Acórdão nº 265/12.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | SILVA GONÇALVES |
Data da Resolução | 19 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA intentou contra BB, “Banco CC, S.A.” e DD, todos identificados nos autos, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, pedindo que o 1.° réu fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 181.956,92, a título de sinal dobrado, em virtude do incumprimento do contrato-promessa de 19-05-2006, acrescida de juros desde a citação e que fosse reconhecido à autora direito o de retenção sobre a fracção autónoma designada pelas letras CJ, correspondente ao 4.° andar, letra A, do prédio sito na R. …, São Domingos de Benfica, Lisboa, descrito na CRP sob o n.° 2402 e inscrito na matriz sob o art. ..., até lhe ser a paga aquela quantia, nos termos do disposto na al. f) do n.° 1 do art. 755.° do CC.
Para tanto, alegou, em síntese: Em 01.02.2005 a autora e o 1.º réu viviam em união de facto; Tendo como objectivo o seu casamento, e a instalação da casa de morada de família na fracção autónoma identificada, a autora e o 1.º réu celebraram, no dia 29-07.2005, um “acordo preliminar” a regular os termos da futura transmissão dessa fracção.
Nos termos desse acordo, a fracção seria adquirida pelo réu, com recurso a empréstimo bancário, e seria por este transmitida à autora, logo que esta estivesse em condições de outorgar a respectiva escritura, ou podendo ser celebrado mero contrato-promessa de compra e venda, mas sempre antes do casamento.
O 1.º réu comprou a fracção em causa no dia 19.10.2005, com o empréstimo bancário de € 300.000,00 concedido pelo 2.º réu; No dia 19.05.2006 o 1.º réu prometeu vender à autora, que prometeu comprar, a identificada fracção, por preço correspondente aos montantes já pagos e ainda em dívida, do empréstimo contraído para a sua aquisição pelo réu.
Tendo sido acordado que a autora poderia ir fazendo pagamentos ao promitente vendedor, a título de sinal e de reforços de sinal, até á outorga do contrato definitivo; que a escritura seria realizada até noventa dias depois de a promitente compradora ter efectuado pagamentos que perfizessem o montante de € 125.000,00, ou no prazo máximo de quinze anos, contado da data do contrato-promessa; e que a promitente compradora entrava, nessa data, na posse exclusiva da fracção prometida vender, sem prejuízo de a mesma se destinar a ser a casa de morada de família.
Nessa data a autora entrou na posse da fracção, habitando-a desde então, nela recebendo visitas de familiares e amigos; A autora e o 1.º réu contraíram, entre si, casamento no regime de separação de bens, no dia 01.08.2006.
No período de 06.06.2007 a 01.07.2009, a autora entregou ao 1.° réu, a título de sinal e princípio de pagamento, quantias que perfazem o montante global de € 90.978,46.
No dia 10.09.2010 a fracção foi penhorada e o 1.° réu acabou por reconhecer que não conseguia pagar a dívida garantida pela penhora e que não tinha possibilidade de cumprir o contrato-promessa referido, declarando a sua intenção séria, inequívoca e categórica de não cumprir; A autora e o réu deixaram de fazer vida conjugal em 15.07.2010, mantendo-se a autora a viver na fracção e passando a suportar os custos relacionados com a mesma.
E a 03-01-2012 foi, entre eles, decretada a separação de pessoas e bens.
Concluiu que tem direito a receber do 1.° réu o dobro da quantia que lhe entregou a título de sinal, por incumprimento do contrato-promessa celebrado, assistindo-lhe, ainda, direito de retenção da fracção objecto do mesmo, para garantia desse crédito.
O 2.º réu reclamou créditos na execução onde foi efectuada a penhora da fracção.
E o terceiro réu é o exequente nessa mesma execução.
Citado, o réu “Banco CC, S.A.” contestou impugnando, por desconhecer, que a autora tivesse entrado na posse da fracção, que o 1.º réu tivesse ficado impossibilitado de cumprir o contrato-promessa, e que tivessem sido efectuados pagamentos a título de sinal e de reforço de sinal.
Conclui pela improcedência da acção.
O réu BB também apresentou contestação, onde alegou não ter a menor possibilidade de cumprir o contrato-promessa e que essa impossibilidade é alheia à sua vontade, não havendo, por isso, qualquer mora, nem direito de retenção por parte da autora.
Os autos prosseguiram para julgamento, realizado com registo da prova produzida, tendo a matéria de facto sido decidida pela forma que consta de fls. fls. 373 a 378.
O réu “Banco CC, S.A.” apresentou alegações sobre o aspecto jurídico da causa, defendendo a improcedência dos pedidos formulados.
Seguiu-se a sentença, onde a acção foi julgada improcedente, com a absolvição dos réus dos pedidos.
Inconformada com o assim decidido, apelou a autora para a Relação de Lisboa que, por acórdão de 08-05-2014 (cfr. fls.), revogou a decisão recorrida, e julgando parcialmente procedente a acção, condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 151 608,72 (cento e cinquenta e um mil, seiscentos e oito euros e setenta e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, ora de 4% ao ano, desde a citação até pagamento e reconheceu à autora direito de retenção sobre a fracção autónoma designada pelas letras CJ, correspondente ao 4.° andar, letra A, do prédio sito na R. …, São Domingos de Benfica, Lisboa, descrito na CRP sob o n.° 2402 e inscrito na matriz sob o art. ..., até lhe ser paga aquela quantia.
Irresignado, recorre agora para este Supremo Tribunal o réu “Banco CC, S.A.
”, que alegou e concluiu pela forma seguinte: a) Por douto acórdão proferido, em 08 de Maio de 2014, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, foi julgada parcialmente procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, e parcialmente a acção, condenando o RR. BB ao pagamento da quantia de € 151.608,72 (cento e cinquenta e um mil seiscentos e oito euros e setenta e dois cêntimos), acrescida de juros, perante a Autora e reconhecendo-se a esta o direito de retenção sobre o objecto do contrato promessa, até lhe ser paga aquela quantia, conforme termos descritos no citado acórdão; b) Sucede que, a ora Recorrente, Banco CC, S.A. não se pode conformar com o citado douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, nomeadamente no que respeita ao direito de retenção, pois considera que este douto Tribunal não valorou devidamente a prova produzida nos presentes autos, ao julgar que a ora Autora entregou ao RR. BB diversas quantias em dinheiro, a título de sinal e de princípio de pagamento, e que este incumpriu definitivamente o contrato promessa dos presentes autos; c) Ao julgar, indevidamente, essa factualidade como provada, entende a ora Recorrente que a Relação de Lisboa não valorou devidamente a prova produzida nos presentes autos, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, e, por conseguinte, errou na aplicação do disposto na alínea f) do n.º l do artigo 755.º, no n.º 2 do artigo 442.º e no artigo 376.º, ambos do Código Civil, e na jurisprudência unânime, pelo que não pode ser admitida a exigência de restituição do sinal em dobro, nem tão-pouco ser reconhecido o direito de retenção; d) Face ao exposto, inconformada com o citado douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, vem a ora Recorrente, Banco CC, S.A., interpor o presente recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça pugnando pela revogação daquele acórdão recorrido; e) De acordo com o douto acórdão recorrido, o recurso de apelação deduzido pela Autora «assentava, fundamentalmente, na alteração da decisão sobre matéria de facto, estando em causa, por um lado, a existência de sinal no âmbito do contrato-promessa de compra celebrado entre a Autora e o primeiro réu, referido na alínea E) dos factos assentes, e, por outro, a recusa do réu em cumprir esse contrato-promessa», pelo que serão essas as duas questões a apreciar no presente recurso; f) No que se refere à apreciação da matéria de facto vertida no artigo 3.º da Base Instrutória, relativa à entrega de valores pela Autora ao 1.º RR. a título de sinal e reforço de sinal, contrariamente ao julgado pelo Tribunal de 1.ª Instância, o douto acórdão recorrido julgou a mesma como provada, naturalmente limitada às entregas julgadas provadas na resposta ao artigo 2.º da Base Instrutória fundamentando, em síntese, que «(...) a base contratual da presente acção ficou assente desde os articulados e, como tal, deve ser considerada. Não podendo, assim, ser questionado que entre os aqui autora e l.º réu foi celebrado o contrato-promessa referido em E), nos precisos termos e condições que dele constam, designadamente as transcritas em sede de matéria de facto, sob a alínea E), cuja materialidade deve ser considerada assente», nomeadamente, os termos estipulados nas Cláusulas 2.ª, n.º 3, e 4.ª, n.º l do contrato promessa, os quais, no entendimento do douto tribunal a quo, «(...) constituem fundamento bastante para imputar no cumprimento do contrato-promessa quaisquer pagamentos efectuados pela promitente compradora, no interesse e por conta do promitente vendedor, na vigência do contrato-promessa, independentemente dos respectivos montante e finalidades. Ou seja, tanto poderia ser o pagamento de uma prestação do crédito à habitação que, nos termos contratados, era da responsabilidade do réu, como qualquer outra prestação de outros créditos - que o réu foi pródigo. Para a autora estava, sempre, em causa a realização de pagamentos no interesse e por conta do réu, os quais, por força do clausulado no contrato-promessa, se convertiam em sinal no âmbito desse contrato»; g) Com efeito, e tal como descrito no douto acórdão recorrido, no artigo 3.º da Base Instrutória perguntava-se se as quantias entregues pela Autora, elencadas no artigo 2.º da Base Instrutória, foram entregues por esta a título de sinal e princípio de pagamento e ao abrigo do n.º 3 da cláusula 2.ª do acordo referido na al. E) da Base Instrutória que estabelecia que «A Promitente Compradora fica com a faculdade de, a partir da presente data e até à data da outorga do contrato definitivo, fazer pagamentos ao Promitente...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO