Acórdão nº 365/13.4TTVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1---- STRUN – Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte instaurou uma acção de defesa de direitos respeitantes aos interesses colectivos dos trabalhadores que representa, contra AA – Transportes, S.A, pedindo que sejam declarados ilícitos os cortes impostos pela Ré, desde Agosto de 2012, à retribuição prevista no nº7 da clª74ª do CCT, e que a mesma seja condenada a devolver os valores retirados à remuneração em causa a cada um dos seus trabalhadores que são filiados no sindicato Autor.

Alegou para tanto que é uma associação sindical constituída para defesa dos trabalhadores nela associados que exercem a actividade profissional no sector dos transportes rodoviários e urbanos, encontrando-se filiada na FECTRANS – Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações/CGTP, que sucedeu à FESTRU, enquanto a Ré se encontra filiada na ANTRAM.

Na sua relação de trabalho com esta, os trabalhadores associados do A estão abrangidos pelo CCT celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE nº9, de 08.03.1980 e no BTE nº16, de 29.04.1982 e posteriores alterações, estando classificados como motoristas dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias. Por isso, têm direito a uma retribuição mensal que não será inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia, conforme resulta da clª74º, nº7 do mencionado CCT.

É hoje matéria assente na Jurisprudência que a referida retribuição é devida mensalmente em relação a 30 dias, devendo também ser paga nos meses em que os trabalhadores se encontrem em gozo de férias e incluída nos subsídios de férias, conforme acórdão do STJ de 09.06.2010.

Acontece porém que, a partir de Agosto de 2012, a Ré começou a pagar aos motoristas do serviço TIR, uma importância abaixo do que vinha pagando a título da retribuição prevista no nº7 da clª74ª, quando a mesma nada tem a ver com a remuneração a título de trabalho suplementar, significando, tão só, que a remuneração não pode ser inferior à correspondente ao pagamento de duas horas de trabalho, uma com o adicional de 50% sobre o valor de uma hora normal, e outra com o adicional de 75% sobre o valor de uma hora normal.

A Ré contestou, sustentando que o valor estabelecido na clª74ª, nº7 deve oscilar em função das variações legal ou contratualmente definidas para a remuneração do trabalho suplementar, pelo que, tendo em conta o estabelecido no artigo 268º do CT, na redacção dada pela Lei nº23/2012 de 25.06, conjugado com o artigo 7º, nº4, al. a) da mesma Lei, conclui pela improcedência da acção[1].

O A respondeu pugnando pela procedência do pedido[2].

Foi proferido despacho saneador/sentença, vindo a julgar-se a acção procedente, pelo que, e considerando ilícitos os «cortes» impostos pela Ré, desde Agosto de 2012, ao valor da retribuição prevista no nº7 da clª74ª da CCT celebrada entre a ANTRAM e a FESTRU, publicada no BTE de 08.03.1980, se condenou aquela a devolver aos seus motoristas TIR, filiados no Autor, os valores deduzidos desde Agosto de 2012 até à reposição da retribuição anteriormente paga a título de clª74ª, nº7 da CCT, a liquidar, se necessário, oportunamente.

A Ré, inconformada, apelou da sentença, pedindo a sua revogação e substituição por acórdão que a absolva dos pedidos, mas o Tribunal da Relação do Porto julgou a apelação improcedente, confirmando integralmente a decisão recorrida.

Novamente inconformada, interpôs a R revista excepcional, que foi admitida pela formação a que se refere o n.º3 do art. 672.ºdo C.P.C.

E rematou a sua alegação com as seguintes conclusões: “…..

  1. A cláusula 74ª/7 do CCTV estipula que: "O trabalhador dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias tem direito a uma retribuição mensal, que não será inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia", acrescentando o n°8 da mesma cláusula que "A estes trabalhadores, de acordo com o estabelecido no número anterior, não lhes é aplicável o disposto nas cláusulas 39ª (Retribuição de trabalho nocturno) e 40ª (Retribuição de trabalho extraordinário) ".

  2. Este Venerando Tribunal fixou já, no douto acórdão n.º 7/2010, o sentido e alcance da referida norma convencional, determinando, nomeadamente, que: "A retribuição mensal prevista no nº 7 da cláusula 74ª do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a ANTRAM - Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU - Federação dos Sindicatos dos Transportes Rodoviários Urbanos, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº16, de 29 de Abril de 1982, tendo como base mínima de cálculo o valor equivalente a duas horas extraordinárias, é devida em relação a todos os dias do mês do calendário".

  3. Por via do disposto na cláusula 74ª do CCTV firmado entre a Antram e a Festru, as partes outorgantes conferiram aos trabalhadores deslocados no estrangeiro o direito a um acréscimo remuneratório e definiram como critério para a sua quantificação o equivalente a duas horas de trabalho extraordinário.

  4. As partes outorgantes do CCTV, podendo estipular um qualquer outro valor a atribuir à retribuição especial em causa (poderiam, desde logo, tão só, ter previsto uma percentagem da própria retribuição base), optaram expressa e deliberadamente por fazer corresponder a sua quantificação por referência à retribuição do trabalho extraordinário.

  5. À formulação do preceito em causa (quer numa perspectiva literal, quer numa perspectiva de unidade do sistema) não foi alheia a intenção de se vir a remunerar efectivamente os trabalhadores abrangidos segundo os critérios de quantificação definidos para o cálculo do trabalho extraordinário.

  6. Não há razão para não fazer oscilar o valor da cláusula 74ª do CCTV em função das variações legal ou contratualmente definidas para a remuneração de trabalho suplementar.

  7. E a remissão feita na cláusula 74ª/7 para a remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia, há-de ser encarada, necessariamente, como urna remissão dinâmica, abstraindo da concreta retribuição existente à data da criação da norma, numa intenção clara de que a retribuição especial dos trabalhadores acompanhasse a evolução salarial dos demais trabalhadores no que concerne à prestação de trabalho suplementar, isto porque, manifestamente, não seria possível sustentar que uma posterior alteração da cláusula 40ª do CCTV - no sentido de aumentar os acréscimos ali previstos - também não tivessem o correspectivo acréscimo na cláusula 74ª/7.

  8. O legislador, deliberadamente, assumiu o propósito de ver reduzidas as retribuições por trabalho suplementar, no âmbito de aplicação do regime ínsito no artigo 7º da Lei na 23/2012, de 25 de Junho.

  9. À oscilação do valor da cláusula 74ª/7 do CCTV, em função das variações legal ou contratualmente definidas para a remuneração de trabalho suplementar, também não obstará o princípio da irredutibilidade da retribuição, ínsito no artigo 129°/nº1, alínea d) do Código do Trabalho, isto porque conforme resulta do referido preceito legal, o que se visa proibir é a diminuição de retribuição por acto unilateral do empregador e sem ressalvar a possibilidade de diminuição da retribuição, quer por imperativo legal, quer por força de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.

  10. A solução mais conforme à vontade do legislador - quer partindo da análise do texto, quer ponderando o elemento decisivo de interpretação (unidade do sistema jurídico), no confronto com o princípio da igualdade, ínsito na Constituição da República Portuguesa) será aquela que aponta no sentido da redução deliberada do valor de trabalho suplementar se vir a repercutir igualmente em todas as componentes retributivas dele dependentes, como é o caso da cláusula 74ª/7.

  11. A redução operada pela Recorrente no valor da retribuição da cláusula 74ª/7 devida aos representados do autor/recorrido é, assim, amplamente lícita.

  12. Ao decidir como decidiu, violou o acórdão recorrido o disposto nos artigos 268°, nº 1 e 129, nº1, d) ambos do Código do Trabalho, nos artigos e 12° do Código Civil, no artigo 7° da Lei 23/2012, e a cláusula 74ª, n.º 7 do CCTV., pelo que deverá ser o mesmo revogado e substituído por outro que absolva a Recorrente do pedido deduzido na petição inicial.” O Autor não alegou.

Cumprido o disposto no nº 3 do artigo 87º do CPT, proferiu o Ex.mº Procurador Geral Adjunto parecer no sentido da confirmação do acórdão recorrido, argumentando para tanto que, integrando os valores atribuídos pela cláusula 74ª, nº 7 do CCTV aplicável a retribuição do trabalhador, tal como é jurisprudência firme deste Supremo Tribunal, a sua diminuição ofende o princípio da irredutibilidade consagrado no artigo 129º, nº1, alínea d) do Código do Trabalho.

Não tendo havido resposta das partes, cumpre decidir.

2---- Para tanto, as instâncias fixaram a seguinte matéria de facto: 1.

O Autor, STRUN – Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte, é uma Associação Sindical constituída pelos trabalhadores nele filiados que exerçam a sua actividade profissional no sector de transportes rodoviários e urbanos.

  1. Assim, representa vários trabalhadores seus associados que exercem a sua actividade profissional remunerada, por conta e sob a direcção e fiscalização da Ré.

  2. A qual se dedica ao transporte rodoviário, nacional e internacional, de mercadorias.

  3. O Autor encontra-se, actualmente, filiado na FECTRANS – Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações/CGTP, que sucedeu, para todos os efeitos, à FESTRU – Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos/CGTP, conforme consta dos Estatutos, publicados no BTE nº47, 1ª série, de 22.12.2007.

  4. A Ré encontra-se filiada na ANTRAM – Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias.

  5. Os associados do Autor, que estão classificados pela Ré como motoristas dos transportes internacionais...

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