Acórdão nº 1224/16.4T8VNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC 1224/16.4T8VNG.P1.S1 6ª SECÇÃO ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I J, requereu autos de processo especial de recuperação, enquanto pessoa singular, invocando que assumiu solidariamente com duas empresas das quais é gestor diversas obrigações, em montante superior a 4 milhões de euros; uma dessas empresas porém encontra-se em processo de revitalização (a segunda viu requerida a respectiva insolvência, em processo judicial que corre termos), sendo certo que, se as referidas obrigações forem exigidas do Requerente, é certo que o mesmo se encontrará em insolvência iminente.

Foi proferido despacho liminar de indeferimento do pedido, do qual, inconformado recorreu o Requerente, tendo sido produzido Acórdão a julgar a Apelação improcedente.

De novo irresignado, recorreu o Requerente de Revista excepcional por oposição de Acórdãos, impugnação essa, que não foi admitida pela Formação a que alude o normativo inserto no artigo 672º, nº3 do CPCivil, através do Acórdão que faz fls 111 a 118, tendo ordenado a remessa dos autos a esta 6ª secção, para conhecimento como Revista normal, a qual foi assim admitida.

O Recorrente apresentou as seguintes conclusões: - O Recorrente é uma pessoa singular, empresária, que ao longo de toda a sua vida se dedicou às empresas, nas quais é detentor das participações sociais, fruto do seu empreendedorismo e das quais, desde sempre, retirou o seu sustento, fazendo sua profissão e, por fim, da qual resultou todo o passivo.

- Pelo que a referida decisão do Tribunal a quo, tem somente na sua base uma tese que carece, desde já, de fundamento legal ou, face à divergência existente de interpretação da lei, de uniformização jurisprudencial.

- A questão fundamental de direito, submetida a recurso, consiste em saber se o processo especial de revitalização (P.E.R.) é aplicável às pessoas singulares, nomeadamente a pessoas singulares e empresárias, mais se desenvolvendo a questão de qual o sujeito do "Devedor" singular a final admissível, para o caso concreto.

- Tal questão advém em razão da falta de definição, por parte do legislador, sobre qual o sujeito do "Devedor" admissível de recorrer a um P.E.R. e, nesse sentido, surgem duas grandes teses: 1) Da aplicabilidade restritiva do processo P.E.R. direcionada para as pessoas coletivas ou pessoas singulares comerciantes; 2) Da aplicabilidade ampla do processo P.E.R. a toda e qualquer pessoa singular, seja ela comerciante ou não.

- A primeira tese sustenta que o processo P.E.R. surgiu como mecanismo de "manutenção do devedor no giro comercial" e "empobrecimento do tecido económico português", como tal, fazendo alusão ao preambulo da Resolução do Conselho de Ministros n° 11/2012, de 19/1 que criou o "Programa Revitalizar" e à Exposição de Motivos da Proposta de Lei n° 39/XII de 30/12/2011. Considerando, por isso, que as normas dos arts.° 17.°-A e segs. devem ser objeto de interpretação restritiva.

- Por sua vez, a segunda tese defende, desde já, que o tópico baseado na Resolução do Conselho de Ministros n°11/12 e da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n°39/XII, ao referir designadamente a "manutenção do devedor no giro comerciar nem sequer parece decisivo, porque mesmo na exposição de motivos não se limita ou restringe o devedor ao comerciante ou empresário, mas ao devedor que esteja em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente (cf. art.01.°n.°2C.I.R.E.).

Sendo certo que os requisitos legais do P.E.R., constantes nos arts. 17°-A a 17°-l, estes, em nenhum lado, limitam a aplicação a pessoas coletivas ou equiparadas, prevendo-se expressamente que pode ser utilizado "por iodo o devedor".

- Tanto mais que as normas dos arts.17°-A e segs., inserindo-se no âmbito das "Disposições introdutórias" (Título I), não impõem qualquer limitação ou condicionamento ao disposto no art.° 2o (sujeitos passivos da insolvência), cuja norma, pela inserção sistemática, se projeta no P.E.R.

- Assim como a redação do n.° 11 do art.° 17.°-D do C.I.R.E., em que "O devedor, bem como os seus administradores de direito ou de facto, no caso de aquele ser uma pessoa colectiva (...)" inclui o âmbito de aplicação ao devedor, pessoa singular.

- Ora, a discrepância a que temos vindo assistir sobre esta matéria no nosso ordenamento tem acarretado decisões, totalmente distintas, nos nossos tribunais, designadamente, em situações cujos devedores pessoas singulares se encontram, entre si, em situação semelhante. No entanto, uns logram obter o deferimento do seu P.E.R. e prossecução da sua revitalização, outros são obrigados a recorrer à insolvência que somente era iminente.

- Verifica-se, assim, um total handicap do exercício pleno do direito, o qual vem repercutindo uma tremenda injustiça a toda e qualquer pessoa singular que necessite de recorrer a um P.E.R. Cujo princípio de igualdade, prescrito no artigo 13.° da Constituição da República, não é atendido, uma vez que situações idênticas não são tratadas, de igual forma, nas diversas instâncias.

- A título exemplificativo dessa realidade é o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 12/07/2016, processo n.° 2533/16.8T8GMR.G1, no qual o Recorrente se encontrava numa situação idêntica à do aqui Recorrente, uma pessoa singular, empresário, fundador e titular de uma empresa, à qual sempre se dedicou ao longo da sua vida, à qual desde sempre foi o responsável máximo da sua gestão e administração, fazendo sua...

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