Acórdão nº 6617/07.5TBCSC.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução30 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA, S.A., intentou acção ordinária contra BB, CC e DD.

Tendo os RR. BB e mulher apresentado contestação, com dedução de reconvenção, foi por eles suscitada perante o juiz de 1ª instância a passagem de guias para pagamento de multa dentro dos 3 dias subsequentes ao termo do prazo. Instruíram tal pretensão com nota da citação referente ao R. DD que alegadamente indicaria uma data diversa daquela que consta da certidão de citação que foi exarada pelo solicitador de execução. Por isso, residindo esse R. fora da área da comarca, beneficiam os demais RR. do prazo de contestação que lhe foi indicado (fls. 811).

A A. opôs-se a tal pretensão por considerar que a referida nota não contrariava a certidão de citação e requereu que se determinasse o desentranhamento da contestação (fls. 822).

O R. DD veio reafirmar que a nota de citação que lhe foi entregue indicava uma data diversa da que consta da certidão de citação, sendo tempestivas as contestações que, com base nessa nota, foram apresentadas (fls. 835).

Sobre aquele requerimento incidiu despacho datado de 12-5-2008 que, atendendo à data que, segundo os RR., estava inscrita na nota de citação do R. DD, considerou tempestivas as contestações que foram apresentadas (fls. 842 a 844).

Por se tratar de acção que foi interposta antes de 1-1-2008, ou seja, antes da entrada em vigor da reforma do regime dos recursos de aprovada pelo Dec. Lei nº 303/07 que ressalvou a aplicação do regime anterior nas acções pendentes naquela data, a A. interpôs recurso de agravo (fls. 854), o qual foi admitido com subida diferida (fls. 861).

A A. apresentou as respectivas alegações que constam de fls. 1197 e segs, e os RR., por seu lado, as contra-alegações de fls. 1625 e segs.

A acção prosseguiu os seus termos normais, com realização de audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença de que foi interposto recurso por parte da A.

A Relação rejeitou o recurso de apelação da sentença, por motivos formais, decisão que este Supremo Tribunal de Justiça revogou, determinando a remessa aos autos à Relação para apreciação da apelação.

Foi então que a Relação incidiu sobre recurso intercalar (o referido recurso que fora admitido como agravo), a que deu provimento. Em resultado dessa decisão, foi declarada a extemporaneidade das contestações que haviam sido apresentadas pelos RR., determinando-se a remessa dos autos à 1ª instância para extracção dos efeitos da revelia. Em concreto concluiu a Relação conceder “provimento ao recurso de agravo interposto pela A., revogando-se o despacho recorrido, proferido em 12-5-2008, devendo os autos prosseguir em conformidade com o que acabou de ser decidido”.

Deste novo acórdão da Relação foi interposto recurso de revista por parte dos RR. em que suscitam as seguintes questões essenciais: a) Nulidade por omissão de pronúncia, na medida em que não foi apreciada a violação, por parte do solicitador de execução, da norma do art. 131º, nº 4, do NCPC, e analogicamente o art. 253º que impõe que as datas sejam escritas por extenso e que seja disponibilizada a citado cópia legível da nota de citação; b) Omissão de pronúncia quando à apreciação das consequências a extrair da irregularidade praticada pelo agente de execução, nos termos dos arts. 157º, nº 6, e 191º, nº 3, do NCPC; c) Se perante a ambiguidade da data inscrita na nota de citação a Relação tinha de averiguar a data em que efectivamente teve lugar a citação do R. DD ou se deveria considerar simplesmente que existia uma irregularidade da citação traduzida na ambiguidade daquela data; d) Se o critério para avaliar a legibilidade de um acto processual reduzido a escrito deve ser o do cidadão normal; e) Se o facto de o acórdão assumir que a data constante da nota de citação não era clara nem evidente deve ser suficiente para considerar que havia uma divergência de datas que não podia ser resolvida contra o citado, passando a valer a data que permitia o prazo mais longo; f) Se a apresentação da contestação para além da data que resultava da certidão de citação se deveu ao facto de a data da citação não se encontrar escrita de forma clara e evidente, sendo a citação irregular; g) Se existe violação do princípio da proporcionalidade pelo facto de a declaração de ineficácia da contestação/reconvenção ter ocorrido já depois de ter sido realizado o julgamento e quando já haviam decorrido 8 anos sobre a sua apresentação, sendo ilegítimo julgar uma causa como se não tivesse havido contestação, depois de ter sido efectuada a audiência de julgamento que incidiu sobre os factos controvertidos.

  1. contra-alegou e, para além de alegar a inadmissibilidade da revista, por falta de integração no art. 671º, nºs 1 e 2, do CPC, sustentou a posição que foi assumida no acórdão recorrido.

Os RR. fizeram juntar aos autos dois pareceres de ilustres processualistas, junção que, malgrado a oposição deduzida pela recorrida, é tempestiva, tendo em consideração o disposto no art. 680º, nº 2, com referência ao art. 651º, nº 2, do CPC. Não faz, aliás, qualquer sentido o requerimento em que foi solicitado o seu desentranhamento.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – Elementos relevantes: 1. Os RR. BB e mulher CC, residentes em …, na (então) Comarca de Cascais, foram citados pessoalmente em 20-11-07, pelas 19 h e 15h – certidão de citação pessoal de fls. 613 e 614; 2. O R. DD, residente em …, na (então) Comarca de Sintra, foi citado pessoalmente em 21-11-07, pelas 13h e 15h – certidão de citação pessoal de fls. 612 e vº -, por solicitador de execução, nos termos dos nºs 1 e 7 do art. 239º do CPC, na redacção do Dec. Lei nº 38/03, de 10-8, constando do verso a assinatura desse R.; 3. A fls. 813 consta uma “Nota de Citação Pessoal” do R. DD, na qual se encontra manuscrita uma data, como data da sua citação, contendo ainda a assinatura do solicitador de execução; 4. As contestações dos RR. foram apresentadas no dia 17-1-08 – fls. 707 a 711 e 713 a 803; 5. Na questão que suscitaram acerca da oportunidade das contestações, os RR. BB e mulher CC afirmaram que a data que consta da nota de citação pessoal referida em 3.

é “25-11-2007”, tendo solicitado a passagem de guias para pagamento de multa correspondente ao 3º dia depois do prazo (fls. 811 e 812); 6. Ouvida a A. defendeu que a data é de “21-11-2007”, correspondente à que consta da certidão de citação referida em 2., requerendo o desentranhamento das contestações (fls. 822 a 824); 7. O Mº Juiz de 1ª instância, na decisão que incidiu sobre essa questão, considerou que a data que consta da nota de citação era, como defendem os RR., 25-11-2007. A partir dessa base, da afirmação de que a data deveria ter sido exarada por extenso e não apenas por algarismos, nos termos do art. 138º, nº 4, do CPC de 1961, e ainda de que a divergência de datas exaradas na certidão e na nota de citação não poderia prejudicar os RR., considerou oportunas as contestações (fls. 842 a 844); 8. Tendo a A. interposto recurso de agravo com subida diferida (fls. 857 e 859), a Relação concluiu que a data que consta da nota de citação é 21-11-2007, correspondente à que consta da certidão de citação de fls. 612, sendo, por isso, intempestivas as contestações que foram apresentadas em 17-1-2008, quando o prazo máximo terminara em 11-1-2008.

III – Questão prévia: 1.

Foi suscitada pela A. a inadmissibilidade da revista com o argumento de que o acórdão da Relação que incidiu sobre aquele despacho não pôs termo ao processo, nos termos do art. 671º, nº 1, do NCPC.

Retorquiram os RR. com argumentos de duas ordens no sentido da admissibilidade da revista. O principal passa por considerar que o acórdão da Relação que declarou a intempestividade das contestações em que foi deduzido pedido reconvencional, determinou, nesta parte, a extinção da instância reconvencional. Complementarmente alegaram que a revista sempre seria admissível ao abrigo do art. 671º, nº 2, do CPC, atenta a verificação de contradição jurisprudencial relativamente às questões de direito em causa.

Devendo ser dada prioridade ao primeiro fundamento invocado pelos RR. para a admissibilidade da revista, desde já se avança que a resposta é positiva em face do art. 671º, nº 1.

  1. O presente recurso de revista obedece ao regime processual que decorre do CPC de 2013. Mas as particularidades do caso exigem algo mais do que esta afirmação peremptória.

    Com efeito, a origem deste recurso remonta a um despacho que, no âmbito desta acção que foi instaurada em 2007, considerou tempestivas as contestações que os RR. apresentaram. Desse despacho, datado de 12-5-08, interpôs a A. recurso de agravo que foi admitido com subida diferida, tendo sido apreciado pela Relação por acórdão de 27-10-2016, no âmbito do recurso de apelação da sentença final.

    Antes da prolação daquele despacho entrara em vigor o Dec. Lei nº 303/07 que alterou o regime dos recursos que estava previsto no CPC de 1961. Contudo, apesar da abolição do recurso de agravo, o regime anterior foi mantido para a impugnação de despachos proferidos em acções instauradas em data anterior à da entrada em vigor do novo regime, ou seja, anteriores a 1-1-2008.

    Assim, tal como a lei então o prescrevia, aquele despacho foi impugnado mediante a interposição de recurso de agravo que foi admitido com subida diferida, nos termos que resultavam dos arts. 734º e 735º do CPC de 1961, na versão anterior às alterações de 2007.

    [1] Todavia, entretanto foi publicado o NCPC e o art. 7º do respectivo diploma preambular impôs a unificação do regime dos recursos independentemente da data da interposição das acções a que respeitam, ainda que...

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