Acórdão nº 859/15.7T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelFERREIRA PINTO
Data da Resolução18 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo 859/15.7T8LSB.L1.S1 (Revista)[1] – 4ª Secção Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I a).

Introdução[2]: AA intentou, em 12 de janeiro de 2015, a presente ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma do processo comum, contra “BB, S.A.”, na Comarca de Lisboa – Lisboa - Instância Central - 1ª Secção do Trabalho - J2, pedindo o reconhecimento da existência de um vínculo de natureza laboral com a ré e que seja declarada a ilicitude do seu despedimento por esta efetuado[3].

Mais peticiona, em consequência, a condenação da ré: i. A reintegrá-la no seu posto de trabalho, sem prejuízo da opção pela indemnização de antiguidade.

A pagar-lhe: ii. As retribuições intercalares, desde Setembro de 2014; iii. Danos não patrimoniais; iv. Créditos laborais, no valor de € 3.775,53; v. Juros de mora, desde 11 de Setembro de 2014, até efetivo e integral pagamento.

Alegou, em resumo, ter sido admitida ao serviço da ré em 1 de outubro de 2007, mediante contrato que, pese embora intitulado de prestação de serviços de funções docentes, equivalia, efetivamente, a um contrato de trabalho.

Nesse âmbito, foi admitida ao serviço da ré para, sob as suas ordens, direção e fiscalização, exercer as funções de assistente, na área da Saúde e Bem-estar, em regime de tempo integral, totalizando 36 horas semanais, sendo 12 horas de lecionação e as restantes aplicadas na correta execução das demais funções docentes.

Auferia, ultimamente, a retribuição global de € 13.441,21, paga em catorze prestações de € 960,09 cada.

Manteve-se como docente contratada pela ré nos anos letivos de 2008/2009, 2009/2010, 2010/2011, 2011/2012, 2012/2013 e 2013/2014, sendo que, no dia 11 de setembro de 2014, a ré promoveu o seu despedimento, sem aviso prévio e sem procedimento disciplinar que antecedesse o despedimento ou justa causa que o fundamentasse.

No âmbito das funções que exerceu na ré sempre teve horário de trabalho, utilizou os bens e utensílios pertença da ré, auferia uma remuneração mensal, bem como subsídio de férias e subsídio de Natal, integrava-se na organização produtiva da ré e estava sujeita ao seu poder disciplinar.

Observava o regime fiscal e de segurança próprios dos trabalhadores por conta de outrem, exercendo as suas funções para a ré em regime de exclusividade.

Aquando do seu despedimento, encontrava-se em licença parental pelo nascimento da sua filha, sendo que a ré não solicitou, à CITE, qualquer parecer prévio.

Devido ao despedimento sofreu danos de natureza não patrimonial merecedores de tutela do direito.

~~~~~~~ Realizada a audiência de partes a que alude o artigo 54º, do Código de Processo Trabalho [CPT], sem se ter conseguido a conciliação das partes, com citação prévia da Ré, esta apresentou contestação, alegando, em síntese, o seguinte: - Celebrou com a autora um primeiro contrato de prestação de serviços de funções docentes no ano letivo 2007/2008, ao qual se seguiram outros, de idêntica natureza, para os anos letivos de 2008/2009, 2009/2010, 2010/2011, 2011/2012, 2012/2013 e 2013/2014; - Os serviços da autora foram contratados para que a mesma lecionasse no Curso de Terapia da Fala, estando a contratação dependente da existência de turmas em cada ano letivo, sendo que, no ano letivo 2014/2015, a ré apenas não celebrou com a autora novo contrato em virtude de, no final desse ano letivo, o referido curso encerrar; - A autora sempre desempenhou a sua atividade com inteira autonomia cultural, científica e pedagógica, sendo que o seu horário era fixado, no início do curso e ano ou semestre, de acordo com as suas conveniências e disponibilidade; - Não dirigia nem fiscalizava a atividade da autora, tendo esta plena liberdade para organização do seu tempo relativamente à preparação de aulas e atividades complementares; - A contratação de docentes do ensino superior particular e cooperativo pode efetuar-se tanto através de um contrato de trabalho como através de contrato de prestação de serviço, sendo que, atenta a atividade contratada com a autora, nunca a mesma poderia ser desempenhada noutro local ou sem sujeição a qualquer horário, sob pena de tanto inviabilizar a organização das aulas; - Os valores pagos por ocasião de férias e de Natal não correspondem a quaisquer subsídios, pois nada impedia as partes de acordar no pagamento nos moldes em que o fizeram.

Conclui, assim, pela improcedência da ação, com a sua consequente absolvição dos pedidos.

A autora apresentou articulado de resposta à contestação, mas o mesmo foi mandado desentranhar, sem prejuízo de permanecerem nos autos os documentos juntos.

~~~~~~~~ Foi proferido despacho saneador, dispensando-se a realização de audiência preliminar, bem como a seleção da matéria de facto assente e a seleção da matéria a constar da base instrutória.

~~~~~~~~ Procedeu-se à realização da Audiência de Julgamento, finda a qual a autora optou, em caso de procedência da ação, pela indemnização de antiguidade em substituição da reintegração no seu posto de trabalho, e procedeu-se à leitura da matéria de facto provada e não provada e da respetiva motivação.

~~~~~~~~ Em 21 de dezembro de 2015, foi proferida sentença, na qual se julgou a ação totalmente improcedente, por não provada, e, consequentemente se absolveu a ré de todos os pedidos formulados pela autora. Para o efeito, concluiu-se, como fundamento para a decisão tomada, que do cotejo de todos os factos provados e da necessária conjugação de todos os indícios que dos mesmos decorriam, que o vínculo que uniu autora e ré se não enquadrava no âmbito de um contrato de trabalho.

II Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação, impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto e pugnando pela aplicação ao caso concreto da presunção de laboralidade estabelecida no artigo 12º, do Código de Trabalho de 2009 [CT/2009] e pelo reconhecimento de que a natureza do vínculo contratual existente entre as partes tinha natureza laboral e não de prestação de serviço.

Em resultado da reapreciação da matéria de facto o Tribunal da Relação de Lisboa aditou dois novos factos, que ficaram com os n.ºs 36 e 37 e com a seguinte redação.

- Facto n.º 36: “Em caso de pretensão de acumulação, tinha de ser feito pedido nesse sentido ao reitor, o qual, como aconteceu, umas vezes autorizava e outras não”.

- Facto n.º 37: “Quer a secretária de curso, quer o pessoal auxiliar, através dos sumários das aulas, faziam controlo das aulas que eram dadas pela autora”.

Por acórdão de 15 de dezembro de 2016, julgou-se parcialmente procedente a apelação da autora e, em consequência, alterou-se a sentença recorrida do seguinte modo: a) Declarou-se a ilicitude do despedimento da autora, efetuado pela ré; b) Condenou-se a ré a pagar à autora as retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da propositura da ação até trânsito em julgado desta decisão, deduzidas do subsídio desemprego que, eventualmente, tenha sido atribuído à autora, devendo a ré entregar a quantia correspondente a este subsídio à Segurança Social; c) Condenou-se a ré a pagar à autora uma indemnização em substituição de reintegração correspondente a 50 dias de retribuição base por fração ou ano completo de antiguidade contada desde 1 de Outubro de 2007 até ao trânsito em julgado deste acórdão; d) Condenou-se a ré a pagar à autora da quantia de € 2.000,00 (Dois Mil Euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data deste acórdão até integral pagamento; e) Condenou-se a ré a pagar ao autor juros de mora à taxa legal, sobre as quantias referidas em b) e c), desde as datas dos respetivos vencimentos parcelares, até integral pagamento; f) Absolveu-se a ré do restante peticionado.

III b).

Do recurso de revista: Inconformada com esta decisão ficou, agora, a Ré “BB, S.A.” que dela interpôs o presente recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, pedindo que se revogue o acórdão recorrido, que se reconheça que o contrato celebrado com a Autora era um contrato de prestação de serviço, com todas as consequências legais daí advindas.

Também pediu, “embora sem conceder”, que, caso venha a entender-se que o vínculo constituído tinha natureza laboral, e sendo o montante da indemnização substitutiva da reintegração de 50 dias por cada ano/fração, a título de compensação de antiguidade, completamente desproporcional e excedendo “em absoluto” o que consta no n.º 1 do artigo 391º, do CT 2009, deve ser alterado e fixado no mínimo legal, e que não pode manter-se a condenação em danos não patrimoniais, para mais cumulada com a referida indemnização.

No recurso a Ré, depois de o motivar, apresentou as seguintes conclusões: 1) “A decisão ora posta [em] crise enferma de erro na aplicação do direito, nos termos do disposto na al, a) do art.º 674º do CPC, sendo que as normas jurídicas violadas pelo Tribunal recorrido são as normas dos art.ºs.10º e 12°, ambos do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, 391º do CT 2009 e 496° do CC.

2) O que está, fundamentalmente, em causa no âmbito do presente recurso é a apreciação do julgamento de direito perpetuado pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, revogando a decisão de primeira instância, considerou que o vínculo constituído entre A. e Ré era um contrato de trabalho. Desde logo, 3) Não poderá perder-se de vista que a atividade exercida pela aqui A. era de docente do ensino superior e, nesta medida, estando reflexamente sujeita ao disposto no n.º.2, do art.º 24º do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, especificidade que foi completamente desconsiderada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

4) A A., pessoa obviamente instruída, celebrou, anualmente e por sete vezes, contrato de prestação de serviços docente, cuja designação não pode deixar de constituir um claro indício do que foi a vontade das partes, indício este completamente desconsiderado pelo tribunal recorrido.

5) Passou completamente despercebido o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT