Acórdão nº 262/14.6TBCMN-A.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução15 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

A executada AA veio deduzir oposição à execução para pagamento de quantia certa que lhe foi movida por BB, mediante embargos, alegando, em síntese: O cheque dado à execução encontra-se prescrito por ter sido apresentado a pagamento mais de 8 dias desde a data da sua emissão, não estando o mesmo dotado de força executiva, pese embora o exequente tenha alegado a relação contratual a ele subjacente.

Mais alega que o aludido cheque foi entregue ao exequente apenas como garantia de pagamento da quantia nele aposta (€ 50 000), correspondente ao sinal previsto no contrato promessa de compra e venda de um imóvel celebrado entre as partes, tendo a executada/embargante, na altura em que assinaram o aludido contrato, entregue ao exequente a quantia de € 50 000 em numerário, a título de sinal e princípio de pagamento do preço acordado, pedindo logo àquele que lhe fosse devolvido o cheque que havia entregue, desculpando-se o mesmo com o facto de o ter esquecido em casa e assegurando-lhe que o devolveria à executada através do seu mandatário Dr. CC, tendo este posteriormente se recusado a entregar-lhe o cheque, alegando que o exequente não o tinha autorizado a entregar.

Invoca, ainda, a nulidade do contrato promessa subjacente ao título executivo, nos termos do art°. 410°, n°. 3 do Código Civil e por não ter sido lido nem explicado à executada/embargante, pois embora esta entenda algumas palavras em português, tem dificuldade em falar, ler ou escrever português.

Conclui, pedindo a procedência da oposição à execução e a condenação do exequente como litigante de má-fé, em multa e indemnização a favor da embargante, em montante a fixar pelo Tribunal, bem como a entregar à embargante o cheque oferecido como título executivo por não ser legítimo possuidor do mesmo.

  1. Contestou o exequente impugnando a matéria invocada pela embargante no seu articulado inicial e defendeu a improcedência das excepções invocadas, alegando, em suma, que: O cheque dado à execução, embora prescrito, pode servir de título executivo como mero quirógrafo, desde que o exequente alegue a relação jurídica subjacente, o que aconteceu "in casu".

    Esse cheque foi-lhe entregue pela executada por forma a reservar para si a aquisição do aludido imóvel, tendo aquela pedido ao exequente que não o depositasse de imediato, pois estava a correr em … o processo de divórcio da executada, estando cativas à ordem do mesmo avultadas quantias a ela pertencentes.

    O contrato foi devidamente explicado à executada, nunca tendo esta solicitado um exemplar do mesmo traduzido em francês, nem em momento algum revelou dificuldades na compreensão da língua portuguesa, para além de que a mesma bem sabia que estava a prescindir do reconhecimento presencial das assinaturas apostas no contrato, sabendo igualmente que lhe está vedada a invocação de tal vício, agindo aquela em abuso de direito ao invocar a nulidade do contrato promessa.

    Conclui pedindo a improcedência da oposição.

  2. Findos os articulados foi realizada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador no qual foi julgada improcedente a excepção de falta do título executivo suscitada pela embargante.

    Fixou-se o objecto do litígio e foram enunciados os temas de prova, que não sofreram reclamações.

    Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.

    Após, foi proferida sentença que julgou procedente a oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, declarou extinta a instância da acção executiva apensa, julgando, ainda, improcedente o pedido de condenação do exequente/embargado como litigante de má-fé.

  3. Inconformado, apelo o exequente/embargado para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, por Acórdão de , revogou a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, e julgou «improcedente a presente oposição à execução mediante embargos de executado», determinando o prosseguimento da execução.

  4. Inconformado, a executada/embargante AA, recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1ª.

    Infere-se do Acórdão recorrido uma contradição entre a motivação e os factos dados como provados 2ª. A saber, afirma não ter qualquer reparo a fazer à apreciação da matéria de facto mantendo inalterada a matéria de facto dada como provada e não provada, mas depois apresentam conclusões baseadas em factos que não constam do elenco da matéria de facto.

    1. Concretizando, afirmam que o cheque foi entregue a título de sinal e que o mesmo foi devolvido por falta de provisão.

    2. Ora, em lado algum consta, nem na sentença recorrida que o cheque foi entregue a título de sinal e que tenha sido devolvido por falta de provisão, cft. factos n° 2 e 10 dados como provados e constantes desta peça.

    3. Dos autos consta prova documental que atesta o motivo da devolução: desautorização do seu pagamento por parte da executada.

    4. Sendo tais factos relevantes para enquadramento jurídico dos factos efectivamente provados e não provados, deve o Acórdão revidendo ser declarado nulo nos termos do art. 615° n° 1 alínea c) do CPC, na medida em que a conclusão III do Acórdão está em contradição com a afirmação de manter a matéria factual provada e não provada na 1ª. instância e com o elenco dos factos provados e não provados.

      Sem prescindir 7ª.

      O art. 441° do Código Civil prescreve que no contrato- promessa de compra e venda presume-se que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço.

    5. O Tribunal recorrido fez uma incorrecta interpretação do art. 441° do CC. Por entender que o cheque mesmo não sendo pago deve ser incluído nesta norma, sendo considerado sinal.

    6. Tal entendimento despe de razão de ser o teor da norma do art. 441°, na medida em que equipara a entrega de uma quantia à entrega de um cheque.

    7. Também, retira a função essencial do cheque e do sinal, já que sendo aquele tão, somente um meio de pagamento só poderá corresponder a entrega de quantia quando a quantia nele aposta é entregue.

    8. Assim, o Tribunal de 1ª. instância entendeu e bem que sinal foi a quantia de 22.000,00€ que o recorrido recebeu e já não o cheque que como podemos constatar da matéria de facto provada não foi entregue e título de sinal mas no valor do sinal.

      Neste sentido veja-se os Acórdãos mencionados pelo Tribunal de 1ª. Instância e também os aqui expostos na motivação 12ª.

      Portanto, deve revogar-se o acórdão em revisão por também constituir uma violação da norma contida no art. 441° do CC e por contrariar isoladamente a jurisprudência dominante colocando em causa a segurança jurídica.

    9. O Acórdão do STJ de 14/09/2006 proferido na revista n° 1245/06 defende que deve ser tido como sinal o cheque entregue a esse título pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor que este apenas podia movimentar na data da outorga da escritura correspondente ao contrato prometido.

    10. O recorrido e o Tribunal recorrido sufragando tal entendimento e concluindo que é um caso semelhante ao caso em apreço invocam-no para sustentar que o cheque deve ser considerado sinal 16ª. Todavia, aquele Acórdão tem como pressuposto não só a entrega do cheque como sinal como também o facto do promitente comprador ter pedido para movimentar aquele cheque aquando da escritura do contrato prometido.

    11. Ora, nenhum destes pressupostos se verifica no caso que nos ocupa: o cheque foi entregue com o valor do sinal e não como sinal e também, o recorrido não logrou provar o facto que alegou de que foi a pedido da recorrente que protelou a sua apresentação a pagamento.

      Sem prescindir 18ª.

      Faz ainda uma incorrecta interpretação da jurisprudência no que respeita à...

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