Acórdão nº 34/13.5TTCLD.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução16 de Setembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – AA Instaurou a presente acção declarativa emergente de contrato de trabalho, no Tribunal do Trabalho das ..., contra: BB, S.A.

Pedindo que a presente acção seja julgada procedente e, em consequência, a Ré condenada a pagar-lhe as seguintes quantias: a) € 9.751,39 - a título de subsídio de agente único; b) € 1.124,65 - a título de subsídio de agente único nas férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; c) € 4.019,40 - a título de descanso compensatório não gozado; d) € 51.201,04 - a título de pagamento de despesas com tempo e kms percorridos com deslocações.

Tudo acrescido de juros de mora, contados à taxa legal sobre as mencionadas quantias, desde a citação até efectivo e integral reembolso.

Alegou, para o efeito e em síntese, que: O Autor foi admitido ao serviço da Ré em 06/10/1980, para desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de motorista de passageiros, tendo o contrato cessado por ter passado à situação de reforma por invalidez, em 2 de Maio de 2012.

De acordo com o AE aplicável, tinha direito ao subsídio de agente único, que a Ré apenas lhe pagou parcialmente.

Integrando tal subsídio, inequivocamente, a retribuição do Autor, devia ter sido levado em conta no pagamento de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Acresce que o Autor prestou trabalho em dia de descanso semanal e em dias feriados, e a Ré não lhe proporcionou o gozo dos respectivos dias de descanso compensatórios ou remunerados.

O Autor, por ordem da Ré, deslocava-se diariamente de ..., onde residia, conduzindo a sua viatura para o local onde iniciava a carreira, no Terminal Rodoviário da ..., percorrendo uma distância diária de ida e volta de 43 kms, na qual despendia diariamente uma hora.

Sucede que a Ré nunca lhe pagou os custos inerentes a tais deslocações, isto é, o tempo despendido pelo Autor nas referidas deslocações, bem como os kms por ele percorridos.

  1. A Ré apresentou contestação na qual:

    1. Excepcionando – deduziu a prescrição dos juros de mora vencidos há mais de 5 anos, invocando, para o efeito, o disposto no art. 310.º, al. d), do CC; b) Impugnando – argumentou que o subsídio de agente único é pago apenas relativamente às horas de condução (quando o motorista execute uma carreira em regime de agente único e não, por exemplo, serviço ocasional ou serviço regular especializado), pelo que não é devido; todavia, reconhece que tal subsídio tem carácter retributivo e, por isso, ultimamente tem sido pago na remuneração de férias, bem como nos subsídios de férias e de Natal.

    Quanto aos descansos compensatórios, considera que não estão previstos na legislação à data vigente e mesmo com a aprovação dos Cód. do Trabalho de 2003 e 2009 (este até à alteração decorrente da Lei nº 23/2012, de 25/06) os regimes de descansos compensatórios pelo trabalho suplementar prestado, em dia útil, não são aplicáveis aos trabalhadores de transportes rodoviários de passageiros, por incompatibilidade com a especificidade das regras de organização do tempo de trabalho destes trabalhadores.

    Por outro lado, o Autor não alegou que tivesse existido acordo entre as partes para a substituição dos descansos compensatórios que eventualmente lhe fossem devidos a esse título, sendo que tal acordo nunca existiu.

    Quanto às despesas de transporte/compensação pelo tempo gasto em deslocações, o Autor não tem direito às mesmas, porquanto diversamente do que alegou, tais quantias não se enquadram na previsão da cláusula 54.ª do AE RN/FESTRU, para além de que desde 25/10/1983, até à cessação do contrato de trabalho, o local de trabalho do Autor foi na ....

    Concluiu pugnando pela procedência da invocada excepção de prescrição de juros e pela total improcedência do pedido e da acção.

  2. O Autor respondeu à contestação.

    4.

    Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença cuja parte dispositiva transcrevemos: “Em face do exposto:

    1. Julgo não provada e improcedente a invocada excepção peremptória de prescrição do crédito de juros moratórios vencidos há mais de 5 anos.

    2. Julgo a presente acção parcialmente procedente e provada e, consequentemente, condeno a Ré “BB, SA” a pagar ao Autor AA a quantia global de € 40.586,25, a título de créditos laborais, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação, e vincendos, até integral pagamento, contados à taxa anual de 4%.

    - Custas a cargo de A. e R., na proporção do decaimento”.

  3. Inconformada, a Ré Apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra que proferiu acórdão no qual: - Julgou procedente a apelação e revogou a sentença na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 37,461,60, a título de despesas de deslocação; - Manteve, no mais e porque não impugnadas em sede recursiva, a restante condenação operada pela sentença e a improcedência da excepção de prescrição.

  4. Insurgiu-se o Autor mediante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões: 1. Com o devido respeito por opinião contrária, não decidiram bem os Venerandos Desembargadores ao julgarem procedente a Apelação, revogando a Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, na parte em que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 37.461,60 a título de despesas de deslocação.

  5. Considera o Douto Acórdão proferido: a. “É que a sentença considerou o acréscimo de distância entre a "residência contratual" do Autor e a filial da ..., quando o que releva é o acréscimo em relação ao local de trabalho anterior.

    b. E "local de trabalho" e "residência contratual" não são sinónimos: o primeiro diz respeito ao local onde o trabalhador foi contratado, segundo a referida cl.ª 17.ª do AE; enquanto a segunda é a residência que o trabalhador detém para efeitos do vínculo contratual que mantém com a empregadora, nomeadamente para todo o tipo de comunicações entre eles.

    c. Assim sendo, a comparação deverá ser feita entre o que o Autor despendia na deslocação para o seu anterior local de trabalho – filial das ... – em relação ao despendido na deslocação para a filial da ....” d. Termina, o Acórdão recorrido, divergindo da decisão tomada pelo Tribunal de 1.ª Instância: e. “Citando a recorrente” as despesas de transporte que a Ré teria de custear não eram todas as que o A. realizou, mas apenas as acrescidas, isto é, aquelas que ele não teria suportado se não fosse a alteração do local de trabalho" f. Para além de o Autor nada ter provado a esse respeito, como lhe competia... é pertinente a observação da Ré, cuja veracidade confirmámos, de que “uma pesquisa rápida em www.google mostra-nos que a residência do A., sita na Rua …, em ..., dista 20,8 kms do Terminal Rodoviário das ..., sito na Rua … e 21,2 Kms do Terminal Rodoviário da ..., sito na Rua ...”.

    g. Tornando irrelevante, em conformidade, a factualidade vertida nos pontos 148 e 149.

  6. Porém, resultou provado em audiência de julgamento que: a. Em 6/10/1980, o A. foi admitido ao serviço da CC, sendo o local de trabalho na filial da ...; b. Em 3/05/1981, a CC transferiu o A. para a filial das ...; c. Em 25/10/1983, a CC alterou o local de trabalho do A, transferindo-o para a filial da ...; sendo que até Maio de 1994, o A iniciava a sua actividade na ..., ... e apenas em meados de 1994 é que passou a iniciar a sua actividade na filial da ....

    d. Desde 6/10/1980 (data da admissão do A.) até 22/02/2012 (data da cessação do contrato de trabalho), o A. manteve a mesma residência, sita na Rua do …, em ..., ....

  7. Assim, a partir de 25/10/83, data da alteração do local de trabalho, temos que considerar dois períodos temporais distintos no que concerne ao acréscimo dos custos com as deslocações do A: a. Num primeiro período, o A. deslocava-se apenas da sua residência, em ..., para a ..., ..., que dista apenas 4 km da sua residência, onde iniciava a carreira pelas 7h 15m, terminando no mesmo local, pelas 20h, assim permanecendo durante cerca de 10 anos e 7 meses.

    b. Num segundo período, contabilizado a partir de meados de 1994, até à cessação do contrato de trabalho, o A passou a deslocar-se, em viatura própria, da sua residência, em ..., até ao terminal da ..., onde iniciava a sua actividade, efectuando, diariamente 43 km.

  8. Só a partir de meados de 1994, é que o A. passou a iniciar, de facto, as suas funções na filial da ..., peticionando, as despesas com as deslocações relativas aos anos, 1994, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011.

  9. Confirmando a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância com apelo ao disposto no art. 21º, n.º 1, al. e), da LCT e 24.°, e no n.º 5 do artigo 315.° do CT de 2003, às Cláusulas 17.ª e 18.ª da AE RN/FESTRU, resulta que a entidade empregadora custeará sempre as despesas feitas pelo trabalhador decorrentes da transferência.

  10. Considerando-se ainda, ser da mais elementar justiça que seja o empregador a pagar o aumento de despesas de transporte resultante da transferência, já que foi ele que a impôs e no seu interesse.

  11. Caso venha a manter-se o Acórdão proferido, caberá ao A., ao invés da obrigação que sobre a Ré impendia, suportar o acréscimo dos custos devidos pela mudança de local de trabalho e imposta pela Ré.

  12. Ao decidir como decidiu, o Acórdão recorrido, violou os artigos 21.° n.º 1, al. e), da LCT e 24.°, e no n.º 5 do artigo 315.° do CT de 2003, art. 194.° n.º 4 C.T. de 2009 e Cláusulas 17.ª e 18.ª da AE aplicável.

  13. Pelo que se conclui no sentido de que a revista deve ser concedida, revogando-se o Acórdão recorrido, e mantendo-se a decisão proferida em 1ª Instância.

  14. As contra-alegações da Ré foram desentranhadas dos autos por terem sido oferecidas fora de prazo.

  15. A Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal emitiu pronúncia no sentido de que deve ser concedida revista, com a consequente revogação do acórdão recorrido e repristinação da decisão da 1ª instância – cf. fls. 618 e segts, do 3º Vol.

    Fundamentou o seu entendimento, em síntese, nos seguintes pontos: · Resulta das disposições pertinentes citadas nos autos que...

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