Acórdão nº 6547/06.8SWLSB-H.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução04 de Janeiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção de tribunal colectivo n.º 6547/06.8TDPRT da ... Secção Criminal da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca do ... – Juiz ... –, foi realizado cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido AA, nascido em ..., [...], actualmente em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional de ....

*** Foi realizada a audiência a que alude o artigo 472.º do Código de Processo Penal em 2 de Maio de 2016, como consta da acta de fls. 8503/4 (volume 27), tendo-se em vista a elaboração do cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido, neste processo n.º 6547/06.8TDPRT, e nos processos comum colectivo n.º 384/09.5PAPRT e n.º 945/09.2JAPRT, estando o arguido presente e tendo prestado declarações.

*** Por acórdão do Colectivo da ... Secção Criminal da Instância Central da Comarca do ... – ..., datado de 11 de Maio de 2016, constante de fls. 8515 a 8549 (volume 27), depositado no mesmo dia, conforme carimbo aposto a fls. 8549 e declaração de depósito de fls. 8552, foi deliberado: «Operando, ao abrigo do disposto nos artigos 77.º e 78.º do Código Penal, o cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas nos processos n.º 6547/06.8TDPRT da ... Secção Criminal Central do ..., n.º 384/09.5JAPRT da ... Secção Criminal Central do ... e n.º 945/09.2JAPRT da Instância Central Criminal de ..., acordam os Juízes que constituem o presente Tribunal Colectivo em condenar o arguido AA na pena única de 11 (onze) anos de prisão.

Em sede de liquidação de pena será considerado o desconto do tempo de detenção/prisão sofrido no processo de Penafiel».

*** Inconformado com o assim deliberado, o arguido AA interpôs recurso, dirigido ao Tribunal da Relação do Porto (fls.8566 e, de novo, em original, a fls. 8582), apresentando a motivação de fls. 8567 a 8581 e, de novo, em original, de fls. 8583 a 8597, que remata com as seguintes conclusões (em transcrição integral, incluindo realces): A. Foi o arguido AA, condenado, nos termos do disposto nos artigos 77.º e 78.º CP, em cúmulo jurídico, numa pena única de 11 anos prisão, necessariamente efectiva, decorrente do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas nos processos n.º 6547/06.8TDPRT da ....ª Secção Criminal Central do ..., n.º 384/09.5JAPRT da ... Secção Criminal Central do ... e 945/09.2 JAPRT da Instância Central de ....

  1. Não se conformando com o douto Acórdão, vem o arguido recorrer do mesmo.

    Da Pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período; C. Como dimana do acórdão recorrido, no âmbito do processo n.º 384/09.5JAPRT da ... Secção Criminal Central do ... foi aplicada ao Recorrente, pela prática de um crime de dano p. e. p. pelo artigo 212.º n.º 1 CP, uma pena de prisão de 1 ano, suspensa na sua execução por igual período.

  2. A sobredita decisão foi proferida em 26.01.2012 e transitou em julgado em 04.12.2015.

    Sucede que, E. Como resulta do CRC do Recorrente junto aos autos a fls., desde a data em que foi proferida a supra referida decisão condenatória até ao presente, não foi o Recorrente constituído Arguido em qualquer processo, bem como não sofreu qualquer condenação.

  3. Assim, não fosse o malogrado facto de a decisão só ter transitado em julgado em 04.12.2015 e já há muito teria a mesmo sido declarada extinta pelo cumprimento, em virtude da conduta imaculada observada pelo Recorrente no decurso da suspensão.

  4. Note-se que, no momento em que foi proferida a decisão condenatória o Recorrente encontrava-se emigrado e em liberdade, porquanto só foi preso para cumprir pena em 09 de Outubro de 2015.

  5. Aqui chegados, e como resulta do explanado supra, encontra-se a decorrer o período de suspensão da pena aplicada, sem que o Recorrente tenha praticado qualquer conduta conducente a que fosse decretada a revogação da suspensa, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 56.º CP.

    I. Nessa medida entende o Recorrente que não estão verificados os pressupostos legais para que o tribunal a quo tivesse incluído, como incluiu, a pena de prisão suspensa aplicada ao Recorrente no processo n.º 384/09.5JAPRT.

  6. Contudo, não ignora o Recorrente as posições doutrinárias e a corrente jurisprudencial que perfilha entendimento contrário e entende que as penas de execução suspensas entram no cúmulo jurídico como penas de prisão, só no final se decidindo se a pena conjunta deve ou não ficar suspensa na sua execução.

  7. Em sentido contrário, porém, se tem manifestado alguma jurisprudência do STJ, ao qual humildemente aderimos, e que entende que a pena de suspensão de execução da pena é uma pena de substituição, autónoma, que se não confunde com a pena de prisão. Esta e aquela são penas de espécie diferentes que não podem ser cumuladas, ao menos sem previamente o tribunal competente ter determinado a sua revogação nos termos do artigo 56.º do CP.

    L. Com efeito, a pena suspensa prevista no artigo 50.º do CP, enquanto pena de substituição, é de natureza diferente da pena de prisão, até pela natureza e função que lhe está politico-criminalmente adstrita.

  8. Assim, sendo a pena suspensa uma pena de substituição conceptualmente distinta e que visa fins diferenciados a nível das prevenção geral e especial da pena de prisão efectiva, só deve ser alterada na sua execução caso o condenado, com a sua conduta, pratique actos que se subsumam nas previsões previstas no artigo 56.º do CP.

  9. Tal entendimento, resulta inequivocamente da letra da lei mormente dos artigos 56.º do CP e 492.º do CPP que consagram e balizam os fundamentos necessários para que possa operar a revogação das penas suspensas na sua execução, bem como o rito processual a que deve obedecer a respectïva revogação/modificação.

  10. Assim, pelos fundamentos explanados não tendo sido decretada, como não foi, a revogação da suspensão da pena aplicada ao Recorrente no processo n.º 384/O9SJAPRT, e encontrando-se em vigência a sua execução pela suspensão, não podia a mesma ter sido incluída no cumulo jurídico realizado, porquanto tal inclusão colide com o vertido nos artigos 56.º do CP e 492.º CPP, sendo por isso ilegal.

  11. Nestes termos, deve ser revogado o cúmulo jurídico realizado e substituído por outro que contemple apenas as penas aplicadas ao Recorrente nos processos n.6547/06.8TDPRT da ... Secção Criminal do ... e n.º 945/09.2JAPRT da Instância Central Criminal de ....

    II - Da errónea determinação da soma das penas parcelares aplicadas ao Recorrente; Q. No que contende com a determinação da pena aplicável em sede de punição do concurso de crimes, resulta do plasmado no n.º 2 do artigo 77.º do CP que: “a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa;...” R. Dito isto, importa começar por relembrar as penas aplicadas ao Recorrente nos processos trazidos à colação em sede de cúmulo jurídico.

    5. Com efeito, no cúmulo jurídico realizado e cuja decisão ora se sindica, foram cumuladas as seguintes penas parcelares: - 6 anos e 9 meses de prisão, mediante decisão de 14.06.2012, transitada em 04.12.2015, no âmbito do processo n.º 6547/06.8TDPRT da ...Secção Criminal Central do ...; - 1 ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período, mediante decisão de 26.01.2012, transitada em 04.12.2015, no âmbito do processo n.º 384/09.5JAPRT da ... Secção Criminal Central do ...; e, - 8 anos de prisão, mediante decisão de 02.02.2011, transitada em 10.04.2012, no âmbito do processo n.º 945/09.2JAPRT da Instância Central Criminal de ....

  12. Isto posto, e como resulta de simples soma aritmética, a soma de todas as penas parcelares a que o Recorrente foi condenado corresponde a 15 anos e 9 meses de prisão.

  13. Contudo, dimana do acórdão ora recorrido (pág. 31) que: “No caso dos autos a pena aplicável vai de 8 anos a 17 anos de prisão — corresponde à soma de todas os penas parcelares.” V. É assim cristalino que o tribunal a quo determinou a pena concretamente aplicável com base em erro no limite máximo da soma das penas parcelares aplicadas ao Recorrente que, in casu se cifra em 1 ano e 3 meses, em desfavor do Recorrente.

  14. Ora, a determinação do intervalo mínimo e máximo onde se deve balizar e fixar a medida concreta da pena não é uma tarefa de somenos importância e padecendo a mesma de erro, tem-se como inquinada a fixação da medida concreta da pena, como se demonstrará infra.

    X. Assim, em face do exposto deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que determine que no caso dos autos, a pena aplicável ao Recorrente vai de 8 anos a 15 anos e nove meses de prisão, o que corresponde à soma de todas as penas parcelares trazidos à colação para efeito de cúmulo jurídico.

  15. E nessa medida realizada nova determinação da pena única a aplicar ao Recorrente, tendo em consideração o limite máximo devidamente corrigido.

    III — Da sustentabilidade da pena única aplicada — 11 anos de prisão - num pressuposto factual inexistente, qual seja o facto de no processo n.º 945/09.2JAPRT ter ficado provado que o crime de tráfico agravado foi praticado por um período de cerca de seis anos (2006 a 2012).

  16. Brota da decisão recorrida (pág. 32), designadamente na fundamentação subjacente à fixação da medida concreta da pena a aplicar ao Recorrente que: “No caso em apreciação é de ter em conta a elevada gravidade do conjunto dos factos, dado o número de crimes cometidos e diferente natureza, o modo de execução dos crimes de burla qualificada e falsificação de documentos no âmbito da sua actividade profissional de venda de veículos automóveis, mais grave a condenação pelo crime de tráfico agravado, durante um período de cerca de seis anos (2006 a 2012)” Itálico e negrito nossos AA. Ora, como resulta da decisão recorrida, designadamente da parte supra transcrita, o tribunal a quo entendeu que sob o Recorrente impendem necessidades de prevenção especial acrescidas, colocando claramente o acento tónico — daí ter utilizado a expressão “mais grave” - no...

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