Acórdão nº 185/12.3TBSBR.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelNUNES RIBEIRO
Data da Resolução16 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: AA, residente no loteamento …, em … - Sabrosa, intentou acção declarativa ordinária contra BB, residente em …, ... - Sabrosa, pedindo seja: a) – Declarado que é dona e proprietária do estabelecimento comercial de Café, Restaurante e Residencial, denominado “CC”, sito no …, n.º …, freguesia de ..., concelho de Sabrosa, constituído pelas instalações do rés-do-chão, 2.º andar, dois terraços, um anexo, um barracão para arrumações e garagem do prédio urbano, sito no …, composto de casa telhada e sobradada para habitação e comércio, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Sabrosa sob o art.º 11….º e descrito na respectiva Conservatória de Registo Predial na ficha n.º 00….

  1. – Declarado que ela, Autora, é titular do direito real de uso sobre as referidas dependências do imóvel supra descrito, nas quais está instalado o aludido estabelecimento comercial.

  2. – O Réu condenado a restituir-lhe as supra referidas dependências do imóvel.

  3. – O Réu condenado a pagar-lhe uma indemnização por perdas, sendo as vencidas de € 42.000,00 e as futuras situadas entre um mínimo de € 1.000,00 e um máximo de € 3.000,00 por cada mês, até efectiva entrega do estabelecimento comercial.

  4. - O Réu ainda condenado numa sanção pecuniária compulsória de € 1.000,00 por cada dia de atraso na entrega do dito estabelecimento, a contar da data da notificação da sentença que vier a decretar a referida entrega.

    Alegou, para tanto, em síntese, que ela e o Réu foram casados um com o outro, sob o regime da comunhão de adquiridos, sendo, na altura, proprietários de um imóvel e, bem assim, de um estabelecimento comercial instalado no rés-do-chão, no 2° andar, nos dois terraços, no anexo, no barracão para arrumações e na garagem do aludido imóvel; que, entretanto divorciaram-se, e, em inventário subsequente, procederam à partilha dos bens comuns; que, no inventário foram relacionadas, além de outras, duas verbas, uma respeitante ao imóvel e outra respeitante ao estabelecimento comercial; que, ao procederem desse modo, ambos tiveram a intenção de que o licitante na verba correspondente ao estabelecimento comercial ficaria titular do direito de uso das respectivas dependências do imóvel onde se encontrava instalado; que, nesse inventário, o imóvel foi adjudicado ao Réu, e à A. o referido estabelecimento comercial nele instalado; que o Réu recusou entregar o estabelecimento comercial à A., sendo ele quem o tem vindo a explorar, obtendo um lucro líquido superior a € 1.000,00 por mês.

    Contestou o Réu, impugnando parte da factualidade invocada pela A. e pedindo a condenação desta, como litigante de má fé, a pagar-lhe uma indemnização nunca inferior a 50% do valor da acção.

    Respondeu a A., impugnando factualidade invocada pelo R., designadamente o pedido de condenação como litigante de má fé.

    O processo prosseguiu seus regulares termos, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença cuja parte dispositiva é do seguinte teor: «Pelo exposto julgo a acção parcialmente procedente, e, em consequência: - Declaro que a A. é dona e proprietária do estabelecimento comercial de café, restaurante e residencial, denominado "CC", sito no …, n.° …, freguesia de ..., concelho de Sabrosa, constituído pelas instalações do rés-do-chão e 2° andar, do prédio urbano sito no …, composto de casa telhada e sobradada para habitação e comércio, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho de Sabrosa sob o art.º 1 1….° e descrito na respectiva Conservatória de Registo Predial na ficha n.º 00..; - Declaro que, logo que concretize o seu direito ao arrendamento das dependências do imóvel supra descrito, nas quais está instalado o aludido estabelecimento comercial, lhe assistirá o direito ao seu uso e a que o R. lhe restitua tais dependências; - Julgo a acção improcedente quanto ao demais, absolvendo o R. do pedido, o mesmo acontecendo com o pedido de condenação da A. com o litigante de má fé.

    Custas a cargo de A. e R., na proporção dos respectivos decaimentos, fixando-se em ¾ pela A. e ¼ pelo R.».

    Inconformado, o Réu apelou para a Relação de Guimarães, tendo a autora interposto, por sua vez, recurso subordinado.

    Por acórdão de 09-6-2016, aquela Relação, julgando procedente o recurso principal e improcedente o recurso subordinado, revogou a sentença recorrida e absolveu o Réu dos pedidos formulados pela Autora.

    Inconformada agora a Autora, esta interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal.

    Na alegação respectiva, conclui da forma seguinte: 1 - Vem a presente Revista interposta da decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que julgou procedente o recurso principal e revogando a decisão da 1ª instância absolveu o Réu dos pedidos e bem assim da decisão do Tribunal da Relação que julgou totalmente improcedente o recurso subordinado.

    2 - No facto 10, a 1ª Instância havia considerado provado que "Após a partilha judicial o Réu colocou os bens móveis que constavam da verba 23 no exterior do estabelecimento para que a Autora os levasse, não permitindo que a Autora se entregasse ou pudesse usar a parte da imóvel afecta ao estabelecimento.

    3 - O Tribunal da Relação, porém, alterou este facto, considerando provado que "Após a partilha judicial, a Autora providenciou pela remoção do prédio de todos os bens móveis que constituíam o recheio do estabelecimento, quer a parte do café quer a parte da residencial".

    4 - Como se vê da decisão do Tribunal da Relação, este transformou o facto da retirada dos móveis para a iniciativa da Autora/Recorrente, ao passo que a 1ª instância havia colocado a retirada dos móveis das instalações a que se destinavam na iniciativa do Réu Recorrido.

    5 - Esta alteração por parte do Tribunal da Relação permitiu que os Senhores Juízes Desembargadores viessem depois a justificar que "a acção praticada pela Autora — a remoção dos bens — fundamenta a convicção de que a intenção seria a do abandono definitivo do prédio".

    6 - No entanto, o Tribunal da Relação considerou o depoimento das testemunhas DD, segundo o à qual os móveis do café estavam num coberto devidamente acondicionados, sendo certo que também a testemunha EE referiu que tais bens se encontravam lá atrás num coberto.

    7 - Assim, sendo certo que o Réu Recorrido não permitiu que a parte do imóvel afecta ao estabelecimento fosse ocupada pela Autora e que foi o Réu que tomou a iniciativa de retirar pelo menos alguns móveis do interior das dependências a que estavam destinados, não se compreende a ligeireza da decisão da Relação ao transformar um facto praticado pelo Réu como tendo sido praticado pela Autora, para daí o Tribunal da Relação concluir um facto falso, a saber, de que o rés-do-chão e 2.° andar do imóvel em questão não faziam parte do estabelecimento comercial de café, restaurante e residencial 8 - De resto, o Tribunal da Relação bem sabia que a iniciativa da retirada dos móveis foi do Réu, que não da Autora, porquanto só assim se justifica o facto provado em 10-A na parte em que considera provado que o Réu não permitiu à Autora a ocupação da parte da imóvel afecta ao estabelecimento comercial.

    9 - Nestes termos impõe-se que esse Supremo Tribunal revogue a decisão do Tribunal da Relação que julgou provado o facto 10 e como não provado o facto F, mantendo-se o facto 10 na versão da 1ª Instância.

    10 - Decidiu o Tribunal da Relação, por aplicação do disposto no artº 360º do Código Civil, acrescentar aos factos provados o facto 10-A, segundo o qual "o Réu não permitiu e nunca permitiria que a parte da imóvel afecta ao estabelecimento fosse ocupada pela Autora por estar convencido que ao licitar o prédio ficava com o direito ao seu uso e fruição exclusivo.

    11 - Para assim o decidir considerou o Tribunal da Relação que o Réu confessou parte do facto que lhe é desfavorável, a saber, que não permitiu a ocupação do imóvel pela Autora, para daí concluir, partindo do princípio da indivisibilidade da confissão, que também deveria ser considerado provado a motivação dessa não permissão, a saber, que o Réu estava convencido que ao licitar o prédio por inteiro ficaria com o direito ao seu uso e fruição...

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