Acórdão nº 1509/13.1TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2017
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) instaurou, em 29/08/ 2013, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra a BB - Companhia de Seguros, S.P.A. - Sucursal em Portugal (R.), a pedir da condenação desta a pagar-lhe a quantia global de € 667.856,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, a contar da citação, bem como no que se viesse a liquidar em decisão ulterior, relativamente aos custos com duas substituições de prótese, alegando, em síntese, que: .
Em 19/11/2011, pelas 22h00, na Rua … em Lisboa, ocorreu um acidente de viação em que o veículo automóvel de matrícula ...-...-ZT atropelou o A. com culpa exclusiva do respetivo condutor; .
A responsabilidade civil emergente da circulação do referido veículo encontrava-se transferida para a R.; .
Em consequência daquele atropelamento, o A. sofreu lesões corporais e subsequentes sequelas, cuja reparação importam, no que aqui releva, os seguintes montantes indemnizatórios: - € 525.000,00, a título de dano patrimonial futuro decorrente da incapacidade de 37 pontos percentuais; - € 40.000,00 a título de danos não patrimoniais.
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A R. contestou a sustentar a improcedência parcial da ação, impugnando, além do mais, os montantes peticionados pelo A., contrapondo-lhes os seguintes valores: € 20.898,75, a título de dano biológico; € 5.779,42, quanto ao dano estético; € 3.302,53, por quantum doloris; € 15.480,62, a título de esforços acrescidos na vida laboral. 3.
Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 382 a 412, datada de 09/06/2016, a julgar a ação parcialmente procedente, condenando a R. a pagar ao A., no que aqui interessa, o seguinte: i) – a quantia de € 110.000,00, a título de indemnização por dano patrimonial derivado do défice funcional permanente da integridade físico-psicológico de 25,6 pontos percentuais; ii) – a quantia de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais; iii) – juros de mora, à taxa anual de 4%, sobre aquelas quantias, a contar da data da sentença.
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Inconformados com tal decisão, tanto o A. como a R. recorreram para o Tribunal da Relação de … que, conforme o acórdão de fls. 539 a 561/v.º, datado de 11/05/2017, julgou improcedente a apelação da R. e procedente a apelação do A., alterando para: i) - € 250.000,00, a indemnização pelo dano patrimonial derivado défice funcional permanente da integridade físico-psicológico de 25,6 pontos percentuais; ii) – € 35.000,00, a indemnização por danos não patrimoniais.
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Desta feita, vem a R. pedir revista, a pedir que a indemnização pelo dano decorrente do referido défice funcional seja reduzida para valor não superior a € 70.000,00 e a indemnização pelos danos não patrimoniais reduzida para valor não superior a € 15.000,00, para o que formula as seguintes conclusões: 1.ª - Os valores indemnizatórios arbitrados a título de dano biológico e de danos morais no acórdão recorrido, pecam por excesso, face à matéria de facto dada como provada, pelo que deverão ser ajustados aos que na perspetiva da Recorrente correspondem a um real e equitativo ressarcimento dos danos sofridos no caso concreto.
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- Com a decisão proferida, o Tribunal “a quo” violou quanto dispõem os artigos 494.º, 496.º, n.ºs 1 e 3, 562.º, 564.º, n.º 1, 564.º, n.º 2, todos do CC, bem assim como o disposto no DL n.º 291/2007, de 21.8 e na Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, alterada pela Portaria n.º 679/2009, de 25 de junho.
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- De igual modo, considera a Recorrente que se verifica violação do preceituado no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 666.º do mesmo diploma, estando o acórdão recorrido ferido de nulidade por contradição entre a fundamentação e a decisão; 4.ª - Com efeito, na fundamentação respeitante ao recurso sobre matéria de facto que tinha sido interposto pela ora Recorrente, o Tribunal “a quo” veio alterar o n.º 19 da matéria de facto, o qual passou a ter a seguinte redacção: "À data do acidente o A. era administrador de uma empresa, denominada "CC", situação que se manteve pelo menos até julho de 2015.”; 5.ª - Significa o exposto que, ao contrário do que consta da parte decisória do acórdão, o recurso interposto pela ora Recorrente foi parcialmente procedente; 6.ª - Significa igualmente, que a ora Recorrente não decaiu na totalidade, o que deverá ter consequências relativamente à condenação por custas; 7.ª - Termos em que se verifica uma contradição entre os fundamentos e a decisão que fere de nulidade o acórdão recorrido, impondo-se, em consequência, a sanação do vício nos termos expostos; 8.ª - No que respeita à indemnização fixada por dano biológico, considera a Recorrente que os critérios para a quantificação deste dano deverão ser diversos dos considerados no acórdão recorrido; 9.ª - Conjugando a matéria de facto dada como provada, com os demais elementos constantes dos autos e o conhecimento público do desfecho da "CC", não poderá ser ignorado, com relevância para a quantificação deste dano, que o Recorrido tem 64 anos, que não exerce atividade profissional como administrador da "CC" que, como é público, está insolvente, que não resultou provado que a tenha exercido a partir de julho de 2015 e que não ter resultou provado que tenha ficado efetivamente afetado, em termos remuneratórios, em virtude da incapacidade decorrente do acidente; 10.ª - Neste contexto, o dano biológico deve, no caso dos autos, integrar a categoria de dano moral e não de dano patrimonial, vide, designadamente, acórdão do STJ, de 27.10.2009 e acórdão da Relação de Coimbra de 04.06.2013, ambos disponíveis em www.dgsi.pt; 11.ª - Não tendo as sequelas sofridas pelo Recorrido tido qualquer repercussão efetiva nos proventos auferidos em virtude da sua atividade profissional, consideramos que a indemnização a fixar para ressarcimento deste dano, não deverá ter como referência a remuneração que o mesmo auferiu enquanto trabalhou como administrador da CC; 12.ª - O dano biológico expresso no grau de incapacidade de que o lesado fica a padecer, e quando não interfere na capacidade de ganho, antes determinando a necessidade de um esforço acrescido para viver e para todas as actividades diárias, levando a uma diminuição da qualidade de vida em geral, é igualmente grave para quem exerce um profissão remunerada com € 5.000,00 ou com € 500,00 sendo a dimensão do direito à saúde que está em causa e que é, tal como o direito à vida, igual para qualquer ser humano; 13.ª - Fazer interferir o valor do salário de cada um ou o do salário mínimo nacional quando o lesado não exerce ou não tem profissão, pode até, a nosso ver gerar situações injustas. Pode acontecer que o esforço acrescido necessário para o exercício da actividade, por força de uma incapacidade como aquela de que o A. padece e que afeta a sua mobilidade, seja maior para alguém que, por exemplo, exerça a profissão de pintor, do que para alguém que seja administrador numa empresa; 14.ª - Utilizando os critérios previstos na Portaria n.º 377/2008 de 26-05, atualizada pela Portaria n.º 679/2009 de 25-06, anexo IV e tendo como referência a remuneração média mensal dos trabalhadores por conta de outrem, havendo também que considerar, naturalmente a idade do lesado que era de 59 anos à data do acidente e o grau de desvalorização que é de 25,6 pontos, chegamos ao valor compensatório de € 58.684,05, consideravelmente inferior ao que foi apurado no acórdão recorrido; 15.ª - Não descurando que releva igualmente para o cômputo deste dano a análise de decisões jurisprudenciais, veja-se, a este propósito as seguintes decisões (todas consultáveis em www.dgsi.pt): um estudante de 21 anos que ficou a padecer de uma incapacidade parcial permanente de 50%, com aumento previsível de 3%, julgou-se adequada indemnização, por danos patrimoniais, de € 110.000,00 (STJ, 25.6.2009, 0863234); o lesado com 28 anos, que à data do acidente auferia € 6.181,70 anuais e ficou com 40% de IPP, atribuiu-se € 80.000,00 pela perda da capacidade de ganho (STJ, 26.01.2010, 220/ 2001-7.S1); a um lesado com 32 anos de idade, que à data do acidente não trabalhava mas tencionava fazê-lo e ficou a padecer de IPG de 30%, fixou-se a indemnização por danos patrimoniais correspondentes, em € 60.000,00 (STJ, 06.12.2011, 52106.0TBVNC. GI.S1); a um sinistrado com 22 anos de idade, que tinha boas perspetivas de seguir carreira militar, que se goraram em virtude das sequelas do acidente, que ficou afetado com IPP de 15%, futuramente ampliada em mais 10%, atribuiu-se, a título de dano patrimonial respetivo, € 100.000,00 (STJ, 01.6.2011, 198100.8GBCLD.LI.S1); No acórdão do STJ de 4/12/2007, foi fixada uma indemnização de € 110.000,00 a um lesado que auferia € 698,32 por mês como empregado do comércio, que já tinha 44 anos à data do acidente, mas que ficou afetado de uma IPP de 47%; no acórdão do STJ de 30109/2010, considerou-se adequada a indemnização de € 80.000,00 para uma estudante de 17 anos de idade, com uma IPP de 20%; 16.ª - Em todos os casos referidos, constatamos situações de vítimas muito mais novas e, como tal, cm muito mais anos de vida ativa pela frente. E com incapacidades superiores à do Recorrido; 17.ª - O Tribunal não pode ignorar três pontos de enorme relevância no caso dos autos: A idade do Recorrido – 64 anos, o facto de não ter tido uma perda efetiva de rendimentos provenientes do seu trabalho e a incapacidade de que ficou a padecer que, não sendo insignificante obviamente, também não é tão elevada como algumas situações citadas nos acórdãos referidos; 18.ª - Em face do exposto e tudo ponderado, afigura-se que a indemnização arbitrada no acórdão recorrido vai muito além do que seria adequado no caso concreto, devendo ser reduzida para montante não superior a € 70.000,00; 19.ª - Quanto à compensação pelas dores, angústias, internamento de 10 dias para colocação da prótese e tratamentos subsequentes, que o Tribunal a quo fixou em € 35.000,00, considera-se adequada, face ao que ficou provado, a redução para...
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