Acórdão nº 2572/12.8TBPDL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Setembro de 2015
Magistrado Responsável | NUNO CAMEIRA |
Data da Resolução | 22 de Setembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
Síntese dos termos essenciais da causa e do recurso Com fundamento no artº 1311º do CC, AA propôs uma acção ordinária de reivindicação contra BB, pedindo para ser reconhecido como proprietário da fracção autónoma que o réu, seu pai, ocupa sem título e contra a sua vontade, e a condenação do réu a entregar-lha.
O réu contestou e deduziu reconvenção, alegando, substancialmente, que seus pais (avós do autor) lhe entregaram em 1994 (tinha então o autor dois anos de idade) o espaço correspondente ao rés do chão reivindicado, para que nele passasse a habitar enquanto fosse vivo; que na sequência disso efectuou diversas obras de adaptação e remodelação do imóvel que importaram em 60 mil €, passando a viver nele, juntamente com o autor e a mãe deste, então sua mulher, desde 1994 até à ruptura da sua vida conjugal, ocorrida em 2010; que só não foi registado qualquer “direito de usufruto” a seu favor porque o autor era menor à data em que foi celebrada a doação, ficando então “para mais tarde, e após a maioridade do autor, que este constituísse o direito de usufruto a favor do R, seu pai”; que existe um documento escrito em poder do autor e no qual o seu avô (pai do réu) “manifesta a sua vontade de constituir usufruto a favor de seu filho, o ora R, sobre a fracção autónoma que doou ao neto e objecto da presente acção”; e que a fracção autónoma dos autos é a sua única casa de morada de família.
Pediu, assim, a improcedência da acção e, em reconvenção, a condenação do autor na constituição a seu favor do usufruto vitalício sobre a fracção autónoma identificada na petição inicial, ou, “em alternativa”, no pagamento dos 60 mil € correspondentes ao valor das obras efectuadas no espaço reivindicado, reconhecendo-se por via deste crédito - a ele, reconvinte - o direito de retenção sobre o prédio ajuizado.
Cumprida a tramitação legal - com réplica, despacho saneador, fixação da matéria assente e base instrutória e audiência de julgamento - foi proferida em 14/2/14 sentença nos seguintes termos (transcrição):
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Julgo a acção totalmente improcedente e consequentemente absolvo o réu do pedido; b) Julgo a reconvenção procedente, na exacta medida da conversão do pedido reconvencional, e em consequência decreto a anulação da doação titulada pela escritura pública outorgada no dia 9/3/2004, em que foram declarantes, como donatários, CC e DD, relativamente à fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão direito, destinada a habitação, do prédio constituído em propriedade horizontal sito na ..., nº … nº/ …, ... e ..., ..., ... (...), concelho de ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n. ° … da dita freguesia, e inscrita na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ….
Por acórdão de 12/3/15 a Relação de Lisboa julgou procedente a apelação do autor, decidindo assim (transcrição): 1) Julgam parcialmente procedente o pedido do A, pelo que vai o R condenado a reconhecer o direito de propriedade do A sobre tal imóvel; 2) Julgam procedente o pedido reconvencional, obrigando-se as partes à constituição do usufruto sobre o imóvel, objecto da doação, por contrato, nos termos do artº 1440 do CC num prazo máximo de 60 dias.
Inconformado, o autor interpôs recurso de revista, que concluiu do seguinte modo: 1º - O douto acórdão recorrido determina judicialmente a constituição dum usufruto a favor do recorrido sobre o imóvel dos autos; 2º - A constituição do usufruto está vedada aos tribunais por força do disposto no artº 1440º do Código Civil; 3º - Ao determinar o contrário, embora por forma indirecta, o douto acórdão recorrido viola aquele dispositivo legal, pelo que deve ser mandado modificar, ainda que, por respeito à verdade material, o pudesse ser em direito de habitação previsto no artº 1484º do CC.
O recorrido contra alegou, sustentando a manutenção integral do acórdão recorrido e afirmando expressamente que acata “a parte em que foi condenado”.
Tudo visto, cumpre decidir.
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Fundamentação 2.1.
Matéria de Facto
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O autor nasceu em 1/9/1991, sendo filho do réu e de EE. (A).
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O réu é filho de CC e de DD. (B).
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O espaço correspondente ao rés-do-chão direito foi entregue por CC e DD ao réu no ano de 1994... (1º).
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... para que este aí passasse a habitar, com a sua família, enquanto fosse vivo, sem a obrigação de pagamento de qualquer renda ou compensação ... (F) e resposta aos quesitos 2º e 3º).
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... o que veio a suceder. (resposta ao quesito 4º).
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O autor residiu no local desde então, com o seu pai e a sua mãe, até 2010, data em que o réu e EE romperam a comunhão conjugal. (Resposta aos quesitos 5º,6º e 7º).
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O réu e a então sua mulher EE, na sequência da entrega e recepção da fracção por CC e DD, foram ao longo do tempo realizando obras de remodelação do espaço exterior, nomeadamente o alpendre, a churrasqueira, o canteiro e o mesão de cimento, pavimentação em betonilha e drenagem pluvial (com caixas, tampas e ligações), e no interior realizaram obras de remodelação da casa de banho, da sala, da cozinha, dos quartos, do sistema eléctrico e da rede de água e pinturas de manutenção, tudo importando num valor que se estima em 39.500 €. (H) e resposta aos quesitos 8º e 9º).
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Por escritura pública outorgada em 9/3/04, CC e DD declararam doar ao autor, por conta da quota disponível, a fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao...
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