Acórdão nº 1552/07.0TBPTM.E2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução29 de Setembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recurso de Revista nº 1552/07.0TAATM.E2.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I— RELATÓRIO AAPortugal, - ..., S.A., com sede no ..., Edifício …, ..., ..., instaurou acção declarativa de condenação sob a forma ordinária contra BB – …, Lda., com sede no ..., Lote …, ..., CC e DD, residentes na Rua ..., Lote …, r/c esq., ..., pedindo a condenação da 1ª ré a pagar-lhe a quantia de 115.370,80€ e a condenação dos 2.º e 3.º réus a pagarem-lhe, solidariamente, e por conta da quantia de 115.370,80€, o montante de 14.963,94€, acrescida de juros de mora vincendos sobre 112.108,99€ à taxa legal supletiva de 10,58% ou outra que venha a estar em vigor, até integral pagamento.

Alega para tanto, e em síntese, que no exercício da sua actividade comercial celebrou com a 1ª ré, em 7/12/1987, um contrato de cessão de exploração de um estabelecimento localizado num Posto de Abastecimento AA, sito no ..., ..., em que acordaram, entre outras cláusulas, que a falta de cumprimento por parte da ré de qualquer das obrigações do contrato, e em especial a falta de pagamento dentro dos prazos fixados, conferia à autora o direito de exigir tanto da cessionária como dos fiadores (os 2.º e 3.º réus) o pagamento de todas as importâncias que lhe fossem devidas, sendo que os 2.º e 3.º réus declararam ficar por fiadores e assumir a obrigação de principais pagadores (renunciando ao benefício da excussão prévia) da 1ª ré, declarando-se solidariamente devedores perante a autora até ao montante máximo de 14.963,94€.

Mais alegou que denunciou o contrato de cessão de exploração estando a 1ª ré em dívida para consigo no montante de 112.108,99€, pelo que accionou a garantia bancária prestada pelo Banco ... a seu favor, no montante de 49.879,79€, estando ainda vencidos juros no montante de 3.261,81€, contados à taxa legal comercial desde 18/01/2007.

Regularmente citados, a ré BB contestou excepcionando a ilegitimidade da autora por não ser representada pelo signatário da procuração a favor do mandatário, e disse não ser devedora do valor alegado pois tem ainda créditos a haver, estando a autora a litigar com má fé pretendendo obter uma vantagem patrimonial de forma ilegítima.

Afirmou ainda que na “conta corrente” invocada pela autora não foram creditadas notas de débito que a ré enviou, existem débitos que desconhece, e não foram creditados valores, que descriminou, a que tinha direito.

A final, deduziu reconvenção pedindo que a autora seja condenada: a) a compensar os créditos de 115.538,47€ que constituem um saldo a favor da ré, acrescida de juros à taxa legal em vigor a partir da data em que é deduzida a reconvenção e até efectivo e integral pagamento; b) a pagar à ré a quantia de 305.373,84€ a título de indemnização de clientela, acrescida de juros à taxa legal em vigor a partir da data em que é deduzida a reconvenção e até efectivo e integral pagamento; c) a indemnizar a ré por violação do denominado contrato de cessão na proporção da vantagem que obteve com a instalação da máquina multibanco, a calcular a final.

A ré DD contestou dizendo que cessou funções como gerente da 1ª ré a partir de 31/03/1997 e, na sequência do seu divórcio com o 2.º réu, ficou este com ambas as quotas da sociedade conforme escritura de partilha de bens celebrada em 23/03/1998. Invocou a nulidade da fiança alegando que o respectivo documento junto aos autos não contém os requisitos exigidos num contrato deste tipo, pois não estabelece o prazo de vinculação e o seu objecto é indeterminável, assim como não pode ser responsável pelo pagamento de juros de mora por nunca ter sido interpelada para pagar.

O réu CC contestou aderindo à contestação apresentada pela ré BB, e invocando a nulidade da fiança, por o respectivo documento ser de carácter genérico e indiscriminado quer no seu quantitativo quer na sua duração, e não pode ser responsável pelo pagamento de juros de mora por nunca ter sido interpelado para pagar.

A autora replicou contrariando o invocado pelos réus nas contestações.

No despacho saneador decidiu-se a tempestividade da réplica, a admissão da reconvenção, ser a autora parte legítima, e improcedentes as invocadas nulidades da fiança, tendo-se convidado a autora e a 1ª ré a aperfeiçoarem os seus articulados no âmbito que se lhes apontou.

Inconformados com o despacho que admitiu a réplica dele agravaram todos os réus, e os dois primeiros também do despacho de indeferimento da aclaração.

Saneado e condensado o processo, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, seguida da prolação da sentença que julgou parcialmente procedentes a acção e a reconvenção.

Inconformada com tal decisão dela apelou a ré BB.

O Tribunal da Relação de Évora, no Acórdão de 16/12/2010, começou por conhecer do agravo interposto concluindo pela tempestividade da réplica, consequentemente negando-lhe provimento. No referente à apelação julgou-a procedente, embora por razões diferentes das apresentadas pela apelante, e ordenou se procedesse à ampliação da matéria de facto com o aditamento à base instrutória de novos factos alegados pelas partes, com realização de nova audiência de julgamento, e consequente anulação da sentença (fls. 2082/2114).

Mantendo-se inconformada, a ré BB recorreu desta decisão na parte em que negou provimento ao agravo, alegando estar o decidido em oposição com o Acórdão deste Supremo Tribunal de 28/05/2009, no Agravo nº 85/09 que certificou.

O Acórdão deste Supremo Tribunal de 15/11/2011, desta mesma conferência, decidiu não tomar conhecimento do objecto do agravo por o mesmo ser inadmissível.

Regressados os autos ao tribunal da 1ª instância, aí se procedeu ao aditamento à base instrutória dos quesitos 48.º a 71.º, realizou-se novo julgamento, e, foi proferida nova sentença que julgou a acção e a reconvenção parcialmente procedentes e, depois de operada a compensação de créditos invocada, condenou a ré BB a pagar à autora a quantia de 97.718,31€, sendo ainda deduzido o valor da perda da margem de lucros nos produtos de loja e lavagens enquanto o Posto esteve encerrado, a apurar em sede de liquidação de sentença.

À quantia devida pela ré BB acrescem juros de mora vencidos, contados a partir da data de vencimento de cada uma das facturas, sobre a quantia respectiva (com observância do disposto no art. 855º 1 do Cód. Civil), e juros de mora que se vencerem até integral pagamento, sendo todos os juros calculados à taxa legal comercial que vigorar em cada momento.

Foram ainda os réus CC e DD condenados a pagar, solidariamente, à autora, e por conta da dívida da ré BB supra referida, valor até ao montante máximo de 14.963,94€. Do mais que lhes era pedido foram os réus e a autora absolvidos (fls. 2344/2370).

De novo inconformados com tal decisão dela apelaram os réus BB e CC, sem êxito, porquanto a Relação de Évora, por unanimidade, no seu acórdão de 25/09/2014, julgou o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida (fls. 2514/2566).

Irresignados, pediram os mencionados réus revista excepcional a este Supremo Tribunal, invocando o estatuído no art. 672.º, nº 1, als. a) e b) do Novo Código de Processo Civil, recurso que, todavia, foi admitido como revista regra por ao caso não ter aplicação a dupla conformidade.

Nas alegações que apresentaram formulam as seguintes conclusões: I - No caso ora em crise, está em discussão a aplicação do regime referente aos contratos de agenciamento, nos contratos de concessão comercial.

II - Tal aplicação, embora legalmente permitida, implica as necessárias adaptações quando aplicada de um regime para outro, sendo que tal abertura permite em ultimo caso ao juiz ter uma enorme discricionariedade sobre a aplicação e adaptação das normas entre os dois tipos diferentes de contrato.

III - Discricionariedade essa que varia de caso para caso e que não se encontra balizada de forma alguma na lei, concretamente quanto à prerrogativa de indemnização de clientela, dando assim poderes para que nuns casos seja aplicada e noutros casos o não seja.

IV - Porém, é de curial importância balizar-se quais os pressupostos da aplicação desta figura quando se trata de uma contrato de concessão comercial, algo que a lei não prevê.

V - Pelo que com tal decisão, tanto em 1ª instância, como em sede de apelação, foi pelos meritíssimos juízes aberta a possibilidade dos grandes grupos empresariais, mascararem os contratos celebrados com pequenas entidades sob a forma de concessão comercial, aplicando os primeiros a sua marca e os seus produtos e com isso nunca serem devedores de qualquer indemnização de clientela, visto considerar-se que foi a marca e não o cessionário que angariou a clientela, conforme foi entendimento das decisões anteriormente proferidas no presente processo.

VI - Tal entendimento, leva a que um cessionário seja sempre e constantemente engolido pelos grandes grupos empresariais, enriquecendo estes sem que seja dada a devida compensação a quem na realidade ajudou ao seu crescimento, estando assim patente a relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito, assim como um interesse de particular relevância social.

VII - O douto acórdão recorrido fez incorrecta interpretação e aplicação da figura da indemnização de clientela ao caso em concreto.

VIII - Resulta inequívoco que os comportamentos dos aqui recorrentes, se enquadram no regime do contrato de agência, previsto no artigo 28 do Decreto-Lei 178/86 de 03 de Julho, uma vez que todas as definições contidas nesse artigo, estão espelhadas no desempenho que os aqui recorrentes levaram a cabo durante 19 anos.

IX - Como é sabido, “o contrato de concessão comercial não beneficia de um regime jurídico próprio. É nessa medida, um contrato legalmente atípico, pese embora a tipicidade social de que goza”, vide António Pinto Monteiro in Revista de Legislação e Jurisprudência, p. 119.

X - Neste sentido, confirmou o Tribunal da Relação de Évora em sede de apelação que, é pacífico que o aludido contrato é um contrato misto de cessão de exploração e de concessão...

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