Acórdão nº 477/03.2TBVNO.C3.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução19 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. 477/03.2TBVNO.C3.S1 R-496[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1º -AA 2º -BB 3º -CC 4º- DD, e; 5º- EE Instauraram, em 18.3.2003, no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Ourém, acção declarativa, de condenação, com processo ordinário, contra: FF, Lda. Pediram: - Sejam anuladas as deliberações tomadas na assembleia-geral da sociedade ré, no dia 16 de Fevereiro de 2003; - A condenação da ré a reconhecer como eficaz a transmissão da quota no valor nominal de € 150.000,00 operada entre os autores e a sociedade “GG-S.G.P.S,S.A.”, pela escritura de aumento do capital social da referida sociedade.

Para o efeito, alegaram, em síntese: A ré é uma sociedade por quotas com o capital social de € 600.000,00, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Ourém, sob o nº …, constituída por escritura de 29 de Março de 1956; O autor AA é viúvo de HH e os autores BB, CC, DD e EE, filhos do autor AA e de HH e seus únicos e universais herdeiros; HH era titular, em comum com o autor AA, de uma quota com o valor nominal de € 150.000,00 na sociedade ré; Por escritura pública datada de 19 de Dezembro de 2002 os Autores procederam ao aumento de capital da sociedade anónima “GG-…, SA”, com sede na ..., ..., ..., através da realização de entradas em espécie e em dinheiro; Nessa escritura foi integrada a quota que os autores detinham na ré; Por carta, entregue em 6 de Janeiro de 2003 os autores deram conhecimento à ré da escritura de aumento do capital social da GG-…., S.A; Por carta registada com aviso de recepção, expedida em 31 de Janeiro de 2003, foi convocada assembleia-geral extraordinária da Ré, para ter lugar no dia 16 de Fevereiro de 2003.

Esta convocatória foi enviada apenas ao autor AA, motivo pelo qual, os autores BB, CC, DD e EE não compareceram a tal assembleia-geral; Existe insuficiência da convocatória, na medida em que, em tal assembleia, estava em causa a alienação da quota dos autores na ré, que o único autor convocado não tinha poderes para deliberar, porque os restantes contitulares da quota não lhe tinham conferido poderes de disposição; A acta da mencionada assembleia-geral não foi lavrada por notário, contrariamente, ao que havia sido requerido pelo autor AA, em tempo oportuno.

O autor AA foi ilegalmente impedido de participar na discussão e na votação da ordem dos trabalhos, quando sendo representante comum dos demais contitulares da quota, apenas estava impedido de votar o ponto dois da convocatória, em virtude de não ter poderes de disposição.

No que se refere à negação do consentimento da ré para a integração da quota de que os autores são contitulares no capital social da “GG, …., S.A.”, porque não se tratou de uma cessão de quotas, mas apenas de um acto de transmissão entre vivos, a validade e eficácia de tal transmissão verifica-se, independentemente desse consentimento, porque, por aplicação do disposto no art. 228º, nº 3, do Código das Sociedades Comerciais, bastava e basta a mera comunicação do acto, à ré.

Em todo o caso, sempre seria eficaz perante a ré, em virtude de esta não ter apresentado por escrito a proposta de amortização da quota a todos os autores, sendo certo que nenhum dos autores participou na deliberação, seja porque nem sequer foram convocados, seja porque o único autor convocado, foi impedido de participar na deliberação.

Por fim, a proposta de amortização sempre se teria de considerar omitida, na medida em que não obedeceu aos requisitos legais, concretamente, o previsto no art. 231º, nº 2, al. d) do Código das Sociedades Comerciais.

Contestou a ré.

Disse, nomeadamente, e no que para o que ora interessa: Com a cessão da quota de que eram contitulares na ré, para a sociedade GG, S.A., os autores afastaram, à revelia da lei e do pacto social e do conhecimento ou consentimento da sociedade ré, qualquer possibilidade de a ré, no futuro, se opor à entrada de novos sócios, estranhos à sociedade, quer o direito de preferência dos restantes sócios da ré, numa futura transmissão dessa quota.

E esse aumento de capital social consubstancia uma verdadeira e própria cessão de quotas.

No caso vertente, é aplicável o nº2 do art. 228º do Código das Sociedades Comerciais, que exige o consentimento da sociedade quanto à cessão a estranhos de quotas da mesma sociedade, além de que foi violado o pacto social da ré, cuja cláusula quinta estabelece a preferência a favor dos sócios da ré, em caso de cessão de quotas a estranhos; A convocatória foi enviada apenas ao autor AA, porque este último, além de contitular da quota, era o representante comum dos restantes autores e, por aplicação do nº2 do art. 222º do Código das Sociedades Comerciais, o dever de convocação mostra-se cabalmente cumprido.

Além disso, não estava em causa a alienação da quota, porque o que foi submetido à deliberação, foi apenas a discussão e aprovação de uma proposta de amortização da quota a apresentar aos autores.

A acta não tinha de ser elaborada por notário, porque o autor AA não endereçou o correspondente pedido em tempo útil, uma vez que o quinto dia útil seguinte ao da data em que tal pedido foi remetido à ré, foi o dia 17 de Fevereiro de 2003, ou seja, um dia depois da realização da assembleia geral, sendo certo que o nº 7 do art. 63º do Código das Sociedades Comerciais alude a cinco dias úteis antes da data da assembleia geral.

O pretenso impedimento do autor AA em participar nos trabalhos da assembleia-geral da ré em 16 de Fevereiro de 2003, é a demonstração cabal da má-fé com que os autores litigam.

Além disso, o autor AA, ao afirmar, contrariamente ao que havia dito momentos antes do início dos trabalhos e ao que constava de carta dirigida à ré, mais de um ano antes, nos termos da qual havia sido nomeado representante comum dos restantes autores, que se encontrava naquela assembleia, a título pessoal e que não representava os outros autores, colocou-se, voluntariamente, em posição de não poder votar.

Por isso, não deve poder prevalecer-se de uma situação que ele próprio criou, sob pena de abuso de direito.

A proposta de amortização foi válida e eficazmente apresentada, quer porque o autor AA é o representante comum de todos os autores, nos termos do art. 222º, nº2, do Código das Sociedades Comerciais, quer porque essa proposta não está sujeita a qualquer formalismo, podendo ser verbal, desde que seja receptícia e a verdade é que foi logo comunicada, no dia da assembleia geral, ao mesmo autor AA; Pediu: A improcedência da acção e a condenação de todos os autores em multa e indemnização à ré, como litigantes de má-fé, em montante não inferior a € 5.000,00 e, cumulativamente, a condenação do autor AA, também como litigante de má-fé, em multa e indemnização à ré, em montante nunca inferior a € 5.000,00.

Os autores replicaram.

Reiterando a sua posição e pugnando pela sua absolvição do pedido de condenação como litigantes de má-fé e pedindo a condenação da ré em multa e indemnização como litigante de má-fé.

*** A final, em 20.4.2011 (fls. 569 a 643) foi proferida sentença que: - Julgou a acção não provada e improcedente e, em consequência, absolveu a Ré de todos os pedidos.

- Condenou cada um dos Autores, como litigantes de má-fé, na multa equivalente a 7 Ucs.

- Determinou a notificação de ambas as partes, nos termos e para os efeitos previstos no art. 457º, nº 2 do Código de Processo Civil, para efeitos de fixação do montante da indemnização devida à ré, com fundamento na litigância de má-fé dos autores.

*** Inconformados, recorreram os autores para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por Acórdão de 13.11.2012 – fls. 813 a 817 – anulada a sentença recorrida, ordenando a repetição do julgamento para apreciação do art. 6º da B.I. com a seguinte redacção: “Antes da realização da assembleia-geral de 16 de Fevereiro de 2003, o autor AA assumiu-se perante os restantes sócios da ré como representante comum dos contitulares da quota dos autores?” *** Foi repetido o julgamento, tendo o teor de tal artigo sido dado como provado.

Foi proferida sentença em 31.1.2014 – fls. 1062 a 1148 – na qual foi decidido: “Termos em que julgo a presente acção não provada e improcedente e, em consequência, absolvo a ré de todos os pedidos.

- Condeno cada um dos autores AA; BB; CC; DD e EE, como litigantes de má-fé, na multa equivalente a 35 UCs.

- Condeno os autores AA; BB; CC; DD e EE, como litigantes de má-fé, a pagarem aos Ilustres Mandatários da ré, a quantia global de € 40.954,20, devidas por honorários – art. 457º nº 1 al. a) do Código de Processo Civil.” *** Inconformados, recorreram os Autores para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por Acórdão de 14.10.2014 – fls. 1413 a 1425 verso (7º Volume) – concedeu provimento ao recurso e, consequentemente, anulou a realização da assembleia de 16.02.2003, com as legais consequências. Mais, absolvendo os autores da condenação como litigantes de má fé.

*** A Ré recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões: A) Resulta claro do teor das alegações e conclusões dos ora Recorridos, apresentadas em sede de recurso de apelação perante o Tribunal a quo que as mesmas não cumprem os requisitos/formalismos previstos no artigo 640.°de Código de Processo Civil que constituem condição de admissibilidade e conhecimento do recurso pela relação.

B) Desde logo porque, pretendendo como pretendiam impugnar a decisão sobre matéria de facto deveriam os ora Recorridos ter especificado, não só os pontos de facto que na sua perspectiva foram incorrectamente julgados, mas quais os meios probatórios que pretendiam ver reapreciados e impunham decisão diversa, indicando, quando esses meios de prova se encontrem gravados, as concretas passagens da gravação em que funda a sua impugnação.

C) Esse ónus, não cumpriram os ora Recorridos, que se limitaram a fazer referências vagas e imprecisas à prova documental e testemunhal, cingindo-se em relação à primeira a reproduzir de forma parcelar e descontextualizada...

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