Acórdão nº 842/10.9TBPNF.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução07 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

  1. AA intentou acção declarativa, com a forma de processo comum ordinário, contra BB e CC, pedindo que os réus sejam condenados, “em alternativa, à escolha do autor”, nos seguintes termos: a) A ver transmitidos para o autor 32/100 do direito de propriedade sobre os imóveis descritos na Conservatória do Registo Predial de Penafiel, com os números de ficha 248 da freguesia de Pinheiro e 208, 815, 816, 817, 818, 819, 810, 821, 822, 823, 824 e 825 da freguesia de Valpedre; b) A pagar ao autor a quantia de € 267.061,98, acrescida de juros à taxa legal sobre o montante indicado, desde a citação e até integral pagamento.

    Como fundamento da sua pretensão, alegou o autor em síntese: nos anos de 80 e 90 do século passado, viu-se confrontado com uma acção executiva hipotecária que lhe foi movida, bem como a outros executados, pelo então Banco DD; na negociação que manteve com o referido banco surgiu como possibilidade, aventada por funcionário bancário, a de fazer adquirir por terceiro o crédito exequendo e de adquirir ao banco os imóveis que para este se haviam transmitido; no quadro do relacionamento de confiança e de grande amizade que então mantinham, autor e réu decidiram aceitar a solução apresentada e, nesse enquadramento, o réu adquiriu o crédito exequendo, habilitando-se para prosseguir os termos da acção executiva, e um conjunto de imóveis; acertaram que o investimento necessário seria efectuado por autor e réu, na medida das respectivas disponibilidades, dando origem a um projecto de investimentos comuns, orientado para a recuperação e rentabilização dos capitais a investir; no quadro deste projecto, seriam suportados por ambos e nas proporções que viessem a ser fixadas, a oportunidade de negócio, as despesas e investimentos realizados e seriam distribuídos por ambos, ou suportados por ambos, os lucros e/ou as menos valias que viessem a ser realizadas, também na proporção dos respectivos investimentos; acordaram ainda que seria mantida uma conta-corrente de despesas e receitas reflectindo o valor da “carteira de investimentos”, mantida, ao longo de anos, até 30 de Abril de 2002; o acordo com o Banco DD veio a ser formalizado por 55.000.000$00, dos quais, 35.000.000$00 respeitam à cessão do crédito e 20.000.000$00 à compra e venda de imóveis, adquirindo os réus quer o crédito e a posição processual de exequente, quer o conjunto de imóveis, estes adquiridos por escritura de 14 de Setembro de 1993, passando autor e réu a concorrer com os capitais necessários ao investimento, sendo que o autor entregou ao réu, na ocasião da celebração do negócio com o Banco DD, a quantia de dez milhões de escudos; a mencionada conta-corrente serviu, designadamente, para aplicações em instrumentos financeiros, aquisições de créditos, aquisições de imóveis, remunerações dos capitais investidos por autor e réu, pagamento de encargos com escrituras, pagamento de impostos incluindo sisas de aquisições e contribuições autárquicas e remunerações de advogado; em 31 de Dezembro de 2001 a conta-corrente mantida pelo réu BB apresentava um saldo credor a favor do autor AA no montante de 23.034.367$00, o qual por conversão em euros passou a ser do montante de € 114.894,94; e em 30 de Abril de 2002 a conta-corrente apresentava um saldo credor a favor do autor AA no montante de € 115.850,34; na mesma data, apresentava um saldo credor a favor do réu BB no montante de € 320.642,48; estes saldos traduziam o entendimento do réu BB sobre o resultado da globalidade das operações em que autor e réu estavam interessados; surpreendentemente, em 2002 o réu BB mandou refazer as conta-correntes, introduzindo nelas movimentos a débito e crédito não autorizados pelo autor, estranhos ao objecto da associação, por forma a fazer reflectir o resultado de “empréstimo” que entretanto efectuara a EE e marido FF. por escritura de mútuo com hipoteca outorgada em 21 de Março de 2000; o património adquirido pelo réu no âmbito da sociedade irregular que constituiu com o autor tem o valor unitário de € 25.000,00 por cada um dos lotes da freguesia de Pinheiro, sendo que de tais lotes os réus venderam 6 e fizeram contas relativamente ao apuro da venda de 4 deles; donde ao autor cabe, na proporção do investimento, o montante de € 95.769,20; a parte sobrante do prédio da freguesia de Pinheiro tem a área de 70544 m2 e um valor superior a € 350.000,00, cabendo ao autor, na proporção do investimento, o montante de € 111.730,73; já o terreno da freguesia de Valpedre tem um valor superior a € 180.000,00, cabendo ao autor, na proporção do investimento, o montante de € 59.562,06; em conclusão, do valor dos imóveis adquiridos pela sociedade irregular constituída entre autor e réu pertence àquele o montante de € 267.061.98; a estar regularizada a propriedade, caberia divisão: não o estando, assiste ao autor o direito de peticionar dos réus o pagamento de quantia em dinheiro correspondente à quota-parte do investimento efectuado para aquisição dos bens; os imóveis adquiridos pelo réu, parcialmente com dinheiro do autor, estão integrados no património do casal constituído por ambos os réus, assim enriquecidos; na medida em que a aquisição dos imóveis foi efectuada também com dinheiro do autor, assiste a este o direito de haver para si parte do património adquirido e entretanto transformado; como decorre até do facto de ambos – autor e réu – terem conduzido e financiado o processo de loteamento de um dos imóveis adquiridos; atenta a concreta forma utilizada, está excluída a possibilidade de divisão da coisa comum, pois que inexiste título de compropriedade; o autor não dispõe de título, nem está em condições de alegar factos dos quais pudesse decorrer o direito à aquisição derivada ou originária da propriedade; o autor participou, assim, com 32% dos montantes investidos pelos réus para aquisição do património, sendo que por carta de Outubro de 2002, o réu reconhecia que os resultados do investimento deveriam ser repartidos em partes iguais, o que conduziria à formulação de pedido por montante bem superior; porém, o autor tal como não aceita a consideração de negócios em que não participou, também não pretende mais do que aquilo que havia convencionado; do exposto resulta dever ser reconhecido ao autor o direito de haver para si 32% do direito de propriedade sobre os imóveis identificados ou, em alternativa, o de haver para si a parte proporcional do valor actualizado de todos os imóveis; soluções a que se deverá chegar, seja pelo reconhecimento da constituição de sociedade irregular, seja por aplicação das regras do enriquecimento sem causa.

    Os réus contestaram e deduziram reconvenção, alegando em síntese: os réus divorciaram-se em 10 de Julho de 2009; refutam os fundamentos da pretensão do autor, nomeadamente que a entrega pelo autor ao réu da quantia de 10.000.000$00 o tenha sido a título distinto de um mero mútuo ou empréstimo; acresce que o autor assumiu que suportaria a diferença do valor que o Banco DD propunha face à proposta do réu, para a concretização do negócio do qual o autor dá nota no seu articulado, no valor de 6.500.000$00, o que nunca fez; por via do acordo celebrado com o Banco DD, o réu aceitou que o autor participasse neste investimento, assumindo ambos um projecto que consistia na rentabilização dos imóveis adquiridos pelo réu e realização de investimentos futuros em imóveis, passando ambos a concorrer com os capitais necessários e na medida das disponibilidades de cada um, orientado para a recuperação e rentabilização dos capitais investidos e a investir; autor e réu acordaram ainda, como condição para a aceitação dos termos propostos pelo Banco DD, que o risco de um qualquer prejuízo decorrente deste negócio impendia sobre o autor, que o capital investido no projecto de investimento que ambos iniciavam, venceria juros à taxa de juro praticada pelas entidades bancárias, em vigor em cada momento, deduzidos 2 pontos percentuais, que com a venda de todos os bens adquiridos seria pago o capital investido na proporção do respectivo investimento e divididos os lucros em partes iguais e, finalmente, que autor e réu acompanhariam todo o processo até final; foi criada uma conta corrente de despesas e receitas, com início em 23 de Março de 1992, onde passaram a ser registados os investimentos realizados e todas as operações financeiras relacionadas com o projecto de investimento, sendo os lançamentos em tal conta corrente efectuados por ordem do autor e réu; nos termos da respectiva conta corrente, o autor apenas investiu a quantia de 13.200.000$00, sendo que, em 5 de Dezembro de 1996, o réu entregou ao autor o aludido montante; em inícios de Março de 1997, o autor, sabendo que o seu cunhado GG iria intentar acção judicial contra ele e sua mulher, com a consequente penhora dos bens e, apesar de ter feito doação do prédio, que constituía a sua habitação, a favor das suas três filhas, pediu especial favor ao réu para a transmissão da titularidade do mesmo imóvel a favor deste ou a favor da Imobiliária HH, Lda., da qual o réu é sócio-gerente; em nome da amizade que os unia, o réu acedeu na transmissão de titularidade do imóvel a favor da referida Imobiliária HH, Lda., que, por sua vez, e de acordo com o autor celebrou contrato de locação financeira imobiliária, tendo o autor assumido perante o réu todas as despesas e pagamento das rendas inerentes ao referido contrato de locação financeira; entretanto, passou a Imobiliária HH, Lda., a suportar o pagamento de todas as rendas e despesas relativas ao contrato de locação financeira, passando todos os movimentos a constar da conta corrente geral; também em 5 de Junho de 1997, a Imobiliária HH, Lda., adquiriu 2 terrenos, sendo que para pagamento do valor da aquisição dos imóveis supra referidos e respectivas despesas, o autor e mulher comparticiparam com o valor 50% do preço da compra, tendo-lhes sido reconhecido pelo réu enquanto sócio gerente da Imobiliária HH, Lda., o direito...

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