Acórdão nº 118/08.1GBAND.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução27 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum colectivo n.º 118/08.1GBAND do Juízo de Instância Criminal de ... (Comarca do ...), foi submetido a julgamento o arguido AA, ..., nascido ..., natural de ..., ..., residente na Rua ..., preso preventivamente à ordem deste processo desde 21 de Fevereiro de 2014.

BB, mãe dos menores CC e DD, filhos da vítima nos autos, com o qual vivia em condições análogas às dos cônjuges, em 5-12-2008 requereu a admissão da sua intervenção como assistente a fls. 737 aa (sic).

Em 21-10-2011 a assistente requereu a consulta dos autos com a finalidade de prestar a maior colaboração ao Ministério Público no inquérito - fls. 806 e original a fls. 822, o que foi deferido por duas vezes, a fls. 814 e 838, mas não sendo dado cumprimento da segunda por a mandatária já ter sido notificada como explica o termo de fls. 839.

O Ministério Público imputara ao arguido em acusação deduzida em 3-11-2011, de fls. 815 a 821, do 4.º volume, a prática de um crime de homicídio qualificado, p. p. pelo artigo 132.º, n.º 1 e 2, alíneas e) e j), do Código Penal e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, punido com a pena acessória de interdição de detenção, uso e porte de armas, nos termos do artigo 90.º daquela lei.

A assistente em 17-11-2011 aderiu à acusação pública, arrolando uma outra testemunha, conforme fls. 841/2 e em original fls. 848/9.

A assistente em 6-12-2011, de fls. 861 a 867 e em original de fls. 912 a 918, por si própria, deduziu pedido cível, em nome próprio pedindo a condenação do arguido a pagar a quantia total de € 111.279,60, sendo € 100.000,00, por danos não patrimoniais sofridos directamente pela demandante; € 11.279, 60, a título de reparação de danos patrimoniais directa e imediatamente sofridos pela demandante com a assistência educativa e psicológica aos dois filhos menores em virtude do assassinato do seu companheiro e danos patrimoniais futuros directamente emergentes para a demandante, com a assistência educativa e acompanhamento psicológico aos dois filhos menores em virtude do homicídio de CC, acrescidos de juros à taxa legal a partir da citação CC e DD, representados pela sua mãe BB, deduzindo pedido cível de fls. 869 a 877 e em original fls. 879 a 887, pedem a condenação do arguido a indemnizá-los, sendo € 125.000,00, por danos não patrimoniais sofridos directamente por cada um dos demandantes; o montante equitativamente determinado pelo julgador, no seu prudente arbítrio, a título de reparação pelos danos patrimoniais causados aos demandantes em virtude da perda do direito à vida do seu pai e o montante equitativamente determinado pelo julgador, no seu prudente arbítrio, entendido como justo e adequado para reparar os danos não patrimoniais e pela perda do direito à vida sofridos directamente pela vítima, acrescidos de juros à taxa legal a partir da citação.

******* Por acórdão do Colectivo da Comarca do ... - ..., de 15 de Julho de 2014, constante de fls. 1755 a 1821, do 7.º volume, depositado no mesmo dia, conforme fls. 1823, foi deliberado: Parte criminal 1 – Absolver o arguido do crime de homicídio qualificado, p. p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, alíneas e) e j), do Código Penal. 2 – Condenar o arguido pela prática de: 2. 1 – Um crime de homicídio simples, p. e p. pelo artigo 131.º do Código Penal, na pena de treze anos e seis meses de prisão; 2. 2 – Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de dois anos de prisão e na pena acessória de interdição de detenção, uso e porte de armas pelo período de três anos; 3. – Em cúmulo jurídico, foi fixada a pena única de catorze anos de prisão e a referida pena acessória. Parte cível Julgar parcialmente procedentes os pedidos de indemnização e condenar o arguido a pagar: 1 – À demandante BB a quantia de € 40.000,00, a título de indemnização por danos morais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da notificação para contestar o pedido até efectivo pagamento; 2 – Ao demandante CC a quantia global de € 100.000,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da notificação para contestar o pedido até efectivo pagamento; 3 – À demandante DD a quantia de € 110.000,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da notificação para contestar o pedido até efectivo pagamento.

******* Inconformados o arguido, a fls. 1842, e a assistente, a fls. 1942, interpuseram recurso do acórdão de ... para o Tribunal da Relação do ....

O arguido apresentou a motivação de fls. 1843 a 1898, impugnando matéria de facto e de direito, e a assistente apresentando a motivação de fls. 1942 a 1980, impugnando igualmente matéria de facto e de direito, requerendo a realização de audiência de julgamento, nos termos do artigo 411.º, n.º 5, do CPP.

Os recursos foram admitidos pelo despacho de fls. 1981.

O arguido respondeu ao recurso da assistente, conforme consta de fls. 1985 a 1994, e em original de fls. 1996 a 2004, e a assistente respondeu ao recurso do arguido como consta de fls. 2026 a 2042 e em original de fls. 2053 a 2069 e o Ministério Público apresentou resposta ao recurso do arguido, de fls. 2005 a 2014, e em original, de fls. 2016 a 2025.

Pelo despacho de 18-11-2014 proferido no Tribunal da Relação do ..., a fls. 2098, foram os recursos admitidos, seguindo-se a audiência em 3 de Dezembro de 2014, conforme fls. 2109/2010.

******* Por acórdão do Tribunal da Relação do ..., datado de 17 de Dezembro de 2014, constante de fls. 2112 a 2184 do 8.º volume, foi deliberado: 1 - Rejeitar o recurso interposto pela assistente; 2 - Conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido, reduzindo para 2.1 - 11 anos a pena de prisão pela prática do crime de homicídio simples; 2.2. - 1 ano e 6 meses a pena de prisão pela prática do crime de detenção de arma proibida; 2.3. - 11 anos e 6 meses a pena de prisão resultante do cúmulo jurídico; 2.4. - € 30.000,00, acrescida de juros legais, a indemnização devida à demandante BB; 2.5. - € 90.000,00, acrescida de juros legais, a indemnização devida ao demandante CC; 2.6 - € 100.000,00, acrescida de juros legais, a indemnização devida à demandante DD, mantendo-se no restante o acórdão recorrido.

******* Deste acórdão o arguido interpôs recurso para este Supremo Tribunal, a fls. 2191, discordando apenas da parte criminal, apresentando a motivação de fls. 2192 a 2205, que remata com as seguintes conclusões: 1ª- Não concordamos com a aplicação da pena privativa da liberdade relativamente ao Crime de Detenção de arma proibida, pois se atendermos aos factos dados como provados verificamos que a opção pela pena de prisão não se mostra necessária, adequada e proporcionada, ao serviço dos objectivos de prevenção geral e especial. Considerou o acórdão recorrido que a utilização da arma por parte do Arguido para a prática do crime de homicídio justifica a opção pela pena de prisão, o que não é aceitável, pois segundo este entendimento sempre que o arguido praticasse um crime com arma de fogo que admitisse pena de prisão, teria necessariamente de ser punido com pena de prisão pela prática do crime de detenção de arma proibida.

  1. - A justificação (única) avançada pelo Acórdão recorrido não se mostra suficiente para fundamentar a opção pela pena de prisão para o crime de detenção de arma proibida, em detrimento da pena de multa.

  2. - A aplicação de uma pena de multa ao Recorrente (atentas as suas condições económicas) permitirá a sua socialização e permitirá premiar uma pessoa que está preparada para manter uma conduta lícita, não obstante a situação excepcional e infeliz que ocorreu na sua vida e pela qual foi julgado no presente processo. O Arguido antes e após os factos sempre respeitou os bens jurídico-criminais, não apresentando por isso, qualquer tendência criminosa, conforme decorre do Certificado de Registo Criminal, o qual está imaculado (ponto 81 dos factos provados).

  3. - A subtracção do arguido à justiça não pode ser entendida como uma não interiorização do mal do crime ou como uma falta de contrição ou arrependimento, isto porque o Recorrente ao longo destes anos têm-se penitenciado por tudo o que aconteceu na noite dos factos e quando teve oportunidade de pedir desculpas aos familiares da vítima, fê-lo de forma sincera e comovida, o que ocorreu em sede de audiência de julgamento. Além disto, embora a conduta do arguido seja censurável aos olhos da comunidade, a mesma não atinge uma gravidade elevada, pois se atendermos à matéria dada como provada temos que a comunidade sabia e sabe que durante cerca de um ano a vítima insistiu para que o arguido lhe pagasse €10.000,00 que entendia ter direito; o arguido sentia medo da vítima, tanto mais que ele era possuidor de armas de fogo e costumava andar com uma arma; a vítima contratou os serviços de um terceiro para pressionar o arguido a pagar €10.000,00 e além dos mais, o Arguido é visto pela comunidade como uma pessoa cordata, pacífica, que não se mete em conflitos, respeitada e respeitadora; bem aceite e integrado no meio em que vivia e trabalhava e um homem trabalhador; no estabelecimento prisional continua a ser acarinhado pelos pais, filha, vizinhos e amigos e ali mantém um comportamento adequado, colaborador, sem reparos (pontos 35°, 36°, 37°, 39°, 41°, 44°, 45°, 46°, 76°, 77° dos factos dados como provados).

  4. - Da matéria dada como provada, depreende-se que a comunidade não considera a pena aplicada ao Arguido justa, mas antes excessiva, devendo por isso, ser aplicado ao Arguido AA uma pena de multa, atenta a sua situação económico-financeira (a qual está vertida na matéria dada como provada) pela prática do crime de detenção de arma proibida, a qual satisfará, na plenitude as exigências de...

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