Acórdão nº 1594/14.9TJVNF.2.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução13 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.

Decretada a insolvência de AA, LDA, foi fixado prazo para a respectiva reclamação de créditos.

Neste apenso de reclamação de créditos, a BANCO BB, SA veio impugnar a lista definitiva de credores reconhecidos e não reconhecidos elaborada pelo Sr. Administrador da Insolvência, designadamente no que concerne ao crédito reconhecido aos credores CC e mulher DD.

Percorrida a tramitação normal, foi proferida sentença com o seguinte dipositivo: A – Julgo reconhecido e verificado o crédito dos reclamantes CC e esposa D. DD sobre a insolvência, do montante de 690.000,00 Euros; B – Reconheço e declaro que este crédito dos Reclamantes está garantido por direito de retenção, nos termos do disposto no art. 755.º, n.º 1, alínea f) e 759.º, do Código Civil, sobre as fracções autónomas identificadas no auto de apreensão sob as verbas 70, 73 e 81 (fracção autónoma designada pelas letras "AO" correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ...-Fase II), fracção autónoma designada pela letra "AR", correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ... – Fase II) e fracção autónoma designada pelas letras "BP", correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ... – Fase II) do Prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 1226 da União de Freguesias de ... e ... (artigo 257); C – Mando que este crédito dos Autores seja pago pelo produto da venda dos imóveis identificados na alínea anterior – auto de apreensão sob as verbas 70, 73 e 81 -, após graduação do mesmo crédito, nos termos dos art. 759.º e 751.º do CC, ou seja, a seguir a privilégios especiais, mas antes de eventual crédito hipotecário, ainda que este tenha sido registado. Inconformados com esta decisão, os reclamantes CC e mulher e BANCO BB interpuseram recursos de apelação, tendo a Relação decidido julgar totalmente improcedente o recurso do credor reclamante BANCO BB e totalmente procedente o recurso dos credores reclamantes CC e mulher, alterando a decisão recorrida nos seguintes termos: A. Julga-se reconhecido e verificado o crédito dos reclamantes CC e esposa D. DD sobre a insolvência, do montante de 690.000,00 Euros, condicionado à eventual recusa ou incumprimento do contrato promessa por parte do Administrador da Insolvência; B. Reconhece-se e declara-se que este crédito dos Reclamantes está garantido por direito de retenção, nos termos do disposto no art. 755.º, n.º 1, alínea f) e 759.º, do Código Civil, sobre as fracções autónomas identificadas no Auto de apreensão sob as verbas 70, 73 e 81 (fracção autónoma designada pelas letras "AO" correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ...-Fase II), fracção autónoma designada pela letra "AR" correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ... – Fase II) e fracção autónoma designada pelas letras "BP" correspondente a apartamento T2 destinado a habitação sito no prédio urbano (Parque ... – Fase II) do Prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 1226 da União de Freguesias de ... e ... (artigo 257); C. Caso venha a verificar-se o incumprimento ou recusa do cumprimento dos contratos promessa por parte do Administrador da Insolvência, determina-se que este crédito dos Autores seja pago pelo produto da venda dos imóveis identificados na alínea anterior – Auto de Apreensão sob as verbas 70, 73 e 81 –, após graduação do mesmo crédito, nos termos dos art. 759.º e 751.º do CC, ou seja, a seguir a privilégios especiais mas antes de eventual crédito hipotecário, ainda que este tenha sido registado.

Ainda inconformada, a BANCO BB veio pedir revista, excepcional, que foi admitida.

Nas conclusões que apresentou suscita, no essencial, esta questão: - Se o promitente comprador, pessoa singular, que obteve a tradição dos imóveis que prometeu adquirir, que pagou integral e antecipadamente o respectivo preço e que arrendou esses imóveis a terceiros, deve ser considerado consumidor, nos termos e para efeitos de aplicação do AUJ do STJ de 20.03.2014, por forma a ser-lhe reconhecido o direito de retenção, previsto nos arts. 755º, nº 1, al. f) e 759º do CC, com prevalência sobre o crédito garantido por hipoteca sobre esses imóveis.

Os recorridos contra-alegaram, concluindo pela improcedência da revista.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

II.

Foram considerados provados os seguintes factos: (Resultante da análise da lista a que se refere o art. 129.° do CIRE, a fls. 28) 1. O Sr. Administrador da Insolvência reconheceu aos impugnados um crédito de 595.126,60 euros, não reconhecendo 94.873,40 euros, justificando a sua posição pela forma seguinte: "crédito reclamado sem qualquer subordinação a qualquer condição, mas reconhecido como condicionado à opção pelo não cumprimento dos contratos promessa + crédito parcialmente não reconhecido quanto ao valor: reconhecido valor correspondente à soma dos sinais comprovadamente pagos e em dobro devido em caso de recusa de cumprimento dos contratos e não o preço de venda das coisas prometidas, nem a totalidade do sinal em dobro peticionado (por não integralmente comprovado)".

(Resultantes da reclamação de créditos apresentada a fls. 95/99 e documentos que a acompanharam) 2. Os aqui reclamantes, a 27/02/2008, na qualidade de compradores, celebraram com a sociedade agora insolvente, na qualidade de vendedora, um contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual, a segunda prometeu vender à primeira um apartamento do Tipo T2, no 3° andar, letra C, do Bloco C, e garagem n.º 37, na cave, sito na Rua ..., da freguesia de ..., concelho de ... - contrato promessa de compra de venda, a fls. 100/101, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

  1. Conforme estipularam as partes na Cláusula 2.ª daquele contrato, a aqui sociedade insolvente prometeu vender aos aqui reclamantes a moradia atrás identificada, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades, pelo preço de 115.000,00 (cento e quinze mil euros) - ibidem.

  2. Por força daquele contrato promessa a sociedade agora insolvente recebeu dos reclamantes a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), conforme recibo de pagamento junto e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e efeitos legais - doc.12.

  3. Da restante parte do preço (€ 90.000,00) foi entretanto liquidado o valor de € 15.000,00 (quinze mil euros), conforme recibos e declarações de pagamento que se juntam e seus conteúdos se dão por integralmente reproduzidos - doc. 12 e 13.

  4. Ficou ainda consagrado naquele contrato promessa, que a respectiva escritura de compra e venda seria realizada dentro do período de 90 dias imediatamente subsequente à data da entrega da respectiva licença de utilização (cf. doc. 11).

  5. Tal licença de utilização data de 3 de Setembro de 2009 e, até à presente data, não foi ainda comunicado aos ora reclamantes qualquer data para a realização da escritura definitiva - cf. doc. 10 a fls. 110.

  6. Desde a predita data da celebração dos contratos-promessa de compra e venda (período de 90 dias imediatamente subsequentes à data da entrega das licenças de utilização) que os aqui reclamantes têm posse, o uso e fruição efectiva das fracções descritas, praticando sobre elas actos de disposição e gestão.

  7. São, inclusive, os aqui reclamantes os responsáveis pelo pagamento dos respectivos condomínios, conforme recibos que se juntam e cujos conteúdos se dão por integralmente reproduzidos - doc. 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25 e 26.

    (Resultantes da rectificação da relação de créditos, a fls. 135/140 e documentos que a acompanharam) 10. A 27.2.2008 e 16.9.2009, os reclamantes celebraram com a sociedade ora insolvente os três contratos promessas de compra e venda alegados na reclamação de créditos (inicialmente) junta aos autos, referentes a 3 apartamentos de tipologia T2 do denominado Edifício "Parque ...", sito em ....

  8. Anteriormente àquelas datas, mais concretamente em 27.1.2005, os reclamantes já haviam celebrado também com a sociedade insolvente, um outro contrato promessa de compra e venda, referente a uma fracção de tipologia T3, no 3.° andar, letra C, do Bloco C, daquele mesmo "Edifício Parque ...".

  9. Tal fracção tipo T3 foi contudo já escriturada e totalmente paga, sendo os reclamantes actualmente seus legítimos proprietários, situação que à semelhança do que já foi exposto, não sucedeu com as três fracções tipologia T2 prometidas vender em Fevereiro de 2008 e Setembro de 2009, pois não obstante os esforços encetados pelos reclamantes junto da Insolvente, esta nunca chegou a celebrar a escritura definitiva de compra e venda de tais fracções.

  10. Por serem várias as fracções em causa, os reclamantes foram efectuando pagamentos por conta de todos os contratos promessa celebrados, pagamentos estes que não eram diferenciados pela sociedade insolvente para nenhuma das fracções em concreto, mas antes reportados ao saldo vigente em conta corrente.

  11. Alguns dos pagamentos efectuados à sociedade insolvente foram em numerário, o que dificultou ainda mais a organização contabilística dos reclamantes.

  12. Contrariamente ao que foi invocado nos n.ºs 3, 4, 9, 10,15 e 16 da reclamação de créditos, os reclamantes não pagaram somente os valores ali discriminados...

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