Acórdão nº 4891/11.1TBSTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução30 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA propôs esta acção contra 1) BB, 2) CC e 3) DD, LDA, alegando, em síntese: é um dos sócios da sociedade R, da qual foi o único gerente entre Outubro de 2007 e Outubro de 2011, altura em que foi destituído sem justa causa, por deliberação de uma assembleia para a qual não foi convocado e na qual não esteve presente e de cuja acta constam apenas conclusões jurídicas e não os factos que fundamentaram essa sua destituição; os 1º e 2º RR passaram a gerir a sociedade, impediram o A de lá entrar e conseguiram registar a sua destituição com base em tal deliberação, apesar de saberem que o mesmo não havia sido convocado para a assembleia; o A deixou de receber a sua remuneração, com a qual assegurava os gastos do seu agregado familiar, não tendo outros rendimentos.

Com tais fundamentos, pediu que os RR sejam condenados a pagar-lhe, solidariamente, a indemnização de € 123.573,12, acrescida dos juros legais desde a citação, correspondente a quatro anos de salários.

Os RR contestaram, invocando a ilegitimidade dos 1º e 2º RR e alegando que a destituição do A foi fundamentada nos factos que descrevem.

Foi proferida sentença julgando a acção improcedente e absolvendo os RR do pedido porque «sendo a deliberação nula e não há destituição e o A mantém-se como gerente da sociedade, não tendo direito à indemnização pedida com fundamento na destituição sem justa causa, sem prejuízo de ter direito a ser indemnizado pela falta de pagamento da remuneração devida por força da sua manutenção como gerente da sociedade» (sic).

A Relação do Porto, julgando parcialmente procedente a apelação interposta pelo A, condenou os RR, solidariamente, a pagar ao A a quantia de € 123.573,12, acrescida de juros.

Os RR interpuseram recurso de revista dessa decisão, cujo objecto delimitaram com as seguintes conclusões: I. (…).

  1. O Acórdão recorrido está ferido da nulidade prevista no art. 615°, nº 1, al. b) e nº 4 e art. 607°, nº 3 do CPC ex vi art. 666°, nº 1 todos do CPC ou outra que, ex officio, se repute subsumível à total e absoluta omissão dos fundamentos de facto e de direito, bem como o percurso lógico-racional, subjacentes à decisão de condenação, e ainda por cima solidária, dos Recorrentes BB e CC no pagamento da indemnização arbitrada; III. Sem prescindir, e caso se conclua pela não verificação da nulidade do Acórdão recorrido referida na conclusão anterior, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, sempre se verifica erro de julgamento e que adiante, nesta conclusões, se especificará em maior detalhe.

  2. O Acórdão Recorrido omitiu acto prescrito pela lei conquanto, tendo decidido, como decidiu, considerar nula a decisão de primeira instância e, por esse motivo, conhecer de todas as questões que ao tribunal de primeira instância era lícito conhecer, não ordenou a notificação das partes nos termos do disposto no art. 665°, nº 3 do CPC; V. Tal omissão tinha, como teve, manifesta influência na discussão da causa tanto mais que a decisão de primeira instância nem sequer havia abordado ou conhecido da atribuição e liquidação da indemnização, respectivo montante e, bem assim, dos responsáveis pelo seu pagamento e respectivo regime de exigibilidade (solidariedade ou conjunção), para além de que sempre poderiam os Recorrentes pugnar, como pugnam, pela inexistência de nulidade da decisão de primeira instância por excesso de pronúncia, o que fere a decisão recorrida de nulidade secundária e que é passível de ser invocada, como é, nas alegações de recurso, tudo à luz do disposto no art. 665°, nº 3 e 195° do CPC.

  3. Sem prescindir, salvo diferente e melhor entendimento, não se verificava excesso de pronúncia da decisão de primeira instância, o que se invoca para todos os efeitos legais, na medida em que a questão da nulidade foi trazida aos autos pelo próprio Recorrido discordando-se, portanto, da decisão recorrida quanto à verificação de nulidade da decisão por excesso de pronúncia, daí, também, o presente recurso.

  4. Por outro lado, não se acompanha a decisão recorrida quando determina que a questão de direito quanto à existência ou inexistência de justa causa transitou em julgado, daí, também, o presente recurso.

  5. O dispositivo da sentença revogada conheceu do pedido (único, aliás) deduzido pelo Recorrido, o qual, como se sabe, era o seguinte: "Termos em que a presente acção deve ser julgada provada e procedente e por vai dela os RR condenados a, solidariamente, pagarem ao A a quantia de € 123.573,12, acrescida de juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento" e não distingue fundamentos ou causas de pedir, julgando improcedente o único pedido formulado nos autos, que era o da indemnização (e o de litigância de má fé).

  6. Com efeito foi a inexistência de factos constitutivos do direito invocado que vaticinou a acção dos autos à total improcedência do pedido em primeira instância, sendo totalmente irrelevantes todas as questões posteriores que houvessem a ser tratadas, designadamente, do preenchimento dos restantes pressupostos da responsabilidade civil dos Recorrentes e, até, do abuso de direito invocado pelos ora Recorrentes na sua defesa.

  7. O objecto da apelação referia-se ao preenchimento dos requisitos de que depende a responsabilidade civil dos Recorrentes, tendo estes, na sua resposta à apelação, onde também se pretendia a condenação daqueles como litigantes de má fé, mantido e reiterado a invocação da justa causa de destituição na medida em que ficaram demonstradas uma série de irregularidades praticas pelo Autor no exercício da gerência.

  8. Ora, para os Recorrentes manteve-se sempre a questão da existência de justa causa, nunca se tendo conformado com a inexistência da mesma, ainda que tenham saído absolvidos da acção contra eles intentada.

  9. Salvo diferente e melhor entendimento, o que o Autor, ora Recorrido, delimitou como objecto das suas alegações foi o preenchimento de todos os pressupostos do instituto jurídico da responsabilidade civil, da nulidade ou da anulabilidade pretendendo retirar a correspectiva obrigação de indemnização, não tendo impugnado a matéria de facto.

  10. Os Recorrentes tendo sido absolvidos do pedido original (e único) e do pedido de litigância de má fé sem que, no dispositivo da sentença, se tivesse declarado procedente qualquer fundamento da acção contra estes proposta, e tendo o objecto do recurso interposto de seguida abrangido todos os pressupostos da responsabilidade civil atentos os factos provados, e tendo os ora Recorrentes, na sua resposta, pugnado pela verificação da justa causa de destituição, sempre poderiam esperar, como esperavam, que o Tribunal da Relação construísse a sua própria convicção de direito quanto aos factos provados e relativamente a todos os pressupostos de um eventual direito de indemnização o que não sucedeu de todo na medida em que conheceram apenas da questão da nulidade que nunca foi fundamento da defesa dos Recorrentes.

  11. A matéria de facto provada sob os pontos J), K), AB), AC), AD), AE), AN), AO) e AP) demonstra a existência de justa causa de destituição do Recorrido, na medida em que tendo este retirado montantes em dinheiro de contas bancárias da Recorrente sociedade em benefício das suas próprias contas bancárias, tendo celebrado acordos de cessação de contrato de trabalho em manifesto conflito de interesses com a sociedade que representava e obrigava, tendo mandado instalar na sua casa produtos realizados com materiais comprados e transformados pela sociedade recorrente que apenas foram facturados após a sua saída da gerência violou os deveres contratuais a que se obrigou ocorrendo efectiva justa causa para a sua destituição pelo que sempre deveriam os Recorrentes ser absolvidos do pedido; XV. Sem prescindir, e ainda que se considere ter sido operada destituição sem justa causa, atenta a matéria de facto provada, não estão preenchidos os pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar pelo que devem os Recorrentes ser absolvidos do pedido, ainda que se admita que tal possa ocorrer por razões distintas.

  12. O Recorrido peticionou nestes autos a indemnização à luz do disposto no art. 257°, nº 7 do CSC, a qual está prevista para a responsabilidade contratual da sociedade comercial em relação ao destituído, aqui Recorrido; XVII. Entre os Recorrentes pessoas singulares e o Recorrido, inexiste qualquer relação contratual pelo que, tão pouco, poderá existir fundamento jurídico que determine a condenação daqueles no pagamento de uma qualquer obrigação de indemnizar.

  13. Ou seja, peticionando o Recorrido nestes autos as remunerações que deveria receber durante 4 (anos) anos nos termos do disposto no art. 257°, nº do CSC será potencialmente devedor das mesmas (e não é conforme vemos e veremos infra) a sociedade Recorrente e nunca os seus sócios aqui recorrentes.

  14. Tão pouco podem os Recorrentes pessoas singulares ser solidariamente responsáveis pelo pagamento de uma indemnização nestes termos na medida em que tal não resulta da lei, nem da convenção das partes (vide art. 513° do CC) pelo que sempre terão de ser absolvidos do pedido; XX. Inexistindo justa causa para a cessação da relação contratual de mandato entre a sociedade Recorrente e o Recorrido mantém-se com plena aplicação as regras gerais de direito no que concerne à fixação da indemnização apenas com a ressalva do limite máximo previsto no art. 257.°, nº 7 do CSC, não existindo, porém, nos autos prova de quaisquer danos ou, no limite, de danos no montante arbitrado de € 123.573,12; XXI. O Recorrido não logrou demonstrar facto determinante e essencial cuja prova a si competia em exclusivo (art. 342°, nº 1 CC), designadamente a inexistência de outra fonte de rendimento conforme alegou, nem tão pouco alegou ou demonstrou a impossibilidade de exercer actividade remunerada de idêntico nível económico, social e profissional.

  15. Não tendo o Recorrido feito prova de que se encontrava desempregado, por maioria de razão, não logrou fazer prova de que não...

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