Acórdão nº 4680/07.8TBVLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DA SILVA GONÇALVES
Data da Resolução21 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, representada pelo seu filho BB na qualidade de seu tutor provisório, instaurou a presente ação declarativa de condenação contra o “Fundo de Garantia Automóvel”, alegando, em breve resumo, que, no dia 19/11/2004, pelas 21,30 horas, quando atravessava a Rua …, em Valongo, foi atropelada por um veículo automóvel que, então, circulava nessa via, o qual lhe causou múltiplas lesões graves, que lhe retiraram qualquer capacidade para trabalhar e cuidar de si própria e a tornaram permanentemente dependente do acompanhamento de terceira pessoa.

O referido atropelamento foi, única e exclusivamente, da responsabilidade do condutor daquele veículo, mas ignora a identidade do mesmo; por isso, pretende que o réu o indemnize, para além dos danos não patrimoniais que já ressarciu, também pela perda da sua capacidade de ganho, que contabiliza em 450.000,00€ e isto porque trabalhava, à data, como empregada doméstica para quatro pessoas distintas e, nessa medida, viu eliminado o seu rendimento.

Termina pedindo a condenação do réu a pagar-lhe o referido valor de € 450.000,00, acrescido de juros moratórios contados desde a data da citação até integral pagamento.

Contestou o réu.

Sem questionar a sua responsabilidade reparatória, confirma que já ressarciu a autora pelos danos não patrimoniais que a mesma sofreu, no valor de € 50.000,00, tendo ainda pago a quantia de € 7.630.47 pelo seu internamento hospitalar.

A autora, todavia, apesar de ter recebido as indicadas quantias, declarou não prescindir das perdas patrimoniais que não fossem assumidas pela seguradora do acidente de trabalho, sendo que o mesmo acidente estava a coberto de seguro de acidentes de trabalho celebrado entre CC e a “Seguros DD, S.A..”, estando a ser pagas, assim, no âmbito de tal processo, as indemnizações que lhe são devidas.

Desta forma concluiu que a autora já foi indemnizada pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu.

Por outro lado, com o objetivo de a referida seguradora vir a exercer os eventuais direitos decorrentes dos valores já pagos, requereu ainda a intervenção provocada da mesma seguradora.

A autora replicou alegando que a responsabilidade por acidentes de trabalho, acionada no âmbito do processo emergente de acidente de trabalho, não abarca a totalidade dos danos patrimoniais por ela sofridos, na medida em que prestava a sua atividade laboral para quatro pessoas diferentes e naqueles autos interveio apenas uma delas, representada pela sua seguradora.

Entretanto, o réu veio dar conta de que a “DD Seguros, S.A.” tinha instaurado contra si uma ação judicial destinada a efetivar os respetivos direitos decorrentes dos pagamentos efetuados à autora em resultado do contrato de seguro de que a mesma é beneficiária.

Nesta medida, desistiu da intervenção provocada daquela seguradora e requereu, em simultâneo, a apensação daquela ação a esta.

Solicitada certidão daquela ação, que corria termos no 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, sob o n.º 243/08.9TBVLG, bem como informação do seu estado, foi decidido, por despacho datado de 25/09/2009 (cfr. fls. 232/233), indeferir a requerida apensação de ações e ordenada a notificação do réu para, no prazo de dez dias, esclarecer se ainda pretendia a intervenção da “DD Seguros, S.A.”.

O réu veio, então, no dia 16/10/2009, responder, informando que desistia da "intervenção provocada da seguradora DD Seguros, S.A. e respectiva apensação de processos, dado já existir, quanto a esta, acção judicial em fase de julgamento".

Entretanto, tendo sido ordenada a apensação a esta ação da ação n.º 4043/10.8 TBVLG, por despacho de 27.10.2011 (cfr. fls. 254ª a 254B), considerando que o despacho que ordenou tal apensação não transitou em julgado e não se mostravam também verificados os pressupostos para tal apensação, foi ordenada a devolução do aludido processo à sua origem.

Inconformado com esta ordem, reagiu o réu interpondo recurso, no qual sustenta, em suma, que a indicada apensação de ações é legal e que o Tribunal recorrido não podia ordenar a referida devolução do processo n.º 4043/10.8 TBVLG.

A Relação, todavia, por acórdão proferido em 24.11.2015 (cfr. fls. 515 a 521), com o fundamento em que, face ao disposto nos n.º s 2 e 3 do citado art. 275.°, inexiste fundamento para, em cumprimento da decisão proferida naquele processo n.º 4043/l0.8TBVLG, se admitir a respectiva apensação aos presentes autos, manteve a decisão da 1.ª instância que ordenou a desapensação do processo n.º 4043/l0.8TBVLG e a sua devolução ao tribunal, donde proveio.

No subsequente desenvolvimento processual teve lugar a audiência prévia e, em seguida, a audiência final.

Finda esta, foi proferida sentença na qual se condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 280.000,00, a título de indemnização, acrescida de juros moratórios, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento.

Inconformado com esta sentença, recorreu o réu para a Relação do Porto que, por acórdão de 08.07.2015 (cfr. fls. 445 a 467), negou provimento aos recursos interpostos pela autora e pelo réu em relação à sentença recorrida e, consequentemente, manteve em vigor o decidido nessa sentença.

Irresignado, recorre agora para este Supremo Tribunal o réu Fundo de Garantia Automóvel, que alegou e concluiu pelo modo seguinte: 1.

Inconformado com o teor do Acórdão proferido em 08.07.2015 pelo T.R.Porto, interpôs o FGA recurso o qual versará sobre dois temas.

  1. O primeiro sobre o recurso de agravo interposto que subiu juntamente com a Apelação, e que o Tribunal a quo decidiu em sede de "II - Questão Prévia", entendendo que o Apelante carecia de legitimidade para o efeito.

  2. Mas o facto é que o Tribunal a quo cometeu um lapso ao decidir com tal fundamentação pois confundiu dois pedidos de apensação distintos que o Recorrente fez no decurso do processo em 1.ª instância.

  3. À data da Contestação apresentada pelo Apelante, havia apenas mais uma acção, a n.º 322/054TTVLG - acção especial de acidente de trabalho em que a seguradora era a Real Seguros, cuja intervenção se requereu.

  4. Entretanto, precisamente por causa dos valores que havia pago na ora referida acção de trabalho, a Real Seguros interpôs uma acção contra o FGA, a Acção com Processo Ordinário n.º 243/08.9TBVLG. Tendo o FGA requerido a apensação da Acção n.º 4680/07.8TBVLG com essa n.º 243/08.9TBVLG.

  5. Esse requerimento foi apreciado pelo citado despacho de 25.09.2009 que indeferiu a apensação e ordenou a notificação do FGA para informar se ainda pretendia a intervenção da seguradora.

  6. E realmente o Apelante FGA, por requerimento de 15.10.2009, desistiu do incidente de intervenção bem como da apensação da Acção n.º 4680/07.8TBVLG com a n.º 243/08. 9TBVLG.

  7. Só que, entretanto, a DD Seguros, então já denominada EE Seguros, interpôs mais uma acção judicial contra o FGA, com o n.º 4043/10.8TBVLG; por causa do mesmo acidente, da mesma sinistrada, só que reclamando o reembolso de novos pagamentos que entretanto havia feito. E nessa acção n.º 4043/10.8TBVLG o FGA, na contestação, requereu a apensação desses autos ao processo n.º 4680/07.8TBVLG.

  8. Ou seja, houve um novo pedido de apensação com uma nova acção, apensação essa que foi admitida pelo Juiz do processo 4043/10, que ordenou a remessa daqueles autos aos autos 4680/07 para apensação.

  9. Só que, chegados os autos do processo 4043/10 ao processo 4680/07, o Juiz deste processo, em 27.10.2011, proferiu despacho que julgou inadmissível a apensação já decida naqueloutro processo e ordenou a devolução do processo 4043/10.

  10. E foi desse despacho, de 27.10.2011, que o FGA interpôs recurso de agravo.

  11. Há assim dois pedidos de apensação distintos, quer no tempo quer quanto às acções a apensar e por isso, ao contrário do decidido no Acórdão ora em crise, o Apelante não acatou o despacho de que interpôs recurso, nem desistiu dessa apensação.

  12. Não existindo assim fundamentos nem de facto nem de direito que permitissem concluir pela ilegitimidade do Apelante, tendo o Tribunal a quo confundido os elementos constantes do processo, gerando assim uma ambiguidade entre estes e a decisão proferida, o que salvo melhor opinião, gera mesmo a nulidade do Acórdão nos termos conjugados nos artigos 615.º, n.º 1, al. c) e 666.º, n.º 1 do C.P.Civil.

  13. O segundo fundamento de recurso prende-se com a dedutibilidade dos valores recebidos pela Recorrida aos montantes a pagar pelo Recorrente.

  14. O aqui Recorrente, em sede de Apelação, requereu que, a final, lhe fosse reconhecido o direito de descontar do montante indemnizatório fixado os montantes que a apelada já tinha recebido do seguro, como era intenção do Tribunal de 1.ª instância, apesar de não expresso no dispositivo da sentença.

  15. O Tribunal a quo considerou que assistia razão ao Apelante, anulou a sentença mas decidiu que não havia que fazer nenhum desconto nem compensação, julgando adequado o pagamento integral de € 280.000,00 17.

    Tal conclusão assenta em três fundamentos nucleares que o Recorrente considera estarem errados.

  16. O FGA é um mero garante da indemnização devida por veículo com condutor desconhecido ou que não beneficie de seguro válido e eficaz, como desde sempre reconhecido pela lei e...

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