Acórdão nº 12198/14.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução30 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (1.º A.) e BB (2.º A.) instauraram, em 04/12/2014, uma ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra CC (1.º R.), advogado, e DD - Seguros Gerais, S.A. (2.ª R.), a pedir a condenação a 2.ª R. a pagar-lhes a quantia de € 300.000,00, acrescida de juros desde a citação, e o 1.º R. no valor que, até aquele montante, exceda porventura o capital de seguro, a título de indemnização pela perda de chance dos A.A. pelo facto de o 1.º R., na qualidade de seu advogado, não ter interposto recurso para a Relação da sentença proferida em 1.ª instância no processo n.º 370/05. 0TBNIS. Alegaram para tanto, em resumo, que: - O 1.º R., na qualidade de advogado, foi mandatado para representar os A.A. no processo de expropriação litigiosa que correu termos no tribunal de ... sob o n.º 307/05.0TBNIS, tendo por objeto uma parcela de terreno destacada de um prédio rústico, sito na freguesia de …, necessário à construção pelo Município de … do Complexo Termal da …, no âmbito do qual foi proferido acórdão arbitral a fixar a indemnização em € 79.678,26, considerando o terreno “solo para outros fins”; - Interposto recurso para o tribunal da 1.ª instância com o fundamento de que a parcela expropriada devia ser considerada “solo apto para a construção”, tal entendimento foi acolhido pela sentença ali proferida, sendo fixada a indemnização em € 195.204,13; - No entanto, os AA tinham fundada expetativa de receber a indemnização de € 1.973.503,59 com base num índice de construção superior ao tido em conta na sentença e, por isso, em reunião com o 1.º R., ficou assente que seria interposto recurso daquela decisão, no caso de o valor da indemnização ser inferior a um milhão de euros.

- Porém, o 1.º R. não cumpriu tal instrução, não interpondo recurso, como ficara acordado; - O 1.º R. beneficiava de um contrato de seguro celebrado entre a 2.ª R. DD e a Ordem dos Advogados a coberto do qual se havia transferido para a seguradora a responsabilidade civil decorrente dos prejuízos causados a terceiros no âmbito da sua atividade profissional.

  1. A 2.ª R. contestou a impugnar o fundamento da sua responsabilização, sustentando que o contrato de seguro foi celebrado e iniciou a sua vigência em 2012, portanto depois do alegado incumprimento do mandato ter ocorrido, não beneficiando, por isso, da cobertura contratada com o 1.º R., concluindo pela sua absolvição do pedido.

  2. O 1.º R. também contestou a impugnar os factos alegados pelos A.A. e a sustentar que, embora, por lapso, tivesse deixado de interpor recurso da sentença, era manifesta a improbabilidade da procedência do recurso visado, concluindo pela sua absolvição do pedido.

  3. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 482-507, datada de 27/09/2016, a julgar a ação parcialmente procedente e a condenar: a) - A 2.ª R. DD a pagar aos A.A. o valor correspondente ao aumento da indemnização fixada pelo Tribunal Judicial de … decorrente do aumento do índice de construção para 20%, até ao limite de € 150.000,00 e deduzida a franquia de € 5.000,00, a calcular em sede de liquidação; b) – O 1.º R. CC a pagar aos A.A. a eventual diferença entre o aumento da indemnização e o limite da responsabilidade da 2.ª R. (€ 150.000,00), bem como da franquia de € 5.000,00; c) – os R.R. a pagar, respetivamente, juros de mora sobre as quantias em que são condenados, calculados à taxa legal de 4% desde a data da citação e até integral e efetivo pagamento.

  4. Inconformados com essa decisão, tanto os A.A. como a 2.ª R. apelaram dela para o Tribunal da Relação de …, tendo sido proferido o acórdão de fls. 661-687, datado de 21/03/2017, a julgar improcedente o recurso interposto pelos A.A. e procedente o recurso interposto pela 2.ª R., absolvendo os R.R. do pedido.

  5. Desta feita, vêm os A.A. pedir revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - O acórdão recorrido excedeu o objeto do recurso interposto pela R. DD, S.A., na medida em que decide sobre questões que esta R. não suscitou, nem no corpo das suas alegações, nem nas conclusões das mesmas; 2.ª - Tais questões, como sejam as de saber se a parcela expropriada tinha solo com natureza apta para construção ou apta por outros fins, estava processualmente arrumada e assente pelas partes litigantes, pelo que o acórdão em apreço violou as normas contidas no artigo 635.º do CPC; 3.ª - Verifique-se que a R. DD, S.A., confina a delimitação do objeto do seu recurso "à impugnação da matéria de facto" vertida nos números 24 a 16 da sentença do Tribunal “a quo” e à “omissão da matéria de facto dada como não provada”, relativamente ao envolvimento pessoal do A. AA no processo de expropriação (conclusão ii); 4.ª - Defende ainda esta R. que "se dê por provada a existência de um plano de urbanização e o ónus inerente à alteração do projeto do Complexo Termal …." (ii infini); 5.ª - Ainda quanto à matéria de facto, esta R. alega que o Tribunal a quo incorreu em erro ao dar como não provada a ausência de manifestação por parte dos AA., da não intenção destes de responsabilizarem o 1.º R. pelo erro profissional por este cometido (iv a xii); 6.ª - Quanto a estas questões, sobre as quais incida o objeto do recurso desta R., o acórdão não tece um único comentário, nem faz a menor referência; 7.ª - Assim como também não se pronuncia sobre as pretensões desta R., expressas no seu recurso (xix) de ver como provado que "segundo o Plano Diretor Municipal aprovado, do qual constava a afetação da parcela em causa nos autos, à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela era de 20%, sendo previsto, quer no plano de pormenor, quer no plano de urbanização um índice de construção de 8%"; 8.ª - Verifica-se também total ausência de análise, por parte do acórdão recorrido quanto às questões interpretativas das cláusulas do contrato de seguro, que protegia o R. Advogado, no exercício da sua atividade profissional, levantadas pela R. DD, S.A., designadamente, os artigos 100.º, 101.º e 139.º daquele contrato, com base nas quais centra a razão de ser da alegada procedência do seu recurso; 9.ª – Assim, como também nada se diz no acórdão sobre a alegada “exceção perentória de pré-conhecimento, invocada pela Recorrente”, apesar de ser com base nesta e apenas nesta exceção perentória, não atendida pelo Tribunal a quo, que a decisão aí proferida deverá ser revogada, segundo alega e pretende esta R.

    10.ª - Constata-se no acórdão recorrido que este, sem qualquer referência às questões supra citadas, optou por analisar uma outra questão que qualifica de "importância decisiva” que é a questão de saber se na parcela expropriada existia “solo apto para construção” ou “solo apto para outros fins” e é o que faz entre as págs. 12 e 24 do aresto; 11.ª - Esta indagação, análise e conclusões vertidas entre as págs. 12 e 24 do acórdão, procuram resolver uma questão jurídica que já estava resolvida entre as partes litigantes, sem a menor divergência entre si, pelo que dela não podia ter-se conhecido em recurso; 12.ª - Na verdade, a recorrente DD, S.A., não só não levantou a questão de aquela parcela estar situada em “solo apto para construção”, como, pelo contrário, até pugnou para que seja dado por provado que segundo o Plano Diretor Municipal aprovado “constava a afetação da parcela em causa nos autos à construção do complexo termal, o índice de construção na parcela expropriada era de 20%”; 13.ª - E no ponto xxxi das suas conclusões repete, de novo, a sua concordância, quer pela existência de um PDM, que abrange o prédio expropriado, quer para o índice de construção de 20%, previsto para o mesmo prédio; 14.ª - Aliás, esta aceitação do índice de construção de 20% (que pressupõe a aceitação de que o solo é apto para construção) já estava presente, quer na contestação da DD, S.A., que não se opôs ao alegado no artigo 10.º da p.i., quer do 1.º R., que especificadamente, aceitou o conteúdo deste artigo 10.º da petição inicial; 15.ª - Foi com base nesta aceitação dos R.R. que a sentença da 1.ª Instância não apreciou (nem podia apreciar essa matéria assente entre as partes), como definitiva, razão porque tal questão não foi objeto de decisão pelo Tribunal a quo; 16.ª - Tal assunto da aptidão construtiva do solo em causa, aliás, já tinha sido resolvida e transitado em julgado no Tribunal da Comarca de ..., com concordância entre os pontos de vista dos expropriados, da expropriante e do Tribunal Judicial de Nisa, no que se refere a tal parcela expropriada estar abrangida pelo PDM de Nisa; 17.ª - Dúvidas não podem restar de que tal questão, estando definitivamente decidida e arrumada, não podia dela tomar conhecimento o acórdão recorrido (veja-se jurisprudência e doutrina supra citadas em 17.º e 18.º); 18.ª - A perda de chance terá que ser especialmente avaliada ao nível da expropriação decidida no Tribunal Judicial de …, tendo como base de apreciação os factos em que os expropriados e a expropriante divergiam entre si, mas não os factos sobre os quais estas partes se mostravam concordantes, como era o caso de na parcela expropriada, à data da DUP, existia já aptidão construtiva; 19.ª - Em todo o caso, mesmo que fosse processualmente admissível indagar, concluir e decidir com base numa questão já assente e arrumada entre as partes e que estas não levantaram no seu recurso, chegar-se-ia igualmente à conclusão de que a área expropriada, em causa, estava efetivamente abrangida pelo PDM de …, publicado no Diário da República n.º 172, de 27/07/1994, bem como pela Carta de Ordenamento conexa ao mesmo (Doc. l, ora junto); 20.ª - Desta Carta de Ordenamento, sobre o local a expropriar e em causa nos autos, constam os símbolos gráficos T * * e as legendas “Equipamentos Existentes” e “Equipamento Propostos”, sendo que para a primeira legenda o símbolo "T" refere-se a "Termas da …" e para a segunda legenda, o símbolo **, diz respeito ao "Complexo Termal da …"; 21.ª - Tendo em conta esta previsão edificativa futura...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
10 temas prácticos
10 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT