Acórdão nº 2455/13.4YYLSB-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelANTÓNIO PIÇARRA
Data da Resolução13 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – AA - Sociedade Industrial de Carvões, Lda.

, com sede em …, instaurou execução comum para pagamento de quantia certa contra EDP – Gestão da Produção de Energia, SA, com sede em Lisboa, tendo por base sentença arbitral datada de 02.12.2012.

A executada deduziu oposição à execução, em 11.03.2013, alegando, em síntese, que: Apesar da sentença arbitral dada à execução ter sido proferida já depois da Lei n.º 63/2011, de 14.12 (NLAV), é aplicável ao caso a Lei n.º 31/86, de 29.08, sendo a mesma passível de impugnação com fundamento na sua anulabilidade, nos termos e para os efeitos do artigo 27º daquele diploma.

Foram cumulados ilegalmente juros de mora com a actualização da quantia indemnizatória fixada na decisão arbitral, pretendendo-se, dessa forma, obter um benefício ilegítimo no valor de €4.776.248,14, a título de juros de mora vencidos desde 2005, para o qual inexiste título executivo.

Existe erro de cálculo aritmético da quantia exequenda, quer no que respeita ao cálculo da actualização das dívidas, quer no que respeita ao início da contagem dos juros de mora, bem como no que concerne à taxa de juros de mora aplicada.

A sentença exequenda ofende a ordem pública interna, na medida em que viola o regime jurídico da prescrição, cujas normas são parte da ordem pública do ordenamento jurídico português, condenando a ora opoente no pagamento de dívidas prescritas, quando a prescrição tinha sido expressamente invocada.

Enferma ainda a sentença de falta ou insuficiência de fundamentação porque não esclarece a razão pela qual entendeu que nas compras de carvão de 1985 e 1986 havia liberdade de negociação de preço, diversamente do que entendeu suceder nas compras de 1987.

Viola também a sentença o princípio do dispositivo relativamente a uma componente do montante indemnizatório.

A peticionada sanção pecuniária compulsória não é devida e, para o caso de assim não se entender, deverá ser reduzido o seu valor diário para €182,04.

Com tais fundamentos, concluiu pela extinção da instância executiva e pela improcedência do pedido de fixação de sanção pecuniária compulsória.

A exequente apresentou contestação a reconhecer a inexistência de título executivo quanto aos juros moratórios, que apenas são devidos a partir da decisão actualizadora, refutando, no mais, os fundamentos da oposição, os quais apenas poderiam ter sido invocados em acção de anulação da sentença arbitral, ou no prazo de propositura da mesma.

Teve lugar a audiência preliminar, no âmbito da qual foi facultado o exercício do contraditório no que respeita às questões suscitadas na contestação, após o que, conhecendo de mérito, foi proferida decisão, datada de 27/05/2015, a julgar procedente a oposição e a extinguir a execução, quanto aos pedidos de juros e de fixação de sanção pecuniária compulsória, e, no mais, improcedente.

Inconformadas, apelaram a executada e a exequente, esta subordinadamente, tendo a Relação de Lisboa, na improcedência do recurso da primeira e procedência do interposto pela última, revogado a decisão no tocante à sanção pecuniária compulsória prevista no nº 4 do artigo 829º-A do Código Civil, que entendeu ser devida, confirmando-a, no mais.

Persistindo inconformada, interpôs a executada recurso de revista excepcional, admitido pela formação prevista no art.º 672º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil, confinando-o à «anulação da sentença arbitral envolvendo a aplicação da lei no tempo, a possível ofensa dos princípios da ordem pública internacional do Estado Português e a prescrição vista nessa envolvência» (cfr. fls. 1840 e 1841).

Finalizou a sua alegação, com as seguintes conclusões[1]: 1. Um dos equívocos em que se incorreu no acórdão recorrido residiu na suposição de que a Recorrente impugnara a sentença proferida pelo tribunal da 1.ª instância, com fundamento em deficiente fundamentação da mesma (v. pág. 36 do acórdão recorrido), quando em nenhum ponto da Apelação da Recorrente foi tal fundamento invocado e, menos ainda, substanciado.

  1. O que a Recorrente procurou fazer nas suas alegações de apelação foi realçar por que é que o modo errado como o tribunal arbitral havia qualificado os ilícitos imputados à EDP conduzira a um resultado manifestamente iníquo, por a haver condenado a indemnizar por práticas negociais ocorridas 26 anos atrás, sendo que, dada a natureza dos ditos ilícitos, a possibilidade da prova da justeza da atuação negocial da mesma EDP se havia tornado, ao fim de tanto tempo, impossível ou ficara, na prática, muito dificultada.

  2. Às consequências deste erro de julgamento cometido pelo tribunal arbitral veio somar-se, agravando-as calamitosamente, outro erro gritante por aquele tribunal cometido e adiante referido nestas conclusões.

  3. Mas, ao procurar evidenciar as consequências gritantemente iníquas de um e de outro erro que o tribunal arbitral cometeu, a Recorrente esteve sempre e só a substanciar o único fundamento que na apelação invocara em apoio do pedido de anulação da sentença arbitral, a saber, a sua contrariedade à ordem pública do sistema jurídico português.

  4. Na sua fundamentação, o tribunal de 1ª instância considerou provados, com interesse para a boa decisão da causa, os seguintes factos: (i) “A Exequente deu à execução sentença arbitral proferida em 02.12.2012 da qual foi junta certidão a folhas 8 e seguintes da execução, que se dá por integralmente reproduzida;” (ii) “Tal decisão foi proferida no âmbito da arbitragem registada com o n.º 1…/2010/AHC/AVS, de que foi junta certidão ao requerimento de oposição, que se dá por integralmente reproduzida.”.

  5. Faz parte integrante da certidão da arbitragem (junta aos presente autos), dada por integralmente reproduzida na ‘fundamentação de facto’ das respetivas decisões, tanto pelo tribunal de 1.ª instância como pelo Tribunal da Relação, a certidão emitida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do …, Unidade Orgânica 01, junta ao processo arbitral pela AA em 19.01.2011, em que a Escrivã Adjunta certificou que a Chamada “BB – Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, SA foi citada em 29/08/2006.

    ” 7. Atestou-se, por outro lado, no processo arbitral (como prova a respetiva certidão integral que foi junta aos presentes autos) que a EDP – Gestão de Produção de Energia, SA sucedeu à BB – Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, SA, que subscreveu os contratos em questão no processo.

  6. Na sentença arbitral, dada por integralmente reproduzida nas fundamentações de facto das decisões das instâncias, referiu-se, contudo, que “a certidão extraída da ação nº 1538/05.9BE – que correu termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do … – certifica que essa ação foi instaurada em 5 de Julho de 2005 e que a Demandada (EDP) foi citada em 8 de Julho de 2005.” 9. Ora, esta asserção não tem a menor correspondência no teor da referida certidão: nela não se certifica que a acção foi intentada em 5 de Julho de 2005, nem que a Demandada (EDP) foi citada em 8 de Julho de 2005, mas apenas que a Chamada BB – Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, SA (a que sucedeu a, de facto, Demandada e ora Executada EDP – Gestão de Produção de Energia, SA) foi citada em 29 de Agosto de 2006.

  7. Tendo considerado, contra o teor expresso do documento autêntico junto aos autos, que a Demandada EDP – Gestão de Produção de Energia, SA foi citada em 8 de Julho de 2005, o tribunal arbitral considerou que “o novo prazo prescricional de vinte anos começou a correr logo após o ato interruptivo (art.326º,nº1, e art.327º, nº2, do Código Civil), ou seja, a partir da citação da EDP em 8 de Julho de 2005.”, julgando, por isso, improcedente a excepção de prescrição deduzida pela Demandada EDP – Gestão de Produção de Energia, SA.

  8. Este erro clamoroso do tribunal arbitral, quanto à data de citação da Demandada EDP – Gestão de Produção de Energia, SA (BB – Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, SA), teve como resultado a condenação da Demandada EDP – Gestão de Produção de Energia, SA no pagamento de todos os valores peticionados pela Demandante relativos ao ano de 1985 e aos meses de Janeiro a Agosto de 1986, o que representa mais de 90 % do pedido exequendo, não obstante tais valores não serem juridicamente exigíveis à Demandada por, quanto aos mesmos, ter decorrido o prazo de prescrição de 20 anos, sem que se tenha verificado a interrupção ficcionada pelo tribunal arbitral.

  9. Na sentença proferida nos presentes autos, o tribunal de 1ª instância identificou os erros imputados pela Executada ao tribunal arbitral, entre os quais “a indevida consideração de que a prescrição teve lugar em 9 de Julho de 2005” mas não se pronunciou em concreto sobre os mesmos, por ter considerado que os fundamentos não integram a “violação da ordem pública (interna ou internacional) do Estado Português”.

  10. Também o Tribunal da Relação de ... ― que na ‘fundamentação de facto’ do seu acórdão se reportou aos factos dados como provados na sentença proferida em 1ª instância (p. 21 do Acórdão) ― entendeu que o “alegado erro de julgamento quanto à data em que ocorreu o facto interruptivo da prescrição, por força do processo que correu termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do …...

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