Acórdão nº 2190/03.1TBPTM.E2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Data da Resolução14 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1.

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública em que é expropriante “IEP – Instituto das Estradas de Portugal” e expropriada “AA, SARL”, proferida decisão arbitral e adjudicados os prédios identificados nos autos à expropriante, vieram, a expropriante e a expropriada, interpor recurso da decisão arbitral.

  1. Da sentença foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de … que, por acórdão já transitado, anulou aquela sentença e determinou a realização de nova avaliação e, se necessário, de inspeção judicial.

  2. Realizadas as diligências de instrução, foi proferida nova sentença que fixou em EUR 142.080,00, o montante a pagar a título de indemnização à expropriada, montante atualizável nos termos previstos no art.24º, do Código das Expropriações.

  3. Inconformada com esta decisão, dela apelou a expropriada, e, em conclusão, disse: 1ª) Expropriação por utilidade pública " é a relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar determinados bens imóveis em um fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjetivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património da pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a esta pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória (M. Caetano — Manual, 8a ed. 944j; 2ª) O porto seguro do direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte resulta, entre outros, das disposições combinadas dos artigos 62° da Constituição da República Portuguesa (CRP), 1311° do Código Civil (CC) e Io do Código das Expropriações (CE); 3ª) São pressupostos legais para o recurso ao instituto da expropriação por utilidade pública, como flui da estatuição do supracitado artigo 62°: a) A sua afetação com observância do cumprimento da lei; b) O pagamento da justa indemnização; 4ª) O direito à "Justa indemnização" consiste num direito, com natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias tuteladas pela Constituição e a sua forma de quantificação está prevista nos artigos 22° a 31°, do Código das Expropriações, na versão de 1999.

    5ª) Numa fórmula sem primor técnico-jurídico, o direito à justa indemnização há-de assegurar ao expropriado a possibilidade de aquisição da propriedade de outro bem, com as características, iguais ou equivalentes, à expropriada, com o produto pecuniário recebido como compensação pela expropriação; 6ª) A expropriação por utilidade pública há-de respeitar os princípios constitucionais da adequação, da necessidade, da proporcionalidade e da igualdade; 7ª) O cálculo da justa indemnização há-de fazer-se com reporte à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo por referência o destino efetivo ou possível do bem expropriado e na perspectiva de uma utilização normal, como flui do regime do artigo 22°, n.°2, do Código das Expropriações; 8ª) As disposições combinadas dos artigos 205°, n.°l, da Constituição da República Portuguesa, 607° do Código de Processo Civil e 24° da Lei 62/2013, de 26/08 (Lei da Organização do Sistema Judiciário) impõem aos tribunais a obrigação legal de fundamentarem as suas decisões; 9ª) De uma breve exegese do regime jurídico da obrigação de fundamentar a sentença destacam-se os seguintes atos: a) Declaração dos factos provados; b) Declaração dos factos não provados; c) Análise crítica das provas; d) Indicação das ilações tiradas dos factos instrumentais; e) Indicação dos demais fundamentos decisivos para a convicção do julgador; 10ª) A sentença sob censura não as contém as estatuições referidas na conclusão antecedente; 11ª) Com efeito, no capítulo dos factos provados, a Mma Juíza «a quo» releva a circunstância de as parcelas de terreno estarem abrangidas pelo Plano Diretor Municipal do concelho de … (o que é uma evidência despropositada, porquanto aqueles Planos sempre abrangem a área do concelho) e omite a vigência do PROT - Algarve, criado pelo Decreto Regulamentar n°. 11/91, de 21/03, que sujeitou todas "as ações com incidência direta ou indireta, na ocupação, uso ou transformação do solo a praticar ou a desenvolver por qualquer entidade no território abrangido pelo PROT - Algarve" ao seu regime, com eficácia vinculativa sobre todos os demais instrumentos de gestão territorial urbanística, o que deve ser elevado à matéria provada.

    12ª) A sentença recorre a factos conclusivos, insusceptíveis de valoração fáctica como suporte de qualquer decisão judicial. Tal sucede no ponto 5, dos factos provados, onde se consigna que as infraestruturas em causa “não foram todavia concluídas e se encontram com algum grau de degradação e inoperacionais"; 13ª) Por se não tratar de factos jurídicos, devem os mesmos ser eliminados; 14ª) No ponto 9 dos factos provados regista-se "Um pedido de Informação Prévia, com vista ao desenvolvimento de um objeto turístico com componente imobiliária, a Câmara Municipal de … deliberou, em Dezembro e 2004, remeter para a revisão do PDM a alteração da classificação dos solos da zona ". Este facto é inócuo e sem qualquer valor em termos de prova, só colhendo sentido com a identificação da autora do pedido, que é, nem mais nem menos, a expropriada, como se alcança dos documentos suporte do sobredito facto junto aos autos; 15ª) A Mma Juíza «a quo» não declarou os factos que julgou não provados, remetendo para uma forma, proibida por lei, e com declaração pela negativa e em termos abstratos, com o seguinte conteúdo: "Os demais que, com relevo para a causa, não constam provados: 16ª) A recorrente ficou sem saber: a) Quais os factos considerados alegados nos autos; b) Quais, entre os factos considerados alegados, a Mma Juíza considerou terem relevância para a causa; c) Quais, entre os factos alegados e considerados com relevância para a acusa, não foram considerados provados; 17ª) Neste contexto, a recorrente está sem saber qual a posição real do tribunal sobre cada facto; 18ª) A sentença recorrida também não procede à análise crítica das provas, mormente, daquelas que determinaram a não respectiva demonstração, de tal modo que, a expropriada não sabe quais as provas carreadas ao processo que foram insuficientes para a sua evidenciação; 19ª) Por outro lado, a sentença recorrida lança mão de documentos não revestidos de força probatória, nos termos do artigo 371°, do Código Civil, para considerar provados os factos dos pontos 2 a 9, tal como os projetos de execução e planta parcelar, e outros que a própria sentença não identifica, para dar como assentes aqueles pontos; 20ª) A sentença recorrida não faz qualquer análise crítica concreta à prova dos pontos 3, 6, 7, 8, e 9 dos factos provados do teor de fls. 1092, com o próprio teor dos autos, desconhecendo-se o que pretende significar com o conceito "o próprio teor dos autos "; 21ª) Pelas razões invocadas, é nula a sentença por violar o regime do artigo 615°, n.°l, alínea b) do Código de Processo Civil.

    22ª) Os documentos autênticos, "exarados por autoridade ou oficial público competente, em razão da matéria e do lugar", "fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas perceções da entidade documentadora" nos termos dos artigos 369° e 370° do Código Civil; 23ª) Por força do dito em 22a) tinha que ter sido dado como provado o facto: "Em 17/03/2003, a Câmara Municipal de … atestou que o prédio de onde foram destacadas as parcelas expropriadas não têm capacidade para produzir quaisquer rendimentos agrícolas" conforme resulta do Documento n° 2, junto com as alegações de 06/11/2007, a fls. 904 dos autos; 24ª) Por força do dito em 22a) tinha que ter sido dado como provado o facto: "Por despacho do Senhor Secretário de Estado da Administração local e Ordenamento do Território (SEALQD, de 24/06/2004, pela Informação n° 570/94, elaborada pela Adjunta Chefe de Gabinete do Senhor SEALOT em 24/006/1994, por Ofício n° 2661 de 17/05/1997, do Senhor Presidente da CCDRA e pela Informação n° 557/DROT-94, elaborada pelos Serviços da CCDRA, em 12/04/1994, foi declarada expressamente a compatibilidade com o PROTAL da Ia Fase do Loteamento, licenciada pelo Alvará n° 80/73, emitido pela CM. …, em 18/04/1973 e constituída por 157 lotes integrados em zona de ocupação turística, abrangendo as parcelas expropriadas" conforme resulta do Doe. junto com o requerimento de 17/03/2008, a fls. 948 e ss dos autos; 25ª) Em matéria de fixação da indemnização, em processos de expropriação por utilidade pública, como o dos autos, reveste importância basilar a classificação do solo expropriado, por determinante da fórmula de cálculo do valor devido; 26ª) Retira-se do Relatório dos peritos, a fls. 10, na resposta aos quesitos, em "3o" e "4o", 10°, que os mesmos utilizaram informação resultante de processo diverso destes autos e de 2005, i.e., posterior à DUP e a estes autos!!; 27ª) Se, para resposta a alguns quesitos, servem aos peritos os elementos/ documentos/ decisões posteriores à data da DUP, já que se reportam a elementos de facto existentes à data da DUP, terão que servir também e ser considerados os restantes elementos/ documentos/ decisões constantes do processo que estejam na mesma situação, i.e., ainda que resultantes de procedimentos ulteriores à data da DUP, que confirmem factos existentes à data desta; 28ª) Se uma norma só é revogada em 2008, estava plenamente vigente e aplicável à data da DUP, o que a Mm.a Juíza «a quo tinha» obrigação de saber, padecendo a sentença de erro ao julgá-la inaplicável; 29ª) A sentença «sub iudice» invoca a inexistência de elementos, nos autos, que imponham a classificação do solo como apto para construção, o que conforma erro grave de julgamento; 30ª) A verificação das circunstâncias previstas nas alíneas do n° 2 do art. 25° do Código das Expropriações não é cumulativa, errando o Tribunal «a quo» ao declará-lo; 31ª) Estão preenchidos os requisitos previstos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
6 temas prácticos
6 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT