Acórdão nº 127/10.0TBPDL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução05 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, …, S.A., propôs a presente acção com processo ordinário contra Banco BB, S.A., sociedade aberta, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de € 35.162.646,26, acrescida de juros a contar da citação e até efectivo e integral pagamento.

Fundamenta este pedido, em síntese, dizendo que em 20/6/2000, a A. adquiriu à sociedade “CC, SA” que, por sua vez, detinha a “DD, SA”. Entre Fevereiro e Março de 1999, a “DD, SA” adquiriu em bolsa 2.200.000 acções representativas do capital social do BBB (de ora em diante “acções BBB”), escriturais e nominativas, pelo preço total de € 59.851.209,00, através de financiamento concedido pelo Banco EE. Para garantia do cumprimento das obrigações emergentes dos contratos de mútuo celebrados com o EE, a “DD, SA” constituiu, a favor deste Banco, penhor sobre as mencionadas acções e ainda sobre outras acções de que era também titular. Em Novembro de 1999, ocorreu o split das acções, passando a “DD, SA” a deter cinco novas acções por cada uma das antigas, ou seja, passou a deter 11.000.000 «acções BBB». Em Abril de 1999, a “DD, SA” adquiriu mais 188.180 acções representativas do capital social do BBB («acções BBB»), escriturais e nominativas, pelo preço total de € 997.589,18. Em 15/12/2000, obtido o consentimento da ora R., a “DD, SA” transmitiu à ora A. a posição que detinha nos contratos de mútuo acima identificados, bem como as «acções BBB» da sua titularidade, que se mantiveram empenhadas a favor do Banco. Em 2001, no âmbito da “Campanha Accionista 2001”, a A. adquiriu 895.054 «acções BBB», escriturais e nominativas, pelo preço total de € 3.840.743,81, tendo para o efeito celebrado com a R. um contrato de mútuo, com penhor, para garantia do cumprimento do empréstimo concedido. Acontece que, e ao contrário do que foi assegurado por representantes da R. aos administradores e accionistas quer da “DD, SA”, quer da A., as «acções BBB» não só não se valorizaram, como sofreram uma descida abrupta da cotação. O valor da «acção BBB» que, a partir de 2000, se afastou progressivamente do preço de aquisição, combinado com o custo do pagamento pela A. (que assumiu a posição contratual da “DD, SA” nos contratos de financiamento atrás mencionados) dos juros dos empréstimos concedidos para as aquisições, determinou uma enorme fragilidade na situação económica da A. que culminou com a venda em 2007 da totalidade das acções representativas do capital social da A. à “FF – …, SA”. A “FF, SA” acabou por vender ao “Banco GG, SA” todas as «acções BBB» que a A. detinha, com o propósito exclusivo de estancar os prejuízos acumulados pela A. com a aquisição daquelas acções. O preço da venda (€ 34.920.546,26) foi integralmente entregue à R. para pagamento da dívida da A. resultante dos encargos com os empréstimos contraídos para a aquisição das «acções BBB». Ainda assim, a A. continua devedora perante a R. da quantia de € 19.398.528,91, a título de capital, bem como de € 1.621.142,59, a título de juros. Mais alega que a actuação da R. não foi orientada no sentido de considerar os legítimos interesses dos seus clientes e, nomeadamente, os da “DD, S.A.” e os da A., já que a R., sem atender ao perfil da “DD, S.A.”, nem à respectiva situação financeira, e visando apenas angariar novo accionista e vender acções representativas de cerca de 1% do seu capital social, induziu aquela sociedade a comprar «acções BBB», a contrair crédito e a dar de penhor todas as «acções BBB», entretanto adquiridas. A “DD, S.A.”, nunca teria celebrado os contratos de compra, mútuo e penhor se não fossem os argumentos repetidamente usados pela R. para demonstrar e a convencer de que aqueles negócios não apresentavam risco e ofereciam rentabilidade. Por outro lado, segundo a CMVM, na informação divulgada ao público, entre 1999 e 2007, a R. ocultou prejuízos sofridos, evidenciou proveitos indevidos (porque cobrados, mas não pagos) e ocultou a detenção efectiva e por si própria de «acções BBB». Também de acordo com a CMVM, a R. apresentou entre 1998 e 2008, resultados líquidos empolados e sobreavaliados e não revelou a quantidade de acções próprias “parqueadas” nas offshore Cayman e outras. Ao adquirir as «acções BBB», a “DD, S.A.”, e a A. contaram com as flutuações normais do mercado e não com as cotações artificialmente criadas pela R. A valorização das «acções BBB» artificialmente criada pela R. produziu na “DD, S.A.”, e na A. a convicção de que a aquisição de acções BBB era efectivamente um negócio de baixo risco e, sobretudo, um bom investimento. Se a “DD, S.A.”, e a A. houvessem conhecido a cotação real dessas acções, nunca teriam celebrado os contratos de aquisição das «acções BBB». A R. actuou com culpa, ao induzir a “DD, S.A.”, e a A. a adquirirem acções cujo valor de mercado estava ficticiamente empolado e a contraírem empréstimos em ordem a financiar aquelas aquisições. Depois de descontado o montante de € 9.835.799,96, correspondente ao valor dos dividendos obtidos em virtude da detenção das «acções BBB», o dano da A. corresponde à desvalorização das «acções BBB» adquiridas através de financiamentos propostos, negociados ou concedidos pela R. e ao montante dos juros pagos nos termos desses financiamentos, bem como daqueles que ainda terá de pagar. A A. viu-se forçada a alienar as 12.083.234 «acções BBB» que havia adquirido. O preço da alienação foi integralmente utilizado para amortizar a dívida da A. para com a R. O preço médio de compra por «acção BBB», objecto do presente processo, foi de 5,35 €, enquanto o preço médio de venda por acção foi de 2,89 €. Assim, a menos-valia sofrida pela autora foi de 2,46 euros por acção, o que, multiplicado pelas 12.083.234 acções, totaliza € 29.724.755,64. Para além da menos-valia apurada, há ainda que ter em conta os prejuízos consistentes nos juros, pagos e a pagar, pelos empréstimos contraídos com o objectivo de adquirir as «acções BBB». Tais juros ascendem a € 15.273.690,58 (€ 13.652.547,99, de juros pagos, mais € 1.621.142,59, de juros a pagar entre 2010 e 2012). Como referido, a A. recebeu € 9.835.799,96, a título de dividendos, pelo que o prejuízo sofrido pela A., sem embargo do que se vier a apurar em execução de sentença, se cifra em € 35.162.646,26.

O R. contestou, tendo, para além do mais, excepcionado a ilegitimidade da A. quanto ao pedido de indemnização, tendo por causa de pedir a “intermediação excessiva”, sustentando que, face ao alegado na petição inicial, é a “DD, SA”, e não a A., a titular do correspondente direito de indemnização, uma vez que quando esta sociedade transmitiu à A. as acções e a posição que detinha nos contratos de mútuo garantidos pelo penhor não lhe transmitiu o direito a qualquer indemnização, nomeadamente o resultante de intermediação excessiva, a prescrição do direito decorrente da alegada informação sem qualidade, por ter já decorrido o prazo previsto no art. 243º, al. b), do CdVM e a prescrição dos demais direitos por terem decorrido mais de três anos sobre o conhecimento por parte da A. do direito invocado.

Na réplica, a A. respondeu à matéria das excepções deduzidas, concluindo pela sua improcedência.

O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.

Nesta julgou-se a acção parcialmente procedente condenando-se o R. a pagar à A. a quantia que se vier a apurar em sede de execução da sentença, correspondente à diferença do preço por que a A. adquiriu as 12.083.234 acções aqui em causa e as vendeu, sendo que no preço não se incluirão as taxas de corretagem e bolsa e respectivo imposto de selo. Condenou-se também o R. a pagar à A. a quantia que se vier apurar em sede de execução desta sentença e correspondentes ao juros pagos pela A. relativamente aos contratos de mútuo referidos em 16 e 32 dos factos provados e apenas quanto aos resultantes das prorrogações do pagamento dos mesmo referidos em 39 a 41 dos mesmos factos. Condenou-se ainda o R. no pagamento dos juros, calculados à taxa comercial sobre as quantias apontadas acima e a contar da data da sua liquidação e até integral pagamento. No mais absolveu-se o R. do demais peticionado. 1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu o Banco R. de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí, por acórdão de 16-6-2015, julgado parcialmente procedente o recurso, considerando-se procedente a excepção da caducidade e, em consequência, absolveu-se o R. do pedido. 1-3- Irresignado com este acórdão, dele recorreu a A. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: “QUESTÃO PRÉVIA 1) Ao alterar o ponto 91 da decisão de facto da Sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, donde passou a constar a referência ao EE, deixando de fazer menção à Ré, BBB, o Tribunal da Relação deveria ter especificado nos pontos 92, 93, 97 e 98 daquela decisão que os mesmos se referem ao BBB e não ao EE.

2) Por configurar uma inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto, deve ser rectificada a actual redacção dos pontos 92, 93, 97 e 98 da decisão de facto, de forma a que deles conste a referência ao BBB.

3) Depois de uma Sentença que analisou substancialmente a questão material subjacente ao litígio, proferindo decisão relativa à responsabilidade civil da Ré e desviando-se da senda de julgamentos baseados em questões puramente formais que tanto tem contribuído para o juízo desfavorável que muitas vezes é formulado acerca da aplicação da lei foi com desapontamento que a Autora, ora Recorrente, recebeu a Decisão recorrenda que absolve a Ré com fundamento na excepção de caducidade.

4) O Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão ora em recurso, fez tábua rasa da...

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