Acórdão nº 1594/10.8TBVFR.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução06 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA instaurou, em 25 de Março de 2010, acção declarativa de condenação, com forma de processo comum ordinário, contra BB, S.A., alegando, em síntese, que no período compreendido entre 1998 e 2009 promoveu a celebração de contratos de compra e venda dos produtos comercializados pela ré nas ilhas dos Açores e da Madeira. Em 27 de Julho de 2009 a ré comunicou-lhe que devia considerar cessada a sua relação de prestação de serviços a partir de 31 de Agosto de 2009.

Pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia total de € 35.049,67 resultante da soma das quantias peticionadas a título de comissões, de indemnização pela inobservância do prazo de pré-aviso, de indemnização de clientela e de juros vencidos. Peticionou ainda os juros vincendos sobre aquela quantia e, bem assim, os valores correspondentes a comissões resultantes dos contratos promovidos pelo autor e celebrados pela ré após o termo do contrato junto de clientes, em montante a liquidar ulteriormente.

A ré contestou, impugnando parcialmente os factos alegados pelo autor.

Percorrida a tramitação subsequente, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor: a) - a quantia de € 665,97, a título de comissões, acrescida de juros de mora vincendos desde 30 de Setembro de 2009, calculados à taxa de juro comercial que vigorar ao longo de cada semestre até efectivo e integral pagamento.

  1. – a quantia de € 26.860,18, a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora desde a citação, calculados à taxa de juro comercial que vigorar ao longo de cada semestre até efectivo e integral pagamento.

  2. – a quantia de € 3.048,84, a título de indemnização pela inobservância de pré-aviso, acrescida de juros de mora desde a citação, calculados à taxa de juro comercial que vigorar ao longo de cada semestre até efectivo e integral pagamento.

    No mais absolveu a ré do pedido.

    Apelou a ré, tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido acórdão, em 4 de Maio de 2017, a julgar o recurso parcialmente procedente e condenar a ré a pagar ao autor a quantia de € 21.500,00, a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora a contar da data da sentença da 1ª Instância (17.11.15), calculados às taxas de juros comerciais vigentes ao longo de cada semestre até efectivo e integral pagamento, mantendo no mais o decidido.

    Mais uma vez inconformada, interpôs a ré recurso de revista.

    Na alegação oportunamente apresentada, aduziu, no que ora releva, as seguintes conclusões: I. O presente recurso é interposto do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, na parte em que condenou a Recorrente a pagar ao Recorrido a quantia de € 21.500,00, a título de indemnização de clientela, acrescida de juros de mora, a contar desde a data da sentença da 1ª instância (17.11.15), calculados às taxas de juros comerciais vigentes ao longo de cada semestre até efectivo e integral pagamento.

    (…) XX. Considerou o Tribunal que a alteração do facto provado n.º 19 não implicava a exclusão de atribuição ao Recorrente da indemnização de clientela, mas apenas tinha repercussão no montante da indemnização, determinando a sua redução em 20%.

    XXI. Ora, salvo o devido respeito, não assiste razão ao Tribunal a quo, entendendo a Recorrente que, em virtude da referida alteração, não é possível concluir pelo preenchimento do requisito previsto na alínea b) do art.º 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho.

    XXII. Da análise do art.º 33.º do aludido diploma resulta que constituem pressupostos cumulativos da atribuição da indemnização de clientela: (i) a angariação de novos clientes para a outra parte ou aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente; (ii) a existência de benefício considerável para o principal, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente; e (iii) o agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os referidos clientes.

    XXIII. Da simples análise do regime legal é possível constatar que, para que haja lugar a indemnização de clientela, não basta que o agente, durante a vigência do contrato, tenha angariado novos clientes para o principal ou tenha aumentado substancialmente o seu volume de negócios, porquanto, tivesse sido essa a intenção, e o legislador teria consagrado como requisito de atribuição de indemnização de clientela unicamente o constante da alínea a).O requisito constante da alínea b) é, pois, autónomo, sendo, aliás, o que verdadeiramente justifica a atribuição da indemnização de clientela.

    XXIV. O fundamento da indemnização de clientela assenta precisamente no facto de se reconhecer que a actividade desenvolvida pelo agente, durante a vigência do contrato de agência, e que teve como resultado a angariação de novos clientes ou o acréscimo substancial do volume de negócios, pode continuar a proporcionar ao principal, após a cessação do contrato, benefícios consideráveis, sem que, cumulativamente, o agente receba qualquer remuneração ou contrapartida por esses benefícios (al. c) do art.º 33.º).

    XXV. Mas, por ser essa a ratio da indemnização de clientela, a mesma naturalmente apenas se justifica se e na medida em que o principal continue a auferir, após a cessação do contrato, benefícios consideráveis da actividade desenvolvida pelo agente.

    XXVI. Atenta a letra da lei e a ratio da indemnização de clientela é, pois, necessário, para que a mesma seja atribuída, a existência de benefícios para o principal, após a cessação do contrato, sendo que o legislador foi mais longe, exigindo, como requisito de atribuição da indemnização de clientela, que esses benefícios sejam consideráveis.

    XXVII. A aferição do preenchimento deste requisito pode suscitar algumas dificuldades, porquanto no momento da cessação do contrato ou no momento em que a indemnização é reclamada em juízo podem ainda não se saber quais foram os benefícios efectivamente alcançados pelo principal após a cessação do contrato.

    XXVIII. Por esse motivo, a doutrina e jurisprudência tem vindo a entender que essa aferição se basta com a formulação de um juízo de prognose que logre demonstrar ser bastante provável a obtenção daqueles benefícios.

    XXIX. Ora, ainda que não se exija ao agente que demonstre a efectiva obtenção por parte do principal de benefícios consideráveis da actividade por si desenvolvida na vigência do contrato – mormente as vendas concluídas após a cessação do contrato com os clientes por si angariados -, é exigível, tal como entendeu – e bem - o Tribunal no acórdão-fundamento, “a demonstração de factos atinentes à prognose relativa à manutenção dos benefícios e ao seu carácter considerável”, XXX. E, neste quadro, a demonstração de quantos dos clientes angariados pelo agente ou cujo volume de negócios aquele impulsionou se mantiveram como clientes do principal após a cessação do contrato e qual o volume de negócios que aqueles representavam antes da cessação do contrato, sendo certo que a demonstração de tais factos incumbe ao agente, porquanto está em causa um facto constitutivo do seu...

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