Acórdão nº 31971/15.1T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelANA LUÍSA GERALDES
Data da Resolução21 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I – 1. AA intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra: C.P. – Caminhos de Ferro Portugueses, E.P.

Pedindo que o Tribunal declare ilícito o seu despedimento e condene a Ré a pagar-lhe:

  1. A quantia ilíquida de € 587,09, que deve ser contabilizada desde o dia 19 de Outubro de 2015 até ao trânsito em julgado da decisão que vier a declarar a ilicitude do despedimento, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde a citação da Ré e até integral pagamento, tudo nos termos dos nºs 1 e 2, do artigo 390º, do Código do Trabalho; b) Uma indemnização no valor de € 80.608,00, se se atender ao critério dos 15 dias por cada ano ou fracção de antiguidade, ou no valor de € 161.260,00, se tal critério for fixado em 30 dias, ou ainda de € 241.868,00, se tal critério for fixado em 45 dias, face ao disposto no nº 1, do artigo 391º, do Código do Trabalho; c) O proporcional do subsídio de Natal relativo ao ano de 2014, no valor ilíquido de € 3.632,75; d) O proporcional do subsídio de férias relativo ao ano de 2014, no valor ilíquido de € 3.602,73; e) Juros de mora vencidos e vincendos sobre as quantias referidas em a) e b), desde a data da citação da Ré até integral pagamento; f) Juros de mora vencidos e vincendos sobre as quantias referidas em d) e e), desde a data de vencimento das mesmas, em 29 de Novembro de 2014, até efectivo e integral pagamento.

    Alegou, para o efeito e em síntese, que: O Autor trabalhou sob a direcção e autoridade da Ré desde 1 de Outubro de 1971 até 28 de Novembro de 2014, data em que completou 70 anos de idade.

    Porém a Ré, antes daquela data, em 30 de Junho de 2014, entregou-lhe uma carta na qual lhe comunicou que uma vez que o Autor iria completar 70 anos de idade em 28 de Novembro de 2014 e já não necessitava dos seus serviços, cessava por caducidade o vínculo laboral com o mesmo a partir do dia 29 de Novembro de 2014.

    O Autor, na data em que perfez 70 anos, não auferia qualquer subsídio ou complemento de reforma, sendo que apenas deu início a tal processo em 3 de Dezembro de 2014, pelo que entende que a Ré não podia operar a caducidade do seu contrato de trabalho na referida data.

    Pelo que, ao actuar dessa forma, a Ré mais não fez do que proceder ao despedimento do Autor, despedimento esse ilícito por inexistência de justa causa.

    Por isso, tem o Autor direito a receber todas as quantias que deixou de auferir, e que peticiona, desde a data do seu despedimento, que deve ser declarado ilícito, até ao trânsito em julgado da decisão que assim o decidir, excluídas as quantias auferidas ou previstas nas alíneas a) a c), do nº 2, do art. 390º do CT.

    2. A Ré contestou argumentando que o contrato de trabalho do Autor cessou validamente por caducidade, por o Autor ter atingido os 70 anos de idade, nada lhe sendo devido uma vez que os créditos laborais lhe foram integralmente pagos.

    Invocou também que, se acaso se considerar ter ocorrido uma situação de despedimento ilícito, as legais consequências sempre seriam as previstas nas regras especiais dos contratos a termo.

    1. O Autor respondeu à contestação, mas aceitou expressamente que a Ré lhe pagou as quantias vertidas nos recibos juntos aos autos.

    2. Foi proferido saneador-sentença no qual se decidiu: «

      1. Julgar improcedente o pedido de declaração de ilicitude do despedimento do Autor e, consequentemente, os pedidos formulados sob os pontos 2 e 3 do pedido; B) Condenar a Ré CAMINHOS DE FERRO PORTUGUESES, EP, no pagamento ao Autor AA da quantia de € 229,81 (duzentos e vinte e nove euros e oitenta e um cêntimos), absolvendo-a do mais peticionado.

      Custas por ambas as partes, na proporção de 99% para o Autor e 1% para a Ré.» 5. Inconformado, o Autor apelou.

    3. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão, em 08 de Fevereiro de 2017, tendo deliberado nos seguintes termos: «Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por AA, revogando a sentença recorrida e, em consequência, - declara-se que não operou a caducidade do contrato de trabalho a que se referem os autos; - declara-se a ilicitude do despedimento do Autor; - condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia que se liquidar posteriormente à sentença, relativa a salários intercalares, desde 19 de Outubro de 2015 e até à data do trânsito em julgado da presente decisão, descontadas as quantias entretanto auferidas, a título de pensão por velhice, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento; - condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de 65.508,52 € (sessenta e cinco mil, quinhentos e oito euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de indemnização em substituição da reintegração, quantia acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento.» 7. Irresignada a Ré interpôs recurso de revista, no qual formulou, em síntese, as seguintes conclusões: A) A R. não se conforma com a decisão recorrida, uma vez que, em seu entender, a Relação não julgou bem a questão, ao contrário da 1a Instância que decidiu em conformidade com a lei e com os factos assentes; B) A MMª Juíza considerou, e bem, que a caducidade invocada está prevista e regulamentada no Código do Trabalho em vigor, uma vez que não há qualquer dúvida que foi invocada para a data em que o trabalhador completava 70 anos de idade, data em ela pode operar se, nesse sentido, houver manifestação da empregadora, como aconteceu; C) A simples análise dos presentes autos demonstra, claramente, a total falta de razão do Tribunal da Relação de Lisboa, ao decidir como decidiu, para mais numa questão meramente de Direito; D) O Tribunal da Relação não aceitou que a idade de 70 anos constitui fundamento para se invocar a caducidade do contrato de trabalho, o que contraria até o próprio entendimento do A., por um lado, e o disposto no Código do Trabalho, por outro; E) De acordo com a Doutrina do Acórdão recorrido, o contrato de trabalho nunca vai caducar por efeito da idade, tenha o trabalhador 70, 80 ou 90 anos, o que retira qualquer utilidade ao disposto nas invocadas disposições do Código do Trabalho, no que à idade diz respeito; F) O art. 348° do CT que tem por epígrafe "Conversão em contrato a termo após a reforma por velhice ou idade de 70 anos", está incluído no respectivo Capítulo VII, sob a epígrafe "Cessação de contrato de trabalho", e na Secção II, que tem por epígrafe "Caducidade de contrato de trabalho", o que significa que a idade de 70 anos é causa tanto de caducidade de contrato de trabalho como de reforma do trabalhador; G) Se as duas situações têm tratamento idêntico, tal como se preconiza no art. 348° do CT, tem que ser possível ao empregador, em ambas, pôr termo ao contrato antes que ele se converta em contrato a termo, pois só assim se garante a igualdade de regime; H) Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento de forma adequada; I) Mas mesmo admitindo, por mera hipótese de raciocínio, e sem conceder, que a ora Recorrente não podia ter feito caducar o contrato de trabalho do A., a consequência não é, nem pode ser, a da aplicação ao caso dos efeitos da ilicitude do despedimento, mas das regras especiais relativas aos contratos de trabalho a termo – art. 393° do CT; J) A não se entender assim estará a violar-se, como acontece com o Acórdão recorrido, o disposto nos arts 343°, 348° e 393°, todos do Código do Trabalho, e o art. 9o do CC; K) Julgando em contrário o Acórdão recorrido violou as disposições legais invocadas nas precedentes conclusões.

      Conclui, assim, a Ré pedindo a revogação do Acórdão da Relação de Lisboa com a sua consequente absolvição, nos termos que constam da sentença proferida pela 1ª instância.

    4. O Autor, por seu turno, contra-alegou tendo formulado, em síntese, as seguintes conclusões: I. A alínea c), do art. 343º do Código do Trabalho, determina que o contrato de trabalho caduca, nos termos gerais, nomeadamente "com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez." II. O art. 348º do Código de Trabalho determina quando é que se verifica a conversão em contrato a termo após a reforma por velhice ou idade de 70 anos.

      1. Da interpretação conjugada dos dois dispositivos legais facilmente se conclui que o facto que determina a efectiva verificação da caducidade do vínculo laboral é a reforma efectiva do trabalhador, por velhice ou invalidez, quando complete 70 anos e se encontre ainda a trabalhar por conta e sob direcção de uma entidade patronal.

      2. Isto é, não basta que o trabalhador complete 70 anos para que a caducidade do contrato opere, é necessário que, simultaneamente, o trabalhador se encontre reformado, a essa mesma data, por invalidez ou reforma.

      3. Com efeito, caso o trabalhador complete 70 anos de idade e não se encontre ainda reformado, o contrato de trabalho converte-se num contrato de trabalho a termo, por seis meses, renovável, sem sujeição a limites máximos, sendo que a sua caducidade depende da comunicação efectuada pela entidade patronal ou pelo trabalhador, com um aviso prévio de sessenta dias ou quinze dias, consoante a iniciativa parta daquela ou deste, tudo conforme dispõe o nº 1, alíneas b) e c), do nº 2, do art. 348º, do Código do Trabalho, por remissão do seu nº 3.

      4. Atendendo à prova produzida nos autos que confirma que o Apelante, à data em que completou 70 anos de idade, não se encontrava reformado por velhice ou invalidez, a caducidade não poderia ter operado.

      5. Assim, nada mais pode concluir-se que, tendo a Apelada utilizado um meio não admitido pela lei para pôr termo à relação laboral que mantinha com o Apelante, agiu contra o estabelecido na lei.

      6. Efectivamente, o acto ilícito não é mais do que um acto praticado contra o que dispõe a lei em vigor, pelo que o despedimento do Apelante não...

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