Acórdão nº 3115/13.1TBLLE.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, S.A.

intentou, em 12.12.2013, no Tribunal Judicial da Comarca de Loulé, com distribuição ao 2º Juízo Cível – agora Comarca de Faro, Faro-Instância Central, 1ª Secção Cível-J3 – acção declarativa sob a forma comum, contra: BB, S.A. pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 146.718,11, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até integral e efectivo pagamento, bem como no pagamento das pensões e outras despesas que vier a pagar na pendência dos autos e que se vencerem no futuro a liquidar em execução de sentença.

Invoca, em suma, que no exercício da sua actividade de seguradora celebrou contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, ao abrigo do qual e na qualidade de seguradora da entidade patronal, satisfez ao lesado determinadas prestações em virtude das lesões sofridas por este em consequência de acidente de viação e simultaneamente de trabalho, assistindo-lhe o direito de ser ressarcida dos montantes pagos e que terá de pagar.

A ré contestou, em síntese, invocando a excepção peremptória de prescrição do direito da autora e, no mais, admitindo a ocorrência do acidente e culpa na sua produção do veículo segurado, impugnando os pagamentos e valores indicados.

*** O processo seguiu os seus termos e foi proferido saneador-sentença cuja parte decisória é a seguinte: “Julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: - Declaro verificada a excepção peremptória de prescrição do direito da autora em relação aos montantes pagos em data anterior a 17.12.2010; - Condeno a ré BB, S.A. a pagar à autora AA, S.A. a quantia de € 34.675,28, acrescida de juros de mora, à taxa legal de juros comerciais, contados desde a data da citação até integral pagamento; - Absolvo a ré do demais peticionado.” *** Inconformada, a Autora recorreu para o Tribunal da Relação de Évora que, por Acórdão de 8.9.2016 – fls. 454 a 477 –, julgou procedente o recurso, revogando a sentença recorrida, condenando a Ré BB, S.A. a pagar à Autora AA, S.A. a quantia de € 146.718,11, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até integral e efectivo pagamento, no mais se mantendo o decidido.

*** Inconformada a Ré recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª. A cronologia dos eventos relevantes para a boa decisão da causa é a seguinte: o sinistro ocorreu em 7.03.1999; por sentença proferida em sede laboral, transitada em julgado, foi a Autora condenada no pagamento ao sinistrado, entre outros, de pensão anual e vitalícia; os pagamentos iniciaram-se em 8.3.1999; a Autora peticiona os pagamentos efectuados ou devidos entre 8.3.1999 e 31.12.2014; A acção foi proposta no dia 12.12.2013 e a citação da Ré ocorreu em 17.12.2013.

2ª. Posto isto temos que aquando da citação já se mostrara decorrido o prazo prescricional de três anos em relação a todos os pagamentos efectuados pela Autora anteriores a 17.12.010. E porquê? 3ª. Porque a expressão direito de regresso utilizada no n °4 do art. 31º da Lei 100/97, de 13.9 aplicável ao caso concreto deve interpretar-se correctivamente como tratando-se de um verdadeiro direito de sub-rogação, com o regime jurídico previsto nos arts. 592° e segs. do Código Civil, conforme orientação doutrinária e jurisprudencial prevalecentes; 4ª. A sub-rogação pressupõe o cumprimento da obrigação por parte do respectivo titular, e a prescrição dos direitos só começa com esse cumprimento, como, de resto, decorre do art. 306º, nº1, 1ª parte, do Código Civil; 5º. No caso dos autos deparamo-nos, maioritariamente, com uma situação de prestações periódicas, importando distinguir a prescrição do direito unitário, a qual se inicia com o primeiro pagamento e a prescrição do direito singular a cada prestação periódica.

6ª. Sabendo-se que a Autora começou a pagar as prestações periódicas ao sinistrado, em 8.3.1999, tomando conhecimento do direito que lhe competia, e por isso estava já em posição de exercer o seu direito, podendo pedir a condenação da Ré no que já tinha pago; 7ª Não o podendo fazer em relação às prestações futuras, pois não é possível pedir-se prestações futuras, em resultado de uma sub-rogação de acordo com o Assento 2/78 (hoje Acórdão Uniformizador de Jurisprudência), proferido a 9.11.1977 (in D.R., I Série, de 22.3.1978); 8ª. Dito de outro modo: à medida que o sub-rogado vai satisfazendo o direito do primitivo credor, com os respectivos pagamentos, vai, igualmente, iniciando temporalmente o seu direito a demandar o devedor responsável perante aquele primitivo credor. O início da contagem da prescrição do seu direito é por isso marcado pela data em que satisfaz o primitivo credor.

9ª. Ora, como a Autora peticiona pagamentos efectuados entre 8.03.1999 e 31.12.2014, e como no dia 12.12.2013 interpôs a pressente acção, interrompeu a prescrição, nos termos do art. 323°, n°1, do Código Civil, mas em data em que já se encontravam prescritos todos os créditos anteriores a 17.12.2010, uma vez que estamos, como em cima se referiu, perante uma prestação periódica ou reiterada.

10ª. Considerando que, como supra se referiu, é característico da sub-rogação a colocação do sub-rogado ou solvens na posição do primitivo credor, agindo a Autora como sub-rogada nos direitos do lesado e tendo iniciado o pagamento das pensões em 8.3.1999, pelo menos nessa data tomou conhecimento do direito que lhe competia, podendo livremente exercê-lo, pois era a data em que era exigível a primeira prestação à ora Ré, pelo que se impunha accionar a mesma, no máximo, no prazo de três anos a contar desse momento, o que não aconteceu.

11ª. Com o que não restam, pois, dúvidas de que, à data em que deu entrada em Juízo a presente acção judicial, ou seja, em 12.12.2013, já o direito unitário da Autora ao eventual reembolso dos montantes devidos, como sub-rogada nos direitos do lesado, se encontrava irremediavelmente prescrito, senão na totalidade, relativamente à Ré, pelo menos em relação a todos os pagamentos efectuados em data anterior a 17.12.2013; 12ª. Não sendo despiciendo relembrar que a prescrição “é um instituto endereçado fundamentalmente à realização de objectivos de conveniência ou oportunidade...”, mas arranca, também, da ponderação de uma inércia negligente do titular do direito em exercitá-lo, o que faz presumir uma renúncia ou, pelo menos, o torna indigno da tutela do Direito, em harmonia com o velho aforismo “dormentibus non succurrit jus” (Carlos Alberto da Mota Pinto -Teoria Geral do Direito Civil, 3ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1999, pp. 375 e 376); 13ª. Consequentemente, a contagem do prazo de prescrição deve fazer-se a partir da data de cada acto de cumprimento, e não do cumprimento integral ou do último pagamento, atendendo à natureza das prestações efectuadas, com o que deve ser integralmente mantida a douta Sentença da 1ª Instância apenas como uma pequena ressalva, a condenação da ora recorrente em juros de mora às taxas aplicáveis às operações comerciais. Senão vejamos: 14º. Estamos em pleno domínio da responsabilidade civil extracontratual, donde, qualquer indemnização que possa impender sobre a seguradora recorrente só vence juros (arts, 804.°, 805.°, 806.°) de mora à taxa legal de 4% (artigo 559° do Código Civil e Portaria n.°291/2003, de 8 de Abril), e não à taxa prevista para as operações comerciais (art. 102.° do Código Comercial) porque o que despoleta a obrigação de indemnizar é, tão só, o sinistro ocorrido, sendo manifesto que não estamos perante pagamento que tenha por fundamento qualquer operação comercial ou mercantil.

15ª. Donde, ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou por erro de aplicação ou interpretação os arts. 298°, n.°1, 304°, n.°1, 306°, 307°, 323°, n.°1, 326°, n.°1, 498°, n.°1 e 2, 499°, 559°, 592°, n.°1, 593°, n.°1, 804.°, 805.° e 806.°, todos do Código Civil; assim como os arts. 493°, n.°1 e 2 e art. 576° do Código de Processo Civil; sem esquecer o Assento 2/78 (hoje Acórdão Uniformizador de Jurisprudência), proferido a 9.11.1977 (in D.R., I Série, de 22.3.1978); bem como o art. 294° do Código do Trabalho; o art. 31°, n.°4 da Lei 100/97, de 13.09; os art.°49°, n.°1 e 51°, n.°1, do Regulamento, aprovado pelo DL 143/99 de 30.4; mais antiga a Base XXXVII n.°4 da Lei n.°2127, de 03.01.1965; a Portaria n.°291/2003, de 8 de Abril e ainda do art. 102.° do Código Comercial.

Termos em que deve ser dado provimento ao recurso interposto nos termos da minuta supra, fazendo-se assim a mais objectiva e elementar Justiça.

A Ré contra-alegou, pugnando pela confirmação do Acórdão.

*** Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação considerou provados os seguintes factos: 1 - A autora é uma sociedade que se dedica à actividade seguradora.

2 - No âmbito do exercício da sua actividade a autora celebrou com a sociedade EE, S.A., um contrato de seguro do ramo “acidentes de trabalho” na modalidade de “folhas de férias”, através do qual assumiu a responsabilidade pelos encargos obrigatórios provenientes de acidentes de trabalho ocorridos com os trabalhadores daquela empresa, contrato esse titulado pela apólice n.º 000000.

3 - No âmbito do referido contrato, o trabalhador da segurada da autora CC, encontrava-se coberto pelas garantias da referida apólice.

4 - No dia 07 de Março de 1999, pelas 19 h10, ocorreu um embate na Estrada Nacional N.º 125/4, a km 5, no concelho de Loulé, distrito de Faro.

5 - Tal embate envolveu quatro veículos, a saber: a) veículo ligeiro de passageiros, de matrícula 00-00-00 conduzido por DD; b) veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula 00-00-00, conduzido pelo trabalhador da segurada da autora, DD; c) veículo ligeiro de passageiros, de matrícula 00-00-00, conduzido por FF; e d) veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula 00-00-00, conduzido por GG.

6 - O veículo conduzido pelo trabalhador da segurada da autora, DD, circulava na Estrada Nacional N.º125/4, no sentido Loulé / Faro.

7 - O...

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