alíneas i) (juros de mora) e j) (custas) do mesmo, cingindo-se, pois, o presente recurso, à apreciação de tais pedidos.

  16. Não só as partes qualificaram os contratos dos autos como sendo de distribuição, como – em face dos factos dados como provados e, por conseguinte, do núcleo essencial de direitos e de deveres deles decorrentes para as partes –, a relação jurídica sub judice deve, efectivamente, qualificar-se como contrato de distribuição, mais próxima da modalidade de contrato de concessão comercial...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
5 temas prácticos
  • Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2019
    • Portugal
    • Supremo Tribunal de Justiça
    • Invalid date
    ...n.º 99/05.3TVLSB.L1.S1), disponível in, www.dgsi.pt. e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Março de 2015 (Processo n.º 2199/11.1TVLSB.L1.S1, disponível in, www.dgsi.pt, cujo entendimento perfilhado foi, sem reserva, desaprovado em comentário de Pinto Monteiro na Revista de Leg......
  • Acórdão nº 618/17.2T8BJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Junho de 2021
    • Portugal
    • 17 Junio 2021
    ...de concessão comercial, encontramos diversos arestos emanados do STJ, de que se destacam os recentes proferidos em 12/03/2015 (Procº 2199/11.1TVLSB.L1.S1-relator Paulo Sá), em 29/09/2015, (Proc.º 1552/07.0 TBPTM.E2.S1-relator Silva Jesus), em 12/05/2016, (Proc.º 2470/08.0TVLSB.L1.S1-relator......
  • Acórdão nº 391/06.0TBBNV.E1.S1   de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2018
    • Portugal
    • 12 Julio 2018
    ... ... Sucede, porém, que o presente processo deu entrada em juízo no dia 15 de Março de 2006, ou seja, antes da publicação do DL n.º 303/2007, de 24-08, que entrou em vigor em 1 de ... 2015 (Nuno Cameira), proc. n.º 4671/06.TBMTS.P1.S1: «I - São elementos estruturantes do contrato de ... ...
  • Acórdão nº 1552/07.0TBPTM.E2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Setembro de 2015
    • Portugal
    • 29 Septiembre 2015
    ...clientela depende somente da verificação cumulativa das als. a) e b); no mesmo sentido se pronuncia o Ac. do STJ de 12/03/15, Proc. nº 2199/11.1TVLSB.L1.S1, desta Secção, no IGFEJ, objecto de comentário crítico e desaprovador neste ponto de Pinto Monteiro na RLJ do Ano 144.º, págs. [13] In ......
  • Peça sua avaliação para resultados completos
4 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT