Acórdão nº 196/12.9TTBRR.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1.

AA Instaurou a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra: - “BB – Comunicações, S.A.”, actualmente “CC, S.A.” Realizada a audiência de partes, não foi possível obter a conciliação dos intervenientes processuais, tendo a empregadora, na sequência desta, apresentado articulado no qual invocou, no essencial, que: O Autor encontrava-se afecto ao Gabinete de Qualidade de Serviço da Rede, o qual tem como uma das missões a verificação da qualidade da rede da DD, informação que se obtém através da realização de medições específicas e testes de cobertura da rede efectuadas no “terreno”.

Para o efeito, foi determinado pela Administração da Ré, com carácter de urgência, a realização de medições a efectuar em toda a área geográfica do País, a fim de obter valores fiáveis da qualidade de transmissão e recepção de telecomunicações.

Tarefa que o Autor se recusou a fazer, alegando o facto de a empresa se recusar disponibilizar-lhe uma viatura para essas deslocações.

Com tal comportamento, entende a empregadora que o Autor acabou por inviabilizar o sucesso do projecto em causa nas zonas que lhe estavam distribuídas e afectas, comprometendo irremediavelmente a relação laboral, pelo que foi despedido pela Ré com alegada justa causa.

2.

Devidamente notificado, veio o Autor/trabalhador contestar fazendo-o nos seguintes termos: 1.

Por excepção: a) Alegou, desde logo, a nulidade do processo disciplinar por violação do dever de ocupação efectiva e por falta de fundamentação quer do relatório final, quer da deliberação de despedimento; b) Invocou, ainda, a caducidade do direito de aplicar a sanção; No mais, impugnou os factos alegados pela Ré, concluindo pela inexistência de motivo justificativo do despedimento, com as respectivas consequências legais, pois foi a Ré que adoptou medidas persecutórias contra a sua pessoa, humilhando-o e vexando-o perante todos os seus colegas.

2.

Em reconvenção: Peticionou o reconhecimento da ilicitude do despedimento e, em consequência: c) O direito à sua reintegração, sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade, bem como o pagamento das retribuições que deixou de auferir, no montante mensal base de 2.317,90 €, acrescidas de diuturnidades no montante mensal de 200,48 €, e de subsídio de alimentação, no valor mensal de 249,26 €, bem como as vincendas que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão; d) Valores esses acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada retribuição até efectivo e integral pagamento, e dos respectivos proporcionais dos subsídios de férias e de Natal, acrescidos de juros de mora; e) A condenação da Ré a pagar-lhe a indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, no montante de 50.000,00 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, contabilizados desde a data da notificação da reconvenção e até efectivo e integral pagamento.

3.

Saneado o processo, a causa foi julgada nos seguintes termos: (i) Improcedente a alegada nulidade do procedimento disciplinar por violação do dever de ocupação efectiva e por falta de fundamentação; (ii) Procedente a excepção de caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar, tendo sido declarada a ilicitude do despedimento do Autor e a Ré condenada a reintegrá-lo no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; (iii) Mais foi a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias que este deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao Autor no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à Segurança Social, tudo a liquidar em incidente; (iv) No demais peticionado foi a Ré absolvida.

4. Inconformada, a Ré apelou pugnando pela improcedência da excepção de caducidade do direito de aplicar sanção e pelo prosseguimento dos autos para apreciação da licitude do despedimento.

Também o Autor recorreu, pretendendo a condenação da Ré no pagamento da quantia de 50.000 €, a título de danos não patrimoniais.

5. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão julgando improcedente a excepção de caducidade do direito da Ré a aplicar a sanção disciplinar de despedimento do Autor e ordenando o prosseguimento dos autos.

6.

O Autor interpôs recurso de revista deste Acórdão, na sequência do qual o Supremo Tribunal de Justiça proferiu Acórdão confirmando a decisão da Relação, exarando o entendimento de que a decisão de despedimento era tempestiva.

7. Os autos baixaram à 1.ª Instância, onde foi realizado julgamento com observância do legal formalismo, e após proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Nestes termos, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência: A) Declaro a ilicitude do despedimento do A. AA e condeno a R. BB, S.A.: a) A reintegrar o trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; b) No pagamento ao A. das quantias que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzindo-se as importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e o subsídio de desemprego atribuído ao A. no período referido, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, a liquidar em incidente; B. Absolvo a R. do demais peticionado.» 8. Novamente inconformadas, ambas as partes apelaram impugnando de facto e de direito.

9. Mediante Acórdão proferido em 12/Outubro/2016, o Tribunal da Relação de Lisboa deliberou nos seguintes termos: «Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pela Ré, BB, S.A.

2. Em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Autor, AA, alterando a matéria de facto provada e condenando a Ré a pagar-lhe a quantia de 30.000 € (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais.» 10. Irresignada, a Ré interpôs recurso de revista principal no qual formulou, em síntese, as seguintes conclusões: 1. O Acórdão da Relação é nulo e de nenhum efeito, ao abrigo do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. b), aplicável por via do art. 674º, n.º 1, al. c), do CPC, por clara oposição entre os fundamentos e a decisão; 2. Caso assim não se entenda, o que por mera hipótese académica se coloca, então o Acórdão será ainda passível de objectiva censura por ter feito errónea interpretação e aplicação da lei substantiva, pelo que o presente recurso é apresentado à cautela, por ser convicção de que a nulidade será suprida pelo Tribunal a quo, anulando-se todo o processado; 3. O Acórdão recorrido considerou alguns factos provados aditando-os, e consequentemente a decisão que deles se terá extraído não terá sido resultado da correcta aplicação da lei em vigor no nosso ordenamento jurídico; 4. Os “factos” provados e aditados sob os nºs 94-A) e 94-B), não possuem conteúdo fáctico sendo meras considerações e/ou valorações, pelo que deverão ser expurgadas da Matéria de Facto Provada; 5. O Tribunal a quo deu como provados os factos constantes dos pontos 133-B), 133-C) e 151), que reproduzem a matéria alegada pelo Autor nos arts. 397.º, 403.º e 439.º da Contestação; 6. No art. 397.º, da Contestação, o Autor alegou: «Em consequência dessa conduta o A. viu-se remetido, não raras vezes, para situações de desespero, sentindo-se violentado e frequentemente constrangido, por se encontrar sob a ordem de desempenhar funções que nada têm que ver com a sua formação e categoria profissional, sujeito a andar de transportes públicos e a pé, na rua, pondo em perigo a sua saúde», sendo que se desconhece, pois o Autor não o refere em momento algum, em que é se traduziu concretamente a situação de desespero, como é que se exteriorizou, de que modo consistiu a sua violentação e constrangimento, para já não falar do facto do Autor não ter sido obrigado a andar de transportes públicos, conforme o facto provado sob os pontos 9.º) e 57.º) da Matéria de Facto Provada; 7. No art. 403.º da Contestação o Autor alegou: «O qual, em consequência de tal conduta, ficou abalado psicologicamente, pondo em causa a sua auto-estima e confiança, provocando-lhe ainda humilhação e desgosto».

De igual modo não se sabe, até porque o Autor nunca o alegou, em que é que se traduziu o seu abalo psicológico e de concreto modo foi posta em causa a sua auto-estima e confiança, e de que forma se traduziu tal diminuição em humilhação e desgosto, e em que é que estas emoções e sentimentos se traduziram concretamente; 8. O mesmo se repete em relação ao facto provado constante do ponto 151), o qual dispõe: «Tais factos têm provocado no Autor ânimos depressivos e uma angústia que perturbam a sua estabilidade familiar.» Este “facto” é uma transcrição do alegado no art. 439.º da Contestação apresentada pelo Autor, que uma vez mais não tem quaisquer factos que demonstrem a causa e modo de exteriorização dos ânimos depressivos e da angústia que levem à consequência retirada por aquele ponto da Matéria de Facto Provada, pelo que também este “facto” deverá ser expurgado da decisão; 9. Em suma, o Autor limita-se a alegar estados de espírito, situações genéricas, que não estão devidamente concretizados e por via dessa ausência não constituem verdadeira matéria de facto; 10. Não colhendo a opinião sufragada pelo Acórdão sub judice de que tal factualidade resultaria dos depoimentos de EE e FF, por uma simples razão: na verdade para que um facto seja dado como provado é necessário que tenha sido previamente alegado; 11. E em momento algum o Recorrido, em sede de Contestação, alegou factos que levassem a concluir pela verificação das consequências, que agora se afirmam em sede do Acórdão em crise, plenamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT