Acórdão nº 8895/11.6TDLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução06 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I.

  1. No Tribunal Judicial da Comarca de ..., Secção Criminal da Instância Local de ..., e no âmbito do Processo Comum n.º 8895/11.6TDLSB, foi decidido, por sentença de 06.11.2015, e no que ora releva para o caso: a) Julgar a acusação improcedente e os pedidos de indemnização cível parcialmente procedentes e, em consequência: b) Absolver o arguido AA da prática do crime de homicídio negligente pelo qual vinha acusado; c) Condenar a demandada ... Seguros, S.A.

    a pagar aos demandantes BB, CC, DD e EE a quantia total de 92.345,92 euros (noventa e um mil e oitocentos e quarenta euros), sendo: €17.500 pelos danos não patrimoniais sofridos pela viúva; € 10.500 pelos danos não patrimoniais sofridos pelo filho EE, e € 7.000 pelos danos não patrimoniais sofridos por cada uma das filhas; € 700 pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima antes de falecer; € 38.500 pelo dano morte; e os restantes € 15.705,92 por danos patrimoniais. Montante a que há a acrescer juros de mora vincendos à taxa legal, absolvendo-se a demandada do demais peticionado pela demandante; d) Condenar a demandada ... Seguros, S.A.

    a pagar ao demandante Instituto da Segurança Social, IP/CNP a quantia de € 10.712,56 a que acrescem juros de mora desde a notificação, ou seja desde 28.11.2014, até integral e efectivo pagamento e absolvê-la do restante peticionado.

    e) Condenar em custas cíveis os demandantes e demandada, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

  2. 2.1 Inconformada com esta decisão a assistente e demandante BB interpôs recurso para o Tribunal da Relação de ...

    pedindo: – A condenação do arguido AA pela prática, em autoria material, do crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137.º, do Código Penal, por culpa exclusiva do mesmo na produção do acidente; - A alteração dos montantes fixados a título de indemnização por danos patrimoniais a título de reforma devida ao malogrado FF, e bem assim de danos morais sofridos pela vítima e seus filhos, visto estarem muito subvalorizados.

    2.2 Notificada da admissão do recurso interposto pela assistente e demandante, a demandada ... Seguros S.A contra-alegou e bem assim interpôs recurso subordinado para o Tribunal da Relação de Lisboa, pugnando no sentido de que a contribuição dos veículos para a produção dos danos deveria ter sido fixada em igual medida, o que vale por dizer em 50% para cada qual.

  3. Por acórdão de 22.09.2016, o Tribunal da Relação de Lisboa, negando provimento aos recursos interpostos pela assistente e demandante, e bem assim pela demandada (o desta, recurso subordinado), confirmou, sem voto de vencido, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.

  4. Irresignada com o assim resolvido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a demandante BB interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo da motivação que apresentou extraído as seguintes conclusões: “Face ao que antecede, reiteramos que a decisão ora recorrida violou entre outras as normas contidas no n.º 2 do art.º 564.º e n.º 3 do art.º 566.º, ambos do Código Civil, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o acórdão recorrido na correspondente parte recorrida, proferindo-se outro que esteja em conformidade com a adequada tutela dos direitos à indemnização civil reclamados, em conformidade aliás, com a jurisprudência maioritária identificada no Ac. STJ, de 20/02/2013, 3.ª Sec., Relator Raul Borges, Proc. 269/09.5GBPNF.P1.S1 – in www.dgsi.pt - porquanto: Contrariamente ao que fez para justificar a decisão recorrida no que respeita a outros danos, como aconteceu com o “dano morte”, em que citou vários acórdãos deste STJ, relativamente ao “dano patrimonial sofrido pelo falecido FF”, aos “danos morais sofridos pela mulher e filhos da vítima” e aos “danos futuros”, o Tribunal recorrido não citou um único acórdão que sustente o entendimento defendido quanto aos montantes indemnizatórios que atribuiu, ou não; O Tribunal recorrido errou ao socorrer-se de um diploma legal – Portaria 377/2008, de 26 de maio (e não, Decreto-Lei (DL) como certamente por lapso se indica no 2.º parágrafo de págs. 53 do acórdão recorrido) - que fixa critérios e valores meramente orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel de proposta para indemnização. Além de que, as disposições constantes naquele Portaria não afastam o direito à indemnização de outros danos, nos termos da lei, nem a fixação de valores superiores aos propostos (como aliás resulta do n.º 2 do art.º 1.º daquele diploma legal), razão aliás, pela qual, de um modo geral e maioritariamente, os nossos Tribunais não têm considerado os valores ali indicados para efeitos de indemnização por acidente de viação; Quer isto dizer que, não se concorda com os montantes atribuídos pelo Tribunal recorrido a título de danos morais, uma vez que estes se mostram inferiores aos que por regra são atribuídos, conforme aliás já decidiu o Supremo Tribunal de Justiça. Ou seja, não se concorda com as quantias atribuídas a título de danos morais sofridos pela própria vítima (€ 1.000,00) que aliás, como antes se referiu, se considera miserabilista e ridícula, bem como com as quantias atribuídas aos filhos da vítima (€ 15.000,00 ao filho “EE”, e € 10.000,00 a cada uma das filhas “DD” e “CC”), porque as quantias que foram reclamadas a esse título, já foram considerados como valores mínimos indemnizatórios neste tipo de danos pelo Ac. STJ, de 20/02/2013, 3.ª Sec., Relator Raul Borges, Proc. 269/09.5GBPNF.P1.S1 – in www.dgsi.pt); Sendo certo que, tal acórdão não é fixador de jurisprudência, tem servido de referência às indemnizações que a esse título têm sido atribuídas pelos nossos Tribunais, porquanto para a respectiva decisão foram tomadas em consideração inúmeras decisões proferidas em recurso de revista pelo STJ, e os padrões que foram considerados naquela decisão jurisprudencial, foram fixados como valores indemnizatórios tendo em vista o Justo Grau de Compensação; A fixação de € 1.000,00 a título de danos morais sofridos pela própria vítima, é miserável, tanto mais que está assente nos autos que o sinistro ocorreu pelas 23h40 e o óbito foi declarado às 01h11, ou seja, 01h30m após o acidente ocorrer. O que significa que, para indeminização do facto da vítima ter estado a sofrer durante 01h30, antevendo inclusivamente a sua morte, o Tribunal recorrido entendeu como justo o pagamento de € 1.000,00! Ora, como melhor se decidiu no referido acórdão jurisprudencial seguido por uma grande maioria dos tribunais, em nenhuma das decisões que ali são consideradas foi fixado um montante tão baixo! Por tais danos não patrimoniais próprios da vítima, substanciados no sofrimento que antecedeu a sua morte, deduziram os demandantes pretensão de indemnização de € 15.000,00, tendo sido concedido na primeira instância o quantitativo de € 1000,00, confirmado pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

    No caso concreto, como consequência do referido acidente, a vítima ficou ferida e sofreu lesões graves, tendo ficado encarcerada e em agonia (cfr. n.ºs 7 e 8 dos factos provados), e consequentemente sofreu na sequência dos referidos ferimentos que lhe provocaram a morte, sofreu dores, angústia e sentiu a vida a aproximar-se do fim.

    Pensamos assim, que a exemplo do que também se considerou no citado acórdão do STJ, a indemnização no caso concreto não poderia ter sido fixada em menos de € 15.000,00, e que, portanto, é injusta a atribuição de apenas € 1.000,00 por este dano; O mesmo se diga relativamente à indemnização que foi fixada pela primeira instância e mantida pelo Tribunal recorrido relativamente aos danos morais sofridos pelos filhos da vítima.

    Com efeito, se consideramos os acórdãos que ali são referenciados sobre esta matéria designadamente desde 2009, a atribuição de valores na ordem dos € 10.000,00/€ 15.000,00 a cada filho, é praticamente uma raridade, sendo que, a média é fixada entre os € 20.000,00 e os € 25.000,00.

    Deste modo, embora se considere que a indemnização a atribuir ao filho mais novo (ainda menor e a residir com a vitima) possa ser substancialmente maior, em virtude da maior proximidade e dependência do amor, carinho e atenção da vitima, seu pai, tal não pode NUNCA significar que, a sua dor tenha sido maior do que a das suas irmãs, e consequentemente, seria mais justa uma indemnização de € 20.000,00 a cada um dos filhos da vitima, podendo a indemnização a atribuir ao filho mais novo ser alavancada em função das especiais circunstâncias (o facto de ser menor, viver na dependência da vitima, estar mais tempo com ela e ser mais dependente da sua atenção, carinho e amor).

    Tanto assim que, o Tribunal considerou provada a matéria descrita em 29, 31, 32 e 35 dos factos provados, ou seja, que os demandantes sofreram um enorme desgosto com a morte da vítima; que o falecido nutria amor, carinho e amizade, que evidenciava, pela mulher e filhos (sem excepção); que os filhos se viram privados do pai e amigo que lhes dava amor e carinho; que o demandante/menor “EE” sente muito a falta do pai, que era um pai presente que dedicava a ele e às demais filhas toda a atenção. Por último, não se concorda também, que o Tribunal requerido não tenha atribuído qualquer indemnização a título de danos futuros decorrentes da quantia que o falecido deixou de auferir enquanto angariador de sucata entre os 70 e os 75 anos.

    Efectivamente, como se determina no n.º 2 do art.º 564.º do Código Civil, na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis. Assim, sendo previsível que o malogrado “FF” continuasse a desenvolver a sua actividade de sucateiro mesmo após se reformar (aos 66,2 anos) e pelo menos até aos 77 anos, tais danos deveriam também ter merecido a tutela do Direito, e consequentemente determinar o Tribunal recorrido a fixar uma indemnização à assistente/recorrente a esse título. No caso concreto, deveria o Tribunal recorrido, tendo em atenção a matéria de facto dada como provada em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT