Acórdão nº 16/16.5TRLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução05 de Abril de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 16/16.5TRLSB.S1 Recurso de revisão[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. Findo o inquérito, face à inexistência de indícios da prática de crime, o Ministério Público não formulou acusação, determinando o arquivamento dos autos.

  1. Veio, então, a assistente, AA Lda, requerer abertura de instrução, pugnando pela pronúncia de BB.

  2. No Tribunal da Relação de Lisboa, o Senhor Juiz Desembargador relator, considerando que o requerimento de abertura de instrução não cumpria as exigências de conteúdo impostas pelo artº 287 nº2 do C.P.Penal, indeferiu o requerimento de abertura de instrução formulado pela assistente, AA Lda, com fundamento na inadmissibilidade legal da instrução, nos termos do disposto no nº3 do citado art. 287º.

  3. Inconformada com esta decisão, a assistente dela interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: «1°. O despacho recorrido viola o que determina o artº. 287°. nº. 3 do CPP. na medida em que só, é de recusar a abertura de instrução, desde que seja: a) extemporâneo; por incompetência do Juiz ou por inadmissibilidade da instrução, o que não ocorre.

    1. Invocar-se no indeferimento: a) A falta de narração de factos na acusação.

      b) A falta das razões da discordância com o despacho de arquivamento.

      É algo que não é compatível com o disposto no artº. 283°. n°. 3 b) e c) do CPP. porquanto de todo o referido foi feita menção expressa, no dito requerimento: - das razões da discordância, de facto e de direito - dos factos - da Lei violada.

    2. O requerimento que mereceu o despacho de indeferimento aqui sob recurso, obedece ao que impõe o arto. 283°. nº. 3, b) e c) do CPP. e basta dar leitura ao requerimento em causa, para tal se constatar.

    3. Termos em que, nos termos do artº. 287°. n°. 3 do CPP. se deve revogar o despacho recorrido e assim se determinar pela abertura da instrução, porquanto não é admissível deixar alguém impune que nada promoveu contra quem: a) Descaminhou bens apreendidos à ordem do Proc. 995/09.9 TDLSB.

      b) Danificou bens apreendidos à ordem do Proc. 995/09.9 TDLSB.

      c) Silenciou ou nada promoveu, contra quem causou o prejuízo, ao Estado Português constante da sentença junta aos autos e à assistente.

      d) Só não vê tal, quem não quer; não pode ou então, entende que os factos transcritos na acusação se devem entender por “não factos"».

  4. Respondeu o Exmº Procurador Geral Adjunto no Tribunal da Relação de Lisboa, concluindo que: «1. O requerimento do assistente de abertura de Instrução não cumpre minimamente as exigências legais (artº 283º, n. 3 do CPP, ex vi seu artº 287º, n. 2), pelo que não permite a definição do objecto da instrução, assim tornando-a inexequível; 2. O que é motivo para a sua rejeição - por inadmissibilidade legal, nos termos do n. 3 do artº 287º CPP – não havendo lugar a prévio “convite” de aperfeiçoamento.

  5. Pelo exposto, o recurso não merecerá provimento, mantendo-se o arquivamento dos autos».

  6. A Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta, neste Supremo Tribunal, emitiu douto parecer, do qual se transcreve o seguinte excerto: «Apenas, segundo nos parece, a questão a apreciar pode resumir-se Á inexistência de fundamento legal para rejeitar o requerimento de abertura de instrução, uma vez que o mesmo obedece ao disposto no artigo 283.º n.º 3, b) e c) do Código de Processo Penal.

    1- A instrução é uma fase que visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento (vide art.º 286.º n.º 1 do Código de Processo Penal).

    O requerimento de abertura de instrução não esta sujeito a especiais formalidades exigindo a lei, contudo, que o mesmo “ deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente pretenda que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenha sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e outros, se espera provar, sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 3, do artigo 283.º ..”(Ac. STJ de 13 /1/2011, proc. n.º 3/09.0YGLSB. S1).

    Assim, quando o tribunal não acusa, e estamos perante um crime público ou semipúblico, o assistente pode apresentar um requerimento para abertura de instrução que corresponderá à dedução de acusação.

    Nestes casos se for aberta a instrução, a decisão instrutória a proferir só poderá recair sobre os factos que constem do requerimento para a respectiva abertura, ficando o objecto do processo delimitado por esses factos.

    Tal vinculação é, aliás, corolário lógico do princípio da “ vinculação temática” característico do acusatório e da finalidade da instrução.

    Neste sentido vide Teresa Beleza (“Apontamentos de Direito Processual Penal, AAFDL, 1995, III vol., pág. 90) “A partir da acusação ou do requerimento para abertura da instrução, o objecto do processo fixa-se nos seus limites máximos. O JIC ou o Tribunal de Julgamento só poderão decidir dentro desses limites …”.

    Estabelece o número 3 do artigo 287.º do Código de Processo Penal, que o requerimento para abertura de instrução “ só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução.” 2 - No caso concreto, o requerimento apresentado pelo assistente visava a comprovação judicial da decisão de arquivamento do inquérito e foi rejeitado com fundamento na sua inadmissibilidade legal uma vez que não cumpre as exigências de conteúdo impostas pelo artigo 287.º n.º 2 do CPP.

    2.1 -No que se refere ao conceito de inadmissibilidade legal a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a entender que se insere neste conceito com a consequente rejeição do requerimento de abertura de instrução “ quando, pela simpres apreciação do requerimento de abertura de instrução, e sem recurso a qualquer elemento externo, o juiz concluir que os factos narrados pelo assistente jamais poderão levar à pronúncia do arguido e bem assim à eventual aplicação de uma sanção, após o respectivo julgamento terá de considerar-se que a fase instrutória é inútil e, como tal, legalmente inadmissível (Despacho do proc. 15/14.1YGLSB.S2 em 17/6/2015 e, no mesmo sentido ainda os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/6/ 2014, proc. 7/14.0YGLSB.S1).

    2.2.

    - Nestes casos, e face ao princípio da vinculação temática e consequente vinculação factual a que o juiz tem de obedecer, a instrução passa a constituir um acto processual inútil, redundando esta fase processual, necessariamente num despacho de não pronúncia.

    A jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça chama particularmente atenção que a inadmissibilidade legal resulta assim, “nesses casos, da violação do princípio da economia processual, entendido na dimensão de proibição da prática de actos inúteis, tal como se encontra estabelecido no artigo 130.º do Código de Processo Civil.

    E embora o Código de Processo Penal não contenha norma equivalente, aquele preceito do processo civil pode ser aplicado no processo penal conforme permite o art.º 4 do correspondente Código, na medida em que se harmoniza em absoluto com o processo penal. Com efeito, é a proibição da prática de actos inúteis que subjaz à norma do artigo 311.º, que permite ao juiz rejeitar a acusação manifestamente infundada, e, bem assim, à do artigo 420.º n.º 1 alínea a) onde se prevê a rejeição do recurso quando for manifesta a sua improcedência “ (Ac. STJ de 11/2/ 2016, proc. 15/14. 1UGLSB.SB.S2.).

  7. Ter-se á de verificar se tendo em conta o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo recorrente, se verifica, ou não, uma situação de falta de indicação dos elementos essenciais da prática do crime de denegação de justiça e prevaricação e, do crime de abuso de poder, previstos e punidos, respectivamente, pelos art. 369.º e 382.º CP, com referência ao art. 386.º C P.

    Conforme resulta do despacho de arquivamento proferido nos autos a fls 287 a 293, os factos narrados e imputados aos denunciados não integram a prática dos crimes inscritos na denúncia ou de qualquer ilícito criminal.

    Ora, a factualidade descrita no requerimento de abertura de instrução é a mesma que foi objecto do despacho de arquivamento proferido nos autos, o que desde logo releva para a inutilidade processual da instrução.

    E, como consta do despacho recorrido o indeferimento de abertura de instrução assenta no entendimento que “no que se refere ao não exercício da acção de regresso, face à condenação do Estado Português , escapa-se-nos a razão pela qual o assistente entende que a responsabilidade pela iniciativa da mesma caberia ao denunciado. Na verdade, é o próprio requerente que afirma que a condenação do Estado no pagamento de uma indemnização se fundou em factos que sucederam no âmbito processo n.º 2741/07. Ora, se assim é, e se o denunciado- pelo menos atento o que consta do arrazoado acusatório – não teve intervenção em tal processado, porque razão lhe caberia a si a responsabilidade de propor tal acção ? Ignora-se e não se vislumbra factualidade que minimamente o determine,” (…) Por outro lado, afirma ainda o assistente que a inacção do denunciado teria por objecto facilitar a prova da acusação (no processo em cujo o julgamento intervinha, o n.º 995/09), impedindo o arguido DD de se defender.

    Parece assim resultar implicitamente que, esse processo n.º 995/09 será um processo-crime, em que o arguido se chamará DD. Sucede, todavia, que, DD não se constituiu assistente nos presentes autos. De facto, embora esse nome (cremos que corresponderá à mesma pessoa) apareça como representante legal da ora assistente, a verdade é que não tem nestes autos qualquer utilidade autónoma, enquanto pessoa singular, para sequer requerer instrução, relativamente a factos que a si digam respeito.

    Para além do mais, e ainda que assim se não entendesse, sempre se diria que por enunciar se mostra...

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