Acórdão nº 444/08.0GEGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

Nestes autos foi condenado, por acórdão de 9 de Dezembro de 2013, do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Gondomar: AA, pela prática, em autoria material, de - um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148.º, n.ºs 1 e 3, do CP (doravante, CP), na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 8 € (oito euros), num montante total de 640 € (seiscentos e quarenta euros), - mais foi julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por BB e, em consequência, o demandado AA condenado a pagar-lhe a quantia de 28.111,48 € (vinte e oito mil cento e onze euros e quarenta e oito cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, biológico e morais, quantia correspondente a 65%, tendo em conta a repartição de culpas apurada, do valor indemnizatório de 43.248,44 €, correspondente a 3.248,44 € por danos patrimoniais, 30.000,00 € por danos não patrimoniais e 20.000,00 € por dano biológico.

  1. Inconformado com a decisão veio o arguido/demandado AA interpor recurso para o Tribunal da Relação do Porto, quanto à condenação em matéria criminal e cível, por entender terem sido violados os arts. 410.º, n.º 2, al. c), a contrario, e 17.º, n.º 1, do CP, bem como os arts. 483.º, 493.º e 570.º, do Código Civil (doravante, CC).

    O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão proferido em 11 de Junho de 2014, negou provimento ao recurso interposto quanto à condenação criminal, e, concedeu parcial provimento ao recurso quanto à indemnização civil (embora mantendo o montante indemnizatório (quer na sua totalidade, quer relativamente aos danos patrimoniais, não patrimoniais e ao dano biológico) — julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por BB e, em consequência, condenou AA a pagar-lhe a quantia de 21.624,22 € (vinte e um mil seiscentos e vinte e quatro euros e vinte e dois cêntimos) a título de indemnização por danos patrimoniais, biológico e morais, correspondente a 50% do montante indemnizatório total, devido a nova repartição de culpas; absolvendo-o do demais peticionado.

  2. Igualmente inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, veio o arguido/demandado AA interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quanto à condenação em matéria cível e criminal, com fundamento na violação dos “arts. 410.º, n.º 2, al. c), a contrario, e 17.º, n.º 1, do Código Penal, bem como os arts. 483.º, 493.º e 570.º, do Código Civil.” (cf. fls. 891/verso).

    Entende o arguido que deveria ser dado como não provado que “Ao não acautelar as medidas de segurança suficientes ao alojamento do cão que ali possuía e à segurança das outras pessoas e animais que por ali passavam, o arguido actuou com falta de cuidado, em violação do seu dever de vigilância, bem sabendo que esse animal era considerado potencialmente perigoso para as pessoas e outros animais”, com a consequente absolvição do recorrente em matéria criminal e cível.

    Para o caso de assim não se entender, defende a alteração da decisão recorrida, diminuindo-se os valores da indemnização pelos danos patrimoniais, dano patrimonial de perda da capacidade de ganho e de danos não patrimoniais. E, mesmo não se alterando tais valores, pugna pela alteração da repartição da quota de responsabilidade pela produção do sinistro em causa por forma a que esta repercuta a maior responsabilidade devida pela recorrida (considerando justa a alteração da divisão de responsabilidade em quota de 10% para o recorrente e 90% para a recorrida).

  3. O recurso não foi admitido na parte relativa à condenação criminal, por a mesma ser irrecorrível, e foi admitido no que se refere à parte relativa à condenação cível, por despacho proferido a fls. 897 dos autos.

  4. São as seguintes as conclusões do recurso apresentado: «1º Foi o Arguido condenado pelo crime de ofensa à integridade física por negligência, condenação essa que teve como base os factos identificados na douta sentença de 1.ª Instância e confirmados no douto acórdão recorrido.

    1. O Arguido, ora recorrente, não se conforma com o douto acórdão proferido, na parte em que decaiu.

    2. O recorrente entende que não pode ser dado como provado o facto vertido no 3º parágrafo de fls. 750 - verso (“Em consequência do acidente, BB desenvolveu perturbação psíquica caracterizada por perturbação do sono, humor depressivo, manifestações ansiosas, irritabilidade, tensão emocional e comportamentos evitantes”), conquanto não encontra sustentação fáctica na prova produzida.

    3. Da mesma forma não poderia ser dado como provado que “Ao não acautelar as medidas de segurança suficientes ao alojamento do cão que ali possuía e à segurança das outras pessoas e animais que por ali passavam, o arguido actuou com falta de cuidado, em violação do seu dever de vigilância” bem sabendo que esse animal era considerado potencialmente perigoso para as pessoas e, outros animais” (último parágrafo de fls. 750 verso), conquanto tal não consubstancia um facto.

    4. Não poderão ser dados como provados os factos contidos nos parágrafos 7º a 9º de fls. 751 dos autos recorridos conquanto não encontram sustentação nas declarações que foram produzidas em sede de audiência de julgamento.

    5. O recorrente cumpriu o seu especial dever de vigilância, previsto no art.6º do Decreto-Lei n.º 312/2003, no sentido de evitar que o cão pusesse em risco a vida ou a integridade física de outras pessoas e de outros animais, ao contrário do sustentado nos autos.

    6. Inexiste negligência do recorrente, que tomou todos os cuidados para que o animal não alcançasse os limites da propriedade, nem extravasasse os mesmos, bem como quanto ao alerta da presença do animal dentro da propriedade, bem como realizou a delimitação da propriedade para a distinguir de domínio público.

    7. A recorrida contribuiu para o resultado lesivo verificado, tendo sido a única e exclusiva culpada do sucedido.

    8. Como tal inexiste obrigação de indemnizar em termos cíveis.

    9. Entendemos que deveria o recorrente ter sido absolvido do crime pelo qual vinha acusado.

    10. Igualmente devendo ser, pelo exposto, absolvido do pedido de indemnização formulado.

    11. Assim não se entendendo, sem prescindir e por mera cautela de patrocínio, entendemos que o Tribunal a quo não considerou todos os elementos devidos na fixação do valor de indemnização pelos danos patrimoniais, dano patrimonial de perda de capacidade de ganho e de danos não patrimoniais, pelo que terão os mesmos de ser revistos, diminuindo estes.

    12. No pressuposto atrás referido, e mesmo não sendo alterados os respectivos valores, deverá ser alterada a repartição de quota de responsabilidade pela produção do sinistro em causa por forma a que esta repercuta a maior responsabilidade devida pela recorrida (considerando-se justa a alteração da divisão de responsabilidade em quota de 10% para o recorrente e 90% para a recorrida).

    13. A sentença recorrida violou, assim, os arts. 410.º n.º 2 al. c) do Código Penal a contrario, 17º n.º 1 do mesmo diploma e arts. 483º, 493º e 570º do Código Civil.» 6.

    Admitido o recurso – nos termos referidos em 4 – e efetuadas as notificações legais, a demandante, BB, apresentou resposta, concluindo o seguinte: «1. Não obstante a abrangência do recurso interposto, o Acórdão em apreço é irrecorrível na parte relativa à condenação criminal (cfr. art. 400º, nº 1, al. e) do C.P.P. - como bem recorda o Tribunal da Relação do Porto no respetivo despacho de admissão -, razão pela qual as presentes Alegações abordam somente as críticas dirigidas à apreciação do pedido de indemnização civil; 2. Sobre o pedido de indemnização cível, o recorrente mais não faz do que reiterar (exatamente) a argumentação já expendida - e julgada improcedente - em sede de recurso de apelação, o que faz de forma não só processualmente inadmissível, como substancialmente insustentada; 3. Fora dos casos expressamente previstos na lei (cfr., designadamente, o disposto no art. 410º, n.ºs 2 e 3 do C.P.P.), o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito (cfr. art. 434º do C.P.P.), pelo que, não se enquadrando a motivação do recurso da matéria de facto em nenhuma das exceções legalmente previstas aos referidos poderes de cognição - nem tendo o arguido produzido qualquer alegação a este propósito -, a decisão proferida em sede de apelação é definitiva no que toca a tal matéria, não podendo ser alterada no âmbito da presente revista; 4. Mantendo-se a apreciação da factualidade em apreço, concordante será, necessariamente, o sentido da decisão a proferir em todos os pontos em que dependa diretamente de tal factualidade; 5. No que concerne à fixação dos danos patrimoniais, todos os factos inerentes à fixação do respetivo montante foram reiteradamente tidos por provados, em primeira instância e em sede de recurso, razão pela qual se impunha - como se impõe - a manutenção da decisão inicialmente proferida; 6. No que respeita à apreciação do dano patrimonial de perda de capacidade de ganho, a alteração da decisão terá de assentar num qualquer erro de julgamento sindicável pelo Tribunal Superior, erro esse que não se vislumbra estar (minimamente) destacado na alegação do recorrente; 7. Ainda que a assistente possuísse antecedentes de depressão no respetivo histórico clínico, certo é que tal facto não impediria que o sinistro ocorrido tivesse - como teve -, também ele, consequências do foro psicológico, o que ficou demonstrado em sede de julgamento, tendo sido (reiteradamente) dado como provado “que a Recorrida desenvolveu perturbação psíquica como consequência do acidente em causa”, razão pela qual nunca poderia o Tribunal considerar - como parece pretender o recorrente - que as sequelas de que padece a assistente são alheias ao sinistro julgado nos autos; 8. As consequências do acidente, no que concerne à avaliação do dano patrimonial de perda de capacidade de ganho da assistente...

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